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FACULDADE DE DIREITO
DEPARTAMENTO DE DIREITO PÚBLICO
CURSO DE DIREITO
FORTALEZA
2021
TÚLIO GRUSKA BENEVIDES FIGUEIRÊDO
FORTALEZA
2021
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação
Universidade Federal do Ceará
Biblioteca Universitária
Gerada automaticamente pelo módulo Catalog, mediante os dados fornecidos pelo(a) autor(a)
1. Impressão 3D. 2. Manufatura aditiva. 3. Modelos de impressão 3D. 4. Impostos sobre o consumo. I.
Título.
CDD 340
TÚLIO GRUSKA BENEVIDES FIGUEIRÊDO
Apresentado em:__/__/____.
BANCA EXAMINADORA
_______________________________________________
Prof. Dr. Hugo de Brito Machado Segundo (Orientador)
Universidade Federal do Ceará (UFC)
______________________________________________
Prof. Dr. Carlos César Sousa Cintra
Universidade Federal do Ceará (UFC)
_____________________________________________
Líslie de Pontes Lima Lopes
Universidade Federal do Ceará (UFC)
AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador, Prof. Dr. Hugo de Brito Machado Segundo, por mesclar críticas
pertinentes com a compreensão da dificuldade que é produzir um trabalho científico em meio
à vida de estudante universitário e estagiário, durante um período de tantas incertezas. Agra-
deço o incentivo e a liberdade imprescindíveis para a finalização desta pesquisa.
Aos professores Dr. Carlos César Sousa Cintra e Líslie de Pontes Lima Lopes, pela
disposição em ler meus escritos e pelo enriquecimento dado ao meu trabalho, com suas ilus-
tres participações e avaliações na minha banca.
À minha mãe, Jesoni Gruska Benevides, por todo o apoio que me concedeu na minha
formação, pelo recíproco amor incondicional e por ser a minha grande inspiração de vida.
Certamente, sem ela, nunca chegaria aonde estou.
À minha tia e madrinha, Marinina Gruska Benevides, pelos valorosos ensinamentos e
incentivo na minha formação, além de ser a responsável pela revisão gramatical deste traba-
lho.
Ao meu pai, Navarro Brito Figueirêdo, pelo suporte e pelo amor na construção da mi-
nha vida.
À minha irmã, Nina Gruska Benevides Figueirêdo, minha eterna companheira de brin-
cadeiras, travessuras, viagens e grandes momentos, nesta aventura chamada vida.
Ao meu irmão e amigo, Caio Maia Figueirêdo, pelo carinho e pela permanente torcida
pelo meu sucesso.
A Maria Almeida Alves, minha eterna babá e minha segunda mãe, por todo o carinho
e cuidado que me dispensou ao longo da vida.
Ao meu amor, Isabel Claudia May Thomas, pela dedicação e incentivo dispensados
nos anos finais da minha formação e no preparo desta monografia; principalmente, por escutar
os sonhos e as angústias de um jovem estudante.
Ao meu amigo de infância, Bruno Freire Braun Chaves, pelo auxílio que me ofereceu
na elaboração deste trabalho e por sua longa amizade.
Ao meu querido amigo, Mateus Uchoa Ayres Carlos, pela sua disposição em conferir
a formatação desta monografia e pelo convívio engrandecedor.
À minha prima e melhor amiga, Eduarda Figueirêdo Silveira, pelo cuidado e carinho
recíprocos, no decorrer da minha jornada.
Ao meu amigo mais antigo, Rafael de Almeida Bessa, pelo companheirismo e pelos
enriquecedores debates ao longo desta pesquisa.
Ao meu cunhado e amigo, Jáder Onofre de Morais Neto, pela vital ajuda na apresenta-
ção deste trabalho, com sua notável expertise nas técnicas com o Microsoft Power Point.
A toda a equipe do Dias, Brasil e Silveira Advocacia; em especial, ao Dr. Rodrigo Sil-
veira Lima, meu chefe e orientador de estágio, pelas valiosas lições no âmbito do direito pú-
blico e da prática forense, bem como pelo enorme auxílio que me ofertou na minha monogra-
fia, e ao Dr. Pedro Henrique de Araújo Cabral, meu ex-chefe e orientador de estágio, por
acreditar em mim e pelos importantes ensinamentos de ordem teórica e prática, fundamentais
para minha formação.
Aos professores, amigos, colegas e funcionários da Faculdade de Direito, pelos mo-
mentos de felicidade e de aprendizado, sem os quais, nunca teria terminado o meu curso.
Aos meus queridos amigos e familiares pelo apoio constante.
RESUMO
O uso das impressoras 3D, em razão das diversas vantagens decorrentes desta tecnologia, é
prática que se torna cada vez mais comum nas atividades econômicas e no âmbito doméstico.
A impressora 3D tem o condão de ser utilizada tanto para a venda de materiais quanto para o
uso próprio. Estando-se diante de uma tecnologia disruptiva, que foge à lógica dos negócios
tradicionais, as discussões sobre as normas tributárias vigentes aplicadas aos negócios que
lhes são relativos é oportuna. O presente trabalho busca analisar os aspectos tributários dos
negócios relativos à impressão 3D, tendo em vista os produtos manufaturados aditivamente e
os próprios modelos de impressão 3D. Estes, igualmente, são passíveis de negócios jurídicos,
mormente, por meio virtual. Para o fim proposto, a pesquisa se limita à análise dos impostos
sobre o consumo – IPI, ICMS e ISS – passíveis de incidir sobre a atividade e, de igual modo,
busca-se compreender a aplicação dos impostos no caso de impressão de objetos tridimensio-
nais para o uso próprio. O trabalho leva em consideração a produção de autores de interesse
para o tema tratado, bem como precedentes judiciais e pareceres da Administração Tributária.
Conclui-se que as normas tributárias vigentes são aplicáveis às atividades com impressão 3D.
The use of 3D printers, due to the innumerable advantages of this technology, is a practice
which has become more and more common in the context of economic activities and in the
household. 3D printing can be used in business and for self-use. Considering the fact that it is
a disruptive technology, different from traditional forms of business, it can lead to discussions
about existing tax laws in Brazil. The present article analyses the tax-related aspects of busi-
nesses employing 3D printing, taking into consideration the manufactured products and the
blueprints – which can be subject to trading, especially by virtual means. Therefore, this re-
search limits itself to the consumption taxes used in the context of 3D printing and, equally,
studies those taxes applied to 3D printing for self-use. This work takes into consideration rel-
evant publications about the subject in study, precedents, and position papers of the Tax Ad-
ministration. It concludes that the current tax laws can be applied to the activities involving
3D printing.
1 INTRODUÇÃO............................................................................................................... 9
2 BREVE ANÁLISE SOBRE A TECNOLOGIA DAS IMPRESSORAS 3D.............. 13
2.1 Nomenclatura, conceito e histórico............................................................................... 13
2.2 Funcionamento das Impressoras 3D. Principais métodos de impressão 3D............. 15
2.3 Modelos de impressão 3D............................................................................................... 17
2.4 Potencialidades da impressão 3D................................................................................... 19
3 IPI. IMPRESSÃO 3D E INDUSTRIALIZAÇÃO........................................................ 21
3.1 Estudo sintético do Imposto sobre Produtos Industrializados.................................... 22
3.2 Impressão 3D enquanto industrialização. Solução de Consulta Cosit nº 97 de 2019
................................................................................................................................................. 25
3.3 Incidência do IPI na manufatura aditiva...................................................................... 28
3.4 IPI e a impressão 3D de objetos para uso próprio....................................................... 29
4 ICMS E ISS...................................................................................................................... 31
4.1 Noções gerais sobre o ICMS........................................................................................... 31
4.2 Noções gerais sobre o ISS............................................................................................... 38
5 IMPRESSÃO 3D NA ATIVIDADE COMERCIAL. ICMS E ISS............................. 43
5.1 Incidência do ICMS na manufatura aditiva................................................................. 43
5.2 Impressão 3D por encomenda. ICMS x ISS................................................................. 45
5.3 ISS sobre a impressão 3D............................................................................................... 47
5.4 ICMS e ISS na impressão 3D de objetos para uso próprio......................................... 49
6 TRIBUTAÇÃO DOS MODELOS DE IMPRESSÃO 3D. ICMS E ISS.................... 52
6.1 Natureza jurídica dos modelos de impressão 3D......................................................... 52
6.2 ICMS nas operações com modelos de impressão 3D................................................... 54
6.3 ISS e as operações com os modelos de impressão 3D.................................................. 56
6.4 A (im)possibilidade de tributar a encomenda de modelo de impressão 3D.............. 61
7 CONCLUSÃO................................................................................................................ 65
REFERÊNCIAS................................................................................................................... 68
ANEXO A – LISTA DE SERVIÇOS ANEXA À LEI COMPLEMENTAR Nº 116, DE 31
DE JULHO DE 2003............................................................................................................ 73
9
1 INTRODUÇÃO
cada vez maior de impressoras 3D desktop, é dizer, impressoras 3D compactas, que podem ser
utilizadas por uma pessoa natural no conforto de sua casa (ASSIS, 2018).
Uma interessante questão sobre tal tecnologia é o fato de que não é limitada pela com-
plexidade do desenho e do objeto a ser impresso. A dificuldade que possui uma impressora
3D para a produção de uma réplica em miniatura da fachada de uma catedral barroca e para a
manufatura de um mero cubo é exatamente a mesma (ORTEGA, 2016).
Diante disso, é importante explicitar que o objeto a ser impresso em três dimensões
não surge simplesmente, mas precisa de ser desenvolvido, de forma semelhante à produção de
um desenho no computador, ou escaneado, por meio de aparato para escaneamento em três
dimensões. Com tal desenho, terá a impressora a capacidade de realizar a produção do materi-
al.
O desenvolvimento de novas tecnologias, ao tempo em que traz diversas comodidades
e facilita a vida daqueles que delas se utilizam, implica em problemas de ordem teórica e prá-
tica. Refletindo sobre o assunto, Harari (2018) entende que o desenvolvimento da tecnologia
coloca a sociedade diante de impasses que a própria filosofia e a ciência em geral não têm
condições de dar respostas e sentidos necessários a tempo de, realmente, resolver tais ques-
tões, visto que os problemas decorrentes destas tecnologias se desenvolvem de maneira mais
rápida do que os próprios filósofos e cientistas conseguem de fato compreendê-los.
Para o Direito, a evolução dessas tecnologias também se desdobra em desafios, porque
trazem novas relações, negócios e realidades distintas daquelas já previstas no ordenamento
jurídico.
Sob a perspectiva do Direito Tributário, os desafios mostram-se ainda mais complexo,
pois o modelo de tributação existente foi pensado para uma realidade econômica tradicional.
E, no caso dos impostos sobre o consumo, ainda baseado na diferenciação de tributos entre
atividades industriais, comerciais e de prestação de serviços, tal modelo de tributação está
sujeito a abalos diante das mudanças trazidas pelas tecnologias disruptivas que têm o condão
de pôr em xeque a forma de tributar as diversas atividades econômicas; destacando-se, em
específico, a impressão 3D (VEITZMAN, 2017).
A utilização da tecnologia de impressão 3D torna-se cada vez mais comum na conse-
cução de determinadas atividades econômicas e no contexto doméstico. Desse modo, a des-
peito de, em uma primeira análise, parecer um problema distante, as situações relativas à tri-
butação das atividades por meio de impressão 3D se mostrarão ainda mais presentes.
11
Nessa perspectiva, vale lembrar que a própria Receita Federal do Brasil tratou, recen-
temente, sobre o assunto na Solução da Consulta nº 97 – Cosit (BRASIL, 2019). E, por sua
vez, a Secretaria de Economia do Distrito Federal, também, analisou o assunto na Solução de
Consulta Cotri 5 de 2017 (DISTRITO FEDERAL, 2017).
Considerando esse contexto, o presente trabalho busca analisar os aspectos tributários
da impressão tridimensional de objetos, sob a perspectiva dos impostos sobre o consumo –
IPI, ICMS e ISS. De igual modo, investigar-se-á aqui, na perspectiva dos citados tributos, os
modelos para impressão 3D – arquivos digitais tridimensionais -, buscando-se analisar a tribu-
tação dos negócios jurídicos sobre tais arquivos, notadamente, em relação às negociações via
internet, existentes em relação a tais modelos.
Para tanto, levará em consideração, para a cobrança dos citados tributos, a realização
da impressão 3D para fins comerciais – produção, encomenda e comercialização - e para o
uso próprio – seja pessoal ou para a consecução de determinada atividade econômica. Tam-
bém, sob semelhante viés, serão analisados os modelos para impressão: o seu desenvolvimen-
to e os negócios jurídicos que lhe são relacionados.
Foi adotado um método de pesquisa qualitativo, com a análise crítica de normas, livros
e artigos científicos relativos ao Direito Tributário, à impressão em 3D e às novas tecnologias.
O exame dos precedentes dos Tribunais, notadamente do Superior Tribunal de Justiça e do
Supremo Tribunal Federal, possibilitou o enriquecimento do debate aqui apresentado, do
mesmo modo que a análise dos pareceres e soluções dados pela Receita Federal e pela Receita
do Distrito Federal, sobre a matéria. À pesquisa bibliográfica empreendida junto à produção
de autores contemporâneos se somou o levantamento de palestras e documentários sobre no-
vas tecnologias.
