“proençal”, ou seja, de provençal. E é de acordo com esse propósito que faz o louvor da sua “se- nhor”, da sua dama. Nas três estrofes ou “cobras”, o poeta faz um “louvor” e não um retrato, di- zendo que a sua “senhor” é dotada de prez (valor), fremusura, bondade, é mui comunal (simples), 5 de grande valor, dotada de bom sém (sensatez); tem um riso bonito (ri melhor que as outras mu- lheres) e fala muito bem; – por isso ela é superlativada (mais que todas las do mundo val, Deus nom quis que lh’outra foss’igual); ele não sabe quem possa cabalmente falar dela, visto que ela só tem virtudes. Ou seja: este poema indica-nos não só o modelo (o provençal), como os moldes em que se faz 10 – uma louvação da dama, de uma dama colocada num plano de superioridade (Rodrigues Lapa equipara este posicionamento do trovador face à dama à postura medieval do vassalo face ao seu suserano ou do crente face à Virgem Maria). E, de facto, quase todas as 725 cantigas de amor falam desta louvação de uma dama colocada num plano tal de superioridade que não é lícito ao trovador dela esperar qualquer bem, qualquer 15 recompensa material ou simplesmente qualquer reciprocidade amorosa. Daí que nas nossas cantigas de amor, e neste como noutros aspetos, numa perspetiva diferente das canções dos trovadores provençais que são o seu modelo, se fale do sofrimento de amor (a “coita” de amor) que faz ensandecer (enlouquecer) ou morrer de amor. De tal modo a insistência na morte de amor e na “coita” é grande, que trovadores houve que ironizaram a esse respeito, em cantigas satíricas. 20 Na Provença, pelo contrário, cantava-se a alegria do amor no seio da natureza (ausente das nos- sas cantigas de amor). PAIS, Amélia Pinto, 2004. História da Literatura em Portugal – Uma perspetiva didática. Vol. 1. Porto: Areal (p. 38)