Você está na página 1de 77

O JUSNATURALISMO TEOLÓGICO E O DIREITO PENAL POSITIVO: UMA ABORDAGEM

CONTEMPORÂNEA
DIREITO
Questões relevantes envolvendo o Jusnaturalismo Teológico, o qual afirma
a existência do direito natural, e os princípios do Direito Penal e sua
base estrutural e alguns aspectos da Lei de Execução Penal.
ÍNDICE
1. RESUMO
2. INTRODUÇÃO
3. JUSNATURALISMO
3.1 Jusnaturalismo Teológico
3.1.1 Cristianismo e Espiritismo
4. JUSTIÇA HUMANA
4.1 Evolução Histórica da Pena – Aspectos Gerais
4.2 Sistema Penal Atual
4.2.1 Direito Penal
4.2.2 Lei de Execução Penal (LEP)
4.2.3 APAC
5. POR UM NOVO SISTEMA PENAL, O SISTEMA EDUCACIONAL
6. CONCLUSÃO
7. REFERENCIAS
1. RESUMO
O presente trabalho analisa as questões relevantes envolvendo o
Jusnaturalismo Teológico, o qual afirma a existência do direito natural,
constituído de leis universais instituídas por Deus, as quais regem todo
o universo e a vida nele inserido. Leis estas que compreendem as leis
físicas, que regem a matéria e as leis morais, que regem as relações
entre os seres da criação. No presente trabalho abordar-se-á ambas, dando
enfoque especial às leis morais. Para melhor compreensão do tema, o
presente trabalho inicia-se com a análise dos aspectos conceituais do
Direito Natural com base nos ensinamentos desenvolvidos pelo Cristianismo
e pela Doutrina Espírita, os quais trazem um corpo doutrinário que
esclarecem o funcionamento do Universo, a evolução dos seres, o objetivo
da vida e demais questões intrínsecas ao Homem. Abordar-se-á o
posicionamento de diversos juristas que vislumbram no conhecimento
advindo do Cristianismo e da Doutrina Espirita possibilidades de se
reestruturar todo o sistema penal vigente. Com o desenvolvimento do
trabalho será possível um comparativo entre a Justiça Divina e a Justiça
Humana, proporcionando reflexões sobre uma possível adequação desta
àquela. Será abordado, no campo da Criminologia, porém sob o enfoque do
Jusnaturalismo Teológico, a questão do criminoso, da vítima e do ato do
crime em si, trazendo a lume uma visão diferenciada dos temas em
contraponto aos conceitos hoje estabelecidos. Posteriormente é abordado o
Sistema Penal atual, sua evolução histórica, sua estrutura e real
eficácia com relação ao combate à criminalidade. Abordar-se-á, embora de
forma sucinta, os princípios do Direito Penal e sua base estrutural e
alguns aspectos da Lei de Execução Penal, sua efetividade e eficácia.
Abordar-se-á o sistema APAC, um novo modelo na relação sociedade-
condenado. Por fim, conclui-se o presente trabalho propondo a criação de
um novo modelo de resposta à criminalidade e à violência, baseado na
educação moral, único meio real de promover o melhoramento do indivíduo e
a consequente paz social.

Palavras-Chave: Jusnaturalimo Teológico. Direito Penal. Educação Moral.


2. INTRODUÇÃO
A ruptura entre ciência e religião principiado pelo movimento
Iluminista1, iniciado no século XVIII, conhecido como Século das Luzes
(da razão) criou um afastamento entre o pensamento religioso e o
pensamento científico. A ciência passou a basear-se na razão e no
experimento, se libertando dos ditames da Igreja. O pensamento racional
assume papel norteador no progresso social. O avanço da ciência, em todas
as áreas do saber é inegável, e a ciência do direito se inclui nesta
perspectiva.

Analisando o Direito Penal, observa-se, porém, que os avanços não foram


de todo positivos, pois ainda se encontra muito arraigado à filosofia
religiosa da idade média, onde prepondera-se a punição, geradora de dor e
sofrimento, ao criminoso. Consequente a esta visão atrasada, observa-se
um sistema criminal que não atende as suas próprias finalidades de
diminuir a criminalidade social, ressocializando o indivíduo. No Brasil,
o que se tem observado é um aumento da criminalidade e um sistema penal
que fere o princípio basilar da Republica Federativa do Brasil, a
Dignidade da Pessoa Humana.

Imperioso buscar soluções para o atual quadro em que se encontra o


Sistema Penal brasileiro. É preciso uma reestruturação de pensamentos e
ações em prol de um mecanismo que se torne eficaz no combate a
criminalidade e na construção efetiva da paz social.

A aproximação do Jusnaturalismo Teológico numa concepção moderna e da


Ciência do Direito poderá fornecer novas perspectivas e soluções para os
desafios da atualidade. É necessário repensar o direito penal, sem
preconceitos e imposições dogmáticas, mas buscando soluções racionais
capazes de satisfazer os anseios da sociedade.

O Jusnaturalismo Teológico contemporâneo se apresenta como uma


possibilidade de rever valores sociais e estimular o desenvolvimento de
mecanismos eficazes de combate à criminalidade, baseados na solidariedade
entre os indivíduos, na cultura da educação e não da punição por
vingança. Possui como principal característica a exigência de uma fé
raciocinada, baseada no pensamento crítico e racional em detrimento de
movimentos religiosos de outrora, em que a imposição do pensamento
religioso causou grandes malefícios a toda sociedade, durante o período
da Idade Média.

No presente estudo, desenvolver-se-á temas pertinentes ao Jusnaturalismo


com o objetivo de, ao apresentarem-se os ensinamentos de uma filosofia
jusnaturalista, o conhecimento dela advindo, possa auxiliar a repensar as
instituições humanas, adequando-as, quanto possível, à realidade maior da
vida, pois, somente compreendendo a dinâmica da vida e o homem nela
inserido, será possível desenvolver procedimentos eficazes no combate à
criminalidade, que nada mais é, do que a exteriorização das imperfeições
que o Ser possui, momentaneamente, dentro de si próprio.

A Lei do Progresso é notável, e com a evolução do pensamento humano é


necessário que as instituições igualmente evoluam. É preciso avançar
diante dos parâmetros ora estabelecidos, combatendo paradigmas
ineficazes, preconceitos e interesses outros que não a construção de uma
sociedade mais justa, humana e solidária.

3. JUSNATURALISMO
O Jusnaturalismo é uma corrente jusfilosófica que defende a existência de
um Direito Natural. É uma “Corrente de pensamento que propugna pela
existência de um direito justo por natureza, independente da disciplina
social imposta pelo legislador.” (ACQUAVIVA, 2010, p. 507).

O Mestre em filosofia do Direito, Antônio Bento Betioli, assim define o


Jusnaturalismo:

“Tomamos o termo “jusnaturalismo” na sua acepção ampla, designando as


inúmeras correntes de pensamento que admitem, além do direito positivo,
da ordem jurídica estabelecida pelo Estado, e existência de uma outra
ordem sobre que se apoia a ordem jurídica positiva, expressão do justo
que deve orientar o trabalho do legislador humano. (....) há várias
maneiras de se conceber o direito natural; para nós, ele vem a ser a
ordenação jurídica originada e fundamentada na natureza humana, na
acepção específica que lhe damos: síntese entre o “natural” e o
histórico”.” (BETIOLI, 2014, P. 565)

Betioli, citando Francisco Amaral, complementa:

“A primeira referência à ideia do direito natural é encontrada na


invocação das leis não escritas que Sófocles põe na boca de Antígona. O
tema da peça é a resistência consciente do cidadão às leis injustas do
Estado, tema esse desenvolvido pelos pensadores gregos, principalmente os
estoicos, cujo pensamento foi divulgado em Roma, passando ao
cristianismo, à filosofia e à teologia moral das idades médias e moderna.
O direito natural foi assim cultivado por filósofos gregos (Platão e
Aristóteles), jurisconsultos e políticos romanos (Paulo, Ulpiano,
Cícero), teólogos católicos (São Tomás de Aquino), os membros da Escola
do direito natural e do direito das gentes, nos séculos XVI e XVII
(Grotius, Pufendorf, Thomasius), filósofos do século XVIII (Voltaire,
Montesquieu), os homens da Revolução Francesa (Declaração dos Direitos do
Homem) e, no século XX, entre outras manifestações, o catolicismo social
e o socialismo humanista”. (Direito Civil: Introdução, Rio de Janeiro:
Renovar, 2008, p. 42 apud BETIOLI, 2014, p. 565)

Betioli, citando Aristóteles, considerado o “pai do direito natural”


relata:

Aristóteles (384-322 a.c), no livro V, Capítulo 7, da Ética a Nicômaco,


distingue o “justo por natureza” do “justo legal”. No primeiro caso, algo
é justo, em todos os lugares e com o mesmo vigor, por força da natureza e
independentemente da vontade humana; em suma, porque corresponde às leis
da natureza. No segundo, no caso do “justo legal”, ele é estabelecido por
leis emanadas da autoridade pública ou por convenções das partes. Desse
modo, Aristóteles opõe-se aos que pretendiam reduzir o direito a pura
convenção humana e abriu caminho a uma concepção jusnaturalista.
(BETIOLI, 2014, p. 566)
Paulo Nader, em sua obra Filosofia do Direito, descreve a existência de
três grandes divisões das ideias jusnaturalistas:

O escorço histórico revela três grupos de jusnaturalismo, que se


diversificam em razão da fonte concebida: o jusnaturalismo cosmológico,
que deriva o Direito Natural da ordem natural das coisas; o teológico,
para quem ele emana diretamente da vontade divina e o jusnaturalismo
antropológico, que indica a natureza humana como a grande fonte, de onde
os juristas-filósofos recolhem os princípios, a partir dos quais deverão
ser elaboradas as leis. (NADER, 2010, p. 55)

Na idade média, Santo Tomás de Aquino desenvolve o Direito Natural como


Expressão da Razão Divina. Betioli esclarece:

Na idade média surge a figura notável de Santo Tomás de Aquino (1225-


1274), com a sua concepção de um mundo governado por leis que guardavam
entre si uma hierarquia. A ordem universal , segundo o Doutor Angélico, é
estabelecida pela “lei eterna”, que vem a ser a razão eterna do próprio
Deus; ou, nas palavras de Tomás de Aquino: “A razão da sabedoria divina
como diretora de todos os movimentos e ações no universo.” (BETIOLI,
2014, p. 567/568)

3.1. Jusnaturalismo Teológico


A teologia ou ciência de Deus é o estudo sobre a divindade, seus
atributos e suas leis que regem o universo. O jusnaturalismo teológico
refere-se a um direito natural estabelecido por uma inteligência
superior, Deus. Define-se, portanto, o Jusnaturalimo Teológico, como
sendo leis universais, instituídas por Deus, que repercutem sobre toda a
obra da criação, incluindo o homem, numa justiça distributiva perfeita,
onde a criatura está em relação constante com o criador.

O professor Ricardo Maurício Freire Soares, em seu artigo intitulado


“Reflexões Sobre o Jusnaturalismo: O Direito Natural como Direito Justo”,
esclarece:

Segundo Paulo Nader (2000, p.117-127)2, o jusnaturalismo teológico se


consolida enquanto doutrina jusfilosófica na Idade Média, sob a decisiva
influência do cristianismo. A doutrina cristã veio introduzir novas
dimensões ao problema da justiça. Tratando-se de uma concepção religiosa
de justiça, deve se dizer que a justiça humana é identificada como uma
justiça transitória e sujeita ao poder temporal. Para o cristianismo, não
é nela que reside necessariamente a verdade, mas na lei de Deus, que age
de modo absoluto, eterno e imutável. Ocorreu, assim, uma verdadeira
revolução da subjetividade, prevalecendo a atitude ou disposição de ser
justo sobre a aspiração de ter uma idéia precisa de justiça. Continua
esta, porém, a ser vista em um quadro superior de idéias, já agora
subordinado a uma visão teológica, a partir do princípio de um Deus
criador, do qual emana a harmonia do universo. Na idade média, o
jusnaturalismo apresentava um conteúdo teológico, pois os fundamentos do
direito natural eram a inteligência e a vontade divina, pela vigência do
credo religioso e o predomínio da fé. Os princípios imutáveis e
universais do direito natural podiam ser sintetizados na fórmula segundo
a qual o bem deve ser feito, daí advindo os deveres dos homens para
consigo mesmos, para com os outros homens e para com Deus. As demais
normas, construídas pelos legisladores, seriam aplicações destes
princípios às contingências da vida, v.g, do princípio jusnatural de que
o homem não deve lesar o próximo, decorreria a norma positivada que veda
os atos ilícitos. Segundo o jusnaturalismo teológico, o fundamento dos
direitos naturais seria a vontade de Deus: o direito positivo deveria
estar em consonância com as exigências perenes e imutáveis da divindade.
(Disponível em: <
www.unifacs.br/revistajuridica/arquivo/edicao_abril2007/docente/doc1.doc>
)

Para entender a ideia da existência de um Direito Natural na sua vertente


Teológica, primeiramente, precisa-se entender a ideia de Deus, como causa
primária de toda estrutura universal existente. Tudo no universo obedece
à lei de causa e efeito, na qual todo efeito tem uma causa, um fonte
geradora, pois, do contrário teria que se admitir que do nada algo
pudesse surgir. Para todo efeito inteligente, a causa há de ser
igualmente inteligente. É irracional admitir-se que simplesmente pela
agregação fortuita da matéria, sem uma inteligência superior comandando
tudo, tenha surgido todo o complexo e harmonioso sistema universal, o
planeta Terra com sua estrutura e o desenvolvimento evolutivo das
espécies que nele habita, tudo movido por forças cegas e pelo acaso. Todo
efeito há que necessariamente ter uma causa, uma força atuante que
possibilita o desenvolver da evolução no planeta. Quando se observa o
Universo, com sua estrutura complexa e com movimentos harmoniosos, donde
se pode observar cálculos matemáticos precisos inseridos nos movimentos
dos astros, conclui-se que uma obra desta magnitude e complexidade só
pode ter sido criada por uma inteligência igualmente magnânima, superior
aos acanhados limites da inteligência humana.

Quando se observa todo o sistema do Universo, verifica-se que o seu


funcionamento é regido por leis materiais, estabelecidas para
possibilitar a harmonia, o desenvolvimento e a renovação constante de
toda a estrutura universal. Estas leis, das quais a ciência compreende
apenas pequena parte, sustentam os mundos e os seres, possibilitando o
desenvolvimento da vida. Mas, se existem as leis que regem os componentes
materiais, existem igualmente as regras que regem os componentes morais,
e é sobre estas regras que se desenvolverá o presente estudo.

Em O Livro dos Espíritos, uma das cinco obras básicas que compõe a
Doutrina Espírita, Allan Kardec3 ensina que a Lei Natural é a Lei de
Deus, e pode ser dividida em Leis da Física e Leis Morais:

A lei natural é a lei de Deus. É a única verdadeira para a felicidade do


homem. Indica-lhe o que deve fazer ou deixar de fazer e ele só é infeliz
quando dela se afasta. A lei de Deus é eterna e imutável como o próprio
Deus. Todas as da Natureza são leis divinas, pois que Deus é o autor de
tudo. Entre as leis divinas, umas regulam o movimento e as relações da
matéria bruta: as leis da física, cujo estudo pertence ao domínio da
Ciência. As outras dizem respeito especialmente ao homem considerado em
si mesmo e nas suas relações com Deus e com seus semelhantes. Contêm as
regras da vida do corpo, bem como as da vida da alma: são as leis morais.
Confiou Deus a certos homens a missão de revelarem a sua lei. Em todos os
tempos houve homens que tiveram essa missão. São Espíritos superiores,
que encarnaram com o fim de fazer progredir a Humanidade. (KARDEC, 2010a,
p. 377,378,380)

Todo o universo é regido por leis criadas por uma Inteligência Suprema,
Deus, que mantêm todo um complexo sistema físico e moral em perfeita
harmonia e funcionamento. Essas leis vêm sendo reveladas aos homens por
Espíritos Superiores, que em todas as épocas da humanidade vem nos trazer
o conhecimento delas. A ciência, através do esforço de cientistas
abnegados sob a inspiração de Espíritos Superiores, pelo mecanismo da
intuição, e a este respeito afirmava Albert Einstein que “não existe
nenhum caminho lógico para o descobrimento das leis elementares – o único
caminho é o da intuição”4, vem, pouco a pouco, descobrindo as leis que
regem o mundo material, cabendo a religião descortinar as leis morais, as
quais, a ciência pouco a pouco vai avalizando pelo experimento e pelas
pesquisas. Os textos bíblicos, os ensinos de Sócrates, Platão, Confúcio,
Buda, entre outros missionários, estão repletos de ensinamentos sobre as
leis imutáveis que regem o universo.

Vive-se na atualidade uma busca por soluções ante os desafios sociais que
se apresentam em todas as áreas do saber humano. É o momento de rever
valores e buscar-se uma simetria entre a ciência e a religião, conforme
ensinos da filosofia espírita:

A Ciência e a Religião são as duas alavancas da inteligência humana: uma


revela as leis do mundo material e a outra as do mundo moral. Tendo, no
entanto, essas leis o mesmo princípio, que é Deus, não podem contradizer-
se. Se fossem a negação uma da outra, uma necessariamente estaria em erro
e a outra com a verdade, porquanto Deus não pode pretender a destruição
de sua própria obra. A incompatibilidade que se julgou existir entre
essas duas ordens de ideias provém apenas de uma observação defeituosa e
de excesso de exclusivismo, de um lado e de outro. Daí um conflito que
deu origem à incredulidade e à intolerância. São chegados os tempos em
que os ensinamentos do Cristo têm de ser completados; em que o véu
intencionalmente lançado sobre algumas partes desse ensino tem de ser
levantado; em que a Ciência, deixando de ser exclusivamente materialista,
tem de levar em conta o elemento espiritual e em que a Religião, deixando
de ignorar as leis orgânicas e imutáveis da matéria, como duas forças que
são, apoiando-se uma na outra e marchando combinadas, se prestarão mútuo
concurso. Então, não mais desmentida pela Ciência, a Religião adquirirá
inabalável poder, porque estará de acordo com a razão, já se lhe não
podendo mais opor a irresistível lógica dos fatos. A Ciência e a Religião
não puderam, até hoje, entender-se, porque, encarando cada uma as coisas
do seu ponto de vista exclusivo, reciprocamente se repeliam. Faltava com
que encher o vazio que as separava, um traço de união que as aproximasse.
Esse traço de união está no conhecimento das leis que regem o Universo
espiritual e suas relações com o mundo corpóreo, leis tão imutáveis
quanto as que regem o movimento dos astros e a existência dos seres. Uma
vez comprovadas pela experiência essas relações, nova luz se fez: a fé
dirigiu-se à razão; esta nada encontrou de ilógico na fé: vencido foi o
materialismo. (KARDEC, 2010b, p. 65/66)

O jusnaturalismo enquanto campo de estudo da filosofia do direito, é o


elo existente entre a ciência do direito e a ciência universal. Através
dele a ciência do direito poderá se desenvolver, e, dia a dia, buscar
aproximar-se cada vez mais do ordenamento perfeito que não é senão o
ordenamento divino que rege os mundos e os seres, conforme ensina a
filosofia espírita (KARDEC, 2010a, p. 438): “Só as leis divinas são
eternas; as humanas mudam com o progresso e continuarão a mudar, até que
tenham sido postas de acordo com aquelas”.

Dentre as várias crenças e filosofias que estudam a divindade, o presente


trabalho terá como base na filosofia cristã, ou Cristianismo, a doutrina
do Cristo. Para aprofundamento no tema utilizar-se-á os conhecimento
trazidos pela filosofia espírita, ou Doutrina Espírita, que tem por base
o próprio cristianismo, sendo, esta doutrina, o Consolador prometido por
Jesus, que viria completar seus ensinamentos, conforme palavras do
próprio Jesus (ALMEIDA, 2008, p. 416): “Tenho ainda muito a vos dizer,
mas vós não o podeis suportar agora; quando vier, porém, o Espírito da
verdade, ele vos guiará a toda verdade”, e em outra passagem Jesus
complementa (ALMEIDA, 2008, p. 1414): “mas o Consolador, O Espírito
Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as
coisas e vos fará lembrar de tudo que vos tenho dito.”

A importância do Jusnaturalismo Teológico, com base na filosofia cristã,


para o momento atual da humanidade, é descrito pelo Espírito de André
Luiz, quando esclarece:

O Evangelho, assim, não é o livro de um povo apenas, mas o Código de


Princípios Morais do Universo, adaptável a todas as pátrias, a todas as
comunidades, a todas as raças e a todas as criaturas, porque representa,
acima de tudo, a carta de conduta para a ascensão da consciência à
imortalidade, na revelação da qual Nosso Senhor Jesus-Cristo empregou a
mediunidade sublime como agente de luz eterna, exaltando a vida e
aniquilando a morte, abolindo o mal e glorificando o bem, a fim de que as
leis humanas se purifiquem e se engrandeçam, se santifiquem e se elevem
para a integração com as Leis de Deus. (XAVIER, 2013c, p. 167)

3.1.1. Cristianismo e Espiritismo


O Cristianismo é o conjunto de ensinamentos trazidos por Jesus Cristo,
contido nos quatro evangelhos escritos pelos evangelistas Mateus, Marcos,
Lucas e João. Além dos evangelhos, formam o Novo Testamento bíblico, os
Atos dos Apóstolos, escrito pelo evangelista Lucas; as Epístolas de
Paulo, que totalizam quatorze epístolas contendo instruções aos primeiros
cristãos; a epístola de Tiago; as duas epístolas de Pedro; as três
epístolas do evangelista João; a epístola de Judas e o livro de
Apocalipse, escrito pelo evangelista João. Além destes livros, todos os
ensinamentos dos livros contidos no Antigo Testamento bíblico, que estão
em sintonia com os ensinamentos cristãos, são considerados como
ensinamentos válidos para o Cristianismo.

Para ter a dimensão da influência da filosofia cristã no mundo


contemporâneo, cita-se uma pesquisa realizada pela Pew Research Center5
que demonstra que a filosofia cristã conta com 31,5% da população mundial
como adeptos, o que lhe confere a primeira posição no ranking das maiores
religiões do mundo, com aproximadamente 2,21 bilhões de adeptos.

No Brasil, considerando as religiões cristãs, como o Catolicismo, os


Evangélicos e os Espíritas, o número de cristãos abrange cerca de 89% da
população brasileira, conforme conclusão retirada dos dados do Censo 2010
do IBGE6.

No âmbito jurídico, têm-se vários juristas que trabalham pelo ideal de


junção entre a ciência do direito e os ensinamentos da filosofia cristã.
Dentre eles cita-se o Mestre em Ciências Penais e Criminológicas,
Promotor de Justiça do Ministério Público do Paraná, Doutor Cândido
Furtado Maia Neto. Em seu artigo Justiça Penal Cristã e Espiritualidade -
Ciência à Luz dos Direitos Humanos e do Evangelho de Jesus Cristo,
Cândido Furtado prescreve:

Na história universal destacamos a obra de Jesus Cristo, conforme


divulgada nos Evangelhos de S. Mateus. S. Marcos, S. João e S. Lucas,
acontecimentos que formam a própria biografia do Mestre dos Mestres, como
caminho de luz às ciências humanas, especialmente como fonte ao direito
penal, penitenciarismo e à criminologia. (Disponível em: )

O então Procurador de Justiça do estado de Minas Gerais, especialista em


Direito Penal, Doutor Rogério Greco, relata:

Depois de conhecer pessoalmente um número considerável de penitenciárias


no Brasil e, também, na Espanha, posso dizer, com segurança, que um dos
fatores mais importantes para a efetiva reinserção do condenado no
convívio em sociedade é, de fato, sua conversão, vale dizer, a entrega,
verdadeira, de sua vida a Jesus Cristo. Que me perdoem os acadêmicos, mas
não estou sendo religioso, como muitos podem pensar. Quem conheceu direta
e pessoalmente as mazelas do cárcere, como é o meu caso, pode falar a
respeito das diferenças existentes entre os presos que se converteram ao
cristianismo e aqueles outros que ainda não tiveram esse encontro com o
Cristo. (GRECO, 2015, Nota do Autor)

No âmbito do direito constitucional, cita-se o professor de Direito


Constitucional, Doutor e Mestre em Direito do Estado, Doutor Uadi Lammêgo
Bulos, que em sua obra Curso de Direito Constitucional, no item que
aborda o Constitucionalismo do porvir, disserta:

O sofrimento da humanidade, a violência social, o desemprego, o


subemprego e a informalidade, a descrença no poder absoluto da razão, o
desprestígio das instituições e do próprio Estado, a crise de valores, a
necessidade de se recorrer aos ensinamentos do Evangelho do Cristo de
Deus, como único alívio imediato para os males humanos, a fome, as
doenças dizimando as massas, (....) são alguns dos fatores que tendem a
influenciar o ato de feitura das constituições do porvir. (BULOS, 2012,
p. 97)

Ante a ciência do direito, vários juristas vislumbram um futuro onde a


filosofia cristã representará uma de suas principais fontes para a
elaboração das normas do porvir. Hoje, já existem associações, como a
Associação Jurídico Espírita do Brasil7, onde profissionais do direito
aliam a ciência do direito à filosofia espírita/cristã, debatendo
soluções em torno dos problemas jurídicos da atualidade.

O Espiritismo ou Doutrina Espírita é o conjunto de ensinamentos trazidos


pelos Espíritos Superiores, estudados, organizados e codificados por
Allan Kardec em várias obras, dentre elas, as mais importantes, as que
compõem o Pentateuco Kardequiano, consideradas obras básicas da Doutrina
Espírita (O Livro dos Espíritos, 1857; O Livro dos Médiuns, 1861; O
Evangelho Segundo o Espiritismo, 1864; O Céu e o Inferno, 1865 e A
Gênese, 1868.). Define-se assim o Espiritismo:

O Espiritismo é a ciência nova que vem revelar aos homens, por meio de
provas irrecusáveis, a existência e a natureza do mundo espiritual e as
suas relações com o mundo corpóreo. Ele no-lo mostra, não mais como coisa
sobrenatural, porém, ao contrário, como uma das forças vivas e sem cessar
atuantes da Natureza, como a fonte de uma imensidade de fenômenos até
hoje incompreendidos e, por isso, relegados para o domínio do fantástico
e do maravilhoso. É a essas relações que o Cristo alude em muitas
circunstâncias e daí vem que muito do que ele disse permaneceu
ininteligível ou falsamente interpretado. O Espiritismo é a chave com o
auxílio da qual tudo se explica de modo fácil. [...] Assim como o Cristo
disse: “Não vim destruir a lei, porém cumpri-la”, também o Espiritismo
diz: “Não venho destruir a lei cristã, mas dar-lhe execução.” Nada ensina
em contrário ao que ensinou o Cristo; mas, desenvolve, completa e
explica, em termos claros e para toda gente, o que foi dito apenas sob
forma alegórica. Vem cumprir, nos tempos preditos, o que o Cristo
anunciou e preparar a realização das coisas futuras. Ele é, pois, obra do
Cristo, que preside, conforme igualmente o anunciou, à regeneração que se
opera e prepara o reino de Deus na Terra. (KARDEC, 2010b, p. 64, 65)

A Doutrina Espírita possui tríplice aspecto: científico8, filosófico e


religioso9. Possui como objetivos principais relembrar os ensinos de
Nosso Senhor Jesus Cristo, explicando-os de forma racional e inteligível,
além de complementar estes ensinamentos com novas revelações acerca das
leis universais. Contribuirá significativamente para o futuro da
humanidade, auxiliando no progresso social:

O Espiritismo é chamado a desempenhar imenso papel na Terra. Ele


reformará a legislação ainda tão frequentemente contrária às leis
divinas; retificará os erros da História; restaurará a religião do
Cristo, que se tornou, nas mãos dos padres, objeto de comércio e de
tráfico vil; instituirá a verdadeira religião, a religião natural, a que
parte do coração e vai diretamente a Deus, sem se deter nas franjas de
uma sotaina, ou nos degraus de um altar. Extinguirá para sempre o ateísmo
e o materialismo, aos quais alguns homens foram levados pelos incessantes
abusos dos que se dizem ministros de Deus, pregam a caridade com uma
espada em cada mão, sacrificam às suas ambições e ao espírito de
dominação os mais sagrados direitos da Humanidade. (KARDEC, 2007, p.
330,331)

Observa-se a grande influência e importância da filosofia cristã e


espírita na atualidade, sendo rica fonte de conhecimento que, embora
venha sendo relegada somente ao âmbito religioso, a cada dia, vem
ganhando espaço no âmbito das ciências humanas. Desenvolver-se-á nos
próximos tópicos os pontos fundamentais destas filosofias, com o objetivo
de levantar reflexões acerca do atual modelo social e das possibilidades
de renovação.

Deus
Segundo a filosofia cristã, Deus é o criador de tudo o que existe. O
livro Gênesis, primeiro livro do pentateuco de Moisés, que abre a
sequencia de livros do Antigo Testamento, inicia falando sobre Deus e a
criação (ALMEIDA, 2008, p.3): “No princípio, criou Deus os céus e a
terra.” 10 Muito se questiona a respeito da criação ter sido realizada em
seis dias, como nos relata os textos bíblicos. Porém, deve-se compreender
que os relatos bíblicos estão repletos de simbolismo e forma alegórica,
peculiar ao estilo oriental. Pode-se entender que cada dia da criação
bíblica representa períodos geológicos que a ciência reconhece como sendo
períodos em que o planeta Terra e a vida nele inserida tenham percorrido
no processo de evolução. A palavra dia constante nos primeiros versículos
do livro Gênesis, em hebraico Yôm, possui significado literal (24 horas)
ou figurado (um espaço de tempo).

Segundo a filosofia espírita (KARDEC, 2010a, p. 73), “Deus é a


inteligência suprema, causa primária de todas as coisas.” Conclui-se
desta definição que Deus é a inteligência maior do Universo, e causa
primária de todas as coisas, ou seja, tudo no Universo é efeito da causa
Deus. E Deus, sendo causa primária, não é efeito, mas causa em si mesmo.
Ainda segundo a filosofia espírita (KARDEC, 2010a, p. 76), o homem não
pode compreender a natureza íntima de Deus, falta-lhe para isso o
sentido, quando, porém, pela sua perfeição, se houver aproximado de Deus,
o homem o verá e o compreenderá. Pode, porém, o homem compreender algumas
das perfeições de Deus:

Deus é eterno. Se tivesse tido princípio, teria saído do nada, ou, então,
também teria sido criado, por um ser anterior. É assim que, de degrau em
degrau, remontamos ao infinito e à eternidade.