É importante recordar que, de modo geral, a análise dos aspectos tributários da im-
pressão em 3D perpassa também a compra e a produção dos aparatos físicos que envolvem a
própria impressora e os insumos utilizados para a impressão tridimensional. Da mesma forma,
pode-se considerar a própria fiscalização a ser realizada pelos órgãos fazendários para a co-
brança dos tributos relativos à atividade. Considerando que a compra e a produção da impres-
sora e dos insumos seguem a lógica tradicional de tributação, não serão analisadas no presente
trabalho. Tampouco, analisar-se-á a fiscalização, vez que faz parte de outro debate, o qual,
não obstante a sua relevância, não condiz com os objetivos aqui propostos.
Para uma melhor compreensão da atividade, far-se-á, no segundo capítulo, uma breve
explicação da tecnologia das impressoras 3D, dos principais métodos de fabricação, dos mo-
12
delos para impressão 3D e das potencialidades da tecnologia. Com isso, nos capítulos seguin-
tes do trabalho, será feita a análise dos citados aspectos tributárias relativos à atividade.
No terceiro capítulo, será estudado o IPI, analisando-se as suas hipóteses de incidência
e outras questões relevantes, para, em seguida, analisar a sua possível aplicação aos negócios
relativos à impressão 3D. De igual modo, será tratada a possibilidade de incidência do tributo
quando da impressão de objetos para uso próprio
No quarto capítulo, far-se-á uma análise em apartado do ICMS e do ISS, com o escopo
de explicar suas hipóteses de incidência e outros assuntos que lhe são de importância. Com
isso, será mais fácil compreender a incidência dos tributos à atividade.
No quinto capítulo, será feito o estudo das possibilidades de incidência de ambos os
tributos, buscando-se evitar possíveis conflitos de competência. Ademais, será analisada a
possibilidade de ambos os tributos no caso de impressão 3D de objetos para uso próprio.
A análise, no sexto capítulo, será voltada aos modelos de impressão 3D, tendo-se o fi-
to de estudar as possíveis formas de incidência do ICMS ou do ISS sobre os negócios que lhes
são relativos.
13
uso do termo acaba por ser não apenas mais atrativo, como também de memorização e de
pronunciação mais fácil se comparado às expressões “manufatura aditiva” e “prototipagem
rápida”.
Não obstante existirem opiniões no sentido de diferenciar a “manufatura aditiva” da
“prototipagem rápida”, ambas as nomenclaturas, juntamente com “impressão 3D”, serão tra-
tadas neste trabalho como sinônimas.
A American Society for Testing and Materials (ASTM) entende a manufatura aditiva
como: “um processo de adesão de materiais para fabricação de objetos a partir de um modelo
3D virtual, normalmente, por acamamento, em oposição às metodologias de manufatura sub-
trativa [...]”1. Essa definição pode ser aplicada à utilização da manufatura com, praticamente,
toda espécie de material, incluindo metais, cerâmicas, polímeros e biológicas (FRAZIER,
2014).
A manufatura aditiva pode ser definida como um processo de adição de materiais em
camadas sucessivas, a partir de um arquivo digital imprimível, de modo automatizado, para
obtenção de um objeto tridimensional; ou, como aduz Volpato (2017, p.16):
1
Tradução autoral.
15
É importante, neste momento, fazer o seguinte adendo: não se pode ignorar que o sur-
gimento de novas tecnologias – inclusive as disruptivas – não é instantâneo, não é proveniente
apenas da criatividade daqueles que as inventam, mas são o resultado da combinação de di-
versas tecnologias já existentes e de todo um desenvolvimento técnico que as procedem.
Nesse sentido, deve-se salientar que, antes da invenção de Hull, houve tecnologias que
aspiravam à produção de uma máquina de impressão em três dimensões. Porém, como o cita-
do inventor logrou criar a primeira impressora 3D e como não há intenção de aqui realizar um
enorme apanhado histórico da tecnologia analisada, não se pretende fazer a análise dos prede-
cessores da Estereolitografia.
Após a fundação da 3D Systems, outras companhias, ainda na década de 1990, surgi-
ram no mercado, desenvolvendo novas técnicas voltadas à manufatura aditiva. Dentro desse
contexto, pode-se citar a Strasys Ltd., Cubital e Helisys Inc., cada qual com seu próprio méto-
do de impressão em três dimensões. A título de curiosidade, hoje a Strasys Ltd. é a maior em-
presa, atuante no mercado de impressoras 3D.
De início, o custo dos processos de impressão era extremamente alto, havendo o sur-
gimento de processos mais baratos em meados da década de 1990 (WOHLERS; GORNET,
2014). A impressão 3D, entretanto, manteve-se, durante este período, restrita ao seguimento
industrial, manufaturando protótipos e peças para a indústria, principalmente.
Nos anos de 2000, surgiram as primeiras impressoras 3D desktop, isto é, compactas,
com tamanho suficiente para serem utilizadas no uso doméstico e no contexto de pequenos
negócios. Essa nova perspectiva de impressoras 3D foi trazida tanto pelas empresas que já
dominavam o mercado, como a Strasys Ltd., quanto por novos players voltados à produção
deste tipo de impressora, por exemplo, a MakerBot Industries (PRINT THE LEGEND, 2014).
O desenvolvimento das impressoras desktop foi fundamental para a maior populariza-
ção da atividade, possibilitando a sua execução por pessoas naturais em suas residências e por
pequenos negócios na consecução de suas atividades econômicas.
Na década de 2010, o número de players no mercado de impressão 3D teve um au-
mento abrupto, incluindo as empresas desenvolvedoras de novas impressoras desktop, como a
FormLabs (WOHLERS; GORNET, 2014). Atualmente, há um número substancial de marcas
e modelos de impressoras 3D disponíveis no mercado.
2
Em português, Estereolitografia.
3
Em português, Deposição por Material Fundido, ou Modelação por Deposição de Material Fundido.
4
Sinterização por Laser Seletivo.
5
Macromoléculas formadas pela união de substâncias simples, os monômeros. Os polímeros podem ser naturais,
como a celulose, ou sintéticos, como o PVC.
17
senho ao material, enquanto a plataforma lhe dá profundidade e altura. Com o tempo, o mate-
rial em plástico transforma-se num objeto, devidamente, impresso.
Dentre as tecnologias de impressão, o FDM, no mercado, dispõe dos menores preços e
utiliza materiais de fácil localização, além de possuir a tecnologia com o funcionamento mais
simples. Em virtude dessas vantagens, é a tecnologia de manufatura aditiva mais popular e
difundida, sendo a mais comum no uso doméstico (MONTEIRO, 2015).
Por fim, no método SLS, o objeto a ser construído é formado, por meio, “da deposição
de uma camada de determinado material em forma de pó (cerâmica, vidro, aço e etc. [sic]),
cujos grânulos são fundidos (sinterização à laser) seletivamente por um feixe de laser” (AS-
SIS, 2018). O método é semelhante à Estereolitografia. Todavia, diferentemente desta tecno-
logia, o material utilizado está em estado sólido, e não em líquido.
As vantagens deste método são a possibilidade de reutilização do pó descartado na
produção da peça e a gama maior de materiais (cerâmica, termoplásticos e metais) que podem
ser utilizados em comparação com o STL. (MONTEIRO, 2015).
Portanto, diante do exposto, é possível perceber que os métodos citados, não obstante
serem distintos, guardam em comum o fato de que o material utilizado na manufatura sofre
transformações físicas e químicas, para ser modelado, dando origem a um novo objeto.
Para ser executada a impressão 3D de algo, faz-se preciso existir, previamente, um ar-
quivo tridimensional imprimível, contendo as características do objeto a ser impresso. Tal
arquivo é lido pela máquina que, por sua vez, manufaturará o objeto. Esse arquivo tridimensi-
onal é o modelo para impressão 3D.
Em relação à nomenclatura, não existe um nome oficial para o modelo de impressão
3D, podendo ser denominado deste modo, de “arquivo digital imprimível”, “modelo geomé-
trico 3D” ou, simplesmente, “arquivo CAD”.
A última denominação está relacionada a um dos meios pelos quais é desenvolvido o
modelo de impressão, pois, “[n]ormalmente, essa representação é na forma de um modelo
geométrico 3D, originado de um sistema CAD (computer-aided design)” (VOLPATO, 2017,
p. 16).
Independentemente da denominação utilizada, é importante perceber que se trata de
um modelo geométrico em 3D, digital, contendo um objeto capaz de ser fabricado por meio
de manufatura aditiva.
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O modelo geométrico em 3D pode ser obtido de duas formas: pela modelagem tridi-
mensional do arquivo, a criação e desenho do objeto a ser impresso, por meio de softwares,
como AutoCAD, TurboCAD, SolidWorks, e pelo escaneamento tridimensional de um deter-
minado objeto (GOMES, 2020).
Na primeira, o modelo é criado, virtualmente, no computador; enquanto, na segunda,
copia-se um objeto tridimensional já existente no meio material, para o meio virtual. Em am-
bas as formas, ao final, o modelo poderá ser materializado do meio digital para o meio físico,
mediante a manufatura aditiva.
Ao ser criado, o modelo de impressão 3D deve ser salvo e posto num formato que seja
capaz de ser lido pela impressora 3D que irá confeccioná-lo.
É fundamental perceber que o modelo de impressão 3D não se confunde com o objeto
a ser manufaturado. O modelo contém a representação em três dimensões do objeto, capaz de
ser lido pela impressora 3D. Por suposto, o modelo poderá dar origem ou não a um objeto
material a depender da vontade daquele que dispõe do modelo. Não existe obrigatoriedade
alguma no sentido de que o modelo tridimensional deva ser impresso em três dimensões.
Sob o mesmo viés, o projeto de uma casa desenvolvido por um arquiteto não se con-
funde com a casa, posteriormente, construída – ou a ser construída - com base nesse projeto.
Outro ponto importante é compreender se o modelo de impressão 3D se trata ou não
de um software. Considerando que a impressora 3D é um computador com a capacidade de
ler o arquivo com o modelo geométrico para impressão 3D e manufaturá-lo, deve-se definir se
o modelo é um software utilizado pela impressora 3D ou um mero arquivo de computador.
Sem a presença do modelo de impressão 3D, a impressora já possui um programa, pa-
ra fazê-la funcionar e para lhe dar a capacidade de ler o arquivo e realizar a impressão, exis-
tindo, inclusive, impressoras com a capacidade de salvar modelos (GOMES, 2020).
O art. 1º Lei nº 9.609 (BRASIL, 1998), responsável pela regulação da proteção da
propriedade industrial de programas de computador, pressupõe, para a caracterização de um
software, os seguintes elementos: “[...] (i) conjunto organizado de informações em linguagem
natural ou codificada; (ii) de emprego necessário; para (iii) que uma máquina automática de
tratamento de informação ou equipamentos periféricos; (iv) funcionem de modo e para fins
determinados” (GOMES, 2020).
Diante disso, Gomes (2020) entende que o modelo de impressão 3D não se configura
como um software, por não atender ao requisito do item (iv), ou seja, o modelo “não é de em-
prego necessário para que a impressora 3D funcione de modo e para fins determinados.”
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Passados mais de trinta anos da invenção da primeira impressora 3D, é possível notar
um evidente desenvolvimento e aprimoramento de suas tecnologias, com a crescente criação e
melhorias dos métodos de manufatura aditiva. Situação esta que aumenta a possibilidade de
fabricação de diversos materiais utilizando essa tecnologia.
Atualmente, já é possível realizar a manufatura aditiva de, praticamente, todo tipo de
objeto, incluindo, materiais biológicos. Todavia, a limitação da impressão 3D acaba por não
ser apenas uma questão de técnica, mas, ainda, financeira, relacionada à viabilidade econômi-
ca da produção de determinados materiais, tanto a nível domiciliar quanto laboratoriais e in-
dustriais.
No contexto do uso doméstico da impressão em 3D, é comum a fabricação de vasos,
pratos, ferramentas de construção – tais como, martelos e furadeiras manuais -, brinquedos e
objetos de decoração, dentre outros utensílios.
As possibilidades de impressão, com uso de materiais não-orgânicos, perpassam a
produção de ferramentas, peças para indústria e peças para a composição de máquinas.
20
Além disso, as impressoras possuem aplicação médica na produção de, por exemplo,
próteses customizadas, implantes dentários e óculos de grau (SCHUBERT, et al., 2014).
Também, na medicina, as impressoras 3D já possuem a capacidade para impressão de
órgãos e tecidos humanos, oferecendo capacidade para ajudar pacientes com urgência de
transplantes, possuindo uma maior flexibilidade para ajustar as estruturas orgânicas às neces-
sidades de cada pessoa (GOPINATHAN; NOH, 2018).
Outra interessante possibilidade está relacionada à capacidade de produção de alimen-
tos por meio da manufatura aditiva. As impressoras 3D têm aptidão para produzir diversos
alimentos, como chocolates, massas, batatas, queijo processado, bolos e, até mesmo, carne.
Essa vertente demonstra vantagens relacionadas a customização de alimentos para o consumi-
dor, tanto em questões nutricionais como em questões estéticas (LIU, et al., 2017).
