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Escrever envolve correr pra lá e pra lá entre essa paisagem escurecida onde a facticidade está

derramada e uma sala sem janelas depurada de tudo o que não conheço. É a depuração que toma tempo. É
a depuração que é um mistério. Uma vez depurada, a sala escreve a si mesma. Copio os nomes de tudo o
que sobra nela e anoto a atividade deles.

Como ocorre a depuração? Lukács diz que começa com meu intuito de remover tudo o que não
acessível à experiência imediata (Erlebbarkeit) do eu como eu. Fosse possível, isso selaria o recinto em
suas próprias fronteiras como um cosmo. Lukács está receitando uma sala para o trabalho estético; seria
um gesto de falsa consciência dizer que a escrita acadêmica pode acontecer ali. Ainda assim, você sabe
tão bem quanto eu, o pensamento se descobre nessa sala em seus melhores momentos – trancado em suas
próprias pressões, pescando fatos da paisagem em notas ou na memória tão bem quanto pode – vibrando
(como diria Mallarmé) com seu desaparecimento. Pessoas veem de diferentes modos como representar a
vibração. “Nomes” e “atividade” são eufemismos para o trabalho. Você pode preferir diferentes
eufemismos; acho que o importante é anotar qualquer vibração que você vir enquanto sua atenção estiver
firme.

Atenção é uma tarefa que compartilhamos, você e eu. Manter a atenção firme significa evitar que
ela se acomode. Esta é a razão, em parte, por que decidi falar de dois homens ao mesmo tempo. Para
evitar que um se acomode ao outro. Movendo-se e não se acomodando, eles estão lado a lado em uma
conversa e, todavia, nenhuma conversa acontece.

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