É imutável. Se estivesse sujeito a mudanças, as leis que regem o Universo


nenhuma estabilidade teriam.

É imaterial. Quer isto dizer que a sua natureza difere de tudo o que
chamamos matéria. De outro modo, ele não seria imutável, porque estaria
sujeito às transformações da matéria.

É único. Se muitos Deuses houvesse, não haveria unidade de vistas, nem


unidade de poder na ordenação do Universo.

É onipotente. Ele o é, porque é único. Se não dispusesse do soberano


poder, algo haveria mais poderoso ou tão poderoso quanto ele, que então
não teria feito todas as coisas. As que não houvesse feito seriam obra de
outro Deus.

É soberanamente justo e bom. A sabedoria providencial das leis divinas se


revela, assim nas mais pequeninas coisas, como nas maiores, e essa
sabedoria não permite se duvide nem da justiça nem da bondade de Deus.
(KARDEC, 2010a, p. 77-78)

A ideia que os homens fazem de Deus evolui conforme evolui o pensamento


humano. Nos ensinos trazidos pelo antigo testamento bíblico, tem-se, de
uma forma geral, a imagem de um Deus vingativo ao qual o homem devia
temer: “Pois o Senhor, vosso Deus, é o Deus dos deuses e o Senhor dos
senhores, o Deus grande, poderoso e temível” (ALMEIDA, 2008, p. 262). Era
necessário utilizar a imagem de um Deus poderoso e vingativo para que
Moisés conseguisse a obediência do povo hebreu. Somente o medo das
consequências das ações poderia conter um povo indisciplinado e rebelde,
que ainda não possuía um desenvolvimento intelectual e moral que
possibilitasse a compreensão de um Deus bom e misericordioso. No livro de
salmos tem-se a seguinte advertência: “Sobre eles faz recair a sua
iniquidade e pela malícia deles próprios os destruirá; o Senhor, nosso
Deus, os exterminará.” (ALMEIDA, 2008, p. 820)

Com a evolução do pensamento humano, a ideia sobre Deus também foi


evoluindo, pois o homem passou a ter condições de compreender melhor
sobre a conceituação de Deus. De um Deus vingativo e temível, tem-se, no
novo testamento bíblico, a imagem de um Deus que é sinônimo de um Pai
justo e amoroso, conforme os ensinos trazidos por Jesus Cristo, onde
esclarece que (ALMEIDA, 2008, p. 1417): “Porque o próprio Pai vos ama”.

Observa-se que do SENHOR DOS EXÉRCITOS do antigo testamento, Deus se


torna o PAI amoroso e justo. E como Pai, ele educa, ele age com justiça,
e, acima de tudo, ele ama seus filhos e trabalha incessantemente para
conduzi-los a glória dos Filhos de Deus, conforme ensina Paulo em sua
epístola aos Romanos:

Porque para mim tenho por certo que os sofrimentos do tempo presente não
podem ser comparados com a glória a ser revelada em nós. A ardente
expectativa da criação aguarda a revelação dos filhos de Deus. Pois a
criação está sujeita à vaidade, não voluntariamente, mas por causa
daquele que a sujeitou, na esperança de que a própria criação será
redimida do cativeiro da corrupção, para a liberdade da glória dos filhos
de Deus. (ALMEIDA, 2008, p. 1487 )

O Apóstolo Paulo, em seu discurso em Atenas, disserta de forma magistral


sobre Deus:

O Deus que fez o mundo e tudo que nele existe, sendo ele Senhor do céu e
da terra, não habita em santuário feito por mãos humanas. Nem é servido
por mãos humanas, como se de alguma coisa precisasse; pois ele mesmo é
quem a todos dá vida, respiração e tudo mais; para buscarem a Deus se,
porventura, tateando, o possam achar, bem que não está longe de cada um
de nós; pois nele vivemos, e nos movemos, e existimos. (ALMEIDA, 2008, p.
1457)

Nesta bela dissertação de Paulo, entende-se Deus como irradiador de uma


energia cósmica, na qual vivemos, pois a criatura está imersa nesta
energia; na qual nos movemos, pois esta energia impulsiona os seres ao
progresso; e existimos, pois esta energia fornece as condições essenciais
da vida aos seres; Dele os seres foram gerados e Nele os seres vivem,
como o peixe mergulhado nas águas. Sobre o tema disserta André Luiz:

Identificando o Fluido Elementar ou Hálito Divino por base mantenedora de


todas as associações da forma nos domínios inumeráveis do Cosmo, do qual
conhecemos o elétron como sendo um dos corpúsculos-base, nas organizações
e oscilações da matéria, interpretaremos o Universo como um todo de
forças dinâmicas, expressando o Pensamento do Criador. (XAVIER, 2013c, p.
37)

Na obra A Gênese, Kardec completa:

O Universo é, ao mesmo tempo, um mecanismo incomensurável, acionado por


um número incontável de inteligências, e um imenso governo em o qual cada
ser inteligente tem a sua parte de ação sob as vistas do soberano Senhor,
cuja vontade única mantém por toda parte a unidade. Sob o império dessa
vasta potência reguladora, tudo se move, tudo funciona em perfeita ordem.
Onde nos parece haver perturbações, o que há são movimentos parciais e
isolados, que se nos afiguram irregulares apenas porque circunscrita é a
nossa visão. Se lhes pudéssemos abarcar o conjunto, veríamos que tais
irregularidades são apenas aparentes e que se harmonizam com o todo.
(KARDEC, 2008a, p. 459)

O apóstolo João evangelista, em sua primeira epístola, disserta


belissimamente sobre a divindade e seu relacionamento com a criatura
humana:

Todo aquele que ama é nascido de Deus e conhece a Deus. Aquele que não
ama não conhece a Deus, pois Deus é amor. Ninguém jamais viu a Deus; se
amarmos uns aos outros, Deus permanece em nós, e o seu amor é, em nós,
aperfeiçoado. No amor não existe o medo; antes o perfeito amor lança fora
o medo. Ora, o medo produz tormento; logo, aquele que teme não é
aperfeiçoado no amor. Nós amamos porque ele nos amou primeiro. (ALMEIDA,
2008, p. 1617)

Nesta passagem observa-se claramente a evolução da visão que o homem


possui de Deus. João nos afirma que no amor não existe o medo. Deus não
deve ser temido, porém amado. É uma mudança na percepção e no
relacionamento da criatura com o criador.

Deus é definido como amor. Deus como a energia cósmica do amor, que se
faz sentir na intimidade da criatura quando esta estabelece sintonia com
o criador, através do desenvolvimento do sentimento do amor dentro de si
mesma, desenvolvendo a unidade cósmica criador/criatura, como ensina
Jesus (ALMEIDA, 2008, p. 1418): “a fim de que todos sejam um; e como és
tu, ó Pai, em mim e eu em ti, também sejam eles em nós; eu neles, e tu em
mim, a fim que sejam aperfeiçoados na unidade”, e em outra passagem,
Jesus assim se expressa (ALMEIDA, 2008, p. 1406): “Eu e o pai somos um”,
no sentido de uma perfeita identificação de sentimentos e pensamentos,
numa afinidade energética intrínseca da criatura com o criador.

E ao buscar a definição do que seja o amor e do que seja o amar,


encontra-se a resposta na personalidade excelsa do Cristo Jesus, que
deixou como o maior mandamento a prática do amor ao próximo, o qual ele
próprio exemplificou na sua passagem pela Terra. O evangelista João
relata a passagem onde Jesus prescreve (ALMEIDA, 2008, p. 1415): “O meu
mandamento é este: que vos ameis uns aos outros, assim como eu vos amei.”
E, em outra passagem Jesus nos orienta (ALMEIDA, 2008, p. 1412): “Vós me
chamais o Mestre e o Senhor e dizeis bem; porque eu o sou. Porque eu vos
dei o exemplo, para que, como eu vos fiz, façais vós também.”
Conclui-se destas passagens, que a missão de Jesus foi ensinar às
criaturas como desenvolver o sentimento do amor dentro de si mesmas,
através da vivência dos exemplos e ensinamento trazido e vivenciados por
ele, com a finalidade de aproximar a criatura do criador11, o ser humano
do ser divino, o homem da sua essência, o que lhe proporcionará a
conquista da plenitude existencial, conforme as palavras do próprio
Cristo Jesus (ALMEIDA, 2008, p. 1405): “Eu vim para que tenham vida e a
tenham em abundância.”

A visão que o homem possui de Deus é de grande importância para sua vida
em sociedade. O relacionamento que o homem possui para com Deus,
invariavelmente é a base para o relacionamento que o homem possui para
com o próprio homem. Se o homem possui a imagem de um Deus cruel e
vingativo, assim também o homem age para com os seus pares, se, ao
contrário, o homem tem uma imagem de um Deus justo e misericordioso,
assim o homem se relacionará para com os seus pares. Sobre este tema, a
filosofia cristã vem trazer a imagem de um Deus Misericordioso,
instruindo seus adeptos a também serem misericordiosos uns com os outros,
conforme ensino de Jesus: “Sede misericordiosos, como também é
misericordioso vosso Pai.” (RYRIE, 2007, p. 991)

A ciência a cada dia busca encontrar provas para a existência de Deus, e


dentre vários cientistas que se dedicam ao intento, destacam-se o polonês
Michael keller, que em 2008 recebeu um dos maiores prêmios em dinheiro
(US$ 1,6 milhão) já dados pela Fundação Templeton, instituição que reúne
pesquisadores de todo o mundo. O prêmio foi dado devido a uma nova teoria
que começa a ganhar corpo em toda a Europa: a “Teologia da Ciência”, a
qual se define assim: a ciência encontrou Deus.12 O cientista Robert
Jastrow, que foi chefe da Divisão Teórica da Nasa e diretor fundador da
Nasa Instituto Goddard de Estudos Espaciais (1961), em entrevista ao
programa Fantástico da Rede Globo de Televisão13, em 20 de maio de 1979,
relata:

6”05 segundos : Robert Jastrow – “Os cientistas descobriram que todas as


galáxias que estão nos sistemas estelares que formam o Universo estão se
distanciando umas das outras a velocidades incríveis como se estivesse
havido uma grande explosão cósmica e como prova disso descobriram os
restos de fleches de luz e do intenso calor que a grande explosão que
criou o universo provocou, encontramos agora em todos os lugares do
espaço a radiação desta bola de fogo cósmica.”

6”55 segundos: Hélio Costa (repórter): “A teoria da grande explosão prova


a existência de Deus?” Robert Jastrow: “Estou numa encruzilhada. Eu não
sei em que acreditar, mas estou convencido agora de que existem no mundo
forças sobrenaturais que não podem ser explicadas com as leis da
natureza. Nós podemos chamar estas forças de Deus ou o que quisermos.”

→ Leis Divinas

Ao adentrar o tema Leis Divinas, inicialmente ater-se-á ao conceito de


Providência14 Divina. Segundo a filosofia espírita (KARDEC, 2008a, p.73),
“A providência é a solicitude de Deus para com as suas criaturas. Ele
está em toda parte, tudo vê, a tudo preside, mesmo às coisas mais
mínimas. É nisso que consiste a ação providencial.” Uma das
características da divindade é a onipresença. Deus está presente em toda
a criação, pois a criação é parte de Deus. Paulo, em sua epístola aos
Efésios (ALMEIDA, 2008, p. 1545), nos ensina que “há (....) um só Deus e
Pai de todos, o qual é sobre todos, age por meio de todos e está em
todos.”

Em outra obra da filosofia espírita, encontram-se mais esclarecimentos


sobre a providência divina:

Realiza-se assim a grande lei de unidade da Criação; Deus nunca esteve


inativo e sempre teve puros Espíritos, experimentados e esclarecidos,
para transmissão de suas ordens e direção do Universo, desde o governo
dos mundos até os mais ínfimos detalhes. Tampouco teve Deus necessidade
de criar seres privilegiados, isentos de obrigações; todos, antigos e
novos, adquiriram suas posições na luta e por mérito próprio; todos,
enfim, são filhos de suas obras. E, desse modo, completa-se com igualdade
a soberana justiça do Criador. (KARDEC, 2008b, p. 122/123)

Analisando o texto, conclui-se que Deus age no Universo através de


Espíritos Superiores, que são Espíritos que, através de um processo de
evolução intelectual/moral, alcançaram, por méritos próprios, a condição
de Espíritos puros e se tornaram auxiliares diretos do criador. Paulo, em
sua epístola aos Hebreus, em se referindo aos anjos, esclarece (ALMEIDA,
2008, p. 1582): “Não são todos eles espíritos ministradores, enviados
para serviço a favor dos que hão de herdar a salvação?”.

Deus irradia-se por todo universo, através da energia cósmica


universal15, atuando por meio dela e pela ação dos Espíritos Superiores,
tudo subordinado às leis universais. É por meio dessas leis, sábias e
justas, que coordenam e organizam todo o sistema universal, que a
Inteligência Suprema se revela ativamente.

As leis divinas são, portanto, uma expressão viva do criador, sendo


conexão constante da criatura com o criador. Segundo a filosofia
espírita:

Todas as leis da natureza são leis divinas, pois que Deus é o autor de
tudo. Entre as leis divinas, umas regulam o movimento e as relações da
matéria bruta: as leis da física, cujo estudo pertence ao domínio da
Ciência. As outras dizem respeito especialmente ao homem considerado em
si mesmo e nas relações com Deus e com seus semelhantes. Contêm as regras
da vida do corpo, bem como as da alma: são as leis morais. (KARDEC,
2010a, p. 378)

O conhecimento das leis divinas têm por objetivo orientar a criatura


sobre o percurso a seguir em direção ao objetivo final de toda a criação,
que é desenvolvimento das virtudes divinas latentes na criatura que a
possibilitará atingir a condição de Espíritos Puros, onde, em sintonia
absoluta com as leis da vida, alcançarão o estado de plenitude íntima. No
livro Gênesis (ALMEIDA, 2008, p. 4) é ensinado que o homem foi criado à
imagem e conforme a semelhança de Deus. Paulo, em sua carta aos Efésios
(ALMEIDA, 2008, p. 1545) ensina que “Até que todos cheguemos à unidade da
fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, à perfeita varonilidade, à
medida da estatura de Cristo.” O Objetivo final da criação é chegar a
perfeita varonilidade, ou a homem perfeito, à medida da estatura de
Cristo, que é o tipo mais perfeito que Deus tem oferecido ao homem para
lhe servir de guia e modelo (KARDEC, 2010a, p. 380). Deve observar que em
Cristo, conforme as palavras de Paulo em sua epístola aos Colossenses
(ALMEIDA, 2008, p. 1556), “habita, corporalmente, toda a plenitude da
Divindade.”

Portanto, conclui-se que o objetivo final da criação é o desenvolvimento


da divindade na criatura, criada à imagem e semelhança do criador
(ALMEIDA, 2008, p. 4), o qual deixou sob a responsabilidade individual
dos seres criados o trabalho da caminhada ascensional em direção a Ele,
em respeito a livre arbítrio dos seres. Deus criou seres autônomos, com
vontade própria, e quer que cada um, pelo esforço próprio, com o auxílio
dos Espíritos Superiores, conquiste a meta final: a perfeição, conforme
esclarece a filosofia espírita:

“Deus criou todos os Espíritos simples e ignorantes, isto é, sem saber. A


cada um deu determinada missão, com o fim de esclarecê-los e de os fazer
chegar progressivamente à perfeição, pelo conhecimento da verdade, para
aproximá-los de si. Nesta perfeição é que eles encontram a pura e eterna
felicidade. Passando pelas provas que Deus lhes impõe é que os Espíritos
adquirem aquele conhecimento. Uns aceitam submissos essas provas e chegam
mais depressa à meta que lhes foi assinada. Outros, só a suportam

murmurando e, pela falta em que desse modo incorrem, permanecem afastados


da perfeição e da prometida felicidade.” (KARDEC, 2010a, p. 128)

A função primordial da lei divina é a educação do ser para que se torne


homem perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra conforme
disserta o apóstolo Paulo, em sua segunda epístola a Timóteo (ALMEIDA,
2008, p. 1576): “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para
ensino, para a repreensão, para correção, para a educação na justiça, a
fim de que todo homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado
para toda boa obra”, e a filosofia espírita completa (KARDEC, 2010a, p.
444) que “A lei natural, ao contrário, rege a Humanidade inteira e o
homem se melhora à medida que melhor a compreende e pratica”.

Com respeito às características das leis divinas, a filosofia espírita


ensina (KARDEC, 2010a, p. 378) que a lei de Deus é eterna e imutável como
o próprio Deus. Ao observar as leis ensinadas por Moisés nos livros
iniciais do Antigo Testamento conclui-se que há divergências entre as
próprias leis mosaicas e entre estas e os ensinos trazidos por Jesus
Cristo. Se as leis de Deus são eternas e imutáveis, como explicar estas
contradições existentes nas leis de Moisés e entre estas e os ensinos de
Jesus, sendo que ambos são profetas reveladores das leis divinas? A
filosofia espírita explica este aparente conflito entre as leis divinas
quando ensina:

Na lei moisaica, há duas partes distintas: a lei de Deus, promulgada no


monte Sinai, e a lei civil ou disciplinar, decretada por Moisés. Uma é
invariável; a outra, apropriada aos costumes e ao caráter do povo, se
modifica com o tempo. A lei de Deus está formulada nos dez mandamentos16.
Todas as outras são leis que Moisés decretou, obrigado que se via a
conter, pelo temor, um povo de seu natural turbulento e indisciplinado,
no qual tinha ele de combater arraigados abusos e preconceitos,
adquiridos durante a escravidão do Egito. Para imprimir autoridade às
suas leis, houve de lhes atribuir origem divina, conforme o fizeram todos
os legisladores dos povos primitivos. A autoridade do homem precisava
apoiar-se na autoridade de Deus; mas, só a idéia de um Deus terrível
podia impressionar criaturas ignorantes, em as quais ainda pouco
desenvolvidos se encontravam o senso moral e o sentimento de uma justiça
reta. É evidente que aquele que incluíra, entre os seus mandamentos,
este: “Não matareis; não causareis dano ao vosso próximo”, não poderia
contradizer-se, fazendo da exterminação um dever. As leis moisaicas,
propriamente ditas, revestiam, pois, um caráter essencialmente
transitório. (KARDEC, 2010b, p. 59-62)

Todas as prescrições contidas nos livros do Antigo Testamento, que não


estão nos Dez Mandamentos, somente devem ser consideradas válidas se em
consonâncias com os próprios Dez Mandamentos e com os ensinos trazidos
pelo maior de todos os profetas, o Mestre dos mestres, Jesus Cristo.

A revelação da lei divina aos homens é gradativa, de acordo com a


evolução intelectual/moral da criatura. O Próprio Mestre Jesus afirmou
que não disse tudo, pois não o entenderiam (ALMEIDA, 2008, p. 1416)
“Tenho ainda muito a vos dizer, mas vós não o podeis suportar agora” e na
sequencia promete a vinda do Espírito de Verdade que ensinará toda a
verdade, quando a humanidade, mais evoluída, tenha condições de
compreender novos ensinamentos.

A filosofia espírita aborda esta questão, quando ensina (KARDEC, 2010a,


p.382) que, “Importa que cada coisa venha a seu tempo. A verdade é como a
luz: o homem precisa habituar-se a ela, pouco a pouco; do contrário, fica
deslumbrado”. Sobre este tema, o apóstolo Paulo, em sua epístola aos
hebreus disserta:

Ora, todo aquele que se alimenta de leite é inexperiente na palavra da


justiça, porque é criança. Mas o alimento sólido é para os adultos, para
aqueles que, pela prática, têm as suas faculdades exercitadas para
discernir não somente o bem, mas também o mal. (ALMEIDA, 2008, p. 1585)

O Homem

A filosofia cristã define o homem como sendo constituído de três


estruturas: o corpo, a alma e o Espírito17, conforme ensina o apóstolo
Paulo, em sua primeira epístola aos Tessalonicenses (ALMEIDA, 2008, p.
1564): “O mesmo Deus vos santifique em tudo; e o vosso espírito, alma e
corpo sejam conservados íntegros e irrepreensíveis.” Segundo a filosofia
espírita (KARDEC, 2010a, p. 109) “os Espíritos são os seres inteligentes
da criação”. Portanto, a inteligência, o raciocínio são atributos do
Espírito. A alma a que Paulo se refere é o que a filosofia espírita
denomina períspirito, definido como (KARDEC, 2010a, p. 138) “substância
semimaterial que serve de primeiro envoltório ao Espírito e liga a alma
ao corpo. Por meio desse laço é que o Espírito atua sobre a matéria e
reciprocamente.” Observa-se que a filosofia espírita coloca alma e
Espírito como sinônimos, sendo a alma um Espírito encarnado (KARDEC,
2010a, p. 137), ou seja, unido ao corpo físico, na carne, ao passo que
Paulo coloca alma como sendo o que a filosofia espírita denomina
períspirito. Portanto, a filosofia espírita define o homem como
constituído de (KARDEC, 2010a, p. 138):

1º — o corpo ou ser material, análogo ao dos animais e animado pelo mesmo


princípio vital; 2º — a alma, Espírito encarnado que tem no corpo a sua
habitação; 3º — o princípio intermediário, ou perispírito, substância
semimaterial que serve de primeiro envoltório ao Espírito e liga a alma
ao corpo. Tal, num fruto, o gérmen, o perisperma e a casca.

A morte representa apenas a destruição do invólucro físico, o corpo


humano, enquanto que o Espírito, revestido pelo perispírito continua sua
existência no pós-morte, pois o Espírito é imortal, e estagia
temporariamente na carne para acelerar o seu processo evolutivo.
Portanto, o Espírito ou alma, após a morte da estrutura física, o corpo,
se desliga deste e continua a existir. O Apóstolo Paulo discorre sobre
este tema em sua primeira epístola aos Coríntios (ALMEIDA, 2008, p.
1518), onde ensina: “Pois assim também é a ressurreição dos mortos.
Semeia-se corpo natural, ressuscita corpo espiritual. Se há corpo
natural, há também corpo espiritual”, corpo este, que a filosofia
espírita denomina como sendo o períspirito.

A filosofia espírita esclarece que (KARDEC, 2010a, p. 147) “a alma no


instante da morte volta a ser Espírito, isto é, volve ao mundo dos
Espíritos, donde se apartara momentaneamente.” Assim como existe o mundo
físico, com sua estrutura social, existe o mundo espiritual, também com
sua estrutura social, conforme nos ensina a filosofia espírita18 e a
filosofia cristã, nas próprias palavras de Jesus (ALMEIDA, 2008, p.1413):
“Na casa de meu Pai há muitas moradas” e do apóstolo Paulo (ALMEIDA,
2008, p. 1553): “Pois a nossa pátria está nos céus.”

Existem várias passagens bíblicas que confirmam a existência de Espíritos


fora do corpo físico, entre elas destaca-se a consulta de Saul a médium
de Em-dor, registrada no livro de 1Samuel, capítulo 28, versículos de 1
ao 25; e a conversa de Jesus com os Espíritos de Moisés e Elias, a qual
transcreve-se:

Seis dias depois, tomou Jesus consigo a Pedro e aos irmãos Tiago e João e
os levou, em particular, a um alto monte. E foi transfigurado diante
deles; o seu rosto resplandecia como o sol, e as suas vestes tornaram-se
brancas como a luz. E eis que apareceram Moisés e Elias falando com ele.
(ALMEIDA, 2008, p. 1272)

Sobre a dualidade constitutiva do homem, no livro Gênesis, do antigo


testamento bíblico, encontra-se a seguinte passagem (ALMEIDA, 2008, p.
4): “Então, formou o Senhor Deus ao homem do pó da terra e lhe soprou nas
narinas o fôlego da vida, e o homem passou a ser alma vivente.” Esta
passagem repleta de simbolismo, descreve a criação do homem por Deus.
Quando é descrito “formou o homem do pó da terra”, simboliza os elementos
químicos que constituem o corpo físico do homem, elementos estes, todos
encontrados na natureza, na terra. O corpo humano é o resultado de um
longo processo evolutivo que durou bilhões de anos. A palavra fôlego, em
hebraico, significa vento, espírito, representando nesta passagem a união
do corpo físico com o Espírito, que proporcionou vida à matéria física,
conforme a expressão ‘fôlego de vida’.
Esta constituição dualística do homem, Espírito e corpo, é confirmada em
várias passagens bíblicas, entre elas destaca-se (ALMEIDA, 2008, p.
1398): “O espírito é que vivifica; a carne para nada aproveita” e
(ALMEIDA, 2008, p. 1600): “Porque, assim como o corpo sem espírito é
morto”. A filosofia espírita esclarece que,

[...] Dupla, no homem, só é a natureza. Há nele a natureza animal e a


natureza espiritual. Participa, pelo seu corpo, da natureza dos animais e
de seus instintos. Por sua alma, participa da dos Espíritos. [...]
Encarnando no corpo do homem, o Espírito lhe traz o princípio intelectual
e moral, que o torna superior aos animais. As duas naturezas nele
existentes dão às suas paixões duas origens diferentes: umas provêm dos
instintos da natureza animal, provindo as outras das impurezas do
Espírito, de cuja encarnação é ele a imagem e que mais ou menos simpatiza
com a grosseria dos apetites animais. Purificando-se, o Espírito se
liberta pouco a pouco da influência da matéria. Sob essa influência,
aproxima-se do bruto. Isento dela, eleva-se à sua verdadeira destinação.
(KARDEC, 2010a, p. 369)

O conhecimento da sobrevivência do Espírito à morte do corpo físico


possibilita reflexões sobre a forma que a humanidade em geral trata seus
criminosos. Busca-se a exclusão, e, em alguns países, institui-se a pena
de morte, como forma de “se livrar” de indivíduos nocivos à sociedade. Se
um indivíduo não é recuperado pelo sistema prisional e vem a desencarnar
(morrer, falecer), ele poderá continuar a prejudicar a sociedade, porém
por outros meios, como a influenciação do pensamento, entre outros. Os
relatos bíblicos de espíritos impuros que prejudicam os homens
encarnados, revelam a atuação de Espíritos sobre o dia a dia da
humanidade encarnada. Um exemplo encontra-se relatado pelo evangelista
Marcos (ALMEIDA, 2008, p. 1304): “Porque Jesus lhe dissera: Espírito
imundo, sai desse homem! E perguntou-lhe: Qual é o teu nome? Respondeu
ele: Legião é o meu nome, porque somos muitos”.

Sobre este tema a filosofia espírita adverte (KARDEC, 2010b, p. 556): “Os
Espíritos maus pululam em torno da Terra, em virtude da inferioridade
moral de seus habitantes. A ação malfazeja que eles desenvolvem faz parte
dos flagelos com que a humanidade se vê a braços neste mundo”. Os
Espíritos dos criminosos, no pós- morte, poderão continuar a prejudicar a
sociedade. Portanto, a forma real de o homem “se livrar” de indivíduos
que prejudicam a sociedade é recuperá-los, educa-los.

→ Encarnação e Reencarnação19

Segundo a filosofia espírita, todos os Espíritos são criados simples e


ignorantes e se instruem nas lutas e tribulações da vida corporal
(KARDEC, 2010a, p. 137). A encarnação constitui mecanismo que Deus
utiliza para que os Espíritos evoluam em inteligência e moral, alcançando
a perfeição espiritual, conforme esclarece a filosofia espírita:

Qual o objetivo da encarnação dos Espíritos? Deus lhes impõe a encarnação


com o fim de fazê-los chegar à perfeição. Para uns, é expiação; para
outros, missão. Mas, para alcançarem essa perfeição, têm que sofrer todas
as vicissitudes da existência corporal: nisso é que está a expiação. Visa
ainda outro fim a encarnação: o de pôr o Espírito em condições de
suportar a parte que lhe toca na obra da criação. Para executá-la é que,
em cada mundo, toma o Espírito um instrumento, de harmonia com a matéria
essencial desse mundo, a fim de aí cumprir, daquele ponto de vista, as
ordens de Deus. É assim que, concorrendo para a obra geral, ele próprio
se adianta. (KARDEC, 2010a, p. 136)

O apóstolo Paulo, em sua epístola aos Filipenses aborda o tema perfeição,


quando ensina (ALMEIDA, 2008, p. 1552): “Não que eu o tenha já recebido
ou tenha já obtido a perfeição; mas prossigo para conquistar aquilo para
o que também fui conquistado por Cristo Jesus.” Paulo descreve claramente
que o seu objetivo final é alcançar a perfeição.

A filosofia espírita ensina que Jesus constitui o tipo mais perfeito que
Deus tem oferecido ao homem, para lhe servir de guia e modelo (KARDEC,
2010a, p.380) e conclui:

Para o homem, Jesus constitui o tipo da perfeição moral a que a


Humanidade pode aspirar na Terra. Deus no-lo oferece como o mais perfeito
modelo e a doutrina que ensinou é a expressão mais pura da lei do Senhor,
porque, sendo ele o mais puro de quantos têm aparecido na Terra, o
Espírito Divino o animava. (KARDEC, 2010a, p.380)

Ainda sobre os objetivos da encarnação, tem-se o seguinte ensinamento


trazido pela filosofia espírita:

A encarnação é necessária ao duplo progresso moral e intelectual do


Espírito: ao progresso intelectual pela atividade obrigatória do
trabalho; ao progresso moral pela necessidade recíproca dos homens entre
si. A vida social é a pedra de toque das boas ou más qualidades. A
bondade, a maldade, a doçura, a violência, a benevolência, a caridade, o
egoísmo, a avareza, o orgulho, a humildade, a sinceridade, a franqueza, a
lealdade, a má-fé, a hipocrisia, em uma palavra, tudo o que constitui o
homem de bem ou o perverso tem por móvel, por alvo e por estímulo as
relações do homem com os seus semelhantes. Para o homem que vivesse
insulado não haveria vícios nem virtudes; preservando-se do mal pelo
insulamento, o bem de si mesmo se anularia. (KARDEC, 2008b, p. 34)

Através do processo das encarnações, o Espírito desenvolve a inteligência


pelo trabalho que se faz necessário à sobrevivência, manutenção e
progresso material. Em contato uns com os outros, o homem desenvolve a
moralidade, os sentimentos nobres, sendo o maior deles, o amor.
Inteligência e Amor são as duas asas que permitirão ao Espírito alçar voo
aos níveis superiores da existência, na dimensão maior da vida, livrando-
se do processo das encarnações.