A construção civil tampouco pode ser excluída do uso da manufatura aditiva. Com ro-
bustas e enormes impressoras 3D, é possível realizar a impressão de casas inteiras, utilizando,
principalmente, o concreto como material. A impressão, nesse caso, ocorre de modo seme-
lhante ao FDM utilizado com polímeros e metais. A construção de casas por meio de impres-
soras 3D mostra-se mais eficiente, considerando que utiliza menos materiais do que uma
construção ordinária – sendo, consequentemente, benéfica para o meio ambiente -, executa a
obra em tempo mais curto, reduz o custo com mão de obra e dá mais liberdade criativa aos
arquitetos (SANJAYAN, et al., 2019).
A despeito dos imensos benefícios no uso da tecnologia, a impressão 3D, também,
demonstra os seus perigos quando se constata a possibilidade de fabricação de armas de fogo,
inteiramente, por meio de manufatura aditiva. Nesse contexto, pode-se citar a Liberator - pri-
meira arma de fogo, utilizando-se o plástico como material, possível de ser produzida inteira-
mente por meio de impressora 3D (PRINT THE LEGEND, 2014).
O perigo, no caso, relaciona-se ao fato de que a produção de tais armas, por meio de
FDM, pode ser facilmente executada com uso de uma impressora 3D desktop, basta que se
tenha o modelo de impressão 3D adequado para executá-la.
Portanto, como é possível vislumbrar, há inúmeras possibilidades de produção com o
uso das impressoras 3D, as quais são capazes de levantar questões das mais diversas ordens,
com reflexos em normas de natureza pública e nas que disciplinam as relações interindividu-
ais e os interesses privados.
21
Dentre os impostos sobre o consumo incidentes nas operações que envolvem a impres-
são 3D, far-se-á primeiro a análise do Imposto sobre Produtos Industrializados e sua possibi-
lidade de incidir sobre os negócios relativos à atividade. Nesse sentido, serão exploradas bre-
vemente as hipóteses de incidência do IPI, bem como outros aspectos relativos ao tributo,
dentre os quais, a industrialização para os fins de sua incidência. Desse modo, chegar-se-á à
compreensão de se a manufatura aditiva pode ser considerada industrialização e da possível
incidência do tributo sobre as operações relativas aos produtos obtidos por esse meio.
Igualmente, a análise incluirá a manufatura aditiva de objetos pelo contribuinte do IPI
e pelo não-contribuinte do imposto, com o fim de exploração da sua atividade econômica e
por particular, pessoa natural, para o uso próprio.
Ademais, deve-se ressaltar que a análise deste capítulo não pretende incluir os mode-
los de impressão 3D - os arquivos digitais imprimíveis. Explica-se isso pelo fato de que a in-
dustrialização pressupõe o trabalho e a modificação de objeto(s) físico(s), tendo como produto
outro objeto, de igual modo, existente no mundo de átomos. E os modelos, por sua natureza,
são arquivos digitais, inexistindo no mundo corpóreo, pelo que não faria sentido tratar da in-
dustrialização de algo que sequer possui o condão de ser industrializado.
De forma contrária, vale destacar o posicionamento de Macedo (2018), no sentido de
que o modelo digital, uma vez que possui a capacidade de ser, em momento posterior, manu-
faturado, deveria incidir-lhe o IPI. Entende o autor, ainda, que o modelo não teria utilidade
sem a impressão 3D posterior.
O entendimento do citado autor, todavia, está eivado de equívocos. Veja-se que, con-
forme explicado no capítulo anterior (item 2.3 supra), o modelo de impressão não se confun-
de com o objeto a ser impresso, sendo, por sua natureza, duas coisas distintas. Além disso,
não é imposto ao adquirente de um modelo de impressão, seja pelo meio que for, a obrigação
de realizar a impressão tridimensional do objeto.
Seria possível argumentar, ainda, que aquele que adquire um arquivo contendo o mo-
delo para impressão 3D não buscaria o modelo, meramente, mas sim o produto que dele pode
ser obtido.
Tampouco tal argumento estaria correto. Não só inexiste a obrigação de realizar a im-
pressão, podendo-se obter o modelo sem jamais realizar a sua manufatura, como também é
impossível universalizar o intuito de todos os que obtêm tais arquivos imprimíveis. Deve-se
perceber que, ademais da impressão, alguém pode obter os direitos de um modelo para reali-
22
zar futuras operações comerciais, utilizá-lo como base para criação de um novo modelo para
impressão ou estudar o seu design. Isso apenas para citar alguns exemplos.
Portanto, não há de se falar em industrialização do modelo para impressão 3D, sendo
infundada a incidência de IPI na espécie; de modo a justificar, por consequência, a análise do
IPI relativa apenas à manufatura aditiva em si, excluindo-se os arquivos digitais imprimíveis.
O Imposto sobre produtos industrializados – IPI – é, conforme art. 153, inciso IV, da
CF/88, tributo de competência da União. No plano infraconstitucional, o CTN, em seu art. 46,
determina os fatos geradores do tributo como sendo: (i) o desembaraço aduaneiro do produto
industrializado; (ii) a sua saída do estabelecimento de contribuinte do imposto, e (iii) “a sua
arrematação, quando apreendido ou abandonado e levado a leilão”.
Cabe observar que a hipótese de incidência prevista no inciso III do art. 46 – arremata-
ção do produto industrializado – não possui relevância prática, vez que “[...] não encontra
concretização na legislação ordinária nem no RIPI [Regulamento do IPI]” (PAULSEN; ME-
LO, 2013).
De acordo com o art. 51 do mesmo diploma legal, o contribuinte do IPI é: (i) “o im-
portador ou quem a lei a ele equiparar”; (ii) “o industrial ou quem a ele a lei equiparar”, (iii) o
comerciante de produtos sujeitos ao imposto que os forneça para o industrial ou àquele, por
lei, a ele equiparado, e (iv) “o arrematante de produtos apreendidos ou abandonados, levados
a leilão”. O parágrafo único do artigo, ainda, determina que qualquer estabelecimento do im-
portador, do industrial, do comerciante ou do arrematante, para os efeitos deste imposto, será
considerado contribuinte autônomo.
Diante disso, é possível perceber que, em verdade, o IPI não incide sobre a industria-
lização per se, mas sobre determinados atos ou operações com produtos industrializados, de-
finidos no art. 46 do CTN, quando praticados por sujeito tido como contribuinte do imposto.
Por sua vez, segundo o parágrafo único do art. 46, do CTN, “considera-se industriali-
zado o produto que tenha sido submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza
ou a finalidade, ou o aperfeiçoe para o consumo.”
Aclarando o disposto no citado artigo, o Decreto nº 7.212 (BRASIL, 2010), responsá-
vel pelo regulamento do IPI (RIPI), conceitua a industrialização como operação que modifica,
aperfeiçoa ou altera o produto:
23
O art. 4º do RIPI define, para os fins de incidência do imposto, cinco espécies de in-
dustrialização: por transformação (inc. I), por beneficiamento (inc. II), por montagem (inc.
III), por acondicionamento ou reacondicionamento (inc. IV) e por renovação ou recondicio-
namento (inc. V).
A base de cálculo do imposto – o valor sobre o qual será aplicada a alíquota, para se
obter o montante do crédito tributário – deve ser o aspecto quantificado do fato gerador, não
podendo ser grandeza que lhe é estranha (MACHADO SEGUNDO, 2019).
O CTN, em seu art. 47, define as bases de cálculo do tributo quando da incidência na
importação, na saída do estabelecimento do contribuinte e na arrematação.
Na importação, a base de cálculo é o preço do produto, acrescido do imposto de im-
portação, das taxas exigidas na entrada do produto do país e dos encargos cambiais.
No caso da saída do estabelecimento do contribuinte – industrial ou não -, será consi-
derado, para o citado fim, o valor da operação responsável pela saída do produto do estabele-
cimento ou, na falta deste, o preço da mercadoria no mercado atacadista na praça do remeten-
te, ou de sua similar.
Por fim, na arrematação, a base de cálculo será o próprio preço pago quando da arre-
matação do produto em leilão.
Em relação à hipótese de incidência relativa à saída do estabelecimento, convém cola-
cionar elucidativa observação de Baleeiro (2018, p. 754) no sentido de que a operação não
seria o fato gerador do tributo, e, sim, a mera saída:
[...] o imposto sobre produtos industrializados, tendo como fato gerador o fato mate-
rial da saída de mercadoria, abstrai o motivo jurídico desta e é exigível em qualquer
circunstância em que ocorra tal saída, ainda que ela não se prenda a uma compra e
24
venda ou negócio com valor definido e claro. Pode ocorrer, p. ex., o caso de integra-
ção vertical ou horizontal entre unidades da mesma empresa ou de empresas do
mesmo grupo econômico. Até mesmo pode ocorrer doação ou destino a uso próprio
do contribuinte. O imposto recai no produto e não no negócio com o produto. O ne-
gócio não é fato gerador, mas apenas base de cálculo, quando para isso oferece prés-
timo.
Conforme art. 153, §3º, inciso II, da CF/88, o IPI é um tributo “[...] não-cumulativo,
compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores”.
O contribuinte terá de pagar, quando do recolhimento do crédito tributário, o valor devido
pelas saídas dos produtos industrializados do estabelecimento, descontados os valores do tri-
buto pagos no momento da entrada.
Ao pagar o imposto nas operações de entrada dos bens industrializados, o contribuinte
“ganhará” um crédito de IPI. Esse montante será descontado do valor devido pelo contribuinte
do imposto no mesmo período de apuração. Caso não utilize o crédito no período que lhe cor-
responde, poderá descontá-lo nos períodos subsequentes.
Cabe ressaltar que, por inexistência de previsão legal, o valor do crédito do IPI, em re-
gra, não será monetariamente atualizado nas operações seguintes, conforme entendimento do
Supremo Tribunal Federal (CARNEIRO, 2019).
Todavia, no caso de resistência infundada do fisco à creditação será possível a atuali-
zação do valor do crédito, nos termos da Súmula nº 411 do Superior Tribunal de Justiça
25
Essa atividade não será considerada industrialização se o produto resultante for con-
feccionado por encomenda direta do consumidor ou usuário, na residência do prepa-
rador ou em oficina, desde que, em qualquer caso, seja preponderante o trabalho
profissional, nos termos do art. 5º, inc. V, c/c art. 7º, II, “a” e “b”, do RIPI/2010.
Dispositivos Legais: art. 4º, inciso I e art. 5º, inc. V, c/c art. 7º, II, “a” e “b”, do RI-
PI/2010. (BRASIL, 2019)
Por esse prisma, não se considerará relevante a técnica e os outros meios físicos em-
pregados para a obtenção do produto. Basta que, na obtenção deste, venha a ocorrer operação
tida como industrialização. Desse modo, não haverá óbice legal apara incluir a impressora 3D
como ferramenta para a produção industrial, sendo importante que o produto dela obtido te-
nha as características legais de um produto industrializado.
Outra perspectiva importante, no entendimento de Melo (2013), é a ideia de estandar-
tização e homogeneidade, é dizer, a produção em massa característica da industrialização.
Desse conceito não se deve entender que todos os bens produzidos sejam exatamente iguais,
por exemplo, uma montadora de automóveis pode industrializar carros de um mesmo modelo
com cores e acessórios distintos e, ainda assim, ser considerada uma indústria. Em realidade,
para se ter tal caracterização como industrializado, imprescindível é a produção em série, sem
estar direcionada a um consumidor em específico, mas a um determinado – ou indeterminado
– coletivo de pessoas.
A impressão em 3D de objetos em série, não direcionada a um consumidor ou peque-
no grupo de consumidores específico, poderá ser considerada como uma industrialização.
Dito isso, fundamental é compreender se, além destes outros requisitos, a manufatura
aditiva se caracteriza como industrialização. Pois bem, um produto advindo duma impressora
3D, seja pelo método de FDM – para obter, por exemplo, a armação de óculos -, seja pelo
SLS – para fabricação de uma chave de fenda -, ou por qualquer outro método, ocorrerá, de
alguma forma, uma alteração no material que lhe modificará a natureza e a finalidade, poden-
do aperfeiçoá-lo para o consumo.
Por consequência, compreende-se que a produção de objetos mediante o uso de im-
pressora 3D poderá ser considerada como operação de industrialização, sendo o produto, dela
advindo, industrializado e, portanto, passível de cobrança pelo IPI, nos casos de ocorrência
dos, anteriormente, citados fatos geradores do tributo.
Ademais, deve-se analisar se a modalidade escolhida pela Solução de Consulta nº 97 –
Cosit está correta. Conforme explicado no capítulo 2 (tópico 2.2), independentemente do mé-
todo utilizado – STL, FDM ou qualquer outro -, o processo de impressão 3D estará sempre
relacionado a alterações físicas e/ou químicas dos materiais utilizados para composição do
objeto manufaturado.
28
utilizado em qualquer das outras técnicas ou, ainda, que vende a impressora 3D para esse tipo
de industrial. De igual modo, pode-se citar o caso do comerciante que compra uma peça im-
pressa em 3D e a revende para um industrial que explora atividade em indústria tradicional.
Em todos os citados casos, haverá a incidência do IPI sobre a operação.
