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Manejo de microbacias 5 Planejamento conservacionista em microbacias Maria Inés Nogueira Alvarenga* Miralda Bueno de Paula® Resumo - Para implantagio de um sistema agropecuario sustentavel é necessério 0 ‘conhecimento amplo ds ecossistemas nos quais a atividade seré implantada. O pla- nejamento conservacionista é uma ferramenta de fundamental importancia neste contexto; sendo aqui abordado de forma simplificada, visando atender a um maior snimero de usuarios, através da sugestio de um roteiro para sua elaboragso. Apresenta~ se, também, uma descrigio dos principais impactos negativos dos sistemas de produsio ‘nas microbacias, bem como sugestio de téenicas de manejo que venham mitigé-los. Palavras-chave: Conservas0; Manejo; Bacia hidrografica INTRODUGAO ‘A utlizagio das terras, salvo algumas poucas situagSes,€ feta sem critérios de capacidade de uso e/ou aptidio agricola, 0 que tem levado & queda de produtividade, ‘menor retorno econdmico, poluigdo € as- soreamento de mananciais, rebaixamento dolengo! frestico, deslocamento do homem ddo campo, perda da biodiversidade, entre otras, resumindo-se em perda ou dimi- nuigo do potencial de sustentabilidade. ‘Tal comportamento pode ser atribuido ‘falta de crédito agricola, falta de orientagdo Aéonica ete, Entretanto,o ponto culminante € falta de politica agricola e de edueago dda populagio, que nao sabe cobrar de seus dirigentes posigées sérias de direciona- ‘mento das politicas de desenvolvimento, que venham contribuir para uma methoria nna qualidade de vida e uma dstribuigao de renda mais usta, Em termos de tecnologias, existe mui- ta informagio que poderia ser aplicada categoricamente se houvesse dados bési- cos sobre 0s recursas naturais (solo, ve- etagio, gua, clima, geomorfologia, geo- logia) em escala compativel para o uso em propriedades. Porém, o que se tem de formagio é0 Projeto RadamBrasl feito pe- Io IBGE, em escala 1: 1,000,000, que serve como orientago, mas ndo & apropriado co- mo base para trabalho na maioria das pro- priedades agricolas, responsiveis pela maior parte da produgio do pafs. Além disso ha alguns levantamentos de solos ‘mais detalhados que cobrem uma grea pouco representativa das éreas agricolas pro- dutivas, Outraferramenta, também de gran- de potencial, & 2 utilizagio de informagies ‘georreferenciadas, nas quais, través do uso de programas especificos como o SPRING, © SGI etc,, obtém-se, por cruzamento de panos de informagées bisicas (declivi- dade, textura do solo, comprimento de ram- pa, geologia etc.) as classes de uso que, aliadas sinformagoes de clima e condigdes socioeconémicas, fornecem mapas de dis tribuigio das classes de aptidao agricola das terms, Entretanto, para grande maioria dos produtores e técnicos que atuam na extensio, a utlizagio dos equipamentos necessétios para obter esses produtos ain- da 6 ut6pica, pois nota-se que existe uma distancia muito grande entre a realidade do produtore onivel tecnolégico desenvolvi- ddo nas universidades ¢ entidades de pes- uisa, Estas dominam tecnologias de Pri- ‘meio Mundo num pats onde a maioria dos produtores vive, muitas vezes, um reali- dade de Terceiro Mundo, sendo estes os verdadeiros necessitados de apoio tecno- l6gico. Dentro desse contexto, 0 objetivo & apresentar de forma simplificada téenicas {que venham contribuir para colocar em pri- tica 0 uso mais racional das terras, em busca dda sustentabilidade. Assim, a elaboragdo do planejamento conservacionista em sub- bacias vem ao encontro das necessidades atuais, ou seja, preservar 0s recursos natu rais, principalmente solo e agua que sio interdependentes. O solo ¢ a caixa de re serva de dgua, que é essencial parao desen- volvimento da vida na terra PLANEJAMENTO CONSERVACIONISTA Plangjamento