Portanto, objetivo da encarnação é possibilitar o progresso do Espírito,


tornando-se assim Espírito Perfeito. Porém, em apenas uma encarnação é
impossível o Espírito adquirir todas as qualidades que o tornem perfeito.
A alma, que não alcançou a perfeição durante a vida corpórea, acaba de
depurar-se sofrendo a prova de uma nova existência (KARDEC, 2010a, p.
166), ou novas existências, o que se denomina reencarnação, tornar a
encarnar, até que alcance a perfeição espiritual. A filosofia espírita
ensina (KARDEC, 2010a, p. 157) que “A cada nova existência, o Espírito dá
um passo para diante na senda do progresso. Desde que se ache limpo de
todas as impurezas, não tem mais necessidade das provas da vida
corporal.”

Nos textos bíblicos também se encontram várias passagens sobre a


reencarnação, entre as quais se destaca o diálogo de Jesus com Nicodemos
e a passagem na qual Jesus afirma que João Batista é a reencarnação de
Elias.

Havia, entre os fariseus, um homem chamado Nicodemos, um dos principais


dos judeus. Este, de noite, foi ter com Jesus e lhe disse: Rabi, sabemos
que és Mestre vindo da parte de Deus; porque ninguém pode fazer estes
sinais que tu fazes, se Deus não estiver com ele. A isto, respondeu
Jesus: Em verdade, em verdade vos digo que, se alguém não nascer de novo,
não pode ver o reino de Deus. Perguntou-lhe Nicodemos: Como pode um homem
nascer, sendo velho? Pode, porventura, voltar ao ventre materno e nascer
segunda vez? Respondeu Jesus: Em verdade, em verdade te digo: quem não
nasce da água e do Espírito não pode entrar no reino de Deus. Não te
admires de eu te dizer: importa-vos nascer de novo. (ALMEIDA, 2008, p.
1389)

Nesta passagem Jesus adverte Nicodemos da necessidade de nascer de novo,


tanto da água, que simboliza a matéria, o corpo físico, quanto do
Espírito, que simboliza o renascimento espiritual, a evolução do
Espírito. E termina Jesus afirmando: ‘importa-vos nascer de novo’. Quanto
à expressão ‘entrar no reino de Deus’, é o símbolo do término do processo
reencarnatório, quando o Espírito atingindo a condição de Espírito puro,
não terá necessidade de reencarnar, a não ser em missão. A respeito dos
Espíritos puros, esclarece a filosofia espírita:

PRIMEIRA ORDEM. — ESPÍRITOS PUROS - 112. CARACTERES GERAIS. — Nenhuma


influência da matéria. Superioridade intelectual e moral absoluta, com
relação aos Espíritos das outras ordens. 113. Primeira classe. CLASSE
ÚNICA. — Os Espíritos que a compõem percorreram todos os graus da escala
e se despojaram de todas as impurezas da matéria. Tendo alcançado a soma
de perfeição de que é suscetível a criatura, não têm mais que sofrer
provas, nem expiações. Não estando mais sujeitos à reencarnação em corpos
perecíveis, realizam a vida eterna no seio de Deus. Gozam de inalterável
felicidade, porque não se acham submetidos às necessidades, nem às
vicissitudes da vida material. Essa felicidade, porém, não é a de
ociosidade monótona, a transcorrer em perpétua contemplação. Eles são os
mensageiros e os ministros de Deus, cujas ordens executam para manutenção
da harmonia universal. Comandam a todos os Espíritos que lhes são
inferiores, auxiliam-nos na obra de seu aperfeiçoamento e lhes designam
as suas missões. Assistir os homens nas suas aflições, concita--los ao
bem ou à expiação das faltas que os conservam distanciados da suprema
felicidade, constitui para eles ocupação gratíssima. São designados às
vezes pelos nomes de anjos, arcanjos ou serafins. (KARDEC, 2010a, p.126-
127)

Em outra passagem, a respeito da reencarnação, Jesus afirma:

Desde os dias de Joao Batista até agora, o reino dos céus é tomado por
esforço, e os que se esforçam se apoderam dele. Porque todos os profetas
e a Lei profetizaram até João. E, se o quereis reconhecer, ele mesmo é
Elias, que estava para vir. (ALMEIDA, 2008, p. 1261)

Quando Jesus afirma ‘ele mesmo é Elias, que estava para vir’, Jesus está
se referindo a uma passagem no livro de Malaquias, onde o SENHOR promete
que Elias, um profeta do Antigo Testamento, que já havia morrido, iria
retornar. Assim diz a passagem (ALMEIDA, 2008, p. 1241): “Eis que vos
enviarei o profeta Elias, antes que venha o grande e terrível Dia do
SENHOR.” Nesta passagem fica clara a ideia da reencarnação, proclamada
pelo próprio Mestre Jesus.

A reencarnação é lei da vida, e tem como objetivo propiciar condições


para a evolução do Espírito, a caminho da perfeição. Na maioria das vezes
a referência à conquista da perfeição aparece nos textos bíblicos,
implicitamente, sob o termo salvação. Salvação no sentido de livrar o
Espírito imortal das vicissitudes da vida corporal, da necessidade de
reencarnar.

O apóstolo Pedro resume o entendimento a respeito da evolução do Espírito


na seguinte passagem:

Por isso, cingindo o vosso entendimento, sede sóbrios e esperai


inteiramente na graça que vos está sendo trazida na revelação de Jesus
Cristo. Como filhos da obediência, não vos amoldeis às paixões que
tínheis anteriormente na vossa ignorância; pelo contrário, segundo é
santo aquele que vos chamou, tornai-vos santos também vós mesmos em todo
o vosso procedimento, (....) Despojando-vos, portanto, de toda maldade e
dolo, de hipocrisia e invejas e de toda sorte de maledicências, desejai
ardentemente, como crianças recém-nascidas, o genuíno leite espiritual,
para que, por ele, vos seja dado crescimento para salvação, (...) sois
edificados casa espiritual para serdes sacerdócio santo, a fim de
oferecerdes sacrifícios espirituais a Deus por intermédio de Jesus
Cristo. (ALMEIDA, 2008, p. 1604-1605)

A proposta de Pedro é a transformação de valores íntimos, desejando o


genuíno leite espiritual, ou seja, o conhecimento das leis divinas,
alimento do Espírito, para que, através da vivencia destas leis, seja
dado ao Espírito crescimento para a salvação. Segundo a filosofia
espírita (KARDEC, 2010b, p. 95) “O progresso é lei da Natureza. A essa
lei todos os seres da Criação, animados e inanimados, foram submetidos
pela bondade de Deus, que quer que tudo se engrandeça e prospere”.

Progredir, tal a lei. Promover o progresso de pessoas, instituições,


leis, enfim, da própria sociedade é o objetivo da grande jornada humana.
A partir do momento que ideologias e sistemas instituídos fracassam é
necessário construir novos conceitos e instituir novos sistemas para um
novo mundo.

O objetivo principal de qualquer organização estatal, incluindo a


organização penal, deverá ser propiciar mecanismos eficazes ao indivíduo
para seu progresso espiritual, conforme ensinamentos de Aristóteles:

Visto que a ciência política utiliza [5] as demais ciências e, ainda,


legisla sobre o que devemos fazer e sobre o que devemos nos abster, a
finalidade dessa ciência deve necessariamente abranger a finalidade das
outras, de maneira que essa finalidade deverá ser o bem humano.
(ARISTÓTELES, 2001, p. 18)

[...] o bem do homem vem a ser a atividade da alma em consonância com a


virtude e, se há mais de uma virtude, em consonância com a melhor e mais
completa entre elas. (ARISTÓTELES, 2001, p. 27)

Sem dúvida alguma, a virtude que devemos examinar é a virtude [15]


humana, pois o bem e a felicidade que estamos buscando são o bem e a
felicidade humanos. Entendemos por virtudes humanas não são a do corpo,
mas a da alma; e também dizemos que a felicidade é uma atividade da alma.
(ARISTÓTELES, 2001, p. 37)

[...] De fato, ao falar do caráter de um homem não dizemos que ele é


sábio ou que possui discernimento, mas que é calmo, amável ou tempe- [10]
rante; porém, louvamos um homem sábio referindo-nos à sua disposição de
espírito, e às disposições de espírito louváveis chamamos virtudes.
(ARISTÓTELES, 2001, p. 39)

Através da aquisição da virtude, que são os valores morais e intelectuais


a serem desenvolvidos pelo indivíduo, constrói-se uma sociedade melhor,
objetivo de qualquer organização política instituída. Conforme
ensinamento do instrutor espiritual Emmanuel, através da psicografia de
Francisco Candido Xavier, é preciso embelezar o mundo, melhorando as
criaturas que o habitam: “O mal, portanto, não é essencialmente do mundo,
mas das criaturas que o habitam. Faz-se preciso, pois, embelezar o mundo
e aprimorá-lo, combatendo o mal que está em nós.” (XAVIER, 2013a, p.
75,76)

Justiça Divina

A Justiça Divina pode ser definida como um sistema de leis divinas que
possui como finalidade retribuir a cada um segundo o seu procedimento,
com vistas ao desenvolvimento espiritual do indivíduo, estimulando-o ou
advertindo-o. O conjunto destas leis resulta em um mecanismo de educação
moral da criatura, com vistas ao objetivo final da criação, o
desenvolvimento dos potenciais do Espírito, culminando na Perfeição
Espiritual. A justiça divina é distributiva20, conforme ensinamento
trazido pela Doutrina Espírita:

Os sofrimentos devidos a causas anteriores à existência presente, como os


que se originam de culpas atuais, são muitas vezes a consequência da
falta cometida, isto é, o homem, pela ação de uma rigorosa justiça
distributiva, sofre o que fez sofrer aos outros. Se foi duro e desumano,
poderá ser a seu turno tratado duramente e com desumanidade; se foi
orgulhoso, poderá nascer em humilhante condição; se foi avaro, egoísta,
ou se fez mau uso de suas riquezas, poderá ver-se privado do necessário;
se foi mau filho, poderá sofrer pelo procedimento de seus filhos, etc.
(KARDEC, 2010b, p. 124)

Observa-se no texto acima que o autor de uma infração às leis divinas


“poderá” sofrer as consequências mais duras de sua ação, ou seja, não é
absoluto, pois, como o objetivo da justiça divina é educar o indivíduo,
se este, por si mesmo se modificar, não necessitará ser punido. Com
relação ao tema disserta Emmanuel:

A inflexibilidade e a dureza não existem para a misericórdia divina, que,


conforme a conduta do Espírito encarnado, pode dispensar na lei, em
benefício do homem, quando a sua existência já demonstre certas
expressões do amor que cobre a multidão dos pecados. ( XAVIER, 2013b, p.
167)

O Apóstolo Paulo, em sua primeira epístola aos Coríntios, adverte que os


homens são livres para agir, porém que devem ponderar se determinadas
atitudes serão proveitosas ou prejudiciais a eles mesmos. Assim Paulo se
expressa (ALMEIDA, 2008, p. 1510): “Todas as coisas são lícitas, mas nem
todas convêm; todas são lícitas, mas nem todas edificam.”

Conforme ensina a Doutrina Espírita, tem o homem o livre arbítrio de seus


atos. Sem o livre arbítrio, o homem seria máquina (KARDEC, 2010a, p.
473). O desenvolvimento do livre arbítrio acompanha o da inteligência,
que faz o homem compreender o bem e o mal, aumentando assim, a
responsabilidade dos atos (KARDEC, 2010a, p. 446). Ao homem concedeu Deus
a liberdade de agir, para que adquira experiência e se desenvolva por si
mesmo, conforme esclarece a filosofia espírita:

Bebei na fonte viva do amor e preparai-vos, cativos da vida, a lançar-vos


um dia, livres e alegres, no seio dAquele que vos criou fracos para vos
tornar perfectíveis e que quer modeleis vós mesmos a vossa maleável
argila, a fim de serdes os artífices da vossa imortalidade. – O Espírito
de Verdade. (Paris, 1861.) (KARDEC, 2010b, p. 160)

Ressalte-se, porém, que a liberdade de agir do homem é relativa, não


sendo, pois, absoluta, estando subordinada às leis naturais que regem o
universo, no âmbito material e moral, conforme ensina Jesus, quando
esclarece que “Não se vendem dois pardais por um asse? E nenhum deles
cairá em terra sem o consentimento de vosso Pai” (RYRIE, 2007, p. 925), e
às consequências de suas atitudes no pretérito, conforme esclarece a
filosofia espírita: “Nossos atos tecem asas de libertação ou algemas de
cativeiro, para nossa vitória ou nossa queda. A ninguém devemos o destino
senão a nós próprios.” (XAVIER, 2013f, p. 23)

O mestre Jesus advertiu sobre a responsabilidade maior de quem possui


conhecimento para discernir o bem e o mal: “Se eu não viera, nem lhes
houvera falado, pecado não teriam; mas, agora, não tem desculpa do seu
pecado”(ALMEIDA, 2008, p. 1415). A filosofia espírita ensina: “O mal é
sempre o mal e não há sofismas que façam se torne boa uma ação má. A
responsabilidade, porém, do mal é relativa aos meios de que o homem
disponha para compreendê-lo.” (KARDEC, 2010a, p. 470).

O próprio Mestre Jesus respeitou o livre arbítrio dos homens quando


declarou (ALMEIDA, 2008, p. 1405): “eu vim para que tenham vida e a
tenham em abundância”; e em outra passagem conclui (ALMEIDA, 2008, p.
1395): “Contudo, não quereis vir a mim para terdes vida”.

Quando Jesus afirma que veio para que os homens tenham vida, quis dizer
que veio ensinar aos homens como viver a vida em plenitude, através do
desenvolvimento das potências internas do Espírito, as quais Jesus
exemplificou durante sua passagem pela Terra, potências estas, que
proporcionarão ao Espírito imortal vida em abundância. Por isso Jesus,
como Mestre por excelência, advertiu (ALMEIDA, 2008, p. 1413): “Em
verdade, em verdade vos digo que aquele que crê em mim fará também as
obras que eu faço e outras maiores fará”.

O Espírito do homem foi criado à imagem e semelhança de Deus. O homem


traz em si, a essência divina. Portanto, sempre que o homem tem atitudes
contrárias às leis de Deus, ele está agindo contrário a sua própria
essência, o que acarretará desajustes íntimos, que, através de variados
processos, desencadeiam consequências emocionais e físicas para o próprio
homem, sendo a verdadeira paz de consciência interior, a vivência em
consonância com as leis divinas. O apóstolo Paulo discorre sobre o tema,
quando afirma que Deus:

Retribuirá a cada um segundo o seu procedimento: a vida eterna aos que,


perseverando em fazer o bem, procuram glória, honra e incorruptibilidade;
mas ira e indignação aos facciosos, que desobedecem à verdade e obedecem
à injustiça. Tribulação e angústia virão sobre a alma de qualquer homem
que faz o mal; glória, porém, e honra, e paz a todo aquele que pratica o
bem. (ALMEIDA, 2008, p. 1479)

O que muitas vezes denomina-se por castigo de Deus, na verdade, é a


própria consciência que convoca o homem, por processos diversos, a
refletir sobre suas atitudes equivocadas, a modificar suas ações, a
reparar os erros cometidos e trabalhar pela construção de uma nova
personalidade, em sintonia com a essência divina que traz em si mesmo, a
qual o próprio homem é responsável por desenvolvê-la. Sobre a essência
divina na criatura, Jesus afirma (ALMEIDA, 2008, p. 1406): “Replicou-lhes
Jesus: Não está escrito na vossa lei: Eu disse: sois deuses?”, e o
Apóstolo João conclui (ALMEIDA, 2008, p. 1616): “Todo aquele que é
nascido de Deus não vive na prática do pecado; pois o que permanece nele
é a divina semente”.

Associado às consequências íntimas do Espírito estão as consequências


externas, pois, todas as ações do homem repercutem no Universo a sua
volta, gerando consequências para ele próprio. Todo Universo é energia, e
todas as ações humanas emitem energia que se associam com energias do
mesmo nível. Energias positivas atraem energias positivas, energias
negativas atraem energias negativas, e cada ser sofre as consequências de
suas próprias atitudes. Eis a lei de Causa e Efeito. A Doutrina Espírita
esclarece sobre os fluídos:

Os fluidos não possuem qualidades sui generis, mas as adquire no meio


onde se elaboram; modificam-se pelos eflúvios deste meio, como o ar pelas
exalações, a água pelos sais das camadas que atravessa. Sob o ponto de
vista moral, trazem o cunho dos sentimentos de ódio, de inveja, de ciúme,
de orgulho, de egoísmo, de violência, de hipocrisia, de bondade, de
benevolência, de amor, de caridade, de doçura, etc. O quadro dos fluídos
seria, pois, o de todas as paixões, das virtudes e dos vícios da
humanidade. Os fluídos se combinam pela semelhança de suas naturezas; os
dessemelhantes se repelem; há incompatibilidade entre os bons e os maus
fluidos. (KARDEC, 2008a, p. 325, 326, 329)
As circunstâncias que ocorrem com o homem, todas as pessoas que convivem
com ele, todos os fatos externos que lhe afetam são atraídos pelo próprio
homem, conforme a qualidade da energia que emite de si mesmo, resultado
de seus pensamentos, sentimentos e atitudes. A este respeito Jesus
adverte (ALMEIDA, 2008, p. 1291): “Embainha a tua espada; pois todos os
que lançam mão da espada à espada perecerão”; e o apóstolo Paulo ensina
(ALMEIDA, 2008, p. 1541): “Não vos enganeis: de Deus não se zomba; pois
aquilo que o homem semear, isso também ceifará”. Neste sentido, a
filosofia espírita esclarece:

Sendo infinita a justiça de Deus, o bem e o mal são rigorosamente


considerados, não havendo uma só ação, um só pensamento mau que não tenha
consequências fatais, como não há uma única ação meritória, um só bom
movimento da alma que se perca, mesmo para os mais perversos, por isso
que constituem tais ações um começo de progresso. A duração do castigo
depende da melhoria do Espírito culpado. O código penal da vida futura
pode resumir-se nestes três princípios: 1º — O sofrimento é inerente à
imperfeição. 2º — Toda imperfeição, assim como toda falta dela promanada,
traz consigo o próprio castigo nas consequências naturais e inevitáveis:
assim, a moléstia pune os excessos e da ociosidade nasce o tédio, sem que
haja mister de uma condenação especial para cada falta ou indivíduo. 3º —
Podendo todo homem libertar-se das imperfeições por efeito da vontade,
pode igualmente anular os males consecutivos e assegurar a futura
felicidade. A cada um segundo as suas obras, no Céu como na Terra: — tal
é a lei da Justiça Divina. (KARDEC, 2008b, p. 99, 100, 109)

Porém, não são todos os acontecimentos na vida do homem que são


resultados da Lei de Causa e Efeito. Muitas vezes são escolhas que o
próprio Espírito faz antes de encarnar para auxiliar no seu progresso
espiritual ou, no caso dos Espíritos Superiores, são situações escolhidas
por eles para que, através de seus exemplos em como lidar com as
dificuldades, auxiliarem a humanidade a evoluir, conforme esclarece a
filosofia espírita,

Não há crer, no entanto, que todo sofrimento suportado neste mundo denote
a existência de uma determinada falta. Muitas vezes são simples provas
buscadas pelo Espírito para concluir a sua depuração e ativar o seu
progresso. Assim, a expiação serve sempre de prova, mas nem sempre a
prova é uma expiação. Provas e expiações, todavia, são sempre sinais de
relativa inferioridade, porquanto o que é perfeito não precisa ser
provado. Pode, pois, um Espírito haver chegado a certo grau de elevação
e, nada obstante, desejoso de adiantar-se mais, solicitar uma missão, uma
tarefa a executar, pela qual tanto mais recompensado será, se sair
vitorioso, quanto mais rude haja sido a luta. Tais são, especialmente,
essas pessoas de instintos naturalmente bons, de alma elevada, de nobres
sentimentos inatos, que parece nada de mau haverem trazido de suas
precedentes existências e que sofrem, com resignação toda cristã, as
maiores dores, somente pedindo a Deus que as possam suportar sem
murmurar. Pode-se, ao contrário, considerar como expiações as aflições
que provocam queixas e impelem o homem à revolta contra Deus. Sem dúvida,
o sofrimento que não provoca queixumes pode ser uma expiação; mas, é
indício de que foi buscada voluntariamente, antes que imposta, e
constitui prova de forte resolução, o que é sinal de progresso. Os
Espíritos não podem aspirar à completa felicidade, enquanto não se tenham
tornado puros: qualquer mácula lhes interdita a entrada nos mundos
ditosos. São como os passageiros de um navio onde há pestosos, aos quais
se veda o acesso à cidade a que aportem, até que se hajam expurgado.
Mediante as diversas existências corpóreas é que os Espíritos se vão
expungindo, pouco a pouco, de suas imperfeições. As provações da vida os
fazem adiantar-se, quando bem suportadas. Como expiações, elas apagam as
faltas e purificam. São o remédio que limpa as chagas e cura o doente.
Quanto mais grave é o mal, tanto mais enérgico deve ser o remédio.
Aquele, pois, que muito sofre deve reconhecer que muito tinha a expiar e
deve regozijar-se à idéia da sua próxima cura. Dele depende, pela
resignação, tornar proveitoso o seu sofrimento e não lhe estragar o fruto
com as suas impaciências, visto que, do contrário, terá de recomeçar.
(KARDEC, 2010b, p. 125/126)

O objetivo final da Lei de Causa e Efeito é dar a cada um segundo a suas


obras. Para aqueles que vivem a divindade em si próprios, a consequência
será a plenitude existencial, resultado da sintonia criatura-criador,
conforme ensina Paulo (ALMEIDA, 2008, p. 1501): “Nem olhos viram, nem
ouvidos ouviram, nem jamais penetrou em coração humano o que Deus tem
preparado para aqueles que o amam”. Para aqueles, que ainda se encontram
nos erros numerosos, as consequências serão situações que levem o
Espírito a refletir, a se modificar e a reparar os erros cometidos,
conforme ensina o salmista (ALMEIDA, 2008, p. 843): “Antes de ser
afligido, andava errado, mas agora guardo a tua palavra. Foi-me bom ter
eu passado pela aflição, para que aprendesse os teus decretos.”

A Doutrina Espírita assim define o culpado e o castigo ante as leis


divinas:

“Quem é, com efeito, o culpado? É aquele que, por um desvio, por um falso
movimento da alma, se afasta do objetivo da criação, que consiste no
culto harmonioso do belo, do bem, idealizados pelo arquétipo humano, pelo
Homem- Deus, por Jesus-Cristo.

“Que é o castigo? A consequência natural, derivada desse falso movimento;


uma certa soma de dores necessária a desgostá-lo da sua deformidade, pela
experimentação do sofrimento. O castigo é o aguilhão que estimula a alma,
pela amargura, a se dobrar sobre si mesma e a buscar o porto de salvação.
O castigo só tem por fim a reabilitação, a redenção. Querê-lo eterno, por
uma falta não eterna, é negar-lhe toda a razão de ser. (KARDEC, 2010a. p.
571)

Ressalta-se que o castigo na visão da filosofia espírita, é a


consequência natural dos atos do indivíduo que violam as leis naturais
instituídas por Deus, como, por exemplo, o indivíduo que adoece devido à
má alimentação. O objetivo do castigo é a reabilitação, a regeneração do
indivíduo. O castigo, portanto, é processo educacional com vistas à
redenção do individuo. Diferentemente do castigo aplicado pela legislação
humana, que na sua grande maioria não possui viés educacional, mas
vingativo, retribuindo-se com sofrimento, o sofrimento causado, sem
preocupação com a educação do infrator.
O Espírito Emmanuel, através da psicografia de Francisco Candido Xavier,
disserta sobre a origem do mal e do relacionamento da criatura como
criador:

-O determinismo divino se constitui de uma só lei, que é a do amor para a


comunidade universal. Todavia, confiando em si mesmo, mais do que em
Deus, o homem transforma a sua fragilidade em foco de ações contrárias a
essa mesma lei, efetuando, desse modo, uma intervenção indébita na
harmonia divina.

Eis o mal.

Urge recompor os elos sagrados dessa harmonia sublime.

Eis o resgate.

Vede, pois, que o mal, essencialmente considerado, não pode existir para
Deus, em virtude de representar um desvio do homem, sendo zero na
Sabedoria e na Providência Divinas.

O Criador é sempre o Pai generoso e sábio, justo e amigo, considerando os


filhos transviados como incursos em vastas experiências. Mas, como Jesus
e os seus prepostos são seus cooperadores divinos, e eles próprios
instituem as tarefas contra o desvio das criaturas humanas, focalizam os
prejuízos do mal com a força de suas responsabilidades educativas, a fim
de que a Humanidade siga retamente no seu verdadeiro caminho para Deus.
(XAVIER, 2013b. p. 95,96)

Consoante à justiça divina, cada um é responsável por suas atitudes, não


sendo imputadas a outrem as consequências do erro de um homem. O profeta
Ezequiel adverte sobre esta questão (ALMEIDA, 2008, p. 1110): “A alma que
pecar, essa morrerá; o filho não levará a iniquidade do pai, nem o pai, a
iniquidade do filho; a justiça do justo ficará sobre ele, e a
perversidade do perverso cairá sobre este”.

Conclui-se que a cada um segundo as suas obras, sendo um erro a crença no


pecado original, adotado por algumas correntes cristãs, nas quais
acreditam que todos os homens sofrem as consequências do pecado cometido
por Adão. Este erro é fruto de uma interpretação equivocada dos textos
bíblicos.

Outro ponto importante que deve ser abordado é a questão das penas
eternas ou fogo eterno, também fruto de interpretações equivocadas do
texto bíblico. Uma das características de Deus é a infinita bondade,
conforme ensina o salmista (ALMEIDA, 2008, p. 853): “Rendei graças ao
SENHOR, porque ele é bom, porque a sua misericórdia dura para sempre.
Rendei graças ao Deus dos deuses, porque a sua misericórdia dura para
sempre”. Deus é misericordioso e sua misericórdia dura para sempre,
portando é um erro acreditar na instituição das penas eternas.

Somente a título de exemplificação, pois não é objetivo deste trabalho


realizar um tratado de teologia, pode-se citar a simbologia21 por detrás
da palavra fogo, utilizada várias vezes por Jesus. O fogo possui as
características de transformar, purificar e iluminar os objetos a ele
submetidos. Significa, assim, todos os processos a que o Espírito será
submetido a fim de se transformar, se purificar e se iluminar, conforme
esclarece o profeta Zacarias:

Farei passar a terceira parte pelo fogo, e a purificarei como se purifica


a prata, e a provarei como se prova o ouro; ela invocará o meu nome, e eu
a ouvirei; direi: é meu povo, e ela dirá: O SENHOR é meu Deus. (ALMEIDA,
2008, p. 1236)

A própria palavra “eterno”, utilizada nos textos bíblicos, origina-se do


grego aiõn, que significa era, um período ou lapso de tempo,
indefinidamente longo, consoante com os ensinos da filosofia espírita
(KARDEC, 2010a, p. 565): “Sendo o estado de sofrimento ou de felicidade
proporcional ao grau de purificação do Espírito, a duração e a natureza
de seus sofrimentos, dependem do tempo que ele gaste em melhorar-se.”
Conclui-se, que ante a justiça divina, as consequências do erro perduram
enquanto o Espírito persista no próprio erro, cessando com a melhora do
Espírito. Conclui-se, ainda, que a finalidade da justiça divina não é a
punição por vingança, como simples consequência pela desobediência às
leis divinas, mas a educação do Espírito, conforme esclarece Paulo:

Filho meu, não menosprezes a correção que vem do Senhor, porque o Senhor
corrige a quem ama. Deus nos disciplina para aproveitamento, a fim de
sermos participantes da sua santidade. Toda disciplina, com efeito, no
momento não parece ser motivo de alegria, mas de tristeza; ao depois,
entretanto, produz fruto pacífico de aos que têm sido por ela
exercitados, fruto de justiça. (ALMEIDA, 2008, p. 1595)

Outra característica da justiça divina é que o homem é responsabilizado


não somente pelos erros que cometeu, mas igualmente pelas consequências
oriundas do bem que deixou de fazer. Tiago adverte (ALMEIDA, 2008, p.
1602): “Portanto, aquele que sabe que deve fazer o bem e não o faz nisso
está pecando”; e a Doutrina Espírita também esclarece acerca do tema,
ensinando que cumpre ao homem fazer o bem no limite de suas forças,
porquanto responderá por todo o mal que haja resultado de não haver
praticado o bem (KARDEC, 2010a, p. 387). Em outra passagem a filosofia
espírita adverte que “Acresce que, para fazer o bem, como lhe cumpre,
pois que isso constitui o objetivo único da vida, facultado lhe é impedir
o mal, sobretudo aquele que possa concorrer para a produção de um mal
maior.” (KARDEC, 2010a, p. 480).