Quanto à hipótese presente no inc. I do art. 46 do CTN, do IPI-importação, o contribu-
inte que importa o produto impresso em 3D deverá arcar com o ônus do tributo. Tal conclusão
valerá, igualmente, para a compra de materiais utilizados na impressão e na própria impresso-
ra 3D.
Abre-se parênteses para explicar que, nos casos do importador e do comerciante cita-
dos anteriormente, quando da venda de produto industrializado, poderão esses contribuintes
creditarem-se perfeitamente do montante do IPI pago pela aquisição do produto. A despeito
do fato de tais contribuintes não realizarem a industrialização propriamente, conclui-se que,
pelo entendimento jurisprudencial, a creditação ocorrerá sobre o valor pago nos bens que irão,
posteriormente, ser objeto de operações, não se podendo creditar daqueles que comporão o
ativo imobilizado do contribuinte.
Sobre a previsão do inc. III do citado dispositivo, do IPI na arrematação, como não
existe hoje regulação legal para a hipótese, não há de se falar em incidência do IPI, no caso de
arrematação de bem impresso em três dimensões.
que, nesse caso, o bem é feito para o uso do próprio contribuinte, de modo a denotar que não
há produção de bem destinada a um número maior de pessoas; havendo, todavia, a manufatu-
ra de bem personalizado.
Diante disso, perder-se-á uma das condições precípuas para a caracterização de bem
industrializado: a produção massificada, para um público não específico. Por esse viés, consi-
derando a personalização do bem, estar-se-á diante de serviço, mais especificamente, de au-
tosserviço, de modo que não se poderá tributar pelo IPI a operação.
Além disso, ainda que houvesse uma produção massificada, porém para uso e consu-
mo do próprio estabelecimento, tampouco se estaria diante de fato gerador do IPI. Como dito
no tópico 3.1, o IPI, para incidir pressupõe a ocorrência de uma das operações descriminadas
como fato gerador do imposto, operações que ocorrem entre dois sujeitos distintos. Dessa
forma, mesmo que a produção ocorra em massa, o uso do produto impresso pelo próprio con-
tribuinte afasta a incidência do imposto.
Para melhor clarificar, caso uma grande indústria contribuinte, dispondo de diversos
funcionários, executasse a impressão 3D de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), com
o fito de proteger os seus operários, na realização de seu trabalho, não ocorreria a incidência
do IPI. A despeito de se produzir o equipamento em série, para um número grande de pessoas,
os materiais estariam restritos à proteção dos funcionários da empresa, de modo que seriam
utilizados pelo próprio contribuinte, não ocorrendo operação que configure o fato gerador do
tributo.
Quanto à creditação no caso, não obstante o fato de se ter um contribuinte do imposto,
este não se poderá creditar do tributo pago na aquisição dos materiais utilizados para a produ-
ção do bem para uso próprio, pois o produto manufaturado não será considerado como indus-
trializado para fins de incidência do imposto, pelo que não poderá dar azo ao referido crédito.
Em relação aos não contribuintes do IPI, como uma pessoa natural que imprime um
vazo para decorar a sua residência ou de comerciante que imprime cabide para sua loja de
roupas, tampouco se incidirá o IPI na impressão 3D por estes agentes.
Além de não serem contribuintes do tributo, não há qualquer industrialização, nos ter-
mos já explicados anteriormente, vez que se trata de produtos para uso próprio e, por conse-
quência, personalizados, bem como não é realizada operação que justifique a incidência do
tributo.
Por conseguinte, evidente a impossibilidade de cobrança do IPI na hipótese de o bem
impresso em 3D destinar-se ao uso do próprio sujeito responsável pela operação.
31
4 ICMS E ISS
tributo encontra previsão no art. 2º, inciso II, da LC nº 87 (BRASIL, 1996), a qual inclui o
fornecimento de alimentos e bebidas em bares e restaurantes.
Abre-se parênteses para fazer uma pequena ressalva. Não obstante o interesse maior
para os fins deste estudo ser a primeira modalidade do ICMS, será relevante, também, o quar-
to tributo, relativamente à energia elétrica, no tocante ao crédito do imposto – assunto a ser
analisado mais adiante.
Explica-se que o tributo, na primeira modalidade, não incide simplesmente sobre mer-
cadorias ou, ainda, sobre quaisquer operações. Estas estão qualificadas pelos termos “circula-
ção” e “mercadorias” para fins de incidência. Dessa forma, terá o imposto, como objeto, as
operações – negócios jurídicos – sobre circulação de mercadorias; “[o] ICMS só pode incidir
sobre operações que conduzem mercadorias, mediante sucessivos contratos mercantis, dos
produtores originários aos consumidores finais” (CARRAZZA, 2009, p. 39).
Quanto ao contribuinte do ICMS sobre a modalidade, o art. 4º da LC nº 87 (BRASIL,
1996), responsável pelo regramento do tributo em normais gerias, define, como contribuinte,
pessoa física ou jurídica que realiza operações de circulação de mercadorias com habitualida-
de ou em volume que caracterize intuito comercial.
Tal previsão guarda direta relação com a natureza mercantil do imposto, indicada já no
inciso II do art. 155 da CF/88, no qual consta a sua previsão, devendo-se tributar os atos de
mercancia próprios de comerciantes, ou industriais. A lei considera como contribuinte a pes-
soa física ou jurídica que pratique atos de mercancia, circunstância comprovada pela habitua-
lidade ou pelo volume da operação de circulação de mercadorias (HARADA, 2017).
Poderá ser considerado contribuinte, também, o comerciante de fato ou irregular, basta
que realize atos mercantis com habitualidade, ainda que o faça de forma clandestina. De igual
modo, um menor – inclusive o absolutamente incapaz – poderá ser considerado contribuinte
do ICMS, se praticar, habitualmente, operações de circulação de mercadorias. Tal entendi-
mento, vale destacar, decorre do art. 126 do CTN (CARRAZZA, 2009).
O parágrafo único do art. 4º da LC nº 87 (BRASIL, 1996), considera, ainda, como
contribuintes, aqueles que, independentemente de habitualidade ou intuito comercial: (i) im-
portem mercadorias ou bens do exterior, qualquer que seja sua finalidade, e (ii) adquiram, em
licitação, mercadorias ou bens apreendidos ou abandonados.
Na visão de Harada (2017), a previsão de incidência do ICMS no caso de mera impor-
tação de mercadoria a qualquer título é inconstitucional, por estar a ir de encontro ao art. 155,
inciso II da CF/88. Veja-se que o dispositivo constitucional prevê o imposto sobre operações
33
Cabe destacar que o STJ, em sua Súmula nº 166, entende que o trivial deslocamento
da mercadoria de um estabelecimento para outro do contribuinte não constitui fato gerador do
ICMS.
Por esse viés, a circulação que enseja incidência do tributo é a econômica, responsável
pela mudança de titularidade. A ocorrência, por exemplo, de remessa de produtos para uma
exposição ou a circulação de automóvel para test-drive, a despeito de tratarem de mercadori-
as, não levaria à incidência do ICMS, pois, nas hipóteses, não houve circulação do ponto de
vista econômico, mas, meramente, físico (MACHADO SEGUNDO, 2019).
Por conseguinte, o citado ICMS deve ter por hipótese de incidência a operação jurídica
que, praticada por comerciante, produtor ou industrial, enseje a circulação de mercadoria, é
dizer, a transmissão de titularidade (CARRAZZA, 2009).
Por fim, deve-se compreender no que consiste, para os fins de incidência do ICMS, a
palavra “mercadoria”. Esta pode ser entendida como um bem móvel destinado à mercancia,
ou seja, determinado bem móvel que se destina à prática de operações mercantis. Pode-se
compreender, assim, que bem móvel é gênero do qual mercadoria é uma de suas espécies
(CARRAZZA, 2009).
Determinado objeto poderá ser ou não considerado mercadoria para fins de incidência,
devendo-se saber sua destinação para tanto. Por isso, uma impressora 3D à venda na prateleira
de uma loja de eletrônicos será considerada mercadoria, enquanto a mesma impressora 3D
utilizada por um sujeito, em sua casa, para imprimir brinquedos e os mais diversos materiais
não poderá ser considerada mercadoria.
Os bens adquiridos para uso próprio não podem ser considerados mercadorias (CAR-
RAZZA, 2009), precisamente, por não serem destinados ao comércio. Voltando-se ao exem-
plo do parágrafo anterior, caso o sujeito resolva, posteriormente, vender a sua impressora 3D,
não haveria de se cogitar em incidência do ICMS.
De igual modo, os bens adquiridos pelo contribuinte do imposto para compor o seu
ativo fixo não podem sofrer a incidência do ICMS, vez que não são, normalmente, comercia-
lizados com o intuito de lucro (PAULSEN; MELO, 2013). Por consequência, a posterior ven-
da de bem do ativo fixo não poderá ser tributada pelo ICMS.
Sobre a necessidade de se tratar a mercadoria como um bem corpóreo, esta já não se
mostra como um conceito rígido, havendo entendimento em sentido diverso tanto no texto
constitucional, quanto na jurisprudência.
Desde o seu texto originário, a Constituição da República, conforme se pode inferir do
§3º do art. 155, trata a energia elétrica, coisa incorpórea, como mercadoria, prevendo a possi-
35
bilidade de sua incidência pelo tributo. Dentro dessa perspectiva, Paulsen (2013) aduz que o
conceito de mercadoria foi ampliado pelo constituinte, para incluir esse bem incorpóreo.
Além disso, em relação aos softwares, o entendimento do STF desenvolveu-se, de iní-
cio, no RE nº 176.626, de modo a incluir, como mercadoria para fins de incidência do ICMS,
os chamados softwares de prateleira, no sentido de que, apesar de se tratar de cessão de uso do
software, a base física que veicula a “venda” do programa de computador torna-se tangível,
de modo que deverá incidir o ICMS.
No julgamento de medida cautelar na ADI nº 1.945/MT, o Supremo entendeu possível
a incidência do ICMS sobre a venda de softwares, por meio de transferência eletrônica de
dados (download), é dizer, tratou como mercadoria bem, evidentemente, incorpóreo. O de-
senvolvimento dessa compreensão justifica-se pelo fato de que novas situações devem ser
albergadas pelo Tribunal:
Cabe salientar, no entanto, que, em fevereiro de 2021, o STF, no julgamento das ADIs
de números 1945/MT e 5659/MG, considerou que não caberia a incidência do ICMS nas ope-
rações de transferência de programas de computador, seja por meio físico ou virtual. No en-
tendimento da Corte, tais negócios se tratariam de mera cessão de direito de uso, devendo
incidir não o ICMS, mas o ISS à hipótese.
Por sua vez, as bases de cálculo do ICMS estão previstas nos incisos do art. 13 da LC
nº 87 (BRASIL, 1996). Para o ICMS sobre as operações de circulação de mercadorias, é im-
portante ressaltar os incisos I, II, IV, V e VII.
Nas operações de circulação de mercadorias em que ocorre meramente a transferência
da propriedade, a base de cálculo será o valor gasto na operação, dentro dos casos de: saída da
mercadoria do estabelecimento do contribuinte; transmissão a terceiro de mercadoria em ar-
mazém geral ou depósito fechado, e transferência da propriedade da mercadoria ou do título
que a represente, quando aquela não houver passado pelo estabelecimento transmitente.
No contexto de fornecimento de alimentos e bebidas em bares, restaurantes e simila-
res, a base de cálculo será o valor da mercadoria e do serviço prestado.
Na hipótese de ocorrer operação de circulação de mercadoria com a prestação de ser-
viços, existirão duas bases de cálculo possíveis. Se o serviço prestado for de competência tri-
36
butária do município, será considerado somente o valor da mercadoria. Porém, caso o serviço
não seja da competência municipal, tomar-se-á o valor da mercadoria e do serviço como base
de cálculo.
Quando da importação de mercadorias, integrará a base de cálculo do tributo o valor
da mercadoria, o imposto de importação, o IPI – se for o caso -, o IOF-câmbio, além das ta-
xas, contribuições e outras despesas alfandegárias.
No caso de aquisição da mercadoria em licitação pública, a base de cálculo incluirá,
ademais do valor da operação, os gastos cobrados ou debitados do adquirente, incluindo, se
for o caso, valores despendidos a título de IPI e/ou imposto de importação.
Sobre as alíquotas, tem-se que, de modo geral, caberá a cada Unidade da Federação,
determinar alíquota interna para o ICMS, dentro de sua parcela territorial. Entretanto, tal de-
terminação tem limitações próprias em resoluções do Senado Federal e nos convênios cele-
brados no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) – formado pelos Se-
cretários de Fazenda (Finanças, Tributação ou Economia) de cada Estado e do Distrito Fede-
ral.
Conforme art. 155, §2º, inciso IV, da CF/88, cabe ao Senado Federal, por meio de re-
solução de iniciativa do Presidente da República ou de um terço da Casa, aprovada pela maio-
ria absoluta de seus membros, fixar alíquotas aplicáveis às operações interestaduais e às ex-
portações.
De igual modo, a resolução do Senado Federal poderá, na forma do inciso V do citado
dispositivo, estabelecer alíquotas máximas e mínimas de ICMS a serem observadas por cada
Unidade da Federação no seu âmbito de competência.