conservacionista € uma programagdo de um conjuntp de recomen- dlagdes a ser seguido naexploragiode uma propriedade agricola, compativel com a capacidade de uso das terras, que especi- fica as prticas mais adequadas para manu- tengio e/ou melhoramento dos recursos naturals: solo, dgua e vegetagio. ““O uso adequado da terra € 0 primeiro passo em diregio&agriculturacometa, Por tanto, cada parcela de terra deve ser em- pregada de acordo com sua capacidade de sustentago e produtividade econémica de forma que os recursos natura sejam eo Jocades & disposiglo do homem para seu melhor uso e beneficio, procurando 20 mes- ‘ng! Agr, D.Sc, Pesg, EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG, E-mail: mines@ufla br Eng’ Ages, D.Sc, Pesg. EPAMIG-CTSM, Caita Postal 176, CEP 37200-000 Lavras-MG. E-mail: bueno@ufla.br Informe Agropecusri. io Hovzonte, v.21, n.207,».55-64, nov idee, 2000 58 ‘mo tempo preservar estes recursos para as goragbes futuras” (Lepsch, 1991). ‘Seré apresentada uma sintese do Levan- tamento de Meio Fisico com vistas a aten- der a téenicos e/ou produtores, que se de- '0 | Arion tt mtoarsos | 2 valde “0 FONTE: Pundek (1994), 2000 60 Manejo de microbaciag E avalinda através dotato, pela sensa- 0 a0 esfregar um pouco de solo imido enlze 0s dedos. A aria provoca sensaglo de aspereza,oslte, sedosidade a agi, peesosidad, Quand se avaliaatexura,deve-seto- mar evidado em bomogeneizara massa do solo, pois determinados sols exigem que amass seja bem rabalhada © problema aferico ato parade 50 at curt: dura menos de um dia; _ PONTE: Pundsk (1995) rmédio: dura de dois dias a um més; longo: dura mais de um més. Para maior clareza, asnotag6es de rscos, de inundago (Freqiéncia x durago) estio reunidas no Quadro 6. : Duragao Declividade cssionsis Freqbentes Muito feqientes E a inclinagio que o solo faz em rela- : as i i 7 «io um plano horizontal Serédetermina- oS da.com clinmetro e enquadtrada nas clas- Médias 2 is 8 ses (Quadro 7). —o a ie 5 Suscetibilidade & erosdo PONTE: Benoni & Belinaza nie (1998), E feita através da observagio da ocor- réncia de erosdo laminar e/ou em suleos; representada por algarismos aribicos de QUADRO7- Classes e declvidade do solo um a seis para erosio laminar e sete a aare - nove para a freqlncia de erasio em sul- Clase a Sinboto ‘cos. Dependendo da profundiade dos sul- S r ‘0s, recebe simbologiaespecifica de acor- an e ddocomo Quadro & Suneondhlada 2s B £8) er0s8o laminar: Onda $10 c 1 sligero—jéaparente, mascom me- Catinosa to-1s > nos de 25% dohorizonte A removido, Forte ondulada 1545 2 ‘ou quando nao for possvel ident poe jan : car a profundidade normal do hor a 2 2onte A de um solo virgem, com mais = 2 ‘de Sem do horizonte superficial re FONT: Beno e Blinazal Jaior (95. rmanescente; 2 : moderada - 25% a 75% do ho- QUADRO 8. Noto de orto hidia em sues Fizonte A removido ou quando nig S-APROS: Nowsioce for possivel identifears profundida- Profiaiidate Freqocia dossuleos de normal do horizonte A de um solo dos sens Ocasiona regen Muto eghete vingem com Sema 1Sem do horizonte 7 a 2 fomuneerene, Supertcal 1 8 9 3: severa—mais de 75% do horizonte ‘A removido ¢ possivelmente hori- Leal ® ® zonte B jé aflorando, ou quando no for possivel identifcir a profundi- oe a dade natural do horizonte A de um . solo virgem, com menos de Sem do eae wu a x horizonte A remanescente; FONTE: Berolini & BellinazaiKinior (1994). Aaropecuitio, Belo Horizonte, 55-64, nov 662.2000, 4 : muito severe — todo horizonte A {J removido e horizonte B bastante ‘erodido e, algumas vezes, removido ‘em proporgies entre 25% e 75% da profundidade original; 5 : extremamente severa —horizonte BB removido na sua maior parte e com horizonte C ja atingido, estando 0 solo praticamente destrufdo para fins agricolas; ‘mboloreservado para dreas des- barrancadas ou translocagbes de blo- cos de terra, A dre erodida deve set delimitada no mapa por linha pon- tilhada tendo no seu interior o sim bolo6, ) erosdo em suloos ~ freqiténca: 7 socosonol—distanciada mais de 30m; 8 :freqdente -menos de 30m entresi, cupando menos de 75% da Srea; 9 muito freqdente ~menos de 30m entresi,ocupando mais de 75% da ea. «) erosdo em suleos ~ profundidade dos suleos: 7; 8; 9 + suleos superfciis que se desfuzem com preparo do solo; ® + © .