Todos os homens se encontram em processo evolutivo a caminho da perfeição


espiritual. Segundo o apóstolo Paulo (ALMEIDA, 2008, p. 1557) “o amor é o
vínculo da perfeição”, demonstrando que somente vivenciando o amor, na
expressão da fraternidade e do auxílio mútuo, o homem alcançará seu
objetivo final diante das leis da vida. Toda vez que as atitudes do
homem, sabedor de suas responsabilidades diante de si próprio e do seu
próximo, não representam a expressão deste amor, ele será
responsabilizado diante da lei de justiça divina. A este respeito
esclarece Emmanuel:

“-A lei de talião prevalece para todos os espíritos que não edificaram
ainda o santuário do amor nos corações, e que representam a quase
totalidade dos seres humanos. Presos, ainda, aos milênios do pretérito,
não cogitaram de aceitar e aplicar o Evangelho a si próprios,
permanecendo encarcerados em círculos viciosos de dolorosas reencarnações
expiatórias e purificadoras. Daí a verdade de que as criaturas humanas se
redimirão pelo amor22 e se elevarão a Deus por ele, anulando com o bem
todas as forças que lhes possam encarcerar o coração nos sofrimentos do
mundo.” (XAVIER, 2013b, p. 187)

A lei de talião expressa pelo benfeitor espiritual Emmanuel, diz respeito


à justiça distributiva, na qual cada um, de acordo com suas atitudes
receberá as consequências, para o processo de educação íntima do
indivíduo. Porém, como também adverte Emmanuel, a prática do amor,
demonstrando a melhora do espírito perante suas imperfeições, o isenta
das consequências do ato equivocado do passado, restando ao Espírito
redimido efetuar a reparação, fazendo o bem àqueles a quem ele tenha
feito o mal, conforme ensinos da Doutrina Espírita:

16º — O arrependimento, conquanto seja o primeiro passo para a


regeneração, não basta por si só; são precisas a expiação23 e a
reparação. Arrependimento, expiação e reparação constituem, portanto, as
três condições necessárias para apagar os traços de uma falta e suas
conseqüências. O arrependimento suaviza os travos da expiação, abrindo
pela esperança o caminho da reabilitação; só a reparação, contudo, pode
anular o efeito destruindo-lhe a causa. Do contrário, o perdão seria uma
graça, não uma anulação. 17º — O arrependimento pode dar-se por toda
parte e em qualquer tempo; se for tarde, porém, o culpado sofre por mais
tempo. Até que os últimos vestígios da falta desapareçam, a expiação
consiste nos sofrimentos físicos e morais que lhe são conseqüentes, seja
na vida atual, seja na vida espiritual após a morte, ou ainda em nova
existência corporal. A reparação consiste em fazer o bem àqueles a quem
se havia feito o mal. Quem não repara os seus erros numa existência, por
fraqueza ou má vontade, achar-se-á numa existência ulterior em contacto
com as mesmas pessoas que de si tiverem queixas, e em condições
voluntariamente escolhidas, de modo a demonstrar-lhes reconhecimento e
fazer-lhes tanto bem quanto mal lhes tenha feito. (KARDEC, 2008b, p. 101,
102)

Conclui-se que a justiça divina é, na verdade, um processo de educação do


indivíduo com vista à perfeição espiritual. Não existem punições
motivadas simplesmente por vingança, devido ao indivíduo não ter
obedecido as leis naturais, ou por ter causado sofrimento ao seu próximo,
existe educação, num processo que culmina com a reparação aos males
causados à outrem. Não existem penas eternas, existe aprendizado por
tempo necessário a melhoria do Espírito. Não existe um Deus terrível, mas
um Pai amoroso e justo. Eis a justiça divina, um mecanismo da educação
dos indivíduos.

A Sociedade e o Criminoso

Ao abordar-se o homem com relação à justiça divina, deve-se igualmente


abordar o homem em relação ao próprio homem, perante os erros uns dos
outros. O Apóstolo Paulo ensina qual deve ser a atitude perante aquele
que erra, esclarecendo:
Não torneis a ninguém mal por mal; esforçai-vos por fazer o bem perante
todos os homens; não vos vingueis a vós mesmos, amados, mas dai lugar a
ira24; porque está escrito: A mim me pertence a vingança25, eu é que
retribuirei, diz o Senhor. Pelo contrário, se o teu inimigo tiver fome,
dá-lhe de comer; se tiver sede, dá-lhe de beber. Não te deixes vencer do
mal, mas vence o mal com o bem. (ALMEIDA, 2008, p. 1494)

Nesta passagem Paulo deixa claro qual o comportamento que o homem deve
ter para com aquele que comete um erro. Inicia dizendo que não se deve
tornar mal por mal. Ante o mal deve-se responder com o bem26. Prossegue
Paulo ensinando que não se deve vingar, mas deixar que as próprias leis
divinas retribuam à ação negativa do indivíduo. Cabe ao homem, perante os
equívocos dos outros, dar alimento ante a fome íntima de valores morais e
dar água ante a sede íntima de esclarecimento. Cabe ao homem auxiliar o
próprio homem no processo evolutivo a que todos se encontram inseridos.
Toda ação da sociedade para com o criminoso deve ter um viés educacional.
Se houver necessidade da punição, do castigo, no sentido de corrigir o
indivíduo, seja restringindo sua liberdade, seja determinando a reparação
ao dano causado, todas estas ações devem ter propósitos educacionais e
nunca vingativos.

Em outra passagem, a filosofia cristã ensina a atitude que o individuo


deve ter com relação àquele que o prejudica ou prejudica a sociedade,
conclamando a uma mudança de atitude com relação a vingança, que era
exercida até então,

Ouvistes que foi dito: Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo. Eu,
porém, vos digo: amai os vossos inimigos27 e orai pelos que vos
perseguem; para que vos torneis filhos do vosso Pai celeste, porque ele
faz nascer o seu sol sobre maus e bons e vir chuvas sobre justos e
injustos. Porque, se amardes os que vos amam, que recompensa tendes? Não
fazem os publicanos também o mesmo? E, se saudardes somente os vossos
irmãos, que fazeis de mais? Não fazem os gentios também o mesmo?
Portanto, sede vós perfeitos como perfeito é o vosso Pai celeste. (RYRIE,
2007, p. 920)

Nesta passagem é ensinado que a atitude da sociedade para o com o


criminoso deve ser de perdão, de auxílio. Por detrás destes ensinamentos,
pode-se destacar duas justificativas que avalizam esta atitude de perdão
e auxílio como sendo a mais acertada. Primeiramente, como ensina a
filosofia espírita, todas as ações de um indivíduo para com outro,
influencia o outro a desenvolver atitudes parecidas. Portanto, quando se
retribui o mal com outro mal, através do processo da vingança, o que se
estará fazendo é estimular que o outro tenha atitudes cada vez mais
voltadas ao mal. Do contrário, quando se retribui o mal com atitudes de
bondade, com ações voltadas ao real melhoramento moral do outro, estar-
se-á estimulando o outro a agir com bondade, modificando suas atitudes do
pretérito. A este respeito, Emmanuel esclarece:

Nossas emoções, pensamentos e atos são elementos dinâmicos de indução.


Todos exteriorizamos a energia mental, configurando as formas sutis com
que influenciamos o próximo, e todos somos afetados por essas mesmas
formas, nascidas nos cérebros alheios. Cada atitude de nossa existência
polariza forças naqueles que se nos afinam com o modo de ser, impelindo-
os à imitação consciente ou inconsciente. É que o princípio de
repercussão nos comanda a atividade em todos os passos da vida. (XAVIER,
2013e, p. 40)

E, em outro ensinamento, a filosofia espírita conclui:

Não há coração tão perverso que, mesmo a seu mau grado, não se mostre
sensível ao bom proceder. Mediante o bom procedimento, tira-se, pelo
menos, todo pretexto às represálias, podendo-se até fazer de um inimigo
um amigo, antes e depois de sua morte. Com um mau proceder, o homem
irrita o seu inimigo, que então se constitui instrumento de que a justiça
de Deus se serve para punir aquele que não perdoou. (KARDEC, 2010b, p.
250)

Outra justificativa a ser analisada é a questão da projeção. A este


respeito, Alessandro Barata disserta:

O fenômeno da projeção da agressividade e do correspondente sentimento de


culpa sobre o delinquente é analisado, na literatura psicanalítica,
através da mítica figura do bode expiatório, carregado dos nossos
sentimentos de culpa e enviado ao deserto. Edwarde Naegeli relaciona a
mórbida necessidade de sensacionais descrições de delitos com esta
necessidade de um bode expiatório, que é encontrado no delinquente, sobre
o qual são projetadas as nossas mais ou menos inconscientes tendências
criminosas. (BARATTA, 2011, p. 56)

E citando Naegeli, Alessandro Baratta conclui:

O nosso negativo, a assim chamada sombra, produz, como conteúdo


consciencial inibido através da instância do superego, sentimentos de
culpa inconscientes que procuram ser descarregados. Em todo homem existe
a tendência a transferir esta sombra sobre uma terceira pessoa, objeto da
projeção, ou seja, a transportá-la para o exterior e, com isso, a
concebê-la como alguma coisa de externo, que pertence a um terceiro. Em
lugar de voltar-se contra si próprio, insulta-se e pune-se o objeto desta
transferência, o bode expiatório, para o qual é sobretudo característico
o fato de que se encontra em condição indefesa. (BARATTA, 2011, p. 56)

Deve-se ter o cuidado ante as manifestações de vingança contra o


criminoso, pois, como discorre Naegeli, existe uma projeção da sombra28
do indivíduo sobre o criminoso. Sobre este tema, Paulo, o apóstolo,
disserta que “Portanto, és indesculpável, ó homem, quando julgas, quem
quer que sejas; porque, no que julgas a outros, a ti mesmo te condenas;
pois praticas as próprias coisas que condenas.” (RYRIE, 2007, p. 1092)
Quando Paulo afirma que o indivíduo pratica as próprias coisas que
condena, este praticar não se resume ao agir, cometer a mesma ação que é
condenada no outro, mas abrange também o fato de o indivíduo possuir
intimamente aquela imperfeição, conforme ensina Jesus, que “qualquer que
olhar para uma mulher com intenção impura, no coração, já adulterou com
ela” (RYRIE, 2007, p. 919). O indivíduo é, em essência, o que sente, o
que pensa, mesmo que não exteriorize por palavras ou atos este sentimento
ou pensamento. Um exemplo disso é reportagem da revista Época com relação
a estudos feitos sobre a homofobia:
Estudo conduzido por universidades americanas e britânicas sugere que a
homofobia é mais comum em indivíduos que possuem desejos retraídos pelo
mesmo sexo. Tal preconceito cresce ainda por culpa de pais autoritários
que reprimem tais desejos, diz a pesquisa publicada na edição de abril do
periódico Journal of Personality and Social Psychology. Segundo os
cientistas, os homofóbicos são geralmente pessoas que estão em guerra com
elas mesmas e acabam externando esses conflitos. Para os pesquisadores,
os homossexuais que vivem em casas controladoras sentem medo de perder o
amor e a aprovação dos pais caso admitam atração pelo mesmo sexo, por
isso negam ou reprimem a si mesmos este desejo. Ou seja, de acordo com a
pesquisa, a homofobia e a agressividade podem ser reação de quem se
identifica com o grupo, mas não aceita o fato.
(http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/noticia/2012/04/homofobia-pode-
ser-reacao-de-desejo-retraido-pelo-mesmo-sexo-diz-estudo.html)

Conclui-se que ao condenar, desejar vingança, o indivíduo poderá estar


simplesmente projetando sua sombra no outro, e, ao mesmo tempo,
utilizando de mecanismos, retribuir o mal pelo mal, que somente
aumentarão as manifestações do mal no outro. Em todos os casos, o perdão
e atitudes positivas no bem são o melhor caminho para a recuperação do
criminoso, e a consequente reconstrução de uma sociedade melhor, com
indivíduos melhorados.

O Criminoso

Criminoso é todo aquele que comete um crime. Crime são ações contrárias
às leis penais estabelecidas por uma sociedade, ou, em um conceito mais
amplo, são ações que contrariam o conceito de justiça. Segundo a
filosofia espírita, “A justiça consiste em cada um respeitar os direitos
dos demais” (KARDEC, 2010a, p. 493), sendo estes direitos determinados
pela lei humana e pela lei divina (KARDEC, 2010a, p. 493). O criminoso,
portanto, é o indivíduo que, conscientemente, infringe as leis humanas
e/ou divinas, desrespeitando a justiça, prejudicando, assim, outro(s)
indivíduo(s).

Vários estudiosos do direito, notadamente os da ciência penal, no âmbito


da criminologia29, desenvolveram teorias para tentar explicar o fenômeno
da criminalidade, suas causas e meios de combatê-las. Para entender o
fenômeno do crime é necessário inicialmente entender os fatores que
favorecem a existência do ato criminoso, entre eles, a personalidade30 do
agente e a influência das condições do meio social31 onde ao agente está
inserido.

Quanto à personalidade32 do agente, a filosofia espírita esclarece que:

“A mente é o equipamento sublime do Espírito, resultado de milênios


incontáveis de evolução incessante, onde estão gravados, de maneira
indelével, todos os recursos psicológicos de nossa personalidade:
caráter, cultura, hábitos, aptidões, sensibilidade, desejos, virtudes,
vícios, amor, paixões etc. Os recursos mentais variam de Espírito para
Espírito, em função do livre-arbítrio de cada um no aproveitamento das
experiências, na existência terrena.” (BARCELOS, 2005 apud SOBRINHO,
2012, p. 576/577)
A mente, sediada no Espírito, se manifesta no corpo físico através do
cérebro, consoante esclarecimento da filosofia espírita: “O cérebro é o
órgão sagrado de manifestação da mente, em trânsito da animalidade
primitiva para a espiritualidade humana.” (XAVIER, 2013d, p. 56).

Todas as ações do homem partem da mente, inclusive a sua própria


estrutura existencial, conforme esclarece a filosofia espírita:

Para definirmos, de alguma sorte, o corpo espiritual, é preciso


considerar, antes de tudo, que ele não é reflexo do corpo físico, porque,
na realidade, é o corpo físico que o reflete, tanto quanto ele próprio, o
corpo espiritual, retrata em si o corpo mental que lhe preside a
formação. (XAVIER, 2011, p. 25)

Na estrutura do homem, vista no item 1.1.1.3, a filosofia espirita


elucidou que o homem é composto pelo Espírito, Perispírito e Corpo
Físico. O Corpo físico é portanto, um reflexo do Perispírito e este um
reflexo do Espírito, ou da Mente, onde se processa todos os valores da
personalidade do Espírito. Por isso, alguns estudiosos da criminologia,
entre eles, Cesare Lombroso33, identificaram traços físicos parecidos
entre criminosos.

Sendo o cérebro, “o instrumento que traduz a mente, manancial de nossos


pensamentos” (XAVIER, 2013d, p. 48), o conhecimento de sua estrutura é de
vital importância para o conhecimento da personalidade do agente, e
consequentemente, para o conhecimento das causas do impulso criminoso do
indivíduo. Sobre este tema, a filosofia espírita esclarece:

Não podemos dizer que possuímos três cérebros simultaneamente. Temos


apenas um que, porém, se divide em três regiões distintas. Tomemo-lo como
se fora um castelo de três andares: no primeiro situamos a “residência de
nossos impulsos automáticos”, simbolizando o sumário vivo dos serviços
realizados; no segundo localizamos o “domicílio das conquistas atuais”,
onde se erguem e se consolidam as qualidades nobres que estamos
edificando; no terceiro, temos a “casa das noções superiores”, indicando
as eminências que nos cumpre atingir. Num deles moram o hábito e o
automatismo; no outro residem o esforço e a vontade; e no último demoram
o ideal e a meta superior a ser alcançada. Distribuímos, deste modo, nos
três andares, o subconsciente, o consciente e o superconsciente. Como
vemos, possuímos, em nós mesmos, o passado, o presente e o futuro.
(XAVIER, 2013d, p. 45/46)

Cada indivíduo possui em si mesmo as suas conquistas na caminhada


evolutiva. Conquistas estas que se tornaram hábitos34, pelo processo do
automatismo, consequência de reiteradas ações e reações diante das
experiências que a vida lhe oferece, nas múltiplas existências corporais.
Todo arquivo do pretérito está situado no subconsciente, sobre o qual
Emmanuel elucida:

A subconsciência é o acervo de experiências realizadas pelo ser em suas


existências passadas. O Espírito, no labor incessante de suas múltiplas
existências, vai ajuntando as séries de suas conquistas, de suas
possibilidades, de seus trabalhos; no seu cérebro espiritual organiza-se,
então, essa consciência profunda, em cujos domínios misteriosos se vão
arquivando as recordações, e a alma, em cada etapa da sua vida imortal,
renasce para uma nova conquista, objetivando sempre o aperfeiçoamento
supremo. (XAVIER, 2014, p. 94)

O indivíduo renasce para a conquista de novos aprendizados e para


modificar os hábitos inferiores adquiridos na sua jornada evolutiva. A
influência das condições sociais35 na qual está inserido é de grande
importância neste processo, contribuindo para que ocorra essa renovação
de hábitos inferiores ou para que haja a continuação da vivencia desses
mesmos hábitos, gerando atitudes infelizes que prejudicam outros
indivíduos, dentre as quais, algumas, tipificadas como crime.

Consoante ensino da filosofia espírita, “por instinto os homens buscam a


sociedade e todos devem concorrer para o progresso, auxiliando-se
mutuamente” (KARDEC, 2010a, p. 440). Todos os membros de uma sociedade
são responsáveis uns pelos outros, devendo auxiliar-se mutuamente, para o
progresso geral. Quando a família, a escola, e a sociedade como um todo,
falha na educação36 e no oferecimento de condições dignas de
sobrevivência ao indivíduo, esta mesma sociedade está contribuindo para
que este indivíduo recapitule experiências infelizes do passado,
estimulando os hábitos infelizes que ainda traz em sua intimidade, dentre
eles, ações tipificadas como crime.

A filosofia espírita esclarece, sobre este tema, ao abordar o egoísmo,


como o vício do qual deriva todo o mal (KARDEC, 2010a, p. 511) que:

“O choque, que o homem experimenta, do egoísmo dos outros é o que muitas


vezes o faz egoísta, por sentir a necessidade de colocar-se na defensiva.
Notando que os outros pensam em si próprios e não nele, ei-lo levado a
ocupar-se consigo, mais do que com os outros. Sirva de base às
instituições sociais, às relações legais de povo a povo e de homem a
homem o princípio da caridade e da fraternidade e cada um pensará menos
na sua pessoa, assim veja que outros nela pensaram. Todos experimentarão
a influência moralizadora do exemplo e do contacto.” (KARDEC, 2010a, p.
513/514)

E conclui:

O homem deseja ser feliz e natural é o sentimento que dá origem a esse


desejo. Por isso é que trabalha incessantemente para melhorar a sua
posição na Terra, que pesquisa as causas de seus males, para remediá-los.
Quando compreender bem que no egoísmo reside uma dessas causas, a que
gera o orgulho, a ambição, a cupidez, a inveja, o ódio, o ciúme, que a
cada momento o magoam, a que perturba todas as relações sociais, provoca
as dissensões, aniquila a confiança, a que o obriga a se manter
constantemente na defensiva contra o seu vizinho, enfim a que do amigo
faz inimigo, ele compreenderá também que esse vício é incompatível com a
sua felicidade e, podemos mesmo acrescentar, com a sua própria segurança.
E quanto mais haja sofrido por efeito desse vício, mais sentirá a
necessidade de combatê-lo, como se combatem a peste, os animais nocivos e
todos os outros flagelos. O seu próprio interesse a isso o induzirá.
(KARDEC, 2010a, p. 515)

→ O Criminoso e a Vítima
Analisando a pessoa do criminoso e da vítima num delito, a Doutrina
Espírita e a filosofia cristã possibilitam um enfoque diferenciado, que
proporciona uma reflexão sobre a visão que a atual sociedade possui do
criminoso e da vítima. Quando Jesus advertiu (ALMEIDA, 2008, p. 1291):
“Embainha a tua espada; pois todos os que lançam mão da espada à espada
perecerão”, o Mestre estava ensinando que aquele que ferir o seu próximo
poderá37 ser ferido igualmente. Então, numa consequência futura, o
indivíduo que feriu será ferido, ou seja, o algoz de hoje será a vítima
de amanhã.

A vítima em um evento38 criminoso ou delito, sendo este qualquer ato que


constitua uma infração às leis estabelecidas (HOUAISS, 2009, p. 610),
sejam estas leis humanas ou divinas, é, na maioria das vezes, um Espírito
em doloroso processo de expiação ante os erros do passado. Expiação, que
segundo Emmanuel, é definida como “a pena imposta ao malfeitor que comete
um crime” (XAVIER, 2013b, p. 167). Conclui-se que a vítima, na verdade, é
um infrator das leis divinas, no passado recente ou remoto, recebendo sua
“punição” educativa no presente, conforme esclarece a filosofia espírita:

Mas, se há males nesta vida cuja causa primária é o homem, outros há


também aos quais, pelo menos na aparência, ele é completamente estranho e
que parecem atingi-lo como por fatalidade. Tal, por exemplo, a perda de
entes queridos e a dos que são o amparo da família. Tais, ainda, os
acidentes que nenhuma previsão poderia impedir; os reveses da fortuna,
que frustram todas as precauções aconselhadas pela prudência; os flagelos
naturais, as enfermidades de nascença, sobretudo as que tiram a tantos
infelizes os meios de ganhar a vida pelo trabalho: as deformidades, a
idiotia, o cretinismo, etc. Os que nascem nessas condições, certamente
nada hão feito na existência atual para merecer, sem compensação, tão
triste sorte, que não podiam evitar, que são impotentes para mudar por si
mesmos e que os põe à mercê da comiseração pública. Por que, pois, seres
tão desgraçados, enquanto, ao lado deles, sob o mesmo teto, na mesma
família, outros são favorecidos de todos os modos? Que dizer, enfim,
dessas crianças que morrem em tenra idade e da vida só conheceram
sofrimentos? Problemas são esses que ainda nenhuma filosofia pôde
resolver, anomalias que nenhuma religião pôde justificar e que seriam a
negação da bondade, da justiça e da providência de Deus, se se
verificasse a hipótese de ser criada a alma ao mesmo tempo que o corpo e
de estar a sua sorte irrevogavelmente determinada após a permanência de
alguns instantes na Terra. Que fizeram essas almas, que acabam de sair
das mãos do Criador, para se verem, neste mundo, a braços com tantas
misérias e para merecerem no futuro uma recompensa ou uma punição
qualquer, visto que não hão podido praticar nem o bem, nem o mal?
Todavia, por virtude do axioma segundo o qual todo efeito tem uma causa,
tais misérias são efeitos que hão de ter uma causa e, desde que se admita
um Deus justo, essa causa também há de ser justa. Ora, ao efeito
precedendo sempre a causa, se esta não se encontra na vida atual, há de
ser anterior a essa vida, isto é, há de estar numa existência precedente.
Por outro lado, não podendo Deus punir alguém pelo bem que fez, nem pelo
mal que não fez, se somos punidos, é que fizemos o mal; se esse mal não o
fizemos na presente vida, tê-lo-emos feito noutra. É uma alternativa a
que ninguém pode fugir e em que a lógica decide de que parte se acha a
justiça de Deus. (KARDEC, 2010b, p. 122/123)
Pode-se concluir que não existe injustiça diante das leis divinas, pois,
Deus, tendo como um de seus atributos a soberana justiça e bondade, não
poderia permitir que na sua criação existisse uma injustiça sequer, sendo
que a aparente injustiça se torna justiça quando revelados as causas
anteriores que culminaram na ação presente, que sendo analisada
isoladamente, aparenta uma injustiça, conforme disserta André Luiz:
“Funciona a justiça, através da injustiça aparente, até que o amor nasça
e redima os que se condenaram a longas e dolorosas sentenças diante da
Boa Lei.” (XAVIER, 2010. p. 23). Nenhuma ação sofrida pelo homem é
injusta, pois, ou representa a aplicação da Lei Divina, em consequência
de uma atitude pretérita desencadeadora das consequências atuais ou uma
solicitação do próprio Espírito, como prova, tornando-se um meio de
acelerar sua evolução, ou missão, onde o Espírito superior em grau
evolutivo solicita para servir de exemplo para os demais, como foi o caso
de Jesus Cristo.

No caso de o fato servir como prova para a vítima, ensina a Doutrina


Espírita:

[...] Sabe ele que, pela mesma destinação da Terra, deve esperar topar aí
com homens maus e perversos; que as maldades com que se defronta fazem
parte das provas que lhe cumpre suportar e o elevado ponto de vista em
que se coloca lhe torna menos amargas as vicissitudes, quer advenham dos
homens, quer das coisas. Se não se queixa das provas, tampouco deve
queixar-se dos que lhe servem de instrumento. Se, em vez de se queixar,
agradece a Deus o experimentá-lo, deve também agradecer a mão que lhe dá
ensejo de demonstrar a sua paciência e a sua resignação. Esta ideia o
dispõe naturalmente ao perdão. (KARDEC, 2010b, p. 248 e 249)

Com base no exposto, conclui-se que, na verdade, não existe vítima,


existe educando. Esta maneira de compreender o ato criminoso desenvolve
na sociedade uma forma diferente de valorar o ato criminoso,
proporcionando o desenvolvimento de um sentimento de compaixão, não
somente pela vítima, mas também pelo criminoso, em detrimento do
sentimento de vingança que ainda vige na sociedade diante de um crime,
atitude esta responsável por produzir consequências donosas para a
recuperação do criminoso39. A vítima de hoje, foi o criminoso de ontem e
o criminoso de hoje poderá vir a ser a vítima de amanhã, em um perfeito e
harmonioso mecanismo de redenção da humanidade, pela ação da lei de Causa
e Efeito. A filosofia cristã ensina a este respeito que “Ai do mundo por
causa dos escândalos! É necessário que haja escândalos, mas ai do homem
pelo qual o escândalo vem!” (BORTOLINE, 2010, p. 1736), e a filosofia
espírita esclarece:

É necessário que o escândalo venha, porque, estando em expiação na Terra,


os homens se punem a si mesmos pelo contacto de seus vícios, cujas
primeiras vítimas são eles próprios e cujos inconvenientes acabam por
compreender. Quando estiverem cansados de sofrer devido ao mal,
procurarão remédio no bem. A reação desses vícios serve, pois, ao mesmo
tempo, de castigo para uns e de provas para outros. É assim que do mal
tira Deus o bem e que os próprios homens utilizam as coisas más ou as
escórias. (KARDEC, 2010b, p. 190/191)
Abordando o tema, o Espírito Emmanuel complementa:

-Num plano de vida, onde quase todos se encontram pelo escândalo que
praticaram no pretérito, é justo que o mesmo “escândalo” seja necessário,
como elemento de expiação, de prova ou de aprendizado, porque aos homens
falta ainda aquele “amor que cobre a multidão dos pecados”. (XAVIER,
2013b, p. 206)

Ressalte-se, porém, que “A nenhum Espírito é dada a missão de praticar o


mal40. Aquele que o faz fá-lo por conta própria, sujeitando-se, portanto,
às consequências.”(KARDEC, 2010a, p.309). O Espírito que necessita passar
pela expiação, atrai para si Espíritos com tendências inferiores para que
sirvam de instrumento para seu processo educativo ante as leis divinas,
Espíritos estes, que, por sua vez, responderão diante da Lei Divina pelos
atos praticados, conforme esclarece a filosofia espírita:

Mas, ai daquele por quem venha o escândalo. Quer dizer que o mal sendo
sempre o mal, aquele que a seu mau grado servir de instrumento à justiça
divina, aquele cujos maus instintos foram utilizados, nem por isso deixou
de praticar o mal e de merecer punição. Assim é, por exemplo, que um
filho ingrato é uma punição ou uma prova para o pai que sofre com isso,
porque esse pai talvez tenha sido também um mau filho que fez sofresse
seu pai. Passa ele pela pena de talião. Mas, essa circunstância não pode
servir de escusa ao filho que, a seu turno, terá de ser castigado em seus
próprios filhos, ou de outra maneira. (KARDEC, 2010b, p. 191)

Esse ciclo, que a princípio parece ser perpétuo, crime-expiação-crime-


expiação, somente cessará quando pela prática do amor, simbolizando a
melhoria intima do Espírito culpado, o Espírito que cometeu uma infração
às leis divinas, não necessitar passar pela expiação, e consequentemente,
não necessitará que outro indivíduo pratique uma ação, considerada pela
legislação humana como crime, para seu aprendizado, consoante
esclarecimento da filosofia espírita:

Sendo assim, dirão, o mal é necessário e durará sempre, porquanto, se


desaparecesse, Deus se veria privado de um poderoso meio de corrigir os
culpados. Logo, é inútil cuidar de melhorar os homens. Deixando, porém,
de haver culpados, também desnecessário se tornariam quaisquer castigos.
Suponhamos que a Humanidade se transforme e passe a ser constituída de
homens de bem: nenhum pensará em fazer mal ao seu próximo e todos serão
ditosos por serem bons. Tal a condição dos mundos elevados, donde já o
mal foi banido; tal virá a ser a da Terra, quando houver progredido
bastante. Mas, ao mesmo tempo que alguns mundos se adiantam, outros se
formam, povoados de Espíritos primitivos e que, além disso, servem de
habitação, de exílio e de estância expiatória a Espíritos imperfeitos,
rebeldes, obstinados no mal, expulsos de mundos que se tornaram felizes.
(KARDEC, 2010b, p. 191)

4. JUSTIÇA HUMANA
A Justiça humana baseia-se na retribuição punitiva ao infrator, como
consequência do ato ilegal que o mesmo praticou. Segundo Bitencourt
(BITENCOURT, 2009, p. 84) “a pena é concebida como um mal que deve ser
imposto ao autor de um delito para que expie sua culpa. Isso não é outra
coisa que a concepção retributiva da pena.”
4.1. Evolução Histórica da Pena – Aspectos Gerais
Segundo o dicionário Houaiss (HOUAISS, 2009, p. 1464), pena é a “sanção
aplicada como punição ou como reparação por uma ação julgada
repreensível; castigo, condenação, penitência”, e Alessandro Baratta
disserta sobre a função da pena:

[...] o fim da pena é a defesa social. [...] a pena constitui, em relação


ao impulso criminoso, um contraestímulo. E assim o limite lógico da pena
é assinalado por esta sua função de contraimpulso, que não deve ser
superada jamais. Por isso, escreve Romagnosi em um parágrafo famoso da
Genesi, “se depois do primeiro delito existisse uma certeza moral de que
não ocorreria nenhum outro, a sociedade não teria direito algum de puní-
lo [o delinquente]”41Contudo, segundo Romagnosi, a pena não é o único
meio de defesa social; antes, o maior esforço da sociedade deve ser
colocado na prevenção do delito, através do melhoramento e
desenvolvimento das condições de vida social. (BARATTA, 2011, p. 35)