Ademais, o art. 155, §2º, inciso XII, alínea ‘g’, da CF/88 aduz que as isenções de
ICMS serão concedidas e revogadas por meio de deliberação entre os Estados, na forma regu-
lada por lei complementar. Cumpre o citado papel, a Lei Complementar nº 24 (BRASIL,
1975), a qual regula o funcionamento das celebrações de convênios no âmbito do Confaz. A
concessão de isenções ou benefícios fiscais precisará da aprovação da unanimidade dos mem-
bros do Confaz, de modo que bastará o desacordo de apenas um Secretário de Fazenda para
que não seja aprovado o convênio.
Outro ponto importante é o fato de o ICMS poder ser um tributo seletivo. Diferente-
mente do IPI, a Constituição não obriga que sejam as alíquotas do ICMS seletivas, cabendo a
cada Estado decidir pela seletividade ou não.
37
Vale destacar que Carrazza (2009) entende que o vocábulo “poderá”, presente no art.
155, §2º, inciso III, da CF/88, deve ser compreendido como um “deverá”, de modo que as
alíquotas do imposto deverão ser sempre seletivas.
Para Machado Segundo (2019), a seletividade do tributo será posta ou não a partir da
escolha do próprio legislador estadual, tratando-se de faculdade de cada Unidade da Federa-
ção.
De toda forma, caso se opte pela seletividade do tributo, esta deverá ser graduada de
acordo com a essencialidade do bem, onerando com menores alíquotas os produtos de primei-
ra necessidade e com maiores os produtos supérfluos. Noutras palavras, “[a] seletividade em
função da essencialidade exige que o ônus econômico do ICMS recaia sobre mercadorias ou
serviços, na razão direta de sua superfluidade e na razão inversa de sua necessidade, tomando-
se como parâmetro o consumo popular” (CARRAZZA, 2009, p. 459).
O ICMS, também, é um tributo não cumulativo, nos termos do art. 155, §2º, inciso I,
da CF/88, de modo que o contribuinte poderá descontar nas operações seguintes, o montante
pago pelo tributo nas operações anteriores. O valor pago pelo imposto, na entrada de merca-
dorias, levará à aquisição de créditos do imposto, os quais poderão ser utilizados pelo comer-
ciante para abater os valores devidos nas operações seguintes. Caso, no mesmo período de
apuração, o comerciante não logre utilizar todo o crédito do ICMS, este deverá ser transferido
para o período subsequente.
A não-cumulatividade pode ser implementada pela via do crédito físico e pela via do
crédito financeiro. Na primeira via, apenas gerariam créditos o ICMS pago pelas mercadorias
destinadas a sair do estabelecimento ou a compor o bem que lhe sairia. Na segunda técnica,
todos os valores pagos pelo contribuinte a título de ICMS lhe concederiam crédito do tributo.
No Brasil, adotou-se um critério intermediário, no qual não são apenas os produtos que saem
do estabelecimento que geraram crédito, mas tampouco são todos os gastos do contribuinte
que têm o condão de gerar o crédito pretendido (MACHADO SEGUNDO, 2019).
Além dos bens destinados à saída do estabelecimento do contribuinte, ou a compor
estes, criará crédito, por exemplo, o imposto pago para aquisição de bens do ativo permanente
do contribuinte, a ser utilizado na exploração da atividade econômica. Por sua vez, os bens
destinados ao uso e consumo (lubrificantes, materiais de limpeza, alimentos etc.) geram, a
partir de janeiro de 2020, créditos de ICMS (PAULSEN; MELO, 2013).
Em relação à energia elétrica, o seu consumo dará direito ao crédito de ICMS, nas hi-
póteses em que: (i) for objeto de operação de saída de energia elétrica; (ii) for consumida no
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processo de industrialização, e (iii) o consumo da energia for utilizado para operações de saí-
da para o exterior, na proporção destas sobre as saídas totais (PAULSEN; MELO, 2013).
Por fim, quanto à atualização monetária dos créditos de ICMS, entende-se que, em re-
gra, não deverá ocorrer. Todavia, o STF compreende que, no caso de impedimento pelo fisco
da utilização do crédito em época própria, é possível a atualização do montante, com vistas a
impedir o enriquecimento sem causa da fazenda (PAULSEN; MELO, 2013).
dispositivo, é, tradicionalmente, dado ao serviço o conceito adoto pelo ramo do direito que lhe
é aplicado.
Nessa perspectiva, dever-se-á entender o conceito constitucional de serviço como se
tem no direito privado, visto ser o ramo do direito que regula esse tipo de prestação. Em vir-
tude disso, é possível identificar que o “serviço possui natureza jurídica de trabalho, de uma
obrigação de fazer, correspondente à conduta de prestar algo, físico ou intelectual, a que se
comprometeu o prestador em troca de uma remuneração devida pelo tomador” (LIMA, 2019).
Assim, o conceito de serviço seria aquele presente no Código Civil (BRASIL, 2002),
em seu art. 594, trazendo sentido de uma obrigação de fazer.
Seguindo esta linha, Melo (2012) compreende o serviço como sendo um esforço hu-
mano prestado a terceiros, em caráter negocial, sob o regime de direito privado, objetivando a
obtenção de bem material ou imaterial.
Por causa de tal compreensão, aplicando os conceitos de direito privado, o Supremo
Tribunal Federal, em fevereiro de 2010, editou a Súmula Vinculante nº 31, a qual dispõe ser
inconstitucional a incidência do ISS sobre a locação de bens móveis.
Não obstante, no ano de 2019, modificando o seu entendimento, na ocasião do julga-
mento do RE nº 651.703, sobre o Tema 584 de Repercussão Geral, o Supremo Tribunal Fede-
ral assentou tese jurídica no sentido de que as operadoras de plano de saúde e de seguro-saúde
prestam serviço passível de tributação pelo ISS.
Mais importante do que saber que, pela jurisprudência do Supremo, as operadoras de
plano de saúde pagarão o ISS é compreender que, no precedente em questão, foi afastado o
conceito civilista de serviço, no sentido de ser considerado como obrigação de fazer, para se
adotar o conceito econômico de serviço.
Compreendeu-se que o conceito civilista, a despeito das disposições dos artigos 109 e
110 do CTN, escaparia ao sentido que quis dar o constituinte ao elencar os serviços tributá-
veis, o qual seria o de captar todas as atividades empresariais cujos produtos fossem serviços
sujeitos à remuneração no ambiente do mercado.
Sob esse viés, o serviço não estaria relacionado somente a uma obrigação de fazer;
mas, com base no conceito econômico, o serviço se consubstancia no oferecimento de uma
utilidade para outrem, a partir de um conjunto de atividades materiais ou imateriais, prestadas
com habitualidade e intuito de lucro, podendo, inclusive, estar conjugada, ou não, com a en-
trega de bens.
É possível entender, também, que poderá ser incluso no âmbito de incidência do ISS
qualquer serviço que não esteja na competência dos Estados (ICMS) ou da União (IOF). Por-
41
tanto, de acordo com a atual jurisprudência do STF, deve-se adotar o conceito econômico de
serviço, no sentido de ser este uma utilidade oferecida ao tomador.
Sobre a lista anexa à Lei Complementar nº 116 (BRASIL, 2003), poderia haver dis-
cussão quanto a sua taxatividade, é dizer, o rol de serviços na lista seria taxativo, de modo que
os municípios não poderiam tributar serviços que não estivessem ali dispostos, ou exemplifi-
cativo, dando aos municípios competência de, no contexto de suas próprias legislações, tribu-
tarem outros serviços que não os ali dispostos.
A definição dos serviços tributáveis pelo ISS na referida lista presente em lei infra-
constitucional pode gerar controvérsia em relação ao antagonismo: autonomia municipal para
instituição contra a concessão de competência ao legislador nacional para definir quais os
serviços a serem tributados. Na medida em que os municípios estão subordinados ao legislati-
vo federal, em relação aos serviços que poderão ser previstos em suas legislações para cobrar
a citada exação, seria possível concluir que a autonomia municipal estaria prejudicada
(PAULSEN; MELO, 2013).
A despeito dessas relevantes questões, somente poderão sofrer a tributação pelo ISS os
serviços constantes na lista anexa à LC nº 116/2003, em virtude do princípio da tipicidade,
relacionado à legalidade tributária estrita (CARNEIRO, 2019). Também nessa direção, a ju-
risprudência de modo geral aponta para a taxatividade da referida lista (MACHADO SE-
GUNDO, 2019).
Outro ponto relevante é saber como será interpretado e aplicado o rol de serviços na
lei complementar. Noutras palavras, é compreender se poderá, na aplicação da lista, o intér-
prete realizar interpretação restritiva ou extensiva ou, ainda, se se poderá utilizar da analogia.
Antes de se analisar a jurisprudência sobre o assunto, deve-se explicar, resumidamen-
te, que a interpretação restritiva ocorre quando, dentre os sentidos possíveis presentes no
enunciado de determinada norma, o intérprete escolhe aquele que restringe mais o alcance do
texto; enquanto, na interpretação extensiva, o intérprete tomará, dentro do universo dos senti-
dos possíveis do enunciado da norma, aquele que lhe concede a maior abrangência.
Por sua vez, a analogia, no direito, não se constitui como um método de interpretação,
mas de integração do ordenamento jurídico. O intérprete, basicamente, aplicará norma que
regula uma determinada situação a um contexto distinto, porém, que lhe guarde semelhança.
Dito isso, deve-se explicar que, atualmente, o STF, como exposto, entende pela taxati-
vidade da lista anexa. Não obstante, ainda no ano de 2020, o Supremo, no julgamento do RE
nº 784.439, relativo ao Tema de repercussão geral nº 296, adotou entendimento no sentido de
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que caberia a interpretação extensiva da lista anexa à Lei Complementar nº 116/2003. Porém,
não foi adotada a possibilidade de analogia com o disposto na lista.
O Tribunal entendeu que as nomenclaturas dadas aos serviços previstos na lista eram
irrelevantes, inclusive, trazendo expressões com o escopo de permitir a interpretação extensi-
va, como “e congêneres”. Ademais, na visão da corte, não existiria óbice constitucional a esta
sistemática interpretativa.
Portanto, pelo entendimento do STF, conforme a tese firmada no julgamento do Tema
296, deve-se entender que é taxativa a lista de serviços anexa à Lei Complementar nº
116/2003; admitindo-se, todavia, a interpretação extensiva.
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Em relação aos produtos impressos por meio de impressoras 3D, será perfeitamente
possível a cobrança do ICMS, quando do acontecimento duma operação de circulação. Toda-
via, conforme explicado, será necessário que o bem impresso seja uma mercadoria, isto é,
tenha sido manufaturado para a mercancia, com o objetivo de ser vendido ou negociado.
Aquele que manufaturou o bem com sua impressora ou que, simplesmente, tenha-o
adquirido com o intuito de pô-lo à venda, de forma eventual, não poderá ser tributado, em
regra, pelo ICMS. Explica-se: para incidir o tributo estadual, é mister que se esteja, também,
diante de operação realizada por contribuinte do ICMS – pessoa (natural ou jurídica) que se
dedica ao comercio – incluindo-se o produtor, industrial etc. -, ainda que de forma irregular.
Portanto, se o bem impresso em 3D, manufaturado ou adquirido com o fito de ser co-
mercializado, é vendido por sujeito que se dedica à mercancia, caberá a incidência do ICMS
sobre a operação.
Não obstante, relativamente ao ICMS-importação, como o tributo incidirá sobre a im-
portação de qualquer bem, independentemente de ser o importador contribuinte ou não do
imposto e do fato de o produto importado ter ou não destinação comercial, a operação de im-
portação de bem manufaturado aditivamente terá plena capacidade de ser tributada pelo im-
posto.
Raciocínio distinto deve ser feito quanto ao ICMS incidido sobre a arrematação de
bem em licitação. Conforme explicado, não é qualquer arrematação que dará ensejo à cobran-
ça do tributo, mas a arrematação de mercadoria, por quem se dedica à atividade mercantil.
Dessa forma, o particular que adquire, em licitação, bem impresso em 3D, se o faz para uso
próprio, não poderá ocorrer a incidência sobre a operação, vez que não se está a tratar de uma
mercadoria. Porém, o contribuinte do imposto que adquire o bem impresso em 3D para re-
vendê-lo ou utilizá-lo em outras operações será tributado pelo ICMS nesta operação.
No mesmo sentido, deve estar a arrematação, em licitação, de objetos utilizados para a
impressão em 3D, por exemplo, termoplásticos. O contribuinte que os adquire para imprimir
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objetos destinados à mercancia ou para, simplesmente, revendê-los deverá ser tributado pelo
ICMS. No entanto, o particular que adquire esses materiais para realizar futura impressão de
bem para uso próprio não poderá ser tributado.
Destaca-se, por oportuno, interessante possibilidade de incidência do ICMS: conside-
rando a possibilidade de fabricação de alimentos por manufatura aditiva, caso determinado
restaurante venha a entregar a seus clientes comidas impressas em 3D, a atividade será tribu-
tada pelo imposto estadual, pois o fornecimento de alimentos em restaurantes e congêneres é
hipótese de incidência do ICMS.
Igualmente, será tributado pelo ICMS, a padaria, mercado e supermercado que vende
ao público alimentos manufaturados aditivamente.
