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SOBRE A HISTÓRIA DO FILME-ENSAIO:


DE VERTOV A VARDA

Carta da Sibéria, de Marker e, no mesmo ano, a presciente caracterização


desse filme como filme-ensaio, feita por André Bazin, constituem dois marcos
históricos no surgimento do filme-ensaio com base no legado literário e fotográfico
que o precede e na cultura do pós-guerra em que se desenvolveu. Porém, apesar
da importância histórica e mítica desse momento, em 1958/1959, há uma
história especificamente cinematográfica que a precede, inserida na evolução do
documentário e do cinema de vanguarda durante a primeira metade do século XX.
A temática e as inovações dessas tradições anteriores, contrapostas à predominância
do cinema narrativo, antecipam parcialmente as inovações mais pronunciadas dos
filmes-ensaio. Igualmente importantes, porém, são as forças sociais e institucionais
que criam novas estruturas cinematográficas para uma recepção crítica que
distinguiria o filme-ensaio e seu discurso na segunda metade do século XX. Na
década de 1940, a dinâmica de uma recepção interativa de ideias, associada aos
documentários e filmes de vanguarda das décadas precedentes, iria se fundir a outras
transformações na estética e na tecnologia do cinema, para introduzir, mais visível
e generalizadamente na França, a prática do filme-ensaio. Essa prática continuou a
evoluir e hoje assume um lugar crítico na cultura cinematográfica mundial.
À medida que se desenvolve em e a partir dessas tradições do documentário
e da vanguarda, a história do filme-ensaio sublinha um ponto crítico central: o
ensaístico não deve necessariamente ser visto simplesmente como uma alternativa a
qualquer uma dessas práticas (ou ao cinema narrativo); antes, ele rima com elas e as
reformula temporalmente como contrapontos dentro delas e para elas. Situado entre
as categorias do realismo e da experiência formal e sintonizado com as possibilidades
da "expressão públicà', o filme-ensaio sugere uma apropriação de certas práticas

O f'ilme-enaalo 3

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