@ : suleos rasos que po- dem sereruzados porméquinas agri- colas, mas no se desfazem com pre- paro do solo; [].(B]: suleosprofundos que ‘lo podem ser cruzados por méqui- nas agricola, mas nko atingiram hrizonte C; 1; BV; 9V : presengade vogorocas. Caracterizagéo e notagao dos elementos necessarios ao levantamento utilitario do meio fisico Existem convengGes com o objetivo de padronizar as informagées da formula imfnima, Por exemplo: usam-se letras mi- niisculasealaatismos arabicos em posigbes especificas (Quadros 2 a 8); 0 zero indica caracteristica nio-diagnosticada: os néme- ros erescem no sentido do agravamento das condigGes. Os fatores limitantes especificos sio representados por letras minsculas como seguir: pedregosidade (pd) inundagio (i) ccariter abrupto (ab) ccariter vértico (ve) hhidromorfisino (hi) seca prolongada (se) _geada e/ou vento fri (ed) cariter distrfico Gi) ‘carter ico (al) baixaCTC(ed, tiomorfismo (i) sodicidade (so) salinidade (s!) presenga de carbonatos (ca) Outro aspecto da formula “obrigat6ria” <éacaracterizagio uso atual da terra, dando Indicagdes sobre atradigio ea experiéneia dos agricultores, para sugerir possiveis ma- nejos futuros. E representada pelo seguinte: floresta: F cerrado: S ccaatinga:T ‘campo nativo: C ‘complexo vegetacional: O terreno estérl:E pastagens: P lavoura: L horticultura: H silvicultura: V pastagem nativa: Pn pastagem melhorada: Pm pastagem cultivada: Pe ‘capineira: Px lavoura perene: Lp Iavoura temporsria: Lt Javoura anual: La ‘uticultura: HE olericultura ou fraticultura: Ho araucitia: Va cesséncias exéticas: Ve cesséncias nativas: Vn pinus: Vp cevcalipto: Ve Exemplo de uma f6rmula minima: pa 22- ha ——— pit- Px c-27 Observastio: adeterminagiio da fetili- dade do solo é essencial para a implantagio decultivos, mesmo que aqui no esteja sen- do considerada como determinante da ca- ppacidade de uso, Entretanto sugere-se que, ‘quando da coleta de amostras para deter- Informe Rgropacuti, Belo Hrionte, v.21, 207, 55-64, nov 662.2000 Manojo de microbacias ‘minago da granulometria, aproveite-se a ‘mesma amostra para determinagio da fet lidade do solo. Roteiro de trabalho ara elaboragio do planejamento con- servacionista, 6 necesito trabalho decam- poe deescritirio.O trabalho decampodeve inieiar aps elaboraglo do mapa base da microbacia a ser estudada. O mapa base pode se feito a partir de foto aérea, cartas topogzificas do IBGE ampliadas em escala axdequada para o trabalho de campo (pelo ‘menos 15.000), levantamentotopogrfico ete; pode ser utlizado até um eroqus, como base para as aividades de campo. entre as atividades aserem desenvol- vidas no trabalho tém-se: 2) alvidodes de campo: percorer are; delimitar no campo glebas e subgle- bas; notar as caractersticas pela for ‘mula convencional; marcar ceras, estradas,afloramentos, reas inun- dadas ete: amostaro sol. ») aividedes de esrtro:elaborar mapa de evantamento do meio fisico; mapa de uso atual; mapa de eapacidade de so; mapa de uso planejado; memo- sialtécnicodeseritvo. IMPACTOS DOS SISTEMAS DE PRODUGAO NAS MICROBACIAS As tecnologias empregadas nas propric dades com diferentes sistemas de produ- io podem afetar de forma negativaou po- sitiva a sustentabilidade das microbacias. Os modelos de produgio agropecuitria, ‘quando nao eficientes, provocam impactos