Em virtude da Súmula nº 166 do STJ e, por óbvio, da inexistência de qualquer opera-
ção, a saída de insumo para a impressão 3D levada de um estabelecimento a outro do contri-
buinte, onde será utilizado para a impressão, não será considerada como fato gerador do tribu-
to.
Sobre a creditação pelo ICMS, na hipótese de contribuinte que paga o imposto para
adquirir bem em 3D para negociá-lo ou algum insumo para impressão 3D, por exemplo, po-
límeros líquidos sensíveis ao ultravioleta, para futura manufatura de bem destinado à circula-
ção, terá ele o direito de creditar-se do imposto pago nessas operações.
Há de se recordar que o crédito do ICMS tem natureza mista, intermediária, de modo
que outros bens, que não apenas os destinados a sair do estabelecimento ou a compor o produ-
to destinado à saída, poderão dar ensejo ao crédito do imposto.
Dessa forma, tendo em vista a possibilidade de o contribuinte responsável por executar
a manufatura aditiva ser considerado industrial (vide capítulo 3, tópicos 3.2 e 3.3), o ICMS
pago pela energia elétrica consumida pela impressora 3D, no caso de manufatura de mercado-
ria, concederá crédito do tributo. Tal creditação se deve ao fato de se entender, na hipótese,
que a impressão 3D é um processo de industrialização, pelo que a energia elétrica nele con-
sumida tem o condão de conferir direito ao crédito.
Considerando que os bens do ativo permanente dão ensejo ao crédito de ICMS, os ob-
jetos impressos em 3D destinados à sua composição concederão direito ao crédito. A impres-
sora 3D adquirida pelo estabelecimento que imprime mercadorias, também, levará ao crédito
do tributo.
É interessante perceber que os materiais utilizados para a manufatura aditiva de produ-
tos destinados ao ativo fixo da empresa, por exemplo, aço em forma de pó, poderão dar ensejo
ao referido crédito de ICMS.
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A manufatura aditiva de um bem feita por encomenda pode ser considerada, em si, um
serviço, vez que o bem é feito de maneira direcionada a uma pessoa ou coletivo determinado
de pessoas, havendo, de uma maneira ou de outra, espécie de personalização.
A manufatura aditiva poderá, por meio do conceito civilista, ser considerada um servi-
ço, pois o que prepondera na relação é a obrigação de fazer determinado(s) objeto(s) por meio
de impressora 3D, ainda que não haja grande esforço do prestador do serviço.
A depender do caso, essa impressão tridimensional por encomenda pode ser conside-
rada uma industrialização, ou produção, por encomenda, a qual, no entendimento de Harada
(2008), é aquela “[...] feita a partir das especificações ditadas por determinado cliente, sobres-
sai-se a característica de ser o produto encomendado o único do mesmo gênero, ou seja, a
produção encomendada é personalizada. Não se presta à exposição para venda ao público em
geral.” Também, seguindo o entendimento civilista, o autor afirma que prepondera, na indus-
trialização por encomenda a obrigação de fazer, e não obrigação de dar, que ensejaria a co-
brança do ICMS.
Além disso, de acordo com o atual entendimento do STF, o bem tridimensionalmente
impresso por encomenda representará ao cliente uma utilidade, por meio de uma atividade
material – e imaterial, a depender do caso -, com a entrega de um bem. Assim, se a manufatu-
ra aditiva por encomenda for feita com habitualidade e intuito de lucro, pelo prestador, será
considerada um serviço, igualmente, pelo conceito econômico.
Não obstante se estar diante de um serviço, não é possível inferir, de plano, que a im-
pressão 3D por encomenda poderá, automaticamente, ser tributada pelo ISS. Em conformida-
de com o explicado no capítulo 4 (tópico 4.2), apenas poderão ser tributados pelo ISS os ser-
viços dispostos na lista anexa, a qual tem natureza taxativa, apesar de ser permitida a interpre-
tação extensiva.
Dito isso, com o escopo de melhor analisar o caso, cabe trazer parecer dado no âmbito
da Coordenação de Tributação – Cotri – da Secretaria de Economia do Distrito Federal, sobre
a incidência do ISS ou do ICMS sobre manufatura aditiva por encomenda, mediante a Solu-
ção de Consulta COTRI nº 5 de 06/04/2017 (DISTRITO FEDERAL, 2017). Confira-se a sua
conclusão relativa à não incidência do imposto municipal pela falta de previsão nas hipóteses
constantes na lista de serviços anexa à LC nº 116/2003, in verbis:
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Abre-se parênteses para mencionar que, a despeito de não ter uma projeção nacional,
mas meramente distrital, é interessante analisar o entendimento da coordenação sobre o assun-
to, pois a Receita do Distrito Federal é responsável pela cobrança do ICMS e do ISS, em vir-
tude de o ente distrital acumular as competências tributárias estaduais e municipais. A solução
em questão consubstancia-se num posicionamento oficial de um ente tributante sobre possível
conflito entre ICMS e ISS, no contexto da impressão 3D.
Para se chegar à conclusão colacionada, argumentou-se, basicamente, o seguinte: (i)
para se tributar um serviço, é mister que este esteja previsto na lista anexa à Lei Complemen-
tar nº 116/2003; (ii) a incidência do ICMS exclui a do ISS e vice-versa, exceptuando-se as
exceções dispostas na própria lista anexa à LC nº 116/2003; (iii) a manufatura aditiva por en-
comenda não encontra previsão na lista anexa; (iv) esse serviço é caracterizado por uma obri-
gação de fazer e, também, por uma obrigação de dar; (vi) quando o serviço não indicado na
lista anexa à LC nº 116/2003 compreende também a entrega de uma mercadoria, a tributação
é feita somente pelo ICMS; (vii) não obstante o bem poder ser impresso a partir de um mode-
lo tridimensional virtual já existente, desenvolvido pelo prestador àquele que encomenda a
manufatura aditiva do objeto ou já entregue por este; de todas as formas, será, ao final, entre-
gue um bem móvel ao contratante; (viii) portanto, com base nessa argumentação, deve-se in-
cidir apenas o ICMS no caso.
É possível concluir, do exposto, que assiste razão ao citado parecer. Com efeito, ine-
xiste na lista anexa qualquer previsão relativa ao serviço de manufatura aditiva por encomen-
da. Também, o serviço em questão envolve a entrega de um bem, o qual, por ser produzido
com o intuito de ser entregue a outra pessoa, de participar de uma operação, ainda que não
seja caracterizada como uma compra e venda pura, terá característica de uma mercadoria.
Veja-se que o prestador não imprime o bem para si, mas para ser entregue a terceiro, mediante
o pagamento de um preço.
Mesmo que o prestador contratado venha a desenvolver um modelo de impressão para
o contratante, antes de realizar a prototipagem rápida do bem, a despeito de ter o condão de
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encarecer o valor da operação, não será desnaturado o fato de a encomenda resultar na entrega
de um bem móvel.
Por esse prisma, apesar de ocorrer um serviço com a entrega da mercadoria manufatu-
rada, este não está previsto na lei complementar. Considerando o fato de a operação resultar
na entrega dum bem, o ICMS deverá incidir sobre o bem e o serviço como um todo.
Todavia, tal conclusão deve ser vista com alguma moderação. Para se incidir o ICMS,
é necessário que a atividade em questão seja prestada com habitualidade pelo contribuinte ou
que, ao menos, o contribuinte realize habitualmente a atividade de circulação de mercadorias
(LUZ, 2020). Conforme explicado exaustivamente, para haver a tributação do ICMS, faz-se
mister que a operação de circulação seja praticada por comerciante, ainda que irregular.
Outro ponto a ser levado em consideração é o fato de que incide o ICMS, porém não
se deve concluir que à operação incidirá, também, o IPI, sendo, plenamente, possível a inci-
dência somente do ICMS, a despeito de a impressão 3D poder ser caracterizada como uma
atividade de industrialização (LUZ, 2020).
Tal situação decorre do fato de que, como explicado, existe, na industrialização, uma
perspectiva de produção em série e massificada, para uma coletividade não objetiva de pesso-
as. Nesse contexto, a manufatura aditiva por encomenda, mesmo se incidindo o ICMS, é feita
de modo direcionado para o contratante do serviço, pelo que perde a característica de produ-
ção padronizada.
Apesar de deixar de apresentar, especificamente, tais razões, a Solução de Consulta nº
97 – Cosit (BRASIL, 2019) converge no sentido de que, se feita a impressão 3D por enco-
menda, estar-se-á diante de um serviço e não de uma industrialização.
Com efeito, de modo geral, não incide o ISS sobre a manufatura aditiva por encomen-
da. Entretanto, deve-se destacar duas hipóteses nas quais incidirá o tributo municipal: primei-
ro, quando, na impressão 3D por encomenda, o contratante entregar os bens que sofrerão o
processo de manufatura aditiva, e segundo, nos casos em que a coisa encomendada, impressa
tridimensionalmente, estiver inclusa como serviço tributável na lista anexa.
Sobre o primeiro caso, deve-se perceber que a lista anexa traz, nos subitens 14.01 e
14.05 atividades que podem ser consideradas como industrialização por encomenda, nos ser-
viços relativos a bens de terceiros:
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Em face disso, não se pode concluir que a industrialização por encomenda, na hipóte-
se, feita por meio de impressão 3D, será tributado com base nos subitens acima. Explica-se: o
item 14 trata dos serviços relativos a bens de terceiros, pelo que, se o prestador utiliza materi-
ais de sua posse ou propriedade, não poderá incidir o ISS. Entretanto, caso a operação seja
feita sobre o bem de terceiro, poderá incidir o tributo. Por conseguinte, caso o contratante da
impressão 3D por encomenda entregue os insumos a serem utilizados na manufatura, poderá
incidir o ISS (GOMES, 2020).
Deve-se explicitar, ainda, que, mesmo se se considerar que as previsões dos subitens
14.01 e 14.05 não incluem diretamente a impressão 3D, a lista comporta a interpretação ex-
tensiva, de modo que será possível interpretar as atividades dispostas nos itens acima, como
manufatura aditiva, vez que incluem “[r]estauração, recondicionamento, acondicionamento,
pintura, beneficiamento, [...] galvanoplastia, anodização, corte, recorte, plastificação, costura,
acabamento [...] e congêneres de objetos quaisquer”, bem como “[...] conserto, restauração,
blindagem [...]”. Todas essas atividades, de uma forma ou de outra, podem estar presentes na
impressão 3D. Tal possibilidade torna-se mais evidente, com a indicação “e congêneres de
objetos quaisquer”, presente no subitem 14.05.
Portanto, indubitável a permissão de se tributar pelo ISS a manufatura aditiva de bem
por encomenda, quando o contratante entrega ao prestador de serviços os insumos utilizados
pela impressora 3D, na produção.
Em relação à segunda possibilidade citada, é importante perceber que, independente-
mente de os bens serem de propriedade do particular, caso a encomenda deste bem conste, na
lista anexa, como serviço tributável pelo ISS, possível será a cobrança do imposto. Conside-
rando o enorme potencial da tecnologia de impressão em 3D e a vasta gama de produtos que
podem ser, por ela, manufaturados, é natural que a produção de determinadas coisas, por meio
de manufatura aditiva encomendada, estejam presentes na lista como serviços tributáveis pelo
imposto municipal:
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[...] com relação aos serviços com fornecimento de materiais, deve incidir apenas o
ISS, desde que os serviços estejam previstos na lista anexa à LC n. 116/2003; [...]
Um exemplo: nos serviços odontológicos (item 4.12), há programas específicos que
analisam as necessidades específicas dos pacientes e permitem a elaboração do Blu-
eprint a ser impresso em 3D. Caso, nessas hipóteses, o dentista realize a venda do
bem ao paciente, não se estará diante de uma operação mercantil de venda de mer-
cadorias, mas sim de prestação de serviços odontológicos em que foi necessária a
alienação de objetos confeccionados a partir de impressão 3D (LUZ, 2020).
É possível encontrar muitos outros exemplos na lista anexa. Em relação aos serviços
de saúde, pode-se citar o caso de próteses sob encomenda (subitem 4.14) confeccionadas por
meio de impressoras 3D. Igualmente, no caso de impressão de órgão para transplante, enco-
mendada pelo paciente, poder-se-ia incluir a prestação no subitem 4.01, relativo aos serviços
de medicina e biomedicina. Mesmo raciocínio se aplica aos órgãos impressos para animais,
por encomenda, classificando-os como serviço de medicina veterinária e zootecnia, do subi-
tem 5.01.
Relativamente aos serviços de arquitetura e construção civil presentes no item 7 da lis-
ta, o uso da impressão 3D é completamente possível e passível de tributação. Como hoje exis-
te tecnologia para imprimir edifícios inteiros por meio de enormes impressoras 3D, a impres-
são tridimensional de uma casa, por exemplo, será tributada pelo ISS, dentro da previsão do
subitem 7.02. A despeito de não se executar a construção de forma tradicional e com um nú-
mero mínimo de trabalhadores, ainda assim, estar-se-á diante de uma atividade de construção
civil. Incluso, no serviço, poderá estar, também, o desenvolvimento do modelo digital do edi-
fício, o que, igualmente, será tributado pelo ISS.