Em todas as épocas da história da humanidade, buscou-se aplicar uma


punição aos atos considerados inaceitáveis pela sociedade, com a
finalidade de reprimir esses atos que trazem consequências danosas à
própria sociedade. O grande legislador hebreu, Moisés (Em torno de 1.500
a.c), estabeleceu diversas regras de conduta para o povo hebreu, assim
como diversas punições a quem infringisse aquelas regras. A pena de morte
era utilizada nos crimes considerados mais graves, como o adultério: “Se
um homem adulterar com a mulher do seu próximo, será morto o adúltero e a
adúltera.” (ALMEIDA, 2008, p. 168), e o homicídio: “Quem ferir a outro,
de modo que este morra, também será morto.” (ALMEIDA, 2008, p. 104)

No período da Idade Média, instituiu-se como punição, para os casos de


crimes mais graves, o Suplício, que consistia na “Pena corporal,
dolorosa, mais ou menos atroz [dizia Jaucourt]; e acrescentava: é um
“fenômeno inexplicável a extensão da imaginação dos homens para a
barbárie e a crueldade.” (ENCYCLOPÉDIE, verbete suplício apud FOUCAULT,
2009, p. 35). Em outra definição mais minuciosa, Foucault esclarece:

O suplício é uma técnica e não deve ser equiparado aos extremos de uma
raiva sem lei. Uma pena, para ser um suplício, deve obedecer a três
critérios principais: em primeiro lugar, produzir uma certa quantidade de
sofrimento que se possa, se não medir exatamente, ao menos apreciar,
comparar e hierarquizar; a morte é um suplício na medida em que ela não é
simplesmente privação do direito de viver, mas a ocasião e o termo final
de uma graduação calculada de sofrimentos: desde a decapitação — que
reduz todos os sofrimentos a um só gesto e num só instante: o grau zero
do

suplício — até o esquartejamento que os leva quase ao infinito, através


do enforcamento, da fogueira e da roda, na qual se agoniza muito tempo; a
morte suplício é a arte de reter a vida no sofrimento, subdividindo-a em
“mil mortes” e obtendo, antes de cessar a existência. O suplício repousa
na arte quantitativa do sofrimento. Mas não é só: esta produção é
regulada. O suplício faz correlacionar o tipo de ferimento físico, a
qualidade, a intensidade, o tempo dos sofrimentos com a gravidade do
crime, a pessoa do criminoso, o nível social de suas vítimas. Há um
código jurídico da dor; a pena, quando é supliciante, não abate sobre o
corpo por acaso ou em bloco; ela é calculada de acordo com regras
detalhadas; número de golpes de açoite, localização do ferrete em brasa,
tempo de agonia na fogueira ou na roda (o tribunal decide se é o caso de
estrangular o paciente imediatamente, em vez de deixa-lo morrer, e ao fim
de quanto tempo esse gesto de piedade deve intervir) tipo de mutilação a
impor (mão decepada, lábios ou língua furados). (FOUCAULT, 2009, p.
35/36)

Em sua obra Vigiar e Punir, Foucault descreve uma condenação imposta a


Robert-François Damiens, que cometeu o crime de homicídio:

[Damiens fora condenado, a 2 de março de 1757], a pedir perdão


publicamente diante da poria principal da Igreja de Paris [aonde devia
ser] levado e acompanhado numa carroça, nu, de camisola, carregando uma
tocha de cera acesa de duas libras; [em seguida], na dita carroça, na
praça de Greve, e sobre um patíbulo que aí será erguido, atenazado nos
mamilos, braços, coxas e barrigas das pernas, sua mão direita segurando a
faca com que cometeu o dito parricídio, queimada com fogo de enxofre, e
às partes em que será atenazado se aplicarão chumbo derretido, óleo
fervente, piche em fogo, cera e enxofre derretidos conjuntamente, e a
seguir seu corpo será puxado e desmembrado por quatro cavalos e seus
membros e corpo consumidos ao fogo, reduzidos a cinzas, e suas cinzas
lançadas ao vento. (FOUCAULT, 2009, p. 9)

Com a evolução da sociedade, os meios de punição também foram evoluindo,


se tornando mais brandos e humanitários. Rogério Greco esclarece que,

Até o século XVIII, portanto, as penas mais utilizadas eram as corporais


e a pena de morte, além das chamadas penas infamantes e, em alguns casos
menos graves, as penas de natureza pecuniária. Com a virada do século
XVIII, principalmente após a Revolução Francesa, a pena de privação de
liberdade começou a ocupar lugar de destaque, em atenção mesmo a um
princípio que, embora embrionário, começava a ser discutido, vale dizer,
o princípio da dignidade da pessoa humana. Analisando essa mudança de
opção punitiva, Foucault dizia que, a partir daquele momento, o
sofrimento não mais recairia sobre o corpo do condenado, mas sim sobre
sua alma. (GRECO, 2015, p. 87)

Quanto a este aspecto, a filosofia espírita, em uma de suas abordagens


sobre a aplicação da pena de morte, descreve a constante evolução dos
meios de punição em nome da Justiça:

A pena de morte, que pode vir a ser banida das sociedades civilizadas,
não terá sido de necessidade em épocas menos adiantadas? “Necessidade não
é o termo. O homem julga necessária uma coisa, sempre que não descobre
outra melhor. À proporção que se instrui, vai compreendendo melhormente o
que é justo e o que é injusto e repudia os excessos cometidos, nos tempos
de ignorância, em nome da justiça.” (KARDEC, 2010a, p.437- 438)

No mesmo sentido, Rush, em 1787, assim se expressa:

Só posso esperar que não esteja longe o tempo em que as forças, o


pelourinho, o patíbulo, o chicote, a roda, serão considerados, na
história dos suplícios, como as marcas da barbárie dos séculos e dos
países e como as provas da fraca influencia da razão e da religião sobre
o espírito humano. (RUSH apud FOUCAULT, 2009, p. 15)

Esclarece-se que o termo religião42, utilizado por Rush, deve ser


entendido no seu sentido original, como meio de religar o homem a Deus, e
não no sentido das religiões organizadas, que a época da idade média,
através dos Tribunais de Inquisição43, utilizaram-se de meios parecidos
com o Suplício como forma de punição contra indivíduos considerados
hereges. A religião estabelecida pela filosofia cristã é a religião do
amor e do perdão, conforme ensinos de Jesus (ALMEIDA, 2008, p. 1251):
“amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem”, e em outra
passagem (ALMEIDA, 2008, p. 1343): “Sede misericordiosos, como também é
misericordioso vosso Pai”, sendo o amor o meio de união da criatura com o
criador (ALMEIDA, 2008, p. 1617): “Deus é amor, e aquele que permanece no
amor permanece em Deus, e Deus, nele”. Portanto é inadmissível, que uma
corrente religiosa que se diz cristã, utilize da violência, em qualquer
nível, para como ser humano. A filosofia espírita define os objetivos
norteadores da verdadeira religião, ensinando que,

O objetivo da religião é conduzir a Deus o homem. Ora, este não chega a


Deus senão quando se torna perfeito. Logo, toda religião que não torna
melhor o homem, não alcança o seu objetivo. Toda aquela em que o homem
julgue poder apoiar-se para fazer o mal, ou é falsa, ou está falseada em
seu princípio. Tal o resultado que dão as em que a forma sobreleva ao
fundo. Nula é a crença na eficácia dos sinais exteriores, se não obsta a
que se cometam assassínios, adultérios, espoliações, que se levantem
calúnias, que se causem danos ao próximo, seja no que for. Semelhantes
religiões fazem supersticiosos, hipócritas, fanáticos; não, porém, homens
de bem. (KARDEC, 2010b, p. 188)

Conclui-se com Rush, que quando a religião, em seu sentido verdadeiro,


estiver influenciando o homem em seus atos de uns para com os outros,
edificar-se-á uma nova sociedade, mais justa, humana e fraterna.

Em consequências das transformações socioeconômicas que ocorreram com a


passagem da Idade Média para a Idade Moderna, a pena de morte foi sendo
contestada por vários setores da sociedade. Eram necessários outros meios
de punição. Sobre isso transcreve Bitencourt:

“A pena privativa de liberdade – assinala – não tem uma longa história


(...). Na segunda metade do século XVIII, o arco da pena de morte estava
excessivamente tenso. Não tinha contido o aumento dos delitos nem o
agravamento das tensões sociais, nem tampouco havia garantido a segurança
das classes superiores. O pelourinho fracassava frequentemente em se
tratando de delitos leves ou de casos dignos de graça, uma vez que a
publicação da execução dava lugar mais à compaixão e à simpatia do que ao
horror. O desterro das cidades e as penas corporais tinham contribuído
para o desenvolvimento de um banditismo sumamente perigoso, que se
estendia com a impetuosa rapidez quando as guerras e as revoluções haviam
desacreditado e paralisado os velhos poderes. A pena privativa de
liberdade foi a nova grande invenção social, intimidando sempre,
corrigindo amiúde, que devia fazer retroceder o delito, quiçá, derrota-
lo, no mínimo, cercá-lo entre muros. A crise da pena de morte encontrou
aí seu fim, porque um método melhor e mais eficaz ocupava o seu lugar,
com exceção de alguns poucos casos mais graves. (HANS VON HENTIG apud
BITENCOURT, 2009, p. 118-119)

Na atualidade, os meios empregados para punição do infrator estão sendo


contestados pela sua ineficácia em alcançar os resultados almejados. O
processo de evolução da pena tem de continuar, numa busca incessante por
um sistema cada vez mais eficaz na solução da criminalidade e da
violência social.

4.2. Sistema Penal Atual


Na atualidade, existem correntes doutrinárias acerca dos fins atribuídos
a pena, podendo ser classificadas em absolutas, relativas ou utilitárias
e mistas. Rogério Greco, citando Ferrajoli, esclarece:

[...] são teorias absolutas todas aquelas doutrinas que concebem a pena
como um fim em si mesma, ou seja, como “castigo”, “reação”, “reparação”,
ou, ainda, “retribuição” do crime, justificada por seu intrínseco valor
axiológico, vale dizer, não um meio, tampouco um custo, mas, sim, um
dever ser metajurídico que possui em si seu próprio fundamento. São, ao
contrário, “relativas” todas as doutrinas utilitaristas que consideram e
justificam a pena enquanto um meio para a realização do fim utilitário da
prevenção de futuros delitos. (GRECO, 2016, p. 44)

Sobre a teoria absoluta, Rogério Greco disserta:

As teorias absolutistas, com os olhos voltados para o passado, ou seja,


simplesmente para a infração penal praticada pelo agente, advogam a tese
da retribuição, sendo que as teorias relativas, com suas lentes voltadas
para o futuro, buscando evitar que outras infrações penais sejam
cometidas, apregoam a prevenção. Na reprovação, conforme preconiza a
teoria absoluta, reside o caráter retributivo da pena. A punição se
justifica pelo fato de ter o agente cometido uma infração penal. Ao mal
do crime, retribui-se com o mal da pena. (GRECO, 2016, p. 44)

Sobre a teoria da Prevenção Especial, uma das divisões das Teorias


relativas ou preventiva, Bitencourt esclarece:

A prevenção especial não busca a intimidação do grupo social nem a


retribuição do fato praticado, visando apenas aquele indivíduo que já
delinquiu para fazer com que não volte a transgredir as normas jurídico-
penais. Os partidários da prevenção especial preferem falar de medidas e
não de penas. A pena, segundo dizem, implica a liberdade ou a capacidade
racional do indivíduo, partindo de um conceito geral de igualdade. Já a
medida supõe que o delinquente é um sujeito perigoso ou diferente do
sujeito normal, por isso, deve ser tratado de acordo com a sua
periculosidade. Como o castigo e a intimidação não têm sentido, o que se
pretende, portanto, é corrigir, ressocializar ou inocuizar. (BITENCOURT,
2009, p. 97)

Nesse sentido, Bitencourt conclui que,

O conceito de ressocialização deve ser submetido necessariamente a novos


debates e a novas definições. É preciso reconhecer que a pena privativa
de liberdade é um instrumento, talvez dos mais graves, com que conta o
Estado para preservar a vida social de um grupo determinado. Este tipo de
pena, contudo, não resolveu o problema da ressocialização do delinquente:
a prisão não ressocializa. As tentativas para eliminar as penas
privativas de liberdade continuam. A pretendida ressocialização deve
sofrer profunda revisão. (BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de
prisão, p. 132 apud GRECO, 2015, p. 339)

Na teoria absolutista, a pena é, simplesmente, uma resposta ao crime. Na


teoria relativa, na pena, existe a preocupação de evitar que outras
infrações penais sejam cometidas, buscando-se, entre outros objetivos, a
ressocialização do criminoso. Na teoria mista, existe uma fusão das
teorias absoluta e relativa, onde a pena passa a ter a função de
retribuição ao ato cometido, mas igualmente a função de recuperar o
criminoso. Esta teoria é a adotada pelo sistema penal brasileiro,
consoante o caput do artigo 59 do Código Penal, pelo menos na teoria,
pois, quando se analisa toda a estrutura do sistema penal brasileiro,
observa-se que a finalidade deste ramo do direito, na prática, é a
punição, a retribuição ao infrator pelo ato cometido. Quando se estipula
previamente o quantum da pena imposta e utiliza-se a pena restritiva de
liberdade como base de todo o sistema, observa-se a irrelevância da
individualização das reais necessidades do indivíduo para sua
reabilitação diante da vida. Sobre este tema, Rogério Greco discorre:

Roeder defendia que a pena não podia ter um tempo determinado, já que
servia para corrigir aquele que praticou a infração penal, e devia durar
o tempo que fosse necessário para isso. Cessada a necessidade,
consequentemente, deveria cessar também o cumprimento da pena. [...]
Pedro Garcia Dorado Monteiro [...] Dizia que [...] a pena não deve ser
retributiva, senão corretiva da vontade criminosa, tomando-se como base
um estudo psicológico e não por fundamento o delito, devendo servir a
pena, outrossim, para impedir a prática de futuros crimes.(GRECO, 2016,
p. 58)

Sendo a teoria mista adotada pela legislação penal brasileira, ao


analisar o atual sistema penitenciário, que tem a função de colocar esta
teoria em prática, encontra-se com um sério problema: as condições das
instituições penais, destinadas ao cumprimento das penas impostas ao
infrator. O que se observa é o tratamento desumano recebido pelos
internos, num absoluto descaso pela dignidade da pessoa humana.

Segundo o “Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias INFOPEN –


Dezembro 2014” (Disponível em ), o sistema prisional brasileiro tem uma
população prisional de 622.202 presos, para um total de 371.884 vagas,
gerando um déficit de 250.318 vagas, demonstrando a questão da
superlotação nos institutos prisionais. Ainda segundo o levantamento, 55
% dos detentos possuem entre 18 e 29 anos, 61,6 % são negros e 75,08 %
possuem até o Ensino Fundamental Completo.

O relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU), Juan E.


Méndez, especialista independente sobre Direitos Humanos, após ter
visitado locais de detenção no Brasil em 2015, divulgou um relatório, em
29 de janeiro de 2016 (disponível em ), no qual denuncia a prática de
tortura e maus-tratos e descreve a situação que encontrou como “cruel,
desumana e degradante, devido à grave superlotação”.

De acordo com reportagem do site G1, Méndez,

afirma no relatório que ouviu diversos relatos de prisioneiros que


apontam para o uso frequente de tortura e maus-tratos no Brasil. As
práticas são aplicadas no momento da detenção e em interrogatórios, pela
polícia, e no tratamento nas prisões, pelos agentes penitenciários, que
raramente são levados à Justiça. Os métodos mais frequentes incluem,
segundo Méndez, chutes, tapas, sufocamento, choques elétricos, uso de
sprays de pimenta, de gás lacrimogêneo, bombas de ruído e balas de
borracha, além de abuso verbal e ameaças. As práticas, segundo notou o
especialista, estão arraigadas de tal maneira que parecem “neutralizadas”
e os detentos as mencionam apenas quando perguntados. Méndez cita que a
superlotação nas prisões é agravada pelas más condições sanitárias e o
ambiente de violência. E observa que a relação entre agentes
penitenciários e prisioneiros em muitos estados chega a ser de 2 para
490, quando deveria ser de 1 para 5. Uma das conclusões é que as mortes
por policiais e agentes penitenciários não são casos isolados e que os
mais afetados são minorias, como negros. Méndez afirma no relatório que
os afrodescendentes correm risco maior de detenção, abuso policial e
tortura, além de receberem penas maiores para os mesmos crimes do que
detentos brancos e sofrer discriminação na prisão. Isso sugere, segundo
Méndez, um alto grau de racismo institucionalizado. (Disponível em <>)

Rogério Greco, ao abordar o tema da dignidade da pessoa humana e os


presídios relata:

O Estado deixa de observar o principio da dignidade da pessoa humana seja


fazendo, ou mesmo deixando de fazer algo para preservá-la. O sistema
carcerário, nosso tema principal, é um exemplo clássico desse raciocínio.
Veja-se o que ocorre, em inúmeras penitenciárias brasileiras, onde presos
são espancados por seus próprios companheiros de cela e o Estado
(representado, ali, por seus agentes públicos), que deveria protegê-los,
nada faz para evitar esse espancamento, pois, no fundo, aprova que os
presos se agridam, ou mesmo que causem a morte uns dos outros. Não é
incomum que funcionários públicos, que deveriam manter a ordem, a
disciplina e a legalidade dos comportamentos no interior do sistema
prisional, pratiquem toda a sorte de crimes contra aqueles que por eles
deveriam ser protegidos. São incontáveis os casos de estupros de presas,
de espancamento por pura diversão, ou mesmo a fim de se obter uma
confissão, de subtração de bens dos presos. (GRECO, 2015, p. 68/69)

Analisando a influencia da mídia sobre a sociedade na questão da


dignidade da pessoa humana em relação aos presos, Rogério Greco disserta
que,

A mídia pode, hoje, ser considerada o quarto Poder, posicionando-se ao


lado do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. [...] Muitos programas
se especializaram no tema criminalidade. [...] Apregoam que o sistema é
demasiado brando com aqueles que praticam uma infração penal e, por isso,
pugnam por uma punição mais severa dos criminosos. A mídia, como afirma
Giovane Santin44, em virtude de suas rotineiras intervenções, conjugadas
com suas distorções da realidade, tem produzido uma evidente mudança
comportamental nos cidadãos, que pretendem fazer da lei penal a salvação
da sociedade contra os criminosos. [...] A sociedade, atemorizada pelos
fatos expostos pelos meios de comunicação em massa, passou a concordar
com as conclusões da mídia e a solicitar também uma resposta rápida, por
parte do Estado, no que diz respeito ao aumento da criminalidade. Os
direitos dos presos passaram a ser tratados com repúdio. [...] Dessa
maneira, a mídia se encarregou de fazer que a expressão direitos humanos
fosse vista com desprezo pela sociedade, que, no fundo, alegra-se quando
alguém que praticou uma infração penal é preso e sofre, ilegalmente, no
cárcere. (GRECO, 2015, p. 72/73)

Quanto às consequência do tratamento desumano ao preso no sistema


prisional para a própria sociedade, Rogério Greco adverte que,

Nas penitenciárias que não atendem às regras mínimas para tratamento do


recluso, o retorno do preso é carregado de traumas, de revoltas, o que
resulta em índices de reincidências extremamente elevados, uma vez que o
sistema não consegue cumprir com sua função ressocializadora, mas, ao
invés, acaba destruindo a personalidade do preso. Não é incomum que,
dependendo do tempo de pena que tenha cumprido, ao final, quando as
portas de sua cela serão abertas, permitindo o seu retorno à sociedade, a
personalidade do egresso esteja completamente destruída. Sairá, muitas
vezes, pior do que entrou, e a sociedade terá que conviver com mais esse
problema. (GRECO, 2015, p. 161)

A Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, em seu artigo


5º, inciso II, prescreve que “ninguém será submetido à tortura nem a
tratamento desumano ou degradante”, porém, a realidade vivenciada nas
instituições prisionais brasileiras está muito distante deste preceito
constitucional. Segundo o Relatório do Sistema Prisional Brasileiro45,
elaborado pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos
Deputados em 2006, dentre os problemas encontrados nas instituições
prisionais de nosso país, destacam-se: Má Qualidade da Água e Comida
Servida aos Presos; Superlotação; Ociosidade dos Presos; Falta de
Assistência Médica para muitos presos doentes; Precariedade das Condições
Sanitárias e de Higiene; Falta de Revisão nos Processos Criminais;
Tortura e Espancamento.

A sociedade humana ainda vivencia os preceitos da Lei Mosaica, do “olho


por olho, dente por dente”, assim expressa (ALMEIDA, 2008, p. 174/175):
“Quem matar alguém será morto. Se alguém causar defeito em seu próximo,
como ele fez, assim será feito: fratura por fratura, olho por olho, dente
por dente”; e, na maioria das vezes, vai além, imputando ao infrator uma
penalidade proporcionalmente maior às consequências do crime praticado,
principalmente quando se leva em conta as condições das instituições
penais. Giuseppe Bettiol alerta:

Se é verdade que o Direito Penal começa onde o terror acaba, é igualmente


verdade que o reino do terror não é apenas aquele em que falta uma lei e
impera o arbítrio, mas é também aquele onde a lei ultrapassa os limites
da proporção, na intenção de deter as mãos do delinquente. (BETTIOL, 1967
apud BITENCOURT, 2009, p. 107)
A ineficiência da atual filosofia penal e do atual sistema vigente é
visível a toda a sociedade e comprovada através de pesquisas de campo:

“Por todos os criminosos atrás das grades não é a solução; em geral é a


causa do aumento da violência”, diz Azevedo. O argumento, embora
controverso, tem sustentação. Um estudo coordenado pela jurista Ela
Wiecko, da Universidade de Brasília, constatou que o índice de
reincidência entre os condenados a pena de prisão (53,1 %) é maior que o
dobro da média verificada entre réus que cumprem penas alternativas.
(http://cienciahoje.uol.com.br/noticias/2011/08/cadeia-para-quem-precisa)

O então Ministro do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de


Justiça, Cézar Peluso, declarou que “a taxa de reincidência no nosso país
chaga a 70%. Isso quer dizer que sete em cada dez libertados voltam ao
crime. É um dos maiores índices do mundo”.46 Bitencourt disserta:

Os altos índices de reincidência tem sido, historicamente, invocados como


um dos fatores principais da comprovação do efetivo fracasso da pena
privativa de liberdade. Apesar da deficiência dos dados estatísticos, é
inquestionável que a delinquência não diminuiu em toda a América Latina e
que o sistema penitenciário tradicional não consegue reabilitar ninguém.
A prisão, em vez de conter a delinquência, tem lhe servido de estímulo,
convertendo-se em um instrumento que oportuniza toda espécie de
desumanidades. Não traz nenhum benefício ao apenado; ao contrário,
possibilita toda a sorte de vícios e degradações. A literatura
especializada é rica em exemplos dos efeitos criminógenos da prisão.
Enfim, a maioria dos fatores que dominam a vida carcerária imprimem a
esta um caráter criminógeno, de sorte que, em qualquer prisão clássica,
as condições materiais e humanas podem exercer efeitos nefastos na
personalidade dos reclusos. Mas apesar dessas condições altamente
criminológenas das prisões clássicas, tem-se procurado, ao longo do
tempo, atribuir ao condenado, exclusivamente, a culpa pela eventual
reincidência, ignorando-se que é impossível alguém ingressar no sistema
penitenciário e não sair de lá pior do que entrou. (BITENCOURT, 2009, p.
111)

Nesta mesma linha de raciocínio, o então Procurador de Justiça em Minas


Gerais, Tomáz de Aquino Resende, adverte que,

O maior de todos os problemas que o Estado enfrenta com a questão da


execução penal é a do retorno do condenado ao convívio social [...] É
que, no caso brasileiro, por exemplo, mais do que 70% dos egressos do
sistema convencional reincidem no crime. E pior, a maioria comete crime
mais grave do que aquele que o levou ao encarceramento anterior. (SILVA,
2011, p. 194)

Os professores e Mestres em Ciências Penais pela UFMG, Antônio de Padova


Marchi Júnior e Franklin Higino Caldeira Filho, advertem:

Ocorrido o crime, a sociedade deseja e espera a aplicação de severa


punição, consequência prevista em razão da realização do tipo penal.
Todavia, acaba por assistir, omissivamente, às ações improdutivas do
Estado que deixa impune o infrator e, quando chega a puni-lo, ou o faz
indevidamente pela aplicação inadequada dos instrumentos sancionatórios
clássicos, ou peca pela resistência em empregar mecanismos punitivos
avançados já incorporados ao ordenamento jurídico pátrio e previstos em
legislações penais modernas. O Estado simplesmente ainda não conseguiu
equacionar de modo satisfatório o binômio punição/recuperação,
evidenciando esse fato tanto aos olhos da comunidade quanto aos do
infrator. O pior é que o cárcere, ao que parece, provoca um efeito
reverso, potencializando o ímpeto criminoso dos internos, já que ninguém
se sensibiliza com as condições de saúde deploráveis, com a superlotação
das celas, com a ausência de atividades intelectuais, laborativas e
religiosas e, principalmente, com a absurda submissão às facções
criminosas que controlam os presídios através da violência. (SILVA, 2011,
p. 173/174)

Na Exposição de Motivos da Nova Parte Geral do Código Penal47, item 27, o


então Ministro da Justiça, Ibrahim Abi-Ackel, dissertou:

As críticas que em todos os países têm se feito à pena privativa de


liberdade fundamenta-se em fatos de crescente importância social, tais
como o tipo de tratamento penal frequentemente inadequado e quase sempre
pernicioso, a inutilidade dos métodos até agora empregados no tratamento
de delinquentes habituais e multirreincidentes, os elevados custos da
construção e manutenção dos estabelecimentos penais, as consequências
maléficas para os infratores primários, ocasionais ou responsáveis por
delitos de pequena significação, sujeitos, na intimidade do cárcere, a
sevícias, corrupção e perda paulatina da aptidão para o trabalho.

Quanto à eficácia do sistema prisional na recuperação do infrator, o


Doutor em Educação Haroldo de Rezende, em artigo, publicado na revista
“Cadernos de História da Educação”, da Universidade Federal de
Uberlândia/MG, disserta:

Dentre as críticas dirigidas ao funcionamento da prisão, já em seu


surgimento, figura tanto a formação da delinquência, uma vez que a
própria prisão possibilita um entrosamento entre os presos que favorece a
organização e a cumplicidade entre eles, como também, a fabricação de
delinquentes, pelo tipo de vida que faz os indivíduos levarem. Desde o
surgimento, constata-se que a prisão, ao invés de transformar os
criminosos em gente honesta (Foucalt, 1992a, p. 131), apenas fabrica
novos criminosos ou os “aperfeiçoa” ainda mais na criminalidade. Talvez
sejam o cinismo, a estranheza, o enigma e a ambiguidade, que acompanham a
prisão desde o seu surgimento, o que confere às práticas penais em nossa
sociedade, ainda hoje, uma aura de evidencia, naturalidade e necessidade
insubstituível. (RESENDE, 2010, p. 79/85)

No mesmo trabalho, Haroldo realizou uma pesquisa48com presos condenados,


sendo abordado o tema sobre a eficácia do sistema carcerário:

Hoje, se eu estivesse com planos de praticar novos crimes, eu saberia por


onde começar, porque eles aí explicam um para o outro, até dão aula um
para o outro, explicando como é que se faz, como se planeja sequestro,
por exemplo (Depoimento de Mateus da Silva); Na realidade, a cadeia não
recupera, o sistema carcerário é falido! E a cadeia é uma faculdade, não
é nem uma escola, é uma faculdade do crime. (Depoimento de Tiago da
Silva); Você pensa que sai daqui recuperado, mas não! Você entra aqui
roubando galinha e sai assaltante de banco (...) aqui é uma escola da
malandragem (Depoimento de Maria da Silva); Você tem que se conscientizar
que ficar atrás de uma grade 12, 15 anos, não vai se recuperar. Não
adianta a pessoa pensar assim, a sociedade pensar assim: ”Quanto mais
tempo ficar, melhor ele vai ficar”. Não! Porque não é fácil conviver
atrás de uma grade em 10, 12 metros de espaço com 6, 7 pessoas. Você tem
duas horas de sol. Não tem ocupação nenhuma, não tem serviço, não tem
nada, não tem confiança. Então, fica difícil. A pessoa que tem muita
cadeia é mais vigiada, vive dentro da tranca e vai se tornando um
criminoso pior porque vai ficar ali muito tempo. Quando ele sair, vai
pensar: “Ah, eu vou me recuperar do crime porque? Não compensa para mim!
Eu fiquei esse tempo todo preso, não tenho mais chance na sociedade, sou
um ex-presidiário e vou aprontar!” É por isso que muitos voltam para o
crime. Se o cara tem muita cadeia, deu cinco, seis meses que ele está
ali, então, arruma um serviço para essa pessoa, arruma uma coisa para
fazer, alguma ocupação, mas não. Eles chegam com palito...isso para mim é
história, palito de picolé, linha para você ficar dentro de uma cela,
enquadrado, trabalhando com aquilo o dia inteiro, vendo aquelas quatro
paredes te segurando. Está certo que você cometeu um crime, mas se é para
recuperar...A cadeia não é para castigar, é para reintegrar a pessoa. Não
é recuperar? Porque se for para castigar, tudo bem, mas não é para
castigar, é para educar o cara de novo. Então, eu acho que tinha que ter
uma oportunidade, se ele está aqui, ele tem que ter uma oportunidade para
provar. Por exemplo, eu roubei você, você não quer me castigar – pelo que
a justiça quer dizer, não quer castigar – você quer que eu me recupere
para não te roubar amanhã de novo. Agora, do jeito que eles estão
fazendo, minha cabeça vai ficar voltada para aquele cara que me pôs na
cadeia. Eu vou sair, vou roubar dele de novo e ainda vou mata-lo. Então,
quer dizer, eu vou é aumentar o meu crime. O preso precisa se reintegrar
à sociedade pelo serviço, fora de uma cela, porque dentro de uma cela,
brincando com cordão ou palito não vai. Quando ele sair, lá fora ele não
vai fazer um artesanato de palito para vender... (Depoimento de Barnabé
da Silva) – (RESENDE, 2010, p. 83, 84, 90, 91).

