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NUNCA É SÓ FUTEBOL

Por Jorge Alexandre Alves*

Na infância muito pobre no Engenho de Dentro, sonhei com o futebol. A bola era
o brinquedo mais barato, mais acessível. E dava asas à imaginação e aos
sonhos de um futuro mais feliz.

Aquelas peladas na Rua Guineza, no “28 de Outubro”, no campo do Laguna, na


Associação do Encantado ou no campo da Bento me faziam esquecer da vida
difícil que levava. Éramos todos Zico, Sócrates, Romário, Careca, Reinado e
Maradona.

Nas peladas da infância sumiam por breves instantes as privações domésticas,


a incerteza de onde morar, a falta de perspectiva de futuro... As carências todas
desapareciam no jogo de bola que transformavam meninos de subúrbio em
craques.

Como eu, tantas crianças, no lirismo de suas brincadeiras, acalentaram suas


utopias de um mundo melhor com uma bola. Como costumo dizer, nunca é só
futebol.

As partidas de Vannucci e sobretudo de Maradona, quase ao mesmo tempo,


marcam na minha memória o começo do fim dos anos 1980. A década já se foi
no tempo há muito, eu sei disso. Mas nas memórias afetivas elas se estendem
para além do tempo.

Por isso, as vezes ainda torço para que a cabeçada derradeira de Oscar vire gol
no final de Brasil X Itália em 1982. E o Estádio Sarriá se torne sinônimo de festa
e não de tragédia.

Da mesma forma, as vezes ainda acordo nas manhãs de domingo na expectativa


de assistir aquelas partidas do Napoli de Maradona, com a narração de Sílvio
Luiz. Em meio às minhas memórias de infância e começo de adolescência, a
década de 1980 se prolongava. Pelo menos até hoje.

Quem sou eu para falar de um gênio do esporte, o maior da Argentina? Nem


jornalista sou... Mas, diferente dos nossos maiores no violento esporte bretão,
nunca se escondeu, nunca se omitiu. Mesmo nas suas contradições pessoais.

Eduardo Galeano, outro gênio, mas da literatura latino-americana, sintetizou o


que ele foi: Diego Armando Maradona foi adorado não apenas por causa de seus
prodigiosos malabarismos, mas também porque era um deus sujo, pecador, o
mais humano dos deuses.

“El Pibe de Oro” foi a síntese mais bem acabada de que nunca é só futebol...

*Jorge Alexandre Alves quis ser Zico e Maradona, mas nunca teve intimidade
com a bola suficiente para sequer chegar perto...

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