Interessante exemplo, também, é o serviço de obras de arte por encomenda, disposto
no item 40 da lista anexa. Plenamente possível o caso de determinado artista, ao ser contrata-
do para confeccionar uma escultura, criar um modelo em seu computador, explorando as mais
diversas formas e, em seguida, imprimí-lo em três dimensões, para entregar ao cliente. Nessa
hipótese, seria, completamente, cabível a cobrança do tributo municipal.
Tem-se aí apenas alguns exemplos, dentre diversos outros que podem ser encontrados,
se se analisar detidamente a lista anexa, inclusive, nos casos em que a impressão em 3D é
somente acessória ao serviço principal.
uso próprio, tanto dos contribuintes que exploram atividades econômicas quanto em relação
àqueles particulares que realizam a impressão 3D fora do contexto de tais atividades.
De modo resumido, adianta-se que não caberá a incidência de qualquer dos tributos na
impressão 3D de uso pessoal, seja doméstica, seja em meio de atividade econômica.
Os tributos em relação aos insumos e à própria impressora 3D serão cobrados nor-
malmente, no momento do adquirimento pelo contribuinte, desde que, ao se adquirir qualquer
deles, esteja-se diante de hipótese de incidência do ICMS ou do ISS.
Primeiramente, em relação ao ICMS, já se tratou indiretamente da incidência do tribu-
to de objetos para uso próprio, quando da análise do imposto no tópico 5.1 deste capítulo, no
entanto cabem, ainda, algumas considerações.
Quanto ao contribuinte do ICMS, não caberá a incidência deste tributo no caso de rea-
lizar a impressão 3D de objetos para uso e consumo ou para compor o ativo permanente da
empresa, em razão da falta dos requisitos para incidência do tributo. Primeiro, não há qual-
quer operação no ato de imprimir algo para si mesmo, o que, por si só, já impede a cobrança
do tributo. Segundo, inexiste circulação de mercadoria, vez que, para a manufatura do objeto,
o contribuinte estará a utilizar os seus próprios insumos, havendo, tão somente, a transforma-
ção destes. O mesmo raciocínio cabe quando do transporte do objeto impresso em 3D, ou dos
insumos para impressão, de um estabelecimento para outro do contribuinte. Terceiro, o bem
produzido não poderá ser considerado mercadoria, pois, a despeito de ajudar de alguma forma
na atividade mercantil explorada, não terá ele mesmo destinação para o comércio.
Sobre o crédito do ICMS na impressão 3D para uso pessoal, rememora-se que, dife-
rentemente do IPI, não há a técnica do crédito físico, mas misto, de modo que o contribuinte
pode creditar-se do imposto pago para a aquisição de bens destinados ao ativo permanente.
Desse modo, a impressora 3D e os insumos utilizados para a impressão de bens destinados ao
ativo permanente – por exemplo, polímeros líquidos – darão ensejo à creditação de ICMS
pelo contribuinte, ainda que não exista destinação comercial.
Em relação ao não-contribuinte de ICMS, cabem as mesmas considerações relativas ao
contribuinte, com, ainda, um impedimento a mais, o fato de não se estar diante de alguém que
explora a atividade mercantil e que, usualmente, não tem obrigação de recolher o tributo esta-
dual. Por óbvio, não poderá ocorrer a creditação de valores relativos ao ICMS, vez que não se
estará diante de contribuinte do tributo.
Conforme explicado anteriormente, na importação de insumos para a impressão 3D ou
de impressora 3D, ocorrerá a incidência normal do imposto, pois a cobrança do ICMS-
importação independe da destinação do produto.
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Feita a análise dos impostos sobre o consumo - IPI, ICMS e ISS – e da incidência des-
tes sobre a impressão 3D, chega-se ao momento de estudar a incidência desses tributos sobre
os modelos de impressão 3D, os arquivos digitais imprimíveis. Estes são fundamentais para se
executar a impressão de um objeto 3D, pois são responsáveis por guardar, em meio eletrônico,
toda a estrutura e a forma daquilo que será aditivamente manufaturado.
Diversos são os negócios que podem ser feitos com os modelos. Devido à populariza-
ção cada vez maior das impressoras 3D desktop e o desenvolvimento constante da tecnologia,
a prática mais acentuada de manufatura aditiva no âmbito doméstico e empresarial é uma rea-
lidade que se avizinha cada vez mais. Diante desse contexto, os negócios celebrados sobre os
modelos de impressão passarão a ter maior relevância.
Rememora-se, também, que, nos casos de impressão 3D de objetos para uso domésti-
co, inclusive, para consecução de atividades econômicas, a inexistência de operações impede
a incidência dos citados tributos. As operações com tais arquivos imprimíveis, talvez, sejam o
único negócio passível de tributação nesse contexto, pelo que é fundamental promover o seu
estudo.
Portanto, far-se-á, neste capítulo, a análise da incidência do ICMS e do ISS nos possí-
veis negócios realizados com os modelos. Conforme explicado no início do capítulo 3 deste
trabalho, não estará incluso o estudo da incidência do IPI sobre os modelos, pois não cabe
tributação por este imposto na espécie.
Foi visto no capítulo 2 (tópico 2.3) que os modelos de impressão 3D não podem ser
considerados softwares, vez que não possuem as características determinantes desta espécie.
Tampouco, os modelos se confundem com o objeto a ser impresso, sendo cada um parte de
duas realidades distintas, o primeiro está dentro de um contexto virtual, salvas as suas infor-
mações em suporte físico ou em nuvem, enquanto o segundo é uma fabricação consubstancia-
da numa realidade de átomos.
Como explicado, os modelos de impressão 3D são meramente arquivos digitais, con-
tendo informações e códigos relativos às características estruturais – e, a depender do caso,
materiais – de determinada coisa passível de ser manufaturada aditivamente.
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Com efeito, o artigo 7.º da Lei 9.610/1998 estabelece que são obras intelectuais pro-
tegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer
suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro. É possível
que projetos sejam juridicamente qualificados como obras intelectuais protegidas
pela legislação, uma vez que, dentre as obras intelectuais elencadas a título exempli-
ficativo, o inciso X do artigo 7.º da Lei 9.610/1998 indica os projetos, esboços e
obras plásticas concernentes à geografia, engenharia, topografia, arquitetura, paisa-
gismo, cenografia e ciência. (GOMES, 2020)
Cláusula primeira – As operações com bens e mercadorias digitais, tais como sof-
twares, programas, jogos eletrônicos, aplicativos, arquivos eletrônicos e congêneres,
que sejam padronizados, ainda que tenham sido ou possam ser adaptados, comercia-
lizadas por meio de transferência eletrônica de dados observarão as disposições con-
tidas neste convênio.
Cláusula segunda – As operações com os bens e mercadorias digitais de que trata es-
te convênio, comercializadas por meio de transferência eletrônica de dados anterio-
res à saída destinada ao consumidor final ficam isentas do ICMS.
Cláusula terceira – O imposto será recolhido nas saídas internas e nas importações
realizadas por meio de site ou de plataforma eletrônica que efetue a venda ou a dis-
ponibilização, ainda que por intermédio de pagamento periódico, de bens e mercado-
rias digitais mediante transferência eletrônica de dados, na unidade federada onde é
domiciliado ou estabelecido o adquirente do bem ou mercadoria digital. (BRASIL,
2017)
ridade do bem digital, de modo que a interpretação do convênio não pode ser considerada
correta (PINTO, 2018).
Igualmente, pode-se considerar que o convênio traz flagrante inconstitucionalidade,
não se podendo aplicá-lo, na medida que dá ensejo à possibilidade de incidência do tributo
sobre qualquer forma de disponibilização de modelos de impressão 3D e de outros bens digi-
tais (GOMS, 2020).
Tal argumento, pela inconstitucionalidade ou, ao menos, pela não aplicação do convê-
nio, mostra-se mais consistente, em virtude do atual entendimento do Supremo Tribunal Fede-
ral quanto à tributação de programas de computador. Ainda em fevereiro deste ano, 2021, o
Supremo, no julgamento das ADIs de números 1945/MT e 5659/MG, considerou que as ope-
rações de transferência de softwares, em meio digital ou físico, consubstanciar-se-iam em
cessão de direito de uso, mero licenciamento, e, portanto, não seria possível a tributação pelo
ICMS, mas, sim, pelo ISS, de competência municipal.
É fundamental perceber que as operações relativas aos modelos de impressão 3D, por
meio virtual, são, praticamente, idênticas aos negócios celebrados com softwares, no mesmo
contexto, sendo possível a aplicação da jurisprudência sobre softwares aos arquivos digitais
imprimíveis (GOMES, 2020). Dessa forma, é perfeitamente aplicável, aos negócios com mo-
delos de impressão 3D o precedente do STF acima citado.
Não deverá incidir, pois, o ICMS, quando da disponibilização de modelo para impres-
são tridimensional por meio de transferência eletrônica de dados ou mediante suporte físico,
devendo-se considerar mero licenciamento de uso do modelo.
Os negócios celerados virtualmente com os modelos de impressão e a incidência do
tributo municipal serão analisados, detidamente, no próximo tópico (6.3), destinado ao estudo
da incidência do ISS sobre essas operações.
Todavia, considerando as diversas possibilidades de negócios jurídicos, não se deve,
simplesmente, considerar a completa impossibilidade da incidência do tributo estadual nas
operações que tenham por objeto os modelos de impressão 3D.
Nesse sentido, Gomes (2020) ressalta duas hipóteses nas quais seria possível a inci-
dência do tributo estadual. A primeira no caso de o modelo digital ser vendido por meio de
uma plataforma física – como um pen drive ou CD, por exemplo -, situação em que, nos ter-
mos da jurisprudência anterior do STF, haveria a consubstanciação do corpus merchandi. A
segunda quando, na transferência online do modelo de impressão, o proprietário do modelo,
realmente, passar a titularidade do bem incorpóreo para o seu comprador, de modo que ocor-
56
de uso dos modelos de impressão 3D, por qualquer dos meios indicados, não poderia ser ca-
racterizada como serviço, não sendo possível a incidência do tributo.
Não obstante, a jurisprudência do STF, claramente, aponta para sentido diverso, é di-
zer, de que a cessão de direito de uso, inclusive, a de arquivos digitais imprimíveis, deve ser
considerada como um serviço.
Veja-se que a 2ª turma do Supremo Tribunal Federal possuía precedente, determinan-
do a incidência do ISS sobre a cessão do direito de uso de marca. Entendeu a turma que não
se aplicaria ao caso a Súmula Vinculante nº 31 – que dispõe sobre a não incidência do tributo
municipal sobre a locação -, pois a cessão do direito de uso da marca não seria locação, mas
serviço autônomo (CARNEIRO, 2019).
A adoção do conceito econômico de serviço, atualmente, pelo STF, leva ao entendi-
mento de que a cessão do direito de uso do modelo de impressão, por meio de uma remunera-
ção e com intuito de lucro, seria um serviço. Explica-se: a cessão de um modelo de impressão
3D representará uma utilidade oferecida por alguém (cessante) a outrem (cessionário), pelo
que, feita esta operação com intuito de lucro, estar-se-á diante de um serviço, para a perspec-
tiva econômica.
Além disso, o atual entendimento do STF indica que não cabe a incidência do ICMS à
cessão de direito de uso de software, por qualquer meio, por não ocorrer a circulação do bem,
devendo-se incidir o ISS ao caso. Considerando a similaridade da cessão de direito de uso do
arquivo digital imprimível com a ocorrida em relação aos programas de computador, não resta
dúvidas de que, pelo caminho da jurisprudência do STF, poder-se-á considerar a cessão do
direito de uso dos modelos de impressão 3D como serviço.
É evidente que as possibilidades de negócios em questão poderão ser consideradas
serviços, devendo-se, para se determinar a possibilidade de incidência do tributo, compreen-
der se a lista anexa à Lei Complementar nº 116/2003 comporta a incidência do ISS a tais pres-
tações.
Nos negócios relativos à cessão do direito de uso do modelo, deve-se analisar se há
previsão que comportaria qualquer uma dessas operações. De início, há de se rejeitar o argu-
mento de que a cessão do direito de uso relativa às duas primeiras possibilidades de negócios
poderia ser enquadrada no subitem 1.05 da lista anexa à LC nº 116 (BRASIL, 2003).
O subitem 1.05 trata do licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de
computador (BRASIL, 2003). Conforme exaustivamente salientado, o modelo de impressão
3D não se trata de um software, de modo que não caberia aplicar tal subitem à cessão do direi-
to de uso em questão. O subitem em comento não abre margem para que se o interprete de
60
forma extensiva, para incluir o modelo, vez que trata, somente, de programa de computador,
não incluindo qualquer outra forma de produção digital (GOMES, 2020).
Nesse contexto, Pinto (2018) entende que se aplica aos modelos de impressão de 3D o
subitem 1.09 da lista anexa, o qual dispõe:
De fato, partindo-se da premissa de que o suporte físico não tem o condão de alterar
a incidência tributária, o fato de o subitem 1.09 da lista anexa à Lei Complementar
61
116/2003 indicar a forma (Internet) não pode servir de fundamento para afastar a tri-
butação do conteúdo (disponibilização sem cessão definitiva). Consoante demons-
trado, o que importa, para fins de incidência do ISS, é a existência de identidade ma-
terial intrínseca entre o serviço previsto no subitem e a atividade objeto de análise.