de graves conseqiiéncias econdmicas € sociais, que se fardo sentir a0 longo do tempo, tais como os descritos a seguir. Eroséo De modo geral 0 preparo do solo tem sido feito sem observagao de técnicas cconservacionistas, predispondo a area & degradagiio, O manejo inadequado e a de~ _gradagiio do solo tém como conseqiéncia ‘acompactaglo, que provoca.aremogao das ‘camadas superiores (erosio), No preparo do solo, 0 técnico deve conhecer a sua susceptibilidade & erosio (erodibilidade) ‘que se refere as caracteristicas intrinsecas Manejo de microbacias do solo, Assim, solos com erodibilidades diferentes apresentardio comportamentos iferentes, sob a mesma forma de cultivo. ‘Dessa maneira a cada grupo e/ou classe de solo corresponded um conjunto de priticas ‘mais eficientes. Outros fatores que in- fluenciam a erosdo do solo slo os extrin- secos, que se referem a um manejo ina equado, o que significa o uso do solo fora de sua classe de capacidade de uso. Poluigéo terme poluigo édirigido usualmente {i presenga de substincias txicas introdu- Zidas pelo homem no meio ambiente. O uso intensivo de fertlizantes e de agrot6xicos provoca o carreamento destes insumos, contaminando a gua do solo e o lengol fredtico. Contudo, muitas vezes a poluicio 6 causada por substincias no-t6xicas, ssendo a erosfio considerada também como ‘uma parte dos problemas da poluigio. Sedimentagéo Nos cursos d’sigua em geral, oassorea- :mento significa o actimulo de sedimentos, residuos de fetilizantes, coretivos edefen- sivos agricolas, © que prejudica a flora, ‘Fauna, captagdo d’ gua, potencializando 0 prejuizo dos agricultores. A sedimentagio assoreando cursos djgua contribui tam- 'bém para 0 aumento das inundagdes. Precipitagao, escoamento e enchentes Segundo Shaxson (1988), uma parte sig- nificativa da Sguada chuva se perde como escoamento superficial com graves efeitos: 2) diminui o volume de digua que seria potencialmente armazenado no solo; b) age como meio de transporte dos nutrients eridos do solo pelo im pacto (desagregagio) das gotas de chuva; © fluxo concentra pode erodir mais solo das margens lito dos canais; «uma réipida concentrago do escoa- mento superficial nos cursos d'gua naturais pode causar sérias inun- dagdes; «) devido 3s perdas de gua da chuva durante a estaglo chuvosa, havers ‘uma redugdo da gua que deveria Informe Agropecuirio, Bo Horizont estar disponivel para sustentar os fluxos dos riosdurante aestagio seca. Estradas cscorrimento superficial ao longo das estradas nas microbacias pode causar cerosio, com efeitos localizados. MANEJO E CONSERVACGAO NAS MICROBACIAS As prticas conservacionistas (Fig. 23, .54) visam & manutengio da potencialida- de produtiva do solo, Bertoni & Lombardi Neto (1990) definem essas priticas como técnicas utilizadas para aumentar a resis- tncia do solo ou diminuir as forgas do processo erosivo. O estado de Santa Catarina, com expe- rigncia no manejo de microbacias hidro- srificas, prioriza uma melhor cobertura vegetal (Silva, 1996); ¢, em seguida aado- 40 do cultivo minimo ou plantio direto, associado com subsolagem e adubagao ‘oratinica para melhoraraestrutura do solo. Posteriormente,o plantio em nivel,culturas em faixas, as barreiras vegetals;e, somente «em iltimo caso, as barreiras mecfnicas ea readequacio das estradas intermas paracvi- tar oescorrimento superficial excessivo, Segundo Shaxson (1988), quase toda compactagio ¢ erosio causadas pelas g0- tas de chuva poderdo ser evitadas se, no ‘minimo, 40% a 50% da superficie do solo estiver protegida com algum tipo de co- bertura bem distribuida que pode ser obtida através das téenicas de manejo, Manejo dos residues de cultura A manutengo da estrtura,redugio da temperatura, conservagio de umidade,re-

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