O professor Alessandro Baratta, em sua obra Criminologia Crítica e


Crítica do Direito Penal, aborda o tema sobre as prisões, dissertando:

O cárcere é contrário a todo moderno ideal educativo, porque este promove


a individualidade, o autorrespeito do indivíduo, alimentado pelo respeito
que o educador tem dele. As cerimônias de degradação no início da
detenção, com as quais o encarcerado é despojado até dos símbolos
exteriores da própria autonomia (vestuário e objetos pessoais), são o
oposto de tudo isso. A educação promove o sentimento de liberdade e de
espontaneidade do indivíduo: a vida no cárcere, como universo
disciplinar, tem um caráter repressivo e uniformizante. Exames clínicos
realizados com os clássicos testes de personalidade mostraram os efeitos
negativos do encarceramento sobre a psique dos condenados e a correlação
destes efeitos com a duração daquele. A conclusão a que chegam estudos
deste gênero é que “a possibilidade de transformar um delinquente
antissocial violento em um indivíduo adaptável, mediante uma longa pena
carcerária, não parece existir” e que “o instituto da pena não pode
realizar a sua finalidade como instituto de educação.”49 (BARATTA, 2011,
p. 183/184)
Analisando o tema sobre a ineficácia dos estabelecimentos criminais,
disserta Hungria:

“Os estabelecimentos da atualidade não passam de monumentos de estupidez.


Para reajustar homens à vida social invertem os processos lógicos de
socialização; impõem silêncio ao único animal que fala; obrigam a regras
que eliminam qualquer esforço de reconstrução moral para a vida livre do
amanhã, induzem a um passivismo hipócrita pelo medo do castigo
disciplinar, ao invés de remodelar caracteres ao influxo de nobres e
elevados motivos; aviltam e desfibram, ao invés de incutirem o espírito
de hombridade, o sentimento de amor-próprio; pretendem, paradoxalmente,
preparar para a liberdade mediante um sistema de cativeiro.” (HUNGRIA
apud MUAKAD, 1998, p. 21)

Com relação à cultura do encarceramento massivo, André Barrocal disserta:

A cultura do medo disseminada pelos meios de comunicação é só um dos


obstáculos ao debate do encarceramento massivo. E não só no Brasil.
Ministro da Corte Suprema da Argentina e vice-presidente da Associação
Internacional de Direito Penal, Eugenio Raúl Zaffaroni acredita que o
mundo moderno no fundo gosta da situação. As sociedades atuais são
excludentes e precisam se livrar dos indesejados. Sistema prisional que
não recupera ninguém e parece um matadouro ou uma universidade do crime
seria o bueiro perfeito. As elites políticas e econômicas não sujam as
mãos. “Quanto mais se matem os pobres, melhor. Esse é o programa das
sociedades excludentes”, resume Zaffaroni. (Disponível em )

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), em estudo divulgado em


2015, intitulado "Violência e segurança pública em 2023: cenários
exploratórios e planejamento prospectivo”, relata falhas nos processos
utilizados pela sociedade no combate à criminalidade e aponta que o
Brasil deve continuar tendo altas taxas de violência. Segundo reportagem
no portal G1,

Até 2023, a tendência é que o Brasil continue tendo altas taxas de


violência, acompanhada do endurecimento da legislação penal, do aumento
da população carcerária e do monitoramento eletrônico, da expansão do
tráfico e da manutenção da política antidrogas atual. A criminalidade no
interior do país também deverá continuar crescendo, assim como a ação de
organizações e facções criminosas no Brasil. O cenário fictício de
violência endêmica é marcado por retrocesso, com a piora da situação de
desigualdade social, desemprego e evasão escolar. Os investimentos em
medidas socioeducativas e de execução penal diminuem e as condições das
prisões e dos centros de internação se deterioram. O trabalho policial
também é afetado negativamente e a relação entre as polícias e a
sociedade piora. Resultado: violência endêmica.
(http://oglobo.globo.com/brasil/violencia-seguira-em-alta-futuro-incerto-
diz-estudo-do-ipea-para-2023-18116789)

Analisando os dados e textos acima, conclui-se da urgente necessidade de


modificação na filosofia e no sistema penal ora vigente em nossa
sociedade. O Sistema Penal atual deve urgentemente ser repensado. De uma
filosofia punitiva baseada na vingança, deve-se edificar uma nova
filosofia, a filosofia da educação moral50 do indivíduo, consoante os
dizeres de Gustav Radbruch (RADBRUCH, 1963 apud BARATTA, 2011, p. 207):
“a melhor reforma do direito penal seria a de substituí-lo, não por um
direito penal melhor, mas por qualquer coisa melhor que o direito penal”.

4.2.1. Direito Penal


O Código Penal brasileiro, Decreto-lei 2.848 de 7 de dezembro de 1940,
institui a base do direito penal brasileiro na atualidade, direito este
que na conceituação de Guilherme de Souza Nucci, “é o corpo de normas
jurídicas voltado à fixação dos limites do poder punitivo do Estado,
instituindo infrações penais e as sanções correspondentes, bem como
regras atinentes à sua aplicação.”(NUCCI, 2014, p. 5). Ressalte-se que o
termo penal nos remete a pena, que segundo o dicionário Houaiss significa
a sanção aplicada como punição ou como reparação por uma ação julgada
repreensível; castigo, condenação, penitência, sofrimento; aflição
(HOUAISS, 2009, p.1464).

Importantes dispositivos legais, que ressaltam uma forte característica


do Código Penal, são seus artigos 14 e 17, onde se trata do Crime Tentado
e do Crime Impossível. No artigo 14, inciso II do referido diploma legal,
trata-se da Tentativa, sendo definido o crime tentado quando “iniciada a
execução, não se consuma por circunstancias alheias à vontade do agente”,
onde há uma diminuição na aplicação da pena, em relação ao quantum
estipulado ao crime em questão quando consumado. Nucci, disserta sobre as
teorias fundamentadoras da punição da tentativa, dentre elas a subjetiva
e objetiva:

a) subjetiva (voluntária ou monista): leva em consideração, para


justificar a punição da tentativa, fundamentalmente, a vontade criminosa,
desde que nítida, podendo ela estar presente e identificada tanto na
preparação quanto na execução. Leva-se em conta apenas o desvalor da
ação, não importando, para a punição, o desvalor do resultado. Nesse
caso, inicia-se a possibilidade de punir a partir do momento em que o
agente ingressa na fase da preparação. Como o objetivo é punir aquele que
manifesta vontade contrária ao direito, nem sempre deve o juiz atenuar a
pena; b) objetiva (realística ou dualista): o objetivo da punição da
tentativa volta-se ao perigo efetivo que o bem jurídico corre, o que
somente se configura quando os atos executórios, de caráter unívoco, têm
início, com idoneidade, para atingi-lo. É a teoria adotada pelo art. 14,
II, do Código Penal brasileiro. Leva-se em consideração tanto o desvalor
da ação quanto o desvalor do resultado. A redução da pena torna-se,
então, obrigatória, uma vez que somente se poderia aplicar a pena igual à
que seria cabível ao delito consumado se o bem jurídico se perdesse por
completo – o que não ocorre na tentativa. (NUCCI, 2014, p. 161)

Conclui-se deste dispositivo legal, que a preocupação primordial do


Estado é com o objeto jurídico protegido. Se não há efeito danoso para a
vítima, a pena do agente que efetuou a tentativa deve ser diminuída com
relação a pena aplicada ao crime consumado. Resulta isso o pensamento de
que o crime em si é mais importante para o Estado que o indivíduo em si,
que ao tentar uma ação criminosa contra outro indivíduo, se mostra, tanto
quanto o agente que chega ao estágio de consumação do crime, necessitado
de se submeter a um processo de reeducação moral. É a filosofia de
combater o crime em si e não as causas da criminalidade, o impulso
inicial, resultante da deficiência moral do indivíduo. É a teoria de
combater o efeito e não as causas.

No artigo 17, que trata do Crime Impossível, tem-se: “Não se pune a


tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta
impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime”. A legislação
leva em conta o resultado e não a ação para que haja punição. Se os meios
utilizados não possuem condições de gerar nenhum resultado danoso, não há
que se falar em punição. Sobre o tema discorre Nucci:

[...] adota-se, no Brasil, a teoria objetiva, vale dizer, leva-se em


conta, para punir a tentativa, o risco objetivo que o bem jurídico corre.
No caso da tentativa inidônea, o bem jurídico não sofreu risco algum,
seja porque o meio é totalmente ineficaz, seja porque o objeto é
inteiramente impróprio. Daí por que não há punição. (NUCCI, 2014, p. 185)

Conclui-se deste dispositivo legal, que há uma preocupação do Estado em


punir quem provocou dano ou teria condições de provocá-lo, e que não há
uma preocupação do Estado com o agente, que possui um ímpeto criminoso,
que precisa ser tratado, e que só não logrou êxito pela ineficácia dos
meios. Este dispositivo legal é resultado da mentalidade da punição como
fim em si mesma, e não da educação, com vistas à modificação moral do
agente.

No artigo 27 disserta sobre a maioridade penal do indivíduo, que se


inicia aos dezoito anos completos, consoante com o artigo 228 da
CRFB/1988, que estipula como penalmente inimputáveis os menores de
dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial. Sobre a
menoridade, disserta Nucci:

Menoridade: trata-se da adoção, nesse contexto, do critério puramente


biológico, isto é, a lei penal criou uma presunção absoluta de que o
menor de 18 anos, em face do desenvolvimento mental incompleto, não tem
condições de compreender o caráter ilícito do que faz ou capacidade de
determinar-se de acordo com esse entendimento. (NUCCI, 2014, p. 282)

Se existisse um sistema que realmente recuperasse o indivíduo, que


mantivesse uma estrutura apta a trabalhar separadamente, cada indivíduo
no desenvolvimento físico-psicológico em que se encontra, não
necessitaria de estipular maioridade penal, pois, independente da idade
do agente que infringiu o ordenamento jurídico, haveria uma instituição
apta para tratá-lo e recuperá-lo, seja sob o regime fechado ou aberto. Se
o jovem, o adolescente ou mesmo a criança cometem um ato prejudicial a
outro ser humano e tipificado como crime, é porque a educação moral no
lar não existiu, ou se existiu, não conseguiu obter êxito, e independente
da capacidade do menor de compreender o caráter ilícito do fato que
cometeu, cabe ao Estado e a sociedade como um todo, propiciar um processo
educacional, compatível com a idade do infrator, que lhe permita um
desenvolvimento do senso de moralidade, num trabalho conjunto com o
infrator e com seus familiares.

No artigo 32 do referido diploma legal, encontra-se o rol das espécies de


pena aplicadas ao criminoso, sendo elas as penas privativas de liberdade,
as restritivas de direito e a pena de multa. Nucci discorre sobre a pena
e suas características, conceituando-a como sendo:

[...] a sanção imposta pelo Estado, por meio de ação penal, ao criminoso
como retribuição ao delito perpetrado e prevenção a novos crimes. O
caráter preventivo da pena desdobra-se em dois aspectos (geral e
especial), que se subdividem (positivo e negativo): a) geral negativo:
significando o poder intimidativo que ela representa a toda a sociedade,
destinatária da norma penal; b) geral positivo: demonstrando e
reafirmando a existência e eficiência do direito penal; c) especial
negativo: significando a intimidação ao autor do delito para que não
torne a agir do mesmo modo, recolhendo-o ao cárcere, quando necessário;
d) especial positivo: que é proposta de ressocialização do condenado,
para que volte ao convívio social quando finalizada a pena ou quando, por
benefícios, a liberdade seja antecipada. Conforme o atual sistema
normativo brasileiro, a pena não deixa de possuir todas as
características em sentido amplo (castigo + intimidação e reafirmação do
direito penal + ressocialização). (NUCCI, 2014, p. 309)

Conforme discorre Nucci, as funções da pena seriam o castigo, intimidação


e reafirmação do direito penal, tendo estas três características um viés
ameaçador da pena, sendo a última característica, a ressocialização.
Porém, como a ressocialização vem se mostrando pouco eficaz, o que sobra
é o caráter ameaçador da pena, o que não contribui eficazmente para a
diminuição da criminalidade. De uma forma geral, o que se verifica é o
claro objetivo de punição do criminoso e não a preocupação em auxilia-lo
a rever valores ante o convívio social. Neste contexto, em relação às
penas privativas de liberdade, o que se constata é que se mostram como
uma forma de ameaça de cercear o indivíduo de um dos bens mais preciosos,
a liberdade, como mecanismo de intimidá-lo ante a prática do crime. É a
cultura da frágil “educação pelo medo”.

O artigo 43 do referido diploma legal, elenca as penas restritivas de


direito, alternativas à pena de privação de liberdade, desde que
atendidos os requisitos dos artigos 44 ao 48 do referido diploma legal,
sendo elas: prestação pecuniária; perda de bens e valores; prestação de
serviço à comunidade ou a entidades públicas; interdição temporária de
direitos e limitação de fins de semana. Guilherme Nucci assim define as
penas restritivas de direito:

[...] são penas alternativas às privativas de liberdade, expressamente


previstas em lei, tendo por fim evitar o encarceramento de determinados
criminosos, autores de infrações penais consideradas mais leves,
promovendo-lhes a recuperação através de restrições a certos direitos.
(NUCCI, 2014, p. 379)

Conceito de prestação pecuniária: consiste no pagamento em dinheiro feito


à vítima e seus dependentes ou a entidade pública ou privada, com
destinação social, de uma importância fixada pelo juiz, não inferior a um
salário mínimo nem superior a 360 salários mínimos. Possui, dentre
outras, a finalidade de antecipar a reparação do dano causado pelo crime
à vitima. (NUCCI, 2014, p. 380)
Conceito de perda de bens e valores: trata-se da perda, em favor do Fundo
Penitenciário Nacional, de bens e valores adquiridos licitamente pelo
condenado, integrantes do seu patrimônio, tendo como teto o montante do
prejuízo causado ou o proveito obtido pelo agente ou terceiro com a
prática do crime, o que for maior. (NUCCI, 2014, p. 381)

Conceito da prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas: é


a atribuição de tarefas gratuitas ao condenado junto a entidades
assistenciais, hospitais, orfanatos e outros estabelecimentos similares,
em programas comunitários ou estatais. Trata-se, em nosso entender, da
melhor sanção penal substitutiva da pena privativa de liberdade, pois
obriga o autor de crime a reparar o dano causado através do seu trabalho,
reeducando-se, enquanto cumpre pena. (NUCCI, 2014, p. 381)

Conceito de interdição temporária de direitos: é a autentica pena


restritiva de direitos, pois tem por finalidade impedir o exercício de
determinada função ou atividade por um período determinado, como forma de
punir o agente de crime relacionado à referida função ou atividade
proibida. (NUCCI, 2014, p. 381)

Conceito de limitação de fim de semana: trata-se do estabelecimento da


obrigação do condenado de permanecer, aos sábados e domingos, por cinco
horas diárias, em Casa do Albergado ou lugar adequado, a fim de
participar de cursos e ouvir palestras, bem como desenvolver atividades
educativas. (NUCCI, 2014, p. 381/382)

As medidas restritivas de direito visam de forma geral à punição e a


reparação do dano causado, impondo ao infrator sanções de restituição de
valores, indenização à vítima, prestação de serviço à comunidade e
interdição de direitos. Quanto à limitação de fim de semana, vislumbra-se
o passo inicial para uma nova metodologia na aplicação da pena, quais
sejam a ministração de cursos e palestras, desde que voltadas também para
a educação moral do indivíduo, abordando temas sobre convivência social,
ética e valores morais.

No capítulo III do título V da parte geral do referido diploma legal,


tem-se as regras de fixação da pena, com a pena base, as circunstancias
agravantes, atenuantes e o cálculo final, estabelecendo previamente o
tempo que o condenado deverá cumprir a pena, devendo ser considerados, a
posteriori, os requisitos de livramento condicional, constante no
capítulo V do título V da parte geral do referido diploma legal e
progressão de regime, constante nos artigos 112 ao 118 da Lei de Execução
Penal (7.210 de 1884). Em todos os casos, de fixação de pena, de
livramento condicional e progressão de regime, não é levado em
consideração a educação moral do indivíduo e seu progresso moral durante
o cumprimento da penalidade imposta pelo Estado. Quando se trata de
recuperar o criminoso, não pode existir tempo previamente estipulado,
pois, a condição única para a reintegração social do condenado deve ser
sua efetiva melhora moral, o que pode durar um tempo menor que o hoje
estipulado pela lei para determinado crime, como pode perdurar um tempo
superior ao estipulado pela lei para determinado crime.
Em relação às regras de aplicação da pena no direito penal e às regras
utilizadas pela justiça divina, observa-se nestas um referencial a ser
utilizado em futuras atualizações do direito penal:

A justiça humana não faz distinção de individualidades, quanto aos seres


que castiga; medindo o crime pelo próprio crime, fere indistintamente os
infratores, e a mesma pena atinge o paciente sem distinção de sexo,
qualquer que seja a sua educação. De modo diverso procede a justiça
divina, cujas punições correspondem ao progresso dos seres aos quais elas
são infligidas. Igualdade de crimes não importa, de fato, igualdade
individual. (KARDEC, 2008b, p. 391) [....] Tanto mais é culpado o homem,
quanto melhor sabe o que faz. (KARDEC, 2010a, p. 385)

Este texto demonstra a necessidade de se levar em consideração, ao se


aplicar a pena, os antecedentes sociais do indivíduo, pois o que
verifica-se no atual panorama social é a exclusão de muitos cidadãos à
direitos básicos de cidadania (escola de qualidade, saúde, emprego,
lazer), e quando os excluídos socialmente atingem os “incluídos”, passa-
se a segunda forma de exclusão: os presídios. O texto também diz respeito
ao artigo 21 do Código Penal brasileiro que adverte que “O
desconhecimento da lei é inescusável.” Porém questiona-se: Para o Estado
cobrar o conhecimento da Lei não deveria promover uma ampla divulgação?
Mas isso não acontece. Com raras exceções, somente os cidadãos que
possuem condições de cursar nível superior em direito possuem um
conhecimento relativamente profundo do direito brasileiro. O ordenamento
jurídico brasileiro hoje conta com uma vasta quantidade de crimes
tipificados, não somente no Código Penal brasileiro, mas também em várias
leis específicas. Com isso verifica-se a necessidade de inserir nos
currículos escolares a formação básica do direito, para aí sim poder
exigir que todos tenham o conhecimento da lei.

No título VIII do referido diploma legal, tem-se os casos de extinção da


punibilidade, que no conceito de Nucci,

[....] é o desaparecimento da pretensão punitiva ou executória do Estado,


em razão de específicos obstáculos previstos em lei, por razões de
política criminal. Inexiste fundamento de ordem técnica para justificar a
causa de extinção da punibilidade; todas decorrem de vontade política do
próprio Estado, por meio do Legislativo, de impedir a punição ao crime
que seria imposta pelo poder Judiciário. (NUCCI, 2014, p. 593)

Em vários casos de extinção da punibilidade, como prescrição, decadência,


não existe uma preocupação com a condição do agente, mas simplesmente com
o decurso do tempo. Mais uma vez, fica nítida a intenção do Estado
unicamente com a punição e não com a recuperação efetiva do indivíduo.

Por fim, conclui-se que em toda estrutura do Código Penal ressalta-se a


função penalizadora do instituto, com regras que em nenhum momento levam
em conta a situação moral do indivíduo e a necessidade de submetê-lo a
uma educação pautada em valores morais. Tem-se um instituto que se impõem
pela ameaça, o que reflete sua ineficácia e atraso diante da evolução
social. O medo não educa, o medo, no máximo, reprime até certo limite.
Sem educação moral do indivíduo não há garantia eficaz de que não haverá
infração ao ordenamento ora instituído.
4.2.2. Lei de Execução Penal (LEP)
O ordenamento jurídico brasileiro, no âmbito das execuções penal, é
regido pela Lei 7.210 de 1984, que determina, entre outros, direitos e
deveres dos condenados e a estrutura dos estabelecimentos penais. Com
relação à Lei de Execução Penal, disserta René Ariel:

“A experiência tem demonstrado ao longo dos anos que a execução penal é


um vasto espaço de terras devolutas, um quadro de naturezas mortas, um
arquipélago de dificuldades e um território sitiado pela violência,
quando não pela indiferença tradicional do Poder Público em relação ao
problema geral da insegurança coletiva e individual. A Lei de Execução
Penal é uma proposta de revisão e mudança de padrões e estruturas
anquilosadas e responsáveis pelo descrédito da execução e, por via de
consequência, do próprio magistério punitivo.” (DOTTI, René Ariel, A Lei
de Execução Penal - Perspectivas Fundamentais. Revista dos Tribunais
598/275 apud SILVA, 2011, p. 349)

A Lei de Execução foi um grande avanço na legislação criminal brasileira,


embora necessitando de algumas inovações. Se as regras já instituídas
pela LEP fossem realmente cumpridas, ter-se-ia um avanço enorme no
trabalho de recuperação do condenado.

Em seu artigo primeiro é exposto o objetivo do referido diploma legal,


que é efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal, bem como
proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e
do internado. Através de ações estipuladas pela referida lei, almeja-se o
objetivo de reintegrar condenado ou internado ao convívio social. Nos
artigos 10 ao 27 é descrito sobre a assistência ao preso, que possui o
objetivo de prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em
sociedade. A assistência ao preso será: material, à saúde, jurídica,
educacional, social e religiosa. Considerando que a assistência ao preso
é devidamente realizada, o que na realidade não acontece na grande
maioria das instituições penais brasileiras, ainda assim, no campo da
assistência educacional encontra-se uma falha. Em seus artigos dezessete
ao vinte e um, o referido diploma legal, trata da Assistência Educacional
ao condenado. Observa-se uma preocupação exclusiva com a educação
intelectual/profissional, olvidando-se da educação moral, única realmente
capaz de promover a recuperação efetiva do indivíduo, por trabalhar a
causa intrínseca da criminalidade.

Em seu artigo quarto, o referido diploma legal, estabelece que o Estado


deverá recorrer à cooperação da comunidade nas atividades de execução da
pena e da medida de segurança. Infelizmente, sociedade atual, por
questões religiosas e culturais, enxerga no criminoso um indivíduo que
errou/pecou e que deve ser condenado/punido. Essa cultura prejudica e
muito uma atuação mais efetiva da sociedade no auxilio à recuperação do
condenado. A mudança na mentalidade social é, em parte, responsabilidade
do Estado, que através do viés educacional, poderá, nas escolas e através
de meios de comunicação, promover uma alteração na visão do indivíduo com
relação ao condenado. Neste sentido, Bitencourt, analisando algumas
sugestões de Alessandro Barata para combater a delinquência, disserta:
É necessário que a questão criminal seja submetida a uma discussão
massiva no seio da sociedade e da classe obreira. Todos os segmentos
sociais devem conscientizar-se de que a criminalidade é problema de todos
e não será resolvido com o simples lema “Lei e Ordem”, que representa uma
política criminal repressiva e defensora intransigente da ordem
(geralmente injusta) estabelecida. Os meios de comunicação coletiva
exercem um papel importante, posto que apresentam a criminalidade como um
“perigoso inimigo” interior. Nessas condições, fica difícil que a opinião
pública possa abandonar a atitude predominantemente repressiva e
vingativa (além de estigmatizante) que tem a respeito do fenômeno
delitivo. É indispensável uma transformação radical da opinião pública e
da atitude dos cidadãos em relação ao delinquente se se pretende
oportunizar-lhe a possibilidade de ressocializar-se. (BITENCOURT, 2009,
p.123)

Quando se tem uma sociedade atuante nas instituições penais e na vida dos
condenados e internados, a vida do egresso mais facilmente se
reestrutura, pois ele encontrará o apoio da sociedade na qual está
inserido, o que atualmente não acontece.

O professor, Mestre e Doutor em Ciências Penais pela UFMG, Felipe Martins


Pinto disserta sobre a participação da comunidade no sistema prisional:

Quando os diversos seres humanos que cumprem pena privativa de liberdade


tentam denunciar as condições a que estão submetidos, eles são execrados
pela sociedade. Amaldiçoados por suas condutas, não raro os condenados em
cumprimento de pena obtêm, em resposta às súplicas por condições
decentes, discursos ultrajantes e de total repúdio, clichês assimilados
com grande naturalidade pelas pessoas em geral e reproduzidos de maneira
quase instintiva. E, por mais disparatado que possa parecer, a
tranquilidade e a qualidade de vida da sociedade como um todo estão
diretamente vinculadas às condições impostas aos diversos condenados e
presos provisórios. Parece um tanto ilógica a colocação formulada acima,
se cotejada com as ideias de vingança e revanchismo, maciçamente
reproduzidas na sociedade. No entanto, diante da previsão constitucional
do artigo 5º, XLVII, da Constituição da República de 1988, que veda a
prisão perpétua e a pena de morte, com exceção das hipóteses de guerra
declarada, afere-se que todos os ocupantes do cárcere potencialmente
retornarão ao convívio social e que o seu reingresso trará todas as
marcas colhidas no período em que estiveram cumprindo pena. Suas atitudes
fora do cárcere guardarão sintonia com as experiências e os sentimentos
experimentados, uma vez que o meio detém relevante papel na construção do
caráter do ser humano e consiste em um instrumento que tanto pode
resgatar um indivíduo socialmente desviado como corrompê-lo. Uma
estrutura carcerária opressora e aviltante contribui para a deformação do
ser humano e fomenta a sua revolta contra a sociedade, que acaba por
sofrer um efeito rebote de sua própria conduta, seja consubstanciada em
discursos vazios e panfletários de cega intensificação do rigor punitivo,
seja pela cômoda postura de pessoas que preferem se omitir sobre a
matéria. (SILVA, 2011, p. 21)

Dissertando sobre a visão social do criminoso, Alessando Baratta adverte:


Estas considerações se referem à relação geral entre cárcere e sociedade.
Antes de tudo, esta relação é uma relação de quem exclui (sociedade) e
quem é excluído (preso). Toda técnica pedagógica de reinserção do detido
choca contra a natureza mesma dessa relação de exclusão. Não se pode, ao
mesmo tempo, excluir e incluir. Antes de falar de educação e de
reinserção é necessário, portanto, fazer um exame dos sistemas de valores
e dos modelos de comportamento presentes na sociedade em que se quer
reinserir o preso. Um tal exame não pode senão levar à conclusão,
pensamos, de que a verdadeira reeducação deveria começar pela sociedade,
antes que pelo condenado51: antes de querer modificar os excluídos, é
preciso modificar a sociedade excludente, atingindo, assim, a raiz do
mecanismo de exclusão. (BARATTA, 2011, p. 186)

No artigo 61, o referido diploma legal estabelece os órgãos da execução


penal, que, entre outras atividades específicas, têm como tarefa o
acompanhamento e a fiscalização da execução penal. No rol dos órgãos
nota-se a ausência de um órgão para trabalhar o desenvolvimento moral do
condenado, composto de psicólogos, pedagogos e religiosos que teriam a
função de fiscalizar e acompanhar a ação do trabalho de recuperação moral
do condenado nos estabelecimentos prisionais e na situação do egresso,
auxiliando no que seja possível e promovendo a interação
sociedade/sistema prisional.

Nos demais dispositivos legais, alguns, embora relativamente eficazes em


determinados fatores da recuperação do indivíduo, esbarram na estrutura
deficitária do Sistema Prisional, que não atende às exigência legais
contidas no referido diploma legal. Há uma negligência, fruto da falta de
vontade por parte do poder público em promover a aplicação fática do
referido diploma legal. Falta assistência jurídica; falta assistência
educacional em todos os níveis; falta estrutura de segurança que garanta
que nenhum preso será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou
degradante, que garanta ao preso o respeito a integridade física e moral;
falta condições materiais dignas; falta respeito ao ser humano, o que
coloca o próprio Estado, e consequentemente a sociedade que ele
representa, no papel de “criminoso” e o criminoso no papel de “vítima.”

Conclui-se o raciocínio acima exposto com a lição de Mario Ottoboni:

É evidente que o zelo pelo correto cumprimento da pena não implica


somente exigir o respeito à dignidade do condenado como pessoa humana,
mas, acima de tudo, requer o empenho pelo trabalho de socialização, sem o
qual haverá apenas a punição do infrator, de pouco significado para a
sociedade e para o sentenciado. Não se legou ao Estado tão somente o
direito de punir, mas, prioritariamente, o dever de recuperar o
condenado, preparando-o convenientemente para voltar ao convívio social.
(OTTOBONI, 2001, p. 47 apud SILVA, 2011, p. 362)

4.2.3. APAC
A APAC (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados),

[...] constitui uma entidade civil de direito privado, sem fins


lucrativos, que adota, preferencialmente, o trabalho voluntário. Possui
estatuto próprio e tem suas ações coordenadas pelo juiz da Execução
Criminal da Comarca, com a colaboração do Ministério público e do
Conselho da Comunidade, conforme previsto em lei. O Poder Legislativo,
por meio da Lei 15.299/2004, reconheceu as APACs como entidades aptas a
firmar convenio com o Poder Executivo, que, por sua vez, passou a
destinar recursos para a construção e reforma dos estabelecimentos
prisionais administrados pelas APACs. (SILVA, 2011, p. 6, 7)

O advogado, escritor, fundador da APAC e inspirador de seu Método,


define--a como sendo “um método de valorização humana, portanto de
evangelização, para oferecer ao condenado condições de recuperar-se,
logrando, dessa forma, o propósito de proteger a sociedade e promover a
justiça” (OTTOBONI, 2004, p. 23 apud SILVA, 2011, p. 56).

O ex-governador de Estado de Minas Gerais, Antônio Augusto Junho


Anastasia, declarou que o método APAC se converte, hoje, em alternativa
concreta às disfuncionalidades de nosso sistema penal. (SILVA, 2011, p.
11) e prossegue:

Nessa toada encarta-se o “método apaqueano”: uma reforma avant la lettre.