Caso contrário, estar-se-ia admitindo que sujeitos dedicados à mesma atividade (dis-
ponibilização sem cessão definitiva) seriam tributados de maneira diversa somente
em função do meio utilizado para o desenvolvimento de tal atividade, o que, a nosso
ver, carece de fundamento constitucional e legal. (GOMES, 2020)
Sob esse viés, segundo o entendimento do citado autor, a cessão de direito de uso de
arquivo digital imprimível, independentemente de ser feita por meio físico ou virtual, dará
ensejo à incidência do ISS, dentro da previsão do subitem 1.09.
Quanto ao subitem 23.01 da lista anexa (BRASIL, 2003), o qual trata de programação
e comunicação visual, desenho industrial e congêneres, deve-se fazer algumas observações. A
programação e comunicação visual têm o fito de transmitir informações de forma visual a
terceiros, isto é, visa à comunicação de determinada mensagem para uma finalidade específi-
ca. E, por sua vez, os modelos de impressão 3D têm o escopo de representar de forma tridi-
mensional determinado objeto. Consequentemente, não se pode considerar o desenvolvimento
do modelo para impressão tridimensional como forma de programação e comunicação visual
(GOMES, 2020).
Sobre o desenho industrial, a Lei nº 9.279 (BRASIL, 1996) define-o pelos atributos da
novidade e da originalidade, bem como pelo uso industrial:
Por esse prisma, caso exista pretensão do fisco em tributar o citado serviço, será mister
a atuação legiferante do Congresso Nacional para incluir à lista anexa à LC nº 116 (BRASIL,
2003) item que enquadre a elaboração de arquivo digital imprimível ou que, ao menos, dê
margem à interpretação extensiva para incluí-lo.
Convém analisar, contudo, se, em razão de não ser possível a tributação do imposto
municipal, poderia caber a aplicação do ICMS, uma vez que o modelo de impressão 3D pro-
duzido se destinaria a compor o patrimônio do contratante. Sob esse viés, seria possível ar-
gumentar que o serviço, por não ser tributável pelo ISS, daria azo à cobrança do tributo esta-
dual, da mesma forma como ocorre na encomenda de objeto impresso em 3D.
A incidência do ICMS pressupõe a circulação da mercadoria, de modo que o bem ob-
jeto da operação precisa de ser transferido da titularidade do comerciante, para o particular.
Com base nisso, deve-se explicar que, na encomenda do arquivo digital imprimível, os direi-
tos patrimoniais e morais sobre o bem surgem, desde o princípio, sob a titularidade do contra-
tante, pois o contratado assume a obrigação de desenvolver o bem em nome daquele que con-
tratou o desenvolvimento do modelo de impressão 3D, de modo que se estará diante de aqui-
sição de propriedade originária. Se a propriedade é originária, não haverá a circulação do
bem. Logo, sem o cumprimento deste requisito, não será possível a incidência do ICMS ao
caso (GOMES, 2020).
Para melhor clarificar, imagine-se a hipótese em que alguém contrata um ghost writer6
para escrever, em seu nome, um livro. A despeito de o sujeito contratado elaborar, por seus
próprios meios e por sua criatividade, a obra literária, ela, desde o seu surgimento e após a
publicação, estará no nome do contratante, pois o “escritor fantasma” elabora em nome deste
uma obra, havendo, desde o princípio, a aquisição de direitos autorais, por aquele que contra-
ta.
A propriedade intelectual do livro não será adquirida pelo escritor para, posteriormen-
te, ser transferida ao contratante. Diversamente, desde o princípio, o contratante terá a propri-
edade da obra em seu nome. Tal raciocínio deve ser aplicado ao modelo de impressão 3D,
pois, grosso modo, o negócio poderá ser considerado semelhante.
Diante dessa situação, percebe-se que a manufatura aditiva por encomenda traz opera-
ção diversa, pois o objeto é manufaturado pelo prestador do serviço, para, em seguida, ser
transacionado, ocorrendo a entrega do bem encomendado e, consequentemente, sua circulação
6
Termo em inglês que se refere a profissional contratado para, em sigilo e em nome do contratante, escrever
texto, artigo, livro, discurso, dentre outros. O trabalho obtido, ao final, é de titularidade do contratante e não do
profissional contratado. Em tradução literal, “escritor fantasma”.
64
7 CONCLUSÃO
A impressão 3D, a despeito de encontrar os seus primórdios na década de 80, pode ser
considerada uma tecnologia disruptiva. A prática dessa forma de manufatura envolve as im-
pressoras 3D, os programas de computador que as fazem funcionar, os modelos de impressão
e os próprios materiais a servirem de insumos para a manufatura dos objetos.
Fez-se, neste trabalho, um indicativo das principais técnicas de impressão, no intuito
de se dar ao leitor uma compreensão do funcionamento da tecnologia. Nesse sentido, pôde-se
perceber que as variadas técnicas de manufatura aditiva buscam a transformar as matérias
primas utilizadas para criação de objetos tridimensionais completos, podendo a tecnologia
produzir objetos nas mais complexas formas e estruturas. Os materiais passíveis de utilização
são diversos, indo de polímeros, metais e cerâmicas até matérias orgânicas.
De igual modo, demonstrou-se que o surgimento das impressoras 3D desktop possibi-
litam o uso da tecnologia ao nível de pequenos negócios e ao ambiente doméstico.
Quanto aos modelos, fundamentais para a representação e criação do objeto a ser im-
presso, compreendeu-se que, por sua natureza, não podem ser considerados programas de
computador, tampouco poderão ser confundidos com o próprio bem a ser manufaturado.
Em relação ao IPI, estudou-se as suas hipóteses de incidência, buscando-se aplicá-lo
ao contexto da impressão 3D. Nessa perspectiva, verificou-se que a prática de manufatura
aditiva pode ser considerada uma forma de industrialização, mais especificamente, industria-
lização por transformação.
Diante disso, a prática da impressão 3D para a produção de bens voltada ao comércio
infere na caracterização daquele que o pratica como industrial e contribuinte do tributo. Desse
modo, as operações que promovem a saída de tais produtos do estabelecimento do contribuin-
te do IPI terão o condão de levar à incidência do imposto. A mesma conclusão se aplica à im-
portação de produtos manufaturados aditivamente.
Relativamente ao crédito do imposto federal, pôde-se concluir que, em virtude da ado-
ção do critério físico, o contribuinte que adquire o bem impresso para revendê-lo terá direito
ao crédito. Da mesma forma, os insumos destinados a compor o bem impresso em 3D que
sairá do estabelecimento em futura operação darão ensejo ao crédito do tributo.
Relativamente ao ICMS e ao ISS, buscou-se analisar as hipóteses de incidência de
ambos os tributos. O estudo conjunto de ambos foi fundamental para se compreender a possi-
bilidade de conflito e a aplicação de um ou de outro, no âmbito dos negócios celebrados no
contexto da impressão 3D.
66
Finalmente, buscou-se estudar a incidência dos citados tributos em relação aos mode-
los de impressão 3D. Constatou-se, de início, que os arquivos digitais imprimíveis estariam
protegidos no âmbito dos direitos autorais, possuindo a natureza jurídica de bens móveis in-
corpóreos, nos termos da legislação civil.
Percebeu-se que, a despeito de não serem considerados programas de computador, os
negócios que envolvem os modelos de impressão guardam extrema similitude com os negó-
cios relativos aos softwares, inclusive, por nenhum dos dois estarem materializados no mundo
de átomos.
Constatou-se que, em razão do atual entendimento do STF relativo ao ICMS e ao ISS
sobre os softwares, não é factível a incidência do tributo estadual à maioria dos negócios en-
volvendo os modelos, pois, nesses casos, se estaria diante de uma mera cessão de direito.
Todavia, destacou-se rara possibilidade de incidência do tributo estadual, no caso de a
operação realmente transferir a titularidade do modelo de impressão 3D para o adquirente,
quando o vendedor adquiriu ou desenvolveu o modelo com o intuito de comercializá-lo.
Constatou-se que a cessão de direito de uso é considerada serviço pela jurisprudência,
a despeito de existirem vozes na doutrina em desacordo com tal possibilidade. Diante disso,
foi possível perceber que a cessão de direito de uso do arquivo digital imprimível encontra
previsão no subitem 1.09 da lista anexa à LC nº 116/2003, pelo que é possível a tributação
pelo imposto municipal.
Por fim, quanto à criação de modelos por encomenda, concluiu-se que não é possível a
incidência do tributo municipal por falta de previsão na lista anexa à LC nº 116/2003, mesmo
utilizando a interpretação extensiva. Tampouco, seria possível a incidência do ICMS, por falta
de transferência da titularidade do bem digital, vez que o modelo desenvolvido estaria, desde
sua criação pelo prestador do serviço, sob a titularidade do contratante.
68
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THE MIDNIGHT GOSPEL. Direção: Pendleton Ward. Criação: Pendleton Ward, Duncan
Trussell. Los Angeles, EUA: Titmouse, Inc., 2020. Distribuição: Netflix.
72
1.02 – Programação.
1.09 - Disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto
por meio da internet, respeitada a imunidade de livros, jornais e periódicos (exceto a distribui-
ção de conteúdos pelas prestadoras de Serviço de Acesso Condicionado, de que trata a Lei no
74
3.01 – (VETADO)
3.03 – Exploração de salões de festas, centro de convenções, escritórios virtuais, stands, qua-
dras esportivas, estádios, ginásios, auditórios, casas de espetáculos, parques de diversões, can-
chas e congêneres, para realização de eventos ou negócios de qualquer natureza.
4.05 – Acupuntura.
4.10 – Nutrição.
4.11 – Obstetrícia.
4.12 – Odontologia.
4.13 – Ortóptica.
4.15 – Psicanálise.
4.16 – Psicologia.
4.20 – Coleta de sangue, leite, tecidos, sêmen, órgãos e materiais biológicos de qualquer espé-
cie.
4.23 – Outros planos de saúde que se cumpram através de serviços de terceiros contratados,
credenciados, cooperados ou apenas pagos pelo operador do plano mediante indicação do
beneficiário. (Vide Lei Complementar nº 175, de 2020)
5.06 – Coleta de sangue, leite, tecidos, sêmen, órgãos e materiais biológicos de qualquer espé-
cie.
6.04 – Ginástica, dança, esportes, natação, artes marciais e demais atividades físicas.
7.04 – Demolição.
7.08 – Calafetação.
7.14 – (VETADO)
7.15 – (VETADO)
7.18 – Limpeza e dragagem de rios, portos, canais, baías, lagos, lagoas, represas, açudes e
congêneres.
12.07 – Shows, ballet, danças, desfiles, bailes, óperas, concertos, recitais, festivais e congêne-
res.
12.14 – Fornecimento de música para ambientes fechados ou não, mediante transmissão por
qualquer processo.
13.01 – (VETADO)
14.01 – Lubrificação, limpeza, lustração, revisão, carga e recarga, conserto, restauração, blin-
dagem, manutenção e conservação de máquinas, veículos, aparelhos, equipamentos, motores,
elevadores ou de qualquer objeto (exceto peças e partes empregadas, que ficam sujeitas ao
ICMS).
14.03 – Recondicionamento de motores (exceto peças e partes empregadas, que ficam sujeitas
ao ICMS).
14.09 – Alfaiataria e costura, quando o material for fornecido pelo usuário final, exceto avia-
mento.
14.14 - Guincho intramunicipal, guindaste e içamento. (Redação dada pela Lei Complementar
nº 157, de 2016)
15.07 – Acesso, movimentação, atendimento e consulta a contas em geral, por qualquer meio
ou processo, inclusive por telefone, fac-símile, internet e telex, acesso a terminais de atendi-
mento, inclusive vinte e quatro horas; acesso a outro banco e a rede compartilhada; forneci-
mento de saldo, extrato e demais informações relativas a contas em geral, por qualquer meio
ou processo.
16.02 - Outros serviços de transporte de natureza municipal. (Incluído pela Lei Complementar
nº 157, de 2016)
17.01 – Assessoria ou consultoria de qualquer natureza, não contida em outros itens desta
lista; análise, exame, pesquisa, coleta, compilação e fornecimento de dados e informações de
qualquer natureza, inclusive cadastro e similares.
17.07 – (VETADO)
17.14 – Advocacia.
17.16 – Auditoria.
17.21 – Estatística.
19.01 - Serviços de distribuição e venda de bilhetes e demais produtos de loteria, bingos, car-
tões, pules ou cupons de apostas, sorteios, prêmios, inclusive os decorrentes de títulos de capi-
talização e congêneres.
22.01 – Serviços de exploração de rodovia mediante cobrança de preço ou pedágio dos usuá-
rios, envolvendo execução de serviços de conservação, manutenção, melhoramentos para
adequação de capacidade e segurança de trânsito, operação, monitoração, assistência aos usu-
ários e outros serviços definidos em contratos, atos de concessão ou de permissão ou em
normas oficiais.
25 - Serviços funerários.
25.05 - Cessão de uso de espaços em cemitérios para sepultamento. (Incluído pela Lei Com-
plementar nº 157, de 2016)
29 – Serviços de biblioteconomia.
36 – Serviços de meteorologia.
38 – Serviços de museologia.
39.01 - Serviços de ourivesaria e lapidação (quando o material for fornecido pelo tomador do
serviço).