Nos idos da década de 1970, alguns visionários, ainda poucos, no Estado
de São Paulo, deram os primeiros passos para consolidar um movimento
promissor: iniciava-se a história das APACs, que vieram a se converter em
um dos mais destacados mecanismos de restituição das penas privativas de
liberdade à sua essência: a ressocialização do apenado. Poder-se-ia
sintetizar o método apaqueano na possibilidade permanente de permitir ao
preso tornar-se sujeito ativo de sua recuperação. Ainda fragilizada por
sua recente implantação, as APACs acabaram por se disseminar no âmbito do
sistema prisional brasileiro, contribuindo sobremaneira para uma inflexão
positiva. A experiência da atuação das APACs, em Minas Gerais, é quiçá um
dos mais promissores avanços no âmbito do Direito Carcerário,
evidenciando a vocação do Estado para a inovação e para as parcerias dos
Poderes com a sociedade. A concatenação de esforços entre Poder
Judiciário, Poder Executivo e a Sociedade Civil organizada permitiu-nos
avançar na implementação desse modelo, que hoje se mostra como a grande
possibilidade para tornar a cadeia mais humana. A singeleza de suas
atividades contrasta com a nobreza e altivez de seus objetivos. As APACs
dão mostra concreta da viabilidade de um Direito Penal fundado em bases
humanistas, que saiba encontrar na compaixão o contrapeso da desforra; na
dignidade, a antítese da massificação; e no Direito, a expressão última
da centelha humana. (SILVA, 2011, p. 12, 13)

A APAC constitui uma evolução no sistema prisional, onde inicia-se um


processo mais humano e mais eficaz no tratamento ao condenado. Surge como
uma nova perspectiva ante o desolador quadro atual do sistema prisional
brasileiro. Como fundamento do método, Silvio Marques Neto, cita um
ensinamento do Professor Psiquiatra Forense Odon Ramos Maranhão, onde, em
resposta ao questionamento “qual é a causa do crime?”, disse que ao
examinar milhares de condenados no Sistema Penitenciário de São Paulo,
para a elaboração de laudos relativos à periculosidade, veio a concluir
que “a causa da criminalidade é a falta de amor paterno na fase da
formação da personalidade”. (SILVA, 2011, p. 30). E, na continuação de
sua exposição, Silvio Marques cita texto de Francesco Carnelutti, contido
na obra Instituições de Processo Penal (2. Ed., 1º vol.), do Professor
Hélio Tarnaghi, na qual o autor reproduz e comenta o discurso de
Carnelutti:
A solução do problema do crime e da pena, que não encontrou nos livros de
ciência, ele a vai achar (é Carnelutti quem o diz) no livro da fé. Quanto
ao problema do crime: Jesus, falando aos discípulos acerca do Juízo
Final, colocou os encarcerados ao lado dos doentes, dos desnudos, dos
peregrinos (sem pouso), dos sedentos, dos esfaimados (a passagem a que
Carnelutti se refere está em S. Mateus 25,34). Os encarcerados são
doentes, mas do espírito. O mal deles é como o dos sequiosos ou
esfomeados. Mas de que têm sede ou fome? Quanto à questão da pena: os
homens alcançarão o prêmio (a visão beatífica) por haver alimentado os
famintos, dessedentado os sedentos, hospedado os viajantes, vestido os
nus, visitado os enfermos, procurado os presos. Aí está, portanto, a
solução: ir até os encarcerados e, como S. Francisco (de Assis), descer
até eles, encará-los, beijá-los. É preciso dar-lhes amor. Nisso está o
segredo da vitória na luta contra o crime. (SILVA, 2011, p. 31)

Os advogados Mario Ottoboni e Valdeci Antônio Ferreira, dissertaram a


respeito do método da APAC:

Aos poucos, cuidadosamente, fomos definindo o Método APAC. A denominação


de recuperando, que demos ao preso que cumpre pena na APAC, foi outro
desafio para se chegar a um bom termo. O objetivo era enquadrá-lo dentro
da proposta básica de valorização humana, mediante uma enorme gama de
ações catalogadas como essenciais, tais como: alfabetização,
solidariedade entre os presidiários, bons costumes, participação em
cursos, educação, aulas de religião, formação de mão de obra
especializada, assistência à saúde, conscientização dos familiares sobre
a importância de interação com a APAC, etc. Recuperando seria o termo
correto, por ser abrangente, diferenciado, e por definir o que era nossa
pretensão de realizar, dentro do programa de valorização do ser humano.
(SILVA, 2011, p. 94, 95)

Outro ponto importante do método APAC é a participação da sociedade,


conforme disserta Mario Ottoboni e Valdeci Antônio Ferreira:

Qualquer trabalho objetivo de nossa proposta dificilmente atingirá o seu


desiderato se não for desenvolvido com o preso atrás das grades. A pena
deve ser executada como uma forma de diálogo do presidiário com a
sociedade, e isso só será possível com a presença da comunidade no
presídio, dando palestra de valorização humana, de conhecimentos gerais,
sobre a importância da família, com alfabetização, cursos bíblicos, tudo
enfim que desperte no recuperando a certeza de que ele não está sozinho,
que é útil, que poderá vencer e ser feliz. Somente quando o preso sente a
presença de alguém que lhe oferece uma amizade sincera, dessas que não
exigem compensações ou retornos, é que se inicia o processo de
desalojamento das coisas más armazenadas em seu interior, e a verdade
começa a assumir o seu lugar, restaurando, gradativamente, a
autoconfiança, revitalizando os seus próprios valores. Isso se chama
libertação interior. (SILVA, 2011, p. 97, 102)

O método APAC dá grande ênfase à questão religiosa, donde Mario Ottoboni


e Valdeci Antônio Ferreira dissertam que,
Portanto, dentro das APACs, deve haver um espaço para se cultivarem os
valores da religião, primando sempre pelo trabalho ecumênico, sem
proselitismo, levado a termo por uma equipe bem preparada, capaz de dar
testemunho de unidade. Ali, mais do que em qualquer outro lugar, a noção
do justo deve ser venerada. (SILVA, 2011, p. 104)

Os mesmos autores citam Nelson Hungria:

- Uma das causas primordiais, senão a causa única, do declínio da cultura


atual é a sua crescente incapacidade religiosa. - Um mundo social sem
religião, como o atual, é um mundo de incertezas, destituído de
entusiasmo, reduzido ao nível morto das conveniências individuais,
impregnado de insuportável tristeza. - Precisamos fazer de novo a
experiência de ‘Deus’. Não basta que dentro das colunas partidas da
inoperante civilização atual nos guiem os ‘gênios’. É preciso também que
surjam os ‘santos’.(SILVA, 2011, p. 104)

Conclui-se que o sistema APAC é um grande avanço social ante o crime,


recuperando, em nosso sistema prisional, a dignidade da pessoa humana e o
tratamento mais eficaz na recuperação do indivíduo.

5. POR UM NOVO SISTEMA PENAL, O SISTEMA EDUCACIONAL


Ao atentar-se a uma reflexão sobre um novo modelo como resposta ao crime
e à violência, deve-se levar em consideração um dos objetivos
fundamentais da República Federativa do Brasil, consoante o artigo
terceiro da Carta Magna, “Constituem objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil: IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de
origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação.”

Promover o bem de todos, inclusive do criminoso, visando sua melhoria


moral e sua inserção à sociedade, deve ser o norteador desse novo modelo
a que se vislumbra desenvolver. O modelo atual, baseado na penalidade, ao
invés de promover o bem do indivíduo, provoca-lhe males, muitas vezes
irreversíveis, sendo contrário à própria Constituição.

Busca-se um novo modelo para uma nova sociedade. Não é mais possível
continuar com o atual modelo vigente que denigre, humilha e expõe o
indivíduo a condições sub-humanas de existência. A sociedade chegou a um
ponto crucial de sua jornada. Este é o momento de efetuar mudanças
drásticas e eficazes com vistas à edificação de uma nova sociedade, que
corresponda aos anseios da Carta Magna e propicie o bem de todos, sem
qualquer tipo de preconceitos, inclusive o preconceito com relação ao
criminoso, que, devido a sua condição, é constantemente tratado com
discriminação quanto aos princípios basilares da dignidade da pessoa
humana. Sobre esta perspectiva relata Vínícius:

O crime não é o criminoso, o vício não é o viciado, o pecado não é o


pecador, do mesmo modo e pelo mesmo critério que o doente não é a doença.
Assim como se combatem as enfermidades e não os enfermos, assim também se
devem combater o crime, o vício e o pecado, e não o criminoso, o viciado
e o pecador. A medicina jamais pensou na eliminação dos enfermos; toda a
sua preocupação está em curar as doenças. Pois o processo deve ser o
mesmo, em se tratando dos distúrbios que afetam o moral dos indivíduos. É
muito fácil encarcerar ou eletrocutar um criminoso. Educá-lo é mais
difícil, mais trabalhoso, demanda esforço, tempo, saber e caridade.
Retirem-se os delinquentes do convívio social, como se faz com o pestoso
que ameaça a salubridade pública; mas, como a este, preste-se àquele a
assistência que lhe é devida: educação. (CAMARGO, 2009, p. 65, 67, 68)

Na mesma linha de raciocínio de Vinícius, o médium Francisco Candido


Xavier, sob a inspiração de seu guia espiritual Emmanuel, foi consultado
sobre questões do Direito Penal, texto este contido no livro “A
Psicografia ante os Tribunais”, de Miguel Timponi, Federação Espírita
Brasileira – 5ª Edição, 1978, e com trechos do texto transcrito por
Clementino de Alencar no jornal “O Globo” do Rio de Janeiro, em
27/05/1935, na qual Chico Xavier esclarece:

[...] Considerando o Direito dentro das características e precisando


conciliá-lo com o Evangelho, somos de opinião de que o Estado ou a
sociedade deve defender-mais e punir menos. A educação deve ser difundida
em todas as suas modalidades, e nas prisões, as penitenciárias devem
representar escolas, hospitais e oficinas, onde o delinquente, apesar de
se conhecer coagido em sua liberdade, reconheça o seu direito de cidadão,
digno da educação, que ainda necessita, e do trabalho, segundo as suas
possibilidades individuais. A escola, a instrução e a assistência
significam um fator preponderante na intangibilidade do estado. A
sociedade pode, pois, castigar o delinquente, regenerá-lo e beneficiá-lo,
buscando reintegrá-lo no respeito e na consideração de si mesmo. (XAVIER,
1978 apud MAIA NETO, 2005, p. 77)

A Educação moral52 deve ser o norteador do novo modelo a ser desenvolvido


como resposta ao crime e à violência existentes em nossa sociedade.
Porém, uma educação realmente comprometida com a melhoria moral do
indivíduo, onde diversas áreas do saber humano se unam e elaborem
propostas de atuação para o tratamento e não a penalização do criminoso.
Assim descreve Haroldo de Resende:

Perscruta-se, pois, o caráter educativo subjacente aos mecanismos


prisionais, implícita ou explicitamente dispostos nos procedimentos de
transformação dos sujeitos transgressores da lei que têm sua existência
segmentada na prisão. Essa transformação deve traduzir-se na reeducação.
A medida punitiva penal trona-se um mecanismo que faz da pena, como
contrapartida da infração, uma transformação do preso, de modo a
reabilitá-lo para o convívio social, reeducando-o. A função do poder de
punir não difere, em sua centralidade, da de educar (Cf. Foucault, 1991,
p. 265). De acordo com a perspectiva teórica, o que a prisão deve fazer
com o condenado, inclusive através do próprio encarceramento, é atuar no
seu comportamento de forma a melhorá-lo, corrigindo-o e transformando-o.
(RESENDE, 2010, p. 80/81)

O professor Dr. Alessandro Baratta cita Calliess sobre a importância da


educação no combate à criminalidade:

Certamente hoje, em uma sociedade na qual o problema da educação tornou-


se o problema social por excelência, a política social não pode ser feita
sem política educacional, e isto significa que as sanções penais devem
sempre vir consideradas também como uma parte da política da educação. Os
processos reguladores do direito penal não podem ser compreendidos fora
dos outros processos sociais da socialização e da educação. (CALLIESS,
1974, p. 129 apud BARATTA, 2011, p. 169)

John Howard, citado por Rogério Greco, coloca a educação moral como uma
das bases para o cumprimento de pena:

Depois de avaliar e criticar inúmeras prisões, Howard, em seu livro


intitulado Estate of prisions, fixou as bases para um cumprimento de pena
que não agredisse os demais direitos do homem, a saber: 1) higiene e
alimentação; 2) disciplina distinta para presos provisórios e os
condenados; 3) educação moral e religiosa; 4) trabalho; 5) sistema
celular mais brando. (ASUA, Luis Gimenez. Tratado de derecho penal, t. I,
p. 259 apud GRECO, 2015, p. 116)

O pedagogo português Manuel Antonio Ferreira-Deusdado, em seu trabalho


intitulado Estudos sobre Criminalidade e Educação, disserta sobre a
importância da educação moral na formação de um novo caráter do
indivíduo:

O espirito humano tem em todos os fenômenos moraes a faculdade de recusar


a sua adesão a qualquer tendência que o solicite. Nos próprios fenômenos
de sensibilidade o império da vontade possue o poder de intervir e a sua
acção póde, dirigida pelas idéias, disciplinada pelo habito e fortalecida
pelo exemplo, contrahir sentimentos nobres e amortecer inclinações ruins.
Ainda que a existência do senso moral no criminoso seja demasiado tênue,
a instrucção ampliando as relações funestas que resultam da prática do
crime, veem mostrar ao criminoso as tristes consequências do delicto e os
nobres estímulos e delicados prazeres que gera a obra da virtude. Toda a
educação resulta de bem dirigir a acquisição dos hábitos. A vontade é o
mobil das nossas acções e a força civilisadora por excellencia.
Fortalece-la pois com exemplos elevados, deve ser o destino da educação.
A noção clara do dever moral que se aviva com a instrucção, não determina
necessariamente a sua prática, todavia é mais um grau de probabilidade
para a execução do bem. A cultura intellectual dilata o poder da
liberdade e modifica por tanto o gênero do crime, porém não o supprime;
mas a cultura do sentimento moral, inoculando o principio do dever,
desvia o homem da senda do crime, e se o homem é como cremos até certo
ponto o artista do seu destino, póde, pela educação com afinco obstinado
e inflexivel, aniquilar na sua alma as inclinações ruins e substitui-las
por aspirações d’uma ethica elevada. (DEUSDADO, 1889, p. 116)

Conforme disserta Manoel Antonio Ferreira-Deusdado no texto acima, a


vontade é o móvel das ações do indivíduo. Eis o grande desafio do
processo educacional moral, despertar a vontade no indivíduo para que ele
promova sua auto- -educação, pois, educação moral não é algo que se
impõe, mas um processo que necessita da total adesão do educando.

A Filosofia Espírita coloca a Educação como elemento transformador da


sociedade, por ser o elemento transformador dos indivíduos que a compõem.
Assim discorre o pedagogo francês Hippolyte Léon Denizard Rivail
(03/10/1804 - 31/03/1869), pseudônimo Allan Kardec:
[...] Esse elemento é a educação, não a educação intelectual, mas a
educação moral. Não nos referimos, porém, à educação moral pelos livros e
sim à que consiste na arte de formar os caracteres, à que incute hábitos,
porquanto a educação é o conjunto dos hábitos adquiridos. Quando essa
arte for conhecida, compreendida e praticada, o homem terá no mundo
hábitos de ordem e de previdência para consigo mesmo e para com os seus,
de respeito a tudo o que é respeitável, hábitos que lhe permitirão
atravessar menos penosamente os maus dias inevitáveis. A desordem e a
imprevidência são duas chagas que só uma educação bem entendida pode
curar. (KARDEC, 2010a, p. 408)

A educação, convenientemente entendida, constitui a chave do progresso


moral. Quando se conhecer a arte de se manejar os caracteres, como se
conhece a de manejar as inteligências, conseguir-se-á corrigi-los, do
mesmo modo que se aprumam plantas novas. Essa arte, porém, exige muito
tato, muita experiência e profunda observação. Faça-se com a moral o que
se faz com a inteligência e ver-se-á que, se há naturezas refratárias,
muito maior do que se julga é o número das que apenas reclamam boa
cultura, para produzir bons frutos. (KARDEC, 2010a, p. 514/515)

Cabe a educação combater essas más tendências. Fá-lo-á utilmente, quando


se basear no estudo aprofundado da natureza moral do homem. Pelo
conhecimento das leis que regem essa natureza moral, chegar-se-á a
modificá-la, como se modifica a inteligência pela instrução e o
temperamento pela higiene. (KARDEC, 2010a, p. 486/487)

Conforme ensina a filosofia espírita, somente a educação moral do ser


poderá solucionar o problema da criminalidade, que nada mais é que a
exteriorização de hábitos53 viciosos que o indivíduo traz consigo, sob o
estímulo de circunstancias externas. A educação moral possibilitará que
este indivíduo substitua os maus por bons hábitos, os vícios por
virtudes54, promovendo uma reestruturação íntima do individuo que
repercutirá na própria reestruturação social.

Sobre a Educação Moral, o Doutor em Filosofia Pedro Goergen, professor


titular (aposentado) da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), em
seu trabalho “Educação Moral Hoje: cenários, perspectivas e
perplexidades”, relata que:

A moralidade da sociedade contemporânea assume hoje uma dimensão


inversamente proporcional à sua visibilidade discursiva. Parece que
quanto mais se fala em ética e moral, mais escandalosamente imorais se
tornam as práticas. O discurso moralizante nasce, de um lado, da justa
revolta das vítimas da barbárie moral e, de outro, do cinismo dos
protagonistas da imoralidade. Comum aos dois aportes é a tendência de
culpabilizar os outros, sejam eles indivíduos, grupos ou instituições. No
presente trabalho, quero defender o ponto de vista de que a barbárie
moral que vivemos não se explica nem se soluciona culpando o outro e
exigindo que ele mude seu comportamento. As raízes da imoralidade são
muito mais profundas e alcançam o terreno comum da tradição e da cultura.
Por isso, entendo que a superação da barbárie moral não pode ser
alcançada mediante intervenções e sanções tópicas, locais, superficiais,
mas que é necessário um repensar amplo e corajoso dos arquétipos de nossa
cultura, no que se refere aos conceitos de cidadania, democracia, justiça
social e espaço público. Tal projeto deve relacionar a nossa tradição
cultural e os valores a ela inerentes com o contexto moralmente perverso
do modo de produção capitalista neoliberal que nos governa no momento. As
perplexidades e ambivalências ético-morais precisam ser entendidas e
analisadas a partir da confluência das características e tradições de
nossa cultura com o modo de produção e os referenciais e representações
ético-morais que lhe são próprias. Estes dois aportes – a tradição
cultural e a realidade econômico-política – representam as vertentes
cínicas das quais nasce a imoralidade que barbariza nossas relações
sociais. Imoralidade essa que ora gera revolta, ora não provoca mais que
indiferença e conformismo. A moralidade social exige o aporte crítico da
filosofia, da antropologia, da história, da ciência política, do direito,
da teoria educacional, das ciências da comunicação, da sociologia, da
psicologia, da economia, da epistemologia e da teologia, tanto para
desvendar suas armadilhas cínicas, quanto para construir um espaço
público no interior do qual se realize um amplo debate ético sobre os
princípios a partir dos quais se julgam as decisões e as ações. Dizer que
a responsabilidade é de todos não significa dizer que ela não é de
ninguém. Ao contrário, significa que cada segmento social, cada
instituição, cada indivíduo deve assumir responsabilidade moral em seu
âmbito de atuação. Por sua inegável influência sobre a formação das
futuras gerações, cabe aos setores diretamente envolvidos com a educação,
como a família, a mídia e a escola, um papel particularmente relevante na
reforma moral da sociedade. Nesse cenário, a tarefa da educação moral
coloca-se numa nova perspectiva de formar um sujeito moral, portador de
uma consciência crítica que lhe permita uma permanente percepção e
avaliação da pertinência dos códigos, normas, tradições, na perspectiva
da liberdade e da justiça. A tarefa da educação moral não é apenas um
compromisso dos pais, da escola ou de uma outra instância qualquer, mas
um compromisso da sociedade como um todo e de todas as suas instituições
políticas, jurídicas, midiáticas e também educacionais.(GEORGE, 2007)

O filósofo grego Aristóteles, na obra Ética a Nicômaco, disserta sobre o


desenvolvimento das virtudes intelectual e moral:

Como vimos, há duas espécies de virtude, a intelectual e a moral. A


primeira deve, em grande parte, sua geração e crescimento ao ensino, e
por isso requer experiência e tempo; ao passo que a virtude moral é
adquirida em resultado do hábito. (...) Pelos atos que praticamos em
nossas relações com outras pessoas, tornamo-nos justos ou injustos; (...)
Em uma palavra: nossas disposições morais nascem de atividades
semelhantes a elas. (ARISTÓTELES, 2008, p. 40/41)

Conclui-se com Aristóteles que as virtudes morais podem ser desenvolvidas


no indivíduo, pela prática constante, que as tornarão hábitos salutares.
Eis o grande desafio da ciência do direito, promover meios que
possibilitarão a recuperação do criminoso, modificando suas disposições
morais, promovendo a educação do ser.

Somente um modelo educacional moral poderá realmente promover a melhoria


do atual quadro em que se encontra a nossa sociedade. Mas, para que se
implemente este modelo, é necessário a boa vontade dos governantes e da
sociedade, num trabalho conjunto. É preciso modificar a mentalidade de
vingança, ora predominante na sociedade contemporânea, para uma
mentalidade de compaixão e auxílio em prol do indivíduo que, por não ter
sido moralmente educado, promove o fenômeno da criminalidade no meio em
que vive. Enquanto a sociedade continuar com o atual modelo de exclusão e
punição, aumentar-se-ão os ódios e a própria violência, pois violência
gera violência.

Rogério Greco adverte sobre a necessidade de mudanças urgentes no atual


sistema instituído,

Assim, já chegamos naquele momento preconizado por Foucault em que


olharíamos para nossas celas e teríamos vergonha do que estávamos fazendo
com os seres humanos, que passaram a ser tratados como animais. Essa
tese, mais do que inovar, serve de alerta para que as medidas sejam
adotadas imediatamente. Não se pode mais esperar, pois, enquanto estamos
discutindo academicamente esses problemas, pessoas estão, neste exato
instante, sofrendo os males impostos de forma ilegal pelo cárcere. O
tempo urge contra nós, ou melhor, contra aqueles miseráveis, destituídos
de qualquer dignidade pessoal, que foram selecionados para fazer parte
deste show de horrores, que servem de bodes expiatórios, encobrindo a
incapacidade do Estado para exercer suas funções sociais! Maranata!
(GRECO, 2015, p. 352)

Nesse mesmo sentido, Cândido Furtado Maia Neto disserta:

O direito penal ortodoxo com seus dogmas ultrapassados dará vez a um novo
paradigma para um novo estudo das ciências jurídicas e criminológicas, no
contexto da espiritualidade, à luz da vida e da reencarnação. (MAIA NETO,
Cândido Furtado, e Lenchoff Carlos, in “Criminalidade, Doutrina Penal e
Filosofia Espírita”, ed. Lake, São Paulo, 2005 ).

O eminente físico e professor indiano radicado nos Estados Unidos da


América, Dr. Amit Goswami, autor de “O Universo Autoconsciente” e “A
Física da Alma”, assevera que tudo gira, acontece e se determina no
universo através de uma consciência cósmica. Razão pela qual, o
tradicional e clássico estudo do direito penal e das causas dos crimes
requer modernas explicações. O direito penal capitalista ou materialista
precisa dar lugar a ciência espiritual, a aplicação clássica não efetiva
a verdadeira justiça criminal, pelo contrário, tem sido causa e produto
de grandes males sociais. (MAIA NETO in <
http://uj.novaprolink.com.br/doutrina/4965/Justica_Penal_Crista_e_Espirit
ualidade__Ciencia_a_Luz_dos_Direitos_Humanos_e_do_Evangelho_de_Jesus_Cris
to >)

Educação moral, eis o caminho pelo qual o atual Direito Penal deve
seguir. Caminho que conduz a novos horizontes, a uma nova realidade, a
uma nova estrutura social. Não mais castigar corpos, mas elevar almas à
conquista das virtudes, à conquista de si mesmas. Não mais punir por
punir, mas conduzir os indivíduos pelos caminhos da autotransformação, da
superação dos vícios e imperfeições morais, da conquista do eu maior que
reside na intimidade de todos os seres, que não é senão o arquétipo
divino, a que está destinada a se tornar toda criação. Que seja a
criatura, em relação ao criador, a sua imagem e semelhança, conforme nos
conclama o Senhor: “Sede santos, porque eu sou santo”. (RIRYE, 2007, p.
1222).
6. CONCLUSÃO
O Jusnaturalismo Teológico, com base na Filosofia Cristã/Espírita, revela
uma Lei Divina que possui como objetivo final a melhoria do Espírito
imortal com vistas à conquista da Perfeição, que significa o
desenvolvimento das virtudes divinas que o Espírito possui em estado
latente. Com a conquista destas virtudes, o homem se torna melhor e se
tornando melhor, a própria sociedade se torna melhor. Esta deve ser a
visão do Direito, hoje denominado Penal: desenvolver mecanismos eficazes
que estimulem o indivíduo a desenvolver as virtudes que existem dentro de
si em estado latente. A este processo denomina-se educação moral.

Não é possível dissociar educação moral de criminalidade, pois se existe


o crime é devido à inexistência de desenvolvimento da moralidade nos
indivíduos. Penalizar o indivíduo, sem moralizá-lo é estimular ainda mais
os vícios que estão, provisoriamente, inerentes à personalidade do
indivíduo criminoso.

Toda mudança de filosofia e modelos sociais enfrentará, inevitavelmente,


a resistência dos paradigmas existentes. Ante os desafios do porvir,
deve-se refletir sobre a ineficácia dos atuais modelos sociais e a
urgente necessidade de elaboração de um novo modelo de atuação da
sociedade frente à criminalidade.

Criminalidade é um problema que diz respeito a toda sociedade.


Infelizmente, vive-se em uma sociedade baseada no individualismo, onde os
interesses próprios se tornam preponderantes frente aos interesses
coletivos. O indivíduo frente a um criminoso possui o pensamento de que,
para que não seja prejudicado pelo ato deste criminoso, este deve ser
encarcerado, “resolvendo” assim o problema. Não existe preocupação quanto
às condições que este criminoso será submetido ou se será efetivamente
recuperado, e quando este criminoso não é preso ou é solto e comete novos
crimes, culpa-se o Estado. Não se deve responsabilizar exclusivamente o
Estado pelos males que afligem a sociedade. A responsabilidade é de
todos, assim como a busca de soluções é responsabilidade de toda a
sociedade. Se existe criminalidade, esta é consequência, dentre outros
fatores, porém como fatores preponderantes, porque a sociedade falhou na
educação de suas crianças e jovens e devido à existência de excluídos
sociais, resultado do egoísmo humano. Enquanto a sociedade não se
responsabilizar pelos males que ela mesma criou e não trabalhar pela
solução dos mesmos, o quadro atual não mudará.

Somente a educação moral, associada à construção de uma sociedade mais


justa e fraterna, será capaz de modificar o atual panorama social. À
educação moral cabe a nobre tarefa de transformar os indivíduos, de
melhorá-los e de torná-los aptos a conviverem pacificamente uns com os
outros, numa sociedade mais fraterna e humana. E este processo envolve
toda a sociedade num trabalho contínuo em prol da própria sociedade.

Não é mais possível postergar as mudanças que se fazem urgentes,


inadiáveis. A atual sociedade já possui maturidade intelectual suficiente
para as transformações exigidas, o que lhe falta é sentimentos nobres e
boa vontade para iniciar a grande obra de edificação de um novo amanhã,
isento dos equívocos da atualidade.
O atual momento que vive a sociedade humana reflete a falência das
instituições e dos métodos sociais constituídos. A violência, a exclusão
social, as paixões desenfreadas, o desrespeito à natureza, a
desvalorização do Ser enquanto Humano, demonstram a decadência de uma
sociedade construída sobre as bases do individualismo, do materialismo e
da satisfação dos prazeres imediatistas a qualquer custo. O homem sofre
as consequências de suas próprias ações equivocadas.

O atual momento requer de cada um dos membros da grande sociedade humana


o desenvolvimento de novos valores íntimos, como a fraternidade55, a
espiritualidade, a benevolência, a indulgência e o perdão. Como
consequência desta reestruturação íntima de valores, ter-se-á uma nova
sociedade, reconstruída sobre novas bases, onde o amor, apregoado e
vivenciado por Nosso Senhor Jesus Cristo será o móvel de todas as
relações sociais.

7. REFERENCIAS
ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário Jurídico Acquaviva / Marcus Cláudio
Acquaviva. – 4. ed. atual. e ampl. – São Paulo: Rideel, 2010.

ALMEIDA, João Ferreira. Bíblia Sagrada. Traduzida em português por João


Ferreira de Almeida. Revista e Atualizada no Brasil. 2 ed. Barueri – SP:
Sociedade Bíblica do Brasil, 2008. 1664p.

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução de Pietro Nassetti. 4 ed. São


Paulo-SP: Editora Martin Claret Ltda, 2008, 256p.

BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal:


introdução à sociologia do direito penal / Alessandro Baratta; tradução
Juarez Cirino dos santos. 6. ed. Rio de janeiro: Editora Revan: Instituto
Carioca de Criminologia, 2011. 256p.

BETIOLI, Antônio Bento. Introdução ao Direito, 13ª ed. revista e atual. –


São Paulo: Saraiva, 2014. 607p.

BERTOLINI, José (coordenação editorial). Bíblia de Jerusalém. São Paulo:


Paulus, 2010.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, volume 1: parte


geral / Cezar Roberto Bitencourt. – 4. ed. rev., atual. e ampl. – São
Paulo: Saraiva, 2009

BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 7. ed. Ver. e


atual. De acordo com a Ementa Constitucional nº 70/2012 – São Paulo:
Saraiva, 2012.

CAMARGO, Pedro de. Vinícius (Pseudônimo). O Mestre na Educação. 10. ed.


1ª reimp. – Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2009. 152 p.

COTRIM, Gilberto. História Global – Brasil e Geral – volume único. 8. ed.


– São Paulo: Saraiva, 2005.
DEUSDADO, Manuel Antonio Ferreira. Estudos sobre Criminalidade e
Educação. 1889. Disponível em: <
www.fd.unl.pt/Anexos/Investigacao/1081.pdf >

FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão; tradução de


Raquel Ramalhete. 36. ed. Petrópolis, RJ : Vozes, 2009.

GOERGEN, Pedro. Educação Moral Hoje: cenários, perspectivas e


perplexidades. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho
(UNESP). Disponível em

GRECO, Rogério. Sistema Prisional: colapso atual e soluções alternativas.


2. ed. rev., ampl. e atual. Niterói, RJ: Impetrus, 2015.

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal, v. 1. 18. ed. Rio de Janeiro:


Impetrus, 2016. 980p.

HOUAISS, Antonio (1915-1999) e Villar, Mauro Salles (1939-). Dicionário


Houaiss da língua portuguesa / elaborado pelo Instituto Antonio Houaiss
de Dados da Língua Portuguesa S/C Ltda. 1. ed. Rio de Janeiro: Objetiva,
2009.

KARDEC, Allan. Obras Póstumas; tradução de Guillon Ribeiro. – 40. ed. –


Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2007. 456 p.

KARDEC, Allan. A gênese: os milagres e as predições segundo o espiritismo


/ por Allan Kardec; [tradução de Guillon Ribeiro da 5. ed. Francesa]. –
52. ed. – 1ª reimp. – Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira,
2008a. 528p.

KARDEC, Allan. O Céu e o Inferno, ou, A justiça Divina segundo o


Espiritismo: Exame comparado das doutrinas sobre passagem da vida
corporal à vida espiritual / por Allan Kardec; [tradução de Manuel
Justiniano Quintão]. – 60. Ed. – 1ª reimp. – Rio de Janeiro: Federação
Espírita Brasileira, 2008b. 496p.

KARDEC, Allan. O que é o espiritismo: noções elementares do mundo


invisível, pelas manifestações dos Espíritos, com o resumo dos princípios
da Doutrina Espírita e resposta às principais objeções que possam ser
apresentada / Allan Kardec. - tradução de Guillon Ribeiro. – 55. ed. – 1ª
reimp. - Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2009. 264 p.

KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos: princípios da doutrina espírita:


espiritismo experimental ; tradução de Guillon Ribeiro. – 2. ed. especial
– 2ª reimp. – Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2010a. 656
p.

KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o espiritismo: com explicações das


máximas morais do Cristo em concordância com o espiritismo e suas
aplicações às diversas circunstâncias da vida / por Allan Kardec;
[tradução de Guillon Ribeiro, da 3. ed. Francesa, revista, corrigida e
modificada pelo autor em 1866]. – 4. ed. – 3º reimp. – Rio de Janeiro:
Federação Espírita Brasileira, 2010b. 608p.
MAIA NETO, Cândido Furtunato. Criminalidade, doutrina penal e filosofia
espírita: direitos (ou problemas) humanos.... 1. ed. São Paulo. LAKE,
2005.

MUAKAD, Irene Batista. Prisão Albergue. São Paulo: Atlas, 1998.

NADER. Paulo. Filosofia do direito. Rio de Janeiro: Editora Forense,


2010.

NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado – 14. ed. rev., atual.
e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2014. 1517 p.

PENTEDO FILHO, Nestor Sampaio. Manual esquemático de criminologia. 2ª ed.


São Paulo: Saraiva, 2012.

Relatório do Sistema Prisional Brasileiro. Comissão de Direitos Humanos e


Minorias da Câmara dos Deputados. 2006. Disponível em: .

RESENDE, Haroldo de. Vigiar, Punir e Educar: O “Sistema Educacional” da


Prisão. Revista “Cadernos de História da Educação”, v. 9, n. 1 – jan/jun.
2010. Universidade Federal de Uberlândia. P. 79 à 92.

ROCHA, Cecília - Responsável. Estudo sistematizado da Doutrina Espírita:


programa fundamental, v. 1 / organizado pela Área de Estudos Doutrinários
da Federação Espírita Brasileira – 2ª ed. – 9ª reimpressão – Rio de
Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2012.

RODRIGUES, Josué Douglas. Joana de Ângelis ao alcance de todos. 1ª reimp.


Jan. 2016. Capivari, SP: Editora EME. 216 p.

RYRIE, Charles C. A Bíblia anotada: edição expandida. ed. rev. e exp. São
Paulo: Mundo Cristão; Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 2007.

SILVA, Jane Ribeiro – Organizadora. A Execução Penal à Luz do Método


APAC. Belo Horizonte: Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais,
2011. 376 p.

SITE: Acesso em 06 de junho de 2013.

SITE: Acesso em 06 de junho de 2013.

SITE: Acesso em 06 de junho de 2013.

SITE: Acesso em 06 de junho de 2013.

SITE: Acesso em 04 de junho de 2013.

SITE: Acesso em 04 de junho de 2013.

SITE: < http://www.istoe.com.br/reportagens/2200_O+CIENTISTA+DE+DEUS >


Acesso em 24/05/2015

SITE: < https://www.youtube.com/watch?v=clSPdpYd1Ao > Acesso em


24/05/2015
SITE: <
http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/noticia/2012/04/homofobia-pode-
ser-reacao-de-desejo-retraido-pelo-mesmo-sexo-diz-estudo.html> Acesso em
03/03/2016

SITE: Acesso em 07/05/2016

SITE: < http://oglobo.globo.com/brasil/violencia-seguira-em-alta-futuro-


incerto-diz-estudo-do-ipea-para-2023-18116789> Acesso em 23/05/2016

SITE: Acesso em 25/05/2016

SITE: <
www.unifacs.br/revistajuridica/arquivo/edicao_abril2007/docente/doc1.doc
> Acesso em 25/05/2016

SITE: < http://www.justica.gov.br/seus-direitos/politica-penal > Acesso


em 26/05/2016

SOBRINHO, Geraldo Campetti (organizador). O Espiritismo de A a Z. 4. ed.


2ª reimpressão. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2012.

XAVIER, Francisco Candido, ditado pelo Espírito André Luiz. Libertação.


2. ed. esp. 3ª reimp. Brasília: FEB, 2010.

XAVIER, Francisco Candido, ditado pelo Espírito André Luiz. Evolução em


dois Mundos. 1. ed. esp. 3ª reimp. Brasília: FEB, 2011.

XAVIER, Francisco Candido, ditado pelo Espírito Emmanuel. Caminho,


Verdade e Vida. 1 ed. 5ª imp. Brasília: FEB, 2013a.

XAVIER, Francisco Candido, ditado pelo Espírito Emmanuel. O Consolador -


29 ed. 1ª imp. Brasília: FEB, 2013b.

XAVIER, Francisco Candido, ditado pelo Espírito André Luiz. Mecanismos da


Mediunidade. 28 ed. 1ª imp. Brasília: FEB, 2013c.

XAVIER, Francisco Candido, ditado pelo Espírito André Luiz. No Mundo


Maior. 28 ed. 1ª imp. Brasília: FEB, 2013d.

XAVIER, Francisco Candido, ditado pelo Espírito Emmanuel. Pensamento e


Vida. 19 ed. 1ª imp. Brasília: FEB, 2013e.

XAVIER, Francisco Candido, ditado pelo Espírito André Luiz. Ação e


Reação. 30 ed. 1ª imp. Brasília: FEB, 2013f.

XAVIER, Francisco Candido, ditado pelo Espírito Emmanuel. Emmanuel - 28


ed. 2ª imp. Brasília: FEB, 2014.

1 “Movimento intelectual que correspondia aos interesses daqueles que


desejavam mais liberdade política e econômica. Os pensadores iluministas
defendiam, além da não intervenção do Estado na economia, a igualdade
jurídica entre os homens, a liberdade religiosa e de expressão e outros
direitos. Com isso, o Iluminismo abriu caminho para as revoluções que
combateram as estruturas do antigo regime,” [...] entre estas estruturas
a serem combatidas estava o [...] “poder da Igreja, que se baseava em
verdades reveladas pela fé, contrariando a autonomia da razão, ou seja, a
liberdade do indivíduo para elaborar conceitos, normas, ideias e teorias.
Segundo o pensamento da iluminista, só com a autonomia da razão seria
possível estimular o avanço da ciência e das técnicas aplicadas aos
transportes, às comunicações, à medicina etc.” (COTRIM, 2005, p. 266)

2 NADER, Paulo. Filosofia do direito. Rio de Janeiro: Editora Forense,


2000.

3 Pseudônimo de Hippolyte Léon Denizard Rivail (03/10/1804 - 31/03/1869),


pedagogo francês que pesquisou, estudou, organizou e codificou os ensinos
trazidos pelos Espíritos Superiores, formando corpo de ensinamentos
denominados Doutrina Espírita ou Espiritismo.

4 (ROHDEN, Huberto. 2004 apud MAIA NETO, 2005, p. 13)

5 Divulgada na Pew Research Forum De on Religion & Public Life (Global


Religion Landscape / 2012), disponível em .

6 Disponível em < http://g1.globo.com/brasil/noticia/2012/06/numero-de-


evangelicos-aumenta-61-em-10-anos-aponta-ibge.html>.

7 Para mais informações, acesse .

8 “O ESPIRITISMO É, AO MESMO TEMPO, UMA CIÊNCIA DE OBSERVAÇÃO E UMA


DOUTRINA FILOSÓFICA. COMO CIÊNCIA PRÁTICA ELE CONSISTE NAS RELAÇÕES QUE
SE ESTABELECEM ENTRE NÓS E OS ESPÍRITOS; COMO FILOSOFIA, COMPREENDE TODAS
AS CONSEQÜÊNCIAS MORAIS QUE DIMANAM DESSAS MESMAS RELAÇÕES.” (KARDEC,
2009, p. 55). Define-se ciência como sendo o “corpo de conhecimentos
sistematizados adquiridos via observação, identificação, pesquisa e
explicação de determinadas categorias de fenômenos e fatos, e formulados
metódica e racionalmente.” (HOUAISS, 2009, p. 463). No âmbito cientifico
da Doutrina Espírita, “O método adotado por Allan Kardec na investigação
e comprovação do fato mediúnico — instrumento comprobatório da existência
e comunicabilidade do Espírito — é o experimental, aplicado às ciências
positivas, fundamentado na observação, comparação, análise sistemática e
conclusão”. (ROCHA, 2012, p. 71)

9 “Espiritismo é uma doutrina filosófica de efeitos religiosos, como


qualquer filosofia espiritualista, pelo que forçosamente vai ter às bases
fundamentais de todas as religiões: Deus, a alma e a vida futura. Mas,
não é uma religião constituída, visto que não tem culto, nem rito, nem
templos e que, entre seus adeptos, nenhum tomou, nem recebeu o título de
sacerdote ou de sumo-sacerdote.” (KARDEC, 2007, p. 289/290)

10 A palavra Deus contida neste versículo bíblico, é um substantivo


masculino plural, deuses, em hebraico Heloim. Na obra Evolução em dois
Mundos, a filosofia espírita esclarece: “O fluído cósmico é o plasma
divino, hausto do Criador ou força nervosa do Todo-Sábio. Nesse elemento
primordial, vibram e vivem constelações e sóis, mundos e seres, como
peixes no oceano. Nessa substância original, ao influxo do próprio Senhor
Supremo, operam as Inteligências Divinas a Ele agregadas, em processo de
comunhão indestrutível, os grandes Devas da teologia hindu ou os Arcanjos
da interpretação de variados templos religiosos, extraindo desse hálito
espiritual os celeiros da energia com que constroem os sistemas da
Imensidade, em serviço de Co-criação em plano maior, de conformidade com
os desígnios do Todo-Misericordioso, que faz deles agentes orientadores
da Criação Excelsa. Essas Inteligências Gloriosas tomam o plasma divino e
convertem-no em habitações cósmicas, de múltiplas expressões, radiantes
ou obscuras, gaseificadas ou sólidas, obedecendo a leis predeterminadas,
quais moradias que perduram por milênios e milênios, mas que se desgastam
e se transformam, por fim, de vez que o Espírito Criado pode formar ou
co-criar, mas só Deus é o Criador de Toda a Eternidade. (XAVIER, 2011, p.
19)

11 “Eu sou o caminho, a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai senão por
mim.” (RYRIE, 2007, p. 1038)

12Reportagem em: <


http://www.istoe.com.br/reportagens/2200_O+CIENTISTA+DE+DEUS > Acesso em
24/05/2015.

13 Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=clSPdpYd1Ao > Acesso


em 24/05/2015.

14 Providência: “4 REL ação pela qual Deus conduz os acontecimentos e as


criaturas para o fim que lhes foi destinado” - (HOUAISS, 2009, p. 1568)

15 O fluído cósmico é o plasma divino, hausto do Criador ou força nervosa


do Todo-Sábio. Nesse elemento primordial, vibram e vivem constelações e
sóis, mundos e seres, como peixes no oceano. (XAVIER, 2011, p. 19)

16 Os dez mandamento estão descritos em várias passagens do antigo


testamento, entre elas no Livro de Êxodo, capítulo 20, versículos 1 ao
17.

17 Os médicos e cientistas, pesquisadores holandeses Titus Rivas, Anny


Adrien e Rudolf Smit publicaram um livro, que por enquanto somente está
disponível em holandês, chamado “Wat een stervend brein niet an”, que na
tradução literal seria intitulado “O que um cérebro morrendo é capaz de
fazer”, onde atestam que a alma pode deixar o corpo e observá-lo. –
Disponível em < https://br.noticias.yahoo.com/blogs/eita/cientistas-
atestam-que-nossa-alma-pode-deixar-o-corpo-e-observ%C3%A1-lo-
135252335.html > Acesso em 23/05/2015.

Estudo científico sobre Experiência Quase Morte (EQM): Disponível em: <
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S01016083201300050
0005&lng=pt&nrm=iso&tlng=e n >

Estudo científico sobre Psicografia: Agência USP de notícias: Disponível


em: < http://www.usp.br/agen/?p=121208>

18 Para aprofundamento no tema, sugere-se a leitura do livro Nosso Lar,


psicografia de Francisco Candido Xavier, pelo Espírito André Luiz, onde
trata da estrutura da colônia espiritual Nosso Lar.
19 Recomenda-se a leitura das seguintes obras científicas que abordam o
tema reencarnação: 20 Casos sugestivos de Reencarnação, de Ian Stevenson
(1918-2007; Foi pesquisador do Departamento de Medicina Psiquiátrica da
Universidade de Virgínia – EUA), editora Difusora Cultural; Muitas Vidas,
Muitos Mestres, de Brian L. Weiss, editora Salamandra.

Estudo científico sobre Regressão de Memória em vidas passadas:


Disponível em: < http://istoe.com.br/26515_DE+VOLTA+AO+PASSADO/>

20 [...] “podemos definir justiça distributiva como sendo o tipo de


justiça pela qual a comunidade dá a cada um de seus membros o que lhe é
devido (bens e encargos), segundo o seu mérito e capacidade.” (BETIOLI,
2014, p. 543). A respeito do caráter distributivo da lei divina cita-se a
passagem bíblica da oferta da viúva pobre: “Assentado diante do
gazofilácio, observava Jesus como o povo lançava ali o dinheiro. Ora,
muitos ricos depositavam grandes quantias. Vindo, porém, uma viúva pobre,
depositou duas pequenas moedas correspondentes a um quadrante. E,
chamando os seus discípulos, disse-lhes: Em verdade vos digo que esta
viúva pobre depositou no gazofilácio mais do que o fizeram todos os
ofertantes. Porque todos eles ofertaram do que lhes sobrava; ela, porém,
da sua pobreza deu tudo quanto possuía, todo o seu sustento.” (RYRIE,
2007, p. 973)

21É preciso interpretar as lições de Jesus no seu sentido espiritual,


conforme as seguintes instruções: “as palavras que eu vos digo são
espírito e são vida.” (RYRIE, 2007, p. 1028) e “a letra mata, mas o
espírito vivifica”. (RYRIE, 2007, p. 1131)

22 “Acima de tudo, porém, tende amor intenso uns para com os outros,
porque o amor cobre multidão de pecados.” (ALMEIDA, 2008, p. 1608)

23 “purificação de crimes ou faltas cometidas” (HOUAISS, 2009, p. 859)

24 A palavra grega traduzida por “ira” significa punição.

25 A palavra grega traduzida por “vingança” significa executar justiça,


penalidade.

26 Bem é “aquilo que enseja as condições ideais ao equilíbrio, à


manutenção, ao aprimoramento e ao progresso de uma pessoa ou de uma
coletividade” (HOUAISS, 2009, p. 275)

27 “Amar os inimigos não é, portanto, ter-lhes uma afeição que não está
na natureza, visto que o contacto de um inimigo nos faz bater o coração
de modo muito diverso do seu bater, ao contacto de um amigo. Amar os
inimigos é não lhes guardar ódio, nem rancor, nem desejos de vingança; é
perdoar-lhes, sem pensamento oculto e sem condições, o mal que nos
causem; é não opor nenhum obstáculo à reconciliação com eles; é desejar-
lhes o bem e não o mal; é experimentar júbilo, em vez de pesar, com o bem
que lhes advenha; é socorrê-los, em se apresentando ocasião; é abster-se,
quer por palavras, quer por atos, de tudo o que os possa prejudicar; é,
finalmente, retribuir-lhes sempre o mal com o bem, sem a intenção de os
humilhar. Quem assim procede preenche as condições do mandamento: Amai os
vossos inimigos.” (KARDEC, 2010b, p. 247/248)

28 “A medida que o indivíduo se afasta da infância, caminhando para a


fase adulta, desenvolve em si mesmo posturas que viabilizam seu
relacionamento com o meio em que vive. Tais posturas vão se tornando mais
complexas com o passar do tempo, exigindo adaptações familiares, sociais,
profissionais e de cidadania, tornando-o parte de uma coletividade
impregnada de costumes, preconceitos, leis e culturas específicas. Esse
processo de adaptação consiste, em última instancia, no resultado do
esforço que o indivíduo vê-se obrigado a realizar, no sentido de não
expor para a sociedade em que está inserido, características de sua
individualidade que ameaçariam sua aceitação social ou afeto daqueles que
lhe são caros. Isso resulta no que a psicologia analítica denomina
máscara ou persona. [...] O conjunto dos conteúdos reprimidos em função
da construção da máscara forma o que a psicologia junguiana denomina
sombra. [...] Todos os conteúdos assim reprimidos são despejados no
inconsciente, mas nem por isso deixam de existir, e de alguma forma irão
se manifestar.” (RODRIGUES, 2016, p. 32/33)

29 “Pode-se conceituar criminologia como a ciência empírica (baseada na


observação e na experiência) e interdisciplinar que tem por objeto de
análise o crime, a personalidade do autor do comportamento delitivo, da
vítima e o controle social das condutas criminosas. A criminologia é uma
ciência do “ser”, empírica, na medida em que seu objeto (crime,
criminoso, vítima e controle social) é visível no mundo real e não no
mundo dos valores, como ocorre com o direito, que é uma ciência do “dever
ser”, portanto normativa e valorativa. A interdisciplinaridade da
criminologia decorre de sua própria consolidação histórica como ciência
dotada de autonomia, à vista da influência profunda de diversas outras
ciências, tais como a sociologia, a psicologia, o direito, a medicina
legal etc.” (PENTEADO FILHO, 2012, p. 19/20)

30 “Entende-se por “personalidade” a síntese de todos os elementos que


concorrem para a conformação mental de uma pessoa”. (PENTEADO FILHO,
2012, p. 199)

31 “As estatísticas criminais demonstram existir uma relação de


proximidade entre a pobreza e a criminalidade. Não que a pobreza seja um
fator condicionante extremo de criminalidade, tendo em vista a ocorrência
dos chamados “crimes do colarinho branco”, geralmente praticados pelas
camadas mais altas da sociedade. Por outro lado, nos crimes contra o
patrimônio, a imensa maioria dos assaltantes é semialfabetizada, pobre,
quando não miserável, com formação moral inadequada. Percebe-se que
nutrem ódio ou aversão àqueles que detêm posses e valores. Esses
sentimentos fazem crescer uma tendência criminal violenta no indivíduo.
Nesse sentido, as causas da pobreza, conhecidas de todos – má
distribuição de renda, desordem social, grandes latifúndios improdutivos
etc. –, somente funcionam como fermento dos sentimentos de exclusão,
revolta social e consequente criminalidade.” (PENTEADO FILHO, 2012, p.
174/175)

32 “Dessa forma, não estaríamos diante um conjunto de traços de


personalidade determinantes de uma conduta criminosa, mas diante de uma
ação delituosa resultante da interação entre determinados contextos e
situações do meio, juntamente com um conjunto de processos cognitivos
pessoais, afetivos e vivenciais, os quais acabariam por levar a pessoa a
interpretar a situação de forma particular e a agir (criminosamente) de
acordo com o sentido que lhe atribui. Aqui também se pensa em determinada
personalidade criminosa, personalidade esta produzida não apenas pelo
arranjo genético, mas sobretudo pelo desenvolvimento pessoal.” (PENTEADO
FILHO, 2012, p. 208)

33 “Lombroso imaginou ter encontrado, no criminoso, em sentido natural-


cientifico, uma variedade de homo sapiens, que seria caracterizada por
sinais (stigmata) físicos e psíquicos.” (GRECO, 2016, p. 53)

34 “maneira usual de ser, fazer, sentir.” (...) “maneira permanente ou


frequente de comportar-se.” (HOUAISS, 2009, p. 1003)

35 “Conforme o ensino de Álvaro May Rink da Costa, “A aprendizagem é


feita num processo de comunicação com outras pessoas, principalmente, por
grupos íntimos, incluindo técnicas de ação delitiva e a direção
específica de motivos e impulsos, racionalizações e atitudes. Uma pessoa
torna-se criminosa porque recebe mais definições favoráveis à violação da
lei do que desfavoráveis a essa violação. Este é o princípio da
associação diferencial.”” (COSTA, ALVARO MAY RINK, 1976 apud PENTEADO
FILHO, 2012, p. 88)

36 “A educação e o ensino são fatores inibitórios de criminalidade. No


entanto, sua carência ou defeitos podem contribuir para estabelecer um
senso moral distorcido na primeira infância. Assim, a educação informal
(família, sociedade) e a formal (escola) assumem relevância indisfarçável
na modelagem da personalidade humana”. (PENTEADO FILHO, 2012, p. 179)

37 “Já desde esta vida poderemos ir resgatando nossas faltas? “Sim,


reparando-as.”” (...) “Só por meio do bem se repara o mal e a reparação
nenhum mérito apresenta, se não atinge o homem nem no seu orgulho, nem
nos seus interesses materiais.”(KARDEC, 2010a, p. 563)

38 “A sociedade humana pode ser comparada a imensa floresta de criações


mentais, onde cada Espírito, em processo de evolução e acrisolamento,
encontra os reflexos de si mesmo. Aí dentro os princípios de ação e
reação funcionam exatos.” (XAVIER, 2013e, p. 75)

39 “A sociedade define o que entende por “conduta desviante”, isto é,


todo comportamento considerado perigoso, constrangedor, impondo sanções
àqueles que se comportarem dessa forma. Destarte, condutas desviantes são
aquelas que as pessoas de uma sociedade rotulam às outras que as
praticam. A teoria da rotulação de criminosos cria um processo de estigma
para os condenados, funcionando a pena como geradora de desigualdades. O
sujeito acaba sofrendo reação da família, amigos, conhecidos, colegas, o
que acarreta a marginalização no trabalho, na escola. Sustenta-se que a
criminalização primária produz a etiqueta ou rótulo, que por sua vez
produz a criminalização secundária (reincidência). A etiqueta ou rótulo
(materializados em atestado de antecedentes, folha corrida criminal,
divulgação de jornais sensacionalistas etc.) acaba por impregnar o
indivíduo, causando a expectativa social de que a conduta venha a ser
praticada, perpetuando o comportamento delinquente e aproximando os
indivíduos rotulados uns dos outros. Uma vez condenado, o indivíduo
ingressa numa “instituição” (presídio), que gerará um processo
institucionalizador, com seu afastamento da sociedade, rotinas do cárcere
etc.” (PENTEADO FILHO, 2012, p. 93/94)

40 “O delito é a lesão social produzida pelo estado egoístico da psique


humana (leia-se espírito) na qual a evolução altruística não está
suficientemente avançada para dominar as tendências egoísticas do limite
que exige determinado estado social” - Relatório do V Congresso
Internacional de Antropologia Criminal em Amsterdã (MAIA NETO, 2005, p.
341)

41 G. D. Romagnosi [1834], p. 83

42 Relig- : “Outros autores [Lactâncio e Sérvio] associam religìo a


religáre: seria propriamente 'o fato de se ligar com relação aos
deuses'.” (Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa 1.0 –
HOUAISS, 2009)

43 Inquisição: “tribunal eclesiástico instituído pela Igreja católica no


começo do sXIII com o fito de investigar e julgar sumariamente pretensos
hereges e feiticeiros, acusados de crimes contra a fé católica; Santo
Ofício [Os condenados eram enviados ao Estado, para serem sentenciados.]”
(HOUAISS, 2009, p. 1087)

44 SANTIN, Giovani. Mídia e criminalidade. Sistemas punitivos e direitos


humanos na Ibero-América, p. 94.

45Disponível em:

46

47 Publicada no Diário do Congresso (Seção II), de 29-3-1984.

48 Foram realizadas treze entrevistas com presos condenados, pessoas que


já foram processadas, julgadas e, por meio de sentença condenatória,
apenadas com reclusão em regime fechado. Cada entrevista foi feita em
duas sessões. Na primeira, depois de explicitados os propósitos da
pesquisa e o procedimento técnico da história oral de vida, deixou-se que
o discurso do depoente fosse o mais livre possível, com mínimas
intervenções, já na segunda sessão foram feitas questões mais diretivas a
partir do depoimento anterior e/ou de outros depoimentos. As entrevistas
foram realizadas na cidade de Uberlândia, MG, na Colônia Penal Professor
Jacy de Assis, instituição inaugurada em setembro de 1998, configurando-
se como um “estabelecimento de passagem”, no qual os presos cumprem penas
enquanto aguardam julgamento ou recambiamento para penitenciárias, mas
também onde, pelas próprias condições do sistema penitenciário,
condenados cumprem sentença. Observe-se que, para a preservação da
identidade dos entrevistados foram-lhes atribuídos nomes fictícios. No
processamento das entrevistas os depoimentos foram editados sem
preocupação em transcrever interjeições, pausas ou vícios de linguagem,
uma vez que o interesse não recai sobre questões específicas da
linguística ou aspectos de expressões da oralidade, de modo que na
conversão das narrativas orais à forma escrita, buscou-se adequação aos
padrões gramaticais, garantindo a preservação integral do conteúdo dos
textos orais, inclusive palavras e expressões próprias daquele espaço
social, remetendo seus significados, quando aparecem ao longo do texto,
em notas de rodapé. (RESENDE, 2010, p. 80)

49 PRESCHI, 1961 apud BARATTA, 2011, p. 183/184

50 Conjunto de valores, individuais ou coletivos, considerados


universalmente como norteadores das relações sociais e da conduta dos
homens. (HOUAISS, 2009, p. 1316)

51 R. BERGALLI, [1976], p. 66. Para crítica da ideologia da


ressocialização, cf., também, R. BERGALLI, [1982].

52 “A moral é a regra do bem proceder, isto é, de distinguir o bem do


mal. Funda-se na observância da lei de Deus. O homem procede bem quando
tudo faz pelo bem de todos, porque então cumpre a lei de Deus.” (KARDEC,
2010a, p. 383) – Com base neste conceito de moral, conclui-se que a
Educação Moral é o processo no qual se possibilita ao indivíduo, a tomada
de consciência das atitudes consideradas benéficas ou maléficas para si
próprio e para o grupo em que vive, estimulando-o a agir no bem. É um
processo de desenvolvimento de virtudes em detrimento dos vícios que
ainda fazem parte da personalidade do indivíduo.

53 “O hábito é uma esteira de reflexos mentais acumulados, operando


constante indução à rotina. Até agora, no mundo, a nossa justiça cheira a
vingança e o nosso amor sabe a egoísmo, pelo reflexo condicionado de
nossas atitudes irrefletidas nos milênios que nos precedem o “hoje”. Não
podemos desconhecer, todavia, que somente adotando a bondade e o
entendimento, com a obrigação de educar-nos e com o dever de servir, como
hábitos automáticos nos alicerces de cada dia, colaborando para a
segurança e felicidade de todos, ainda mesmo à custa de nosso sacrifício,
é que refletiremos em nós a verdadeira felicidade, por estarmos nutrindo
o verdadeiro bem.” (XAVIER, 2013e, p. 83,85)

54 “A virtude, no mais alto grau, é o conjunto de todas as qualidades


essenciais que constituem o homem de bem.” (KARDEC,2010b, p. 356) A
filosofia espírita define bem como sendo “[...] tudo que é conforme a lei
de Deus; o mal, tudo que lhe é contrário. Assim, fazer o bem é proceder
de acordo com a lei de Deus. Fazer o mal é infringí-la.” (KARDEC, 2010a,
p. 383) Portando o homem de bem é aquele que tem suas ações pautadas nas
leis divinas. E, se houver dúvida quanto à qualidade de uma ação, a
filosofia espírita esclarece: “Estando sujeito ao erro, não pode o homem
enganar-se na apreciação do bem e do mal e crer que pratica o bem quando
em realidade pratica o mal? “Jesus disse: vede o que queríeis que vos
fizessem ou não vos fizessem. Tudo se resume nisso. Não vos
enganareis.””(KARDEC, 2010a, p. 383/384)

55 “A fraternidade, na rigorosa acepção do termo, resume todos os deveres


dos homens, uns para com os outros. Significa: devotamento, abnegação,
tolerância, benevolência, indulgência. É, por excelência, a caridade
evangélica e a aplicação da máxima: “Proceder para com os outros, como
quereríamos que os outros procedessem para conosco.” O oposto do egoísmo.
A fraternidade diz: “Um por todos e todos por um.” O egoísmo diz: “Cada
um por si.”” (KARDEC, 2007, p. 259)

Publicado por: NEILSON JOSÉ DE CASTRO JUNIOR

O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do


canal colaborativo Monografias. O Brasil Escola não se responsabiliza
pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do
autor. Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse:
http://www.brasilescola.com.

Você também pode gostar