Você está na página 1de 2

A cultura, a política e o meio ambiente

Há poucos dias, Dilma Rousseff tomou posse como a primeira mulher a assumir a
Presidência da República Federativa do Brasil. A cerimônia de transmissão do cargo,
bonita apesar da chuva, me deixou emocionada. Como dizia Renato Russo, "vamos
cantar juntos o Hino Nacional; a lágrima é verdadeira." Minhas lágrimas foram verdadeiras
e sei que as de muita gente por aí também. Passada a festa, agora é hora de o novo
governo se deparar com velhos problemas que fazem parte do nosso contexto histórico.

Não votei em Dilma Rousseff. Fui eleitora de Marina Silva no primeiro turno e, na segunda
etapa, optei por, democrática e conscientemente, anular meu voto. Nem por isso torço
para que o governo daquela que se declara "a presidenta de todos os brasileiros" dê
errado. O país é maior do que divergências ideológico-partidárias e é por causa do
destino do Brasil que acontecimentos políticos voltam a ser assunto neste blog.

O motivo deste texto é um episódio que, num primeiro momento, pode parecer trivial. Na
quarta-feira 12 de janeiro, ainda na primeira quinzena do governo Dilma, o presidente do
Ibama, Abelardo Bayma, deixou o cargo alegando razões pessoais. Certo, ninguém é
obrigado a ficar para sempre no mesmo emprego, não é?

Mas pelo que foi divulgado nos noticiários, Bayma parece ter sido mais um numa lista de
servidores públicos que caíram sob o peso da pressão, dentro e fora do governo, para
agilizar a liberação de licenças ambientais. Especialmente licenças ambientais de usinas
hidrelétricas e especificamente a licença para construção de um monstro chamado Belo
Monte.

Qualquer um que se disponha a fazer uma pesquisa no Google sobre o assunto Belo
Monte acaba descobrindo as graves questões ambientais envolvidas na realização dessa
obra, que vem sendo discutida desde os anos 1980. Não é algo que possa ser decidido
sem muita reflexão e estudos, pois deslocamento de pessoas, destruição de habitats,
mortandade de animais, tudo isso faz parte do panorama projetado. Enquanto isso, as
menções à questão da eficiência energética, que renderia ao Brasil a economia de
milhares de quilowatts, permanecem tímidas.

É mais fácil, mais conveniente para diversos interesses capitalistas e mais grandioso em
uma futura disputa eleitoral investir numa megaobra do que em campanhas de educação
do povo, de facilitação da compra de eletrodomésticos mais econômicos, de
aproveitamento da maravilhosa luz do sol que aquece nosso país durante todo o ano. E o
que mais me inquieta é que a maior parcela da população permanece alheia às
discussões e às implicações de temas como esse, que acabam sendo decididos apenas
pelos políticos, muitas vezes de acordo com seus próprios interesses ou com a força do
lobby praticado.

Como o assunto aqui é meio ambiente e cultura, que tal lembrarmos o documentário Uma
verdade inconveniente, em que o antigo vice-presidente americano Al Gore questiona a
ideia de colocar defesa ambiental e lucro numa balança e mostra que, sem um planeta
habitável, não há lucro possível? Que tal lembrar o trecho de Matrix em que o agente
Smith compara a humanidade aos vírus, dizendo que são as únicas espécies a tentarem
destruir o local em que vivem? O planeta não é casa somente para a raça humana. Hoje,
já se sabe que há famílias de ursos polares morrendo dentro de tocas que, por causa do
aquecimento global, desabam enquanto eles estão hibernados. E o número de espécies
extintas e em risco de extinção é chocante.
Então, se você, caro leitor, acha que o que está acontecendo é um mero ciclo natural na
história da Terra, sugiro que assista a Uma verdade inconveniente. Ou leia o livro. Se
pensa que não pode fazer nada a respeito do assunto Belo Monte, a organização
Avaaz.org, mundialmente conhecida pelo ativismo na internet, está promovendo um
abaixo assinado em que pede a paralisação do projeto, o investimento em eficiência
energética, em fontes de energia que causem menos impacto ambiental e a defesa dos
direitos das populações indígenas. Em cinco dias, foram colhidas 150 mil assinaturas e a
petição pode ser consultada e assinada em
https://secure.avaaz.org/po/pare_belo_monte/?vl.

Agora, se você é daquelas pessoas que acham que política não tem nada a ver com sua
vida e é apenas um assunto maçante, minha sugestão é que leia o livro Política – Quem
manda, por que manda, como manda de João Ubaldo Ribeiro, que eu tive a sorte de ler
quando ainda estava no ensino médio. Esse livro, muito didático e nem por isso menos
interessante, termina com um apêndice intitulado Dez bons conselhos de meu pai para
cidadãos honestos e prestantes. O resumo do capítulo é o seguinte:

1) Não seja tutelado: Não permita que as pessoas resolvam as coisas por você, por mais
que o problema seja chato de enfrentar.
2) Não seja colonizado: Tenha orgulho de sua herança, não seja subserviente com o
estrangeiro, não se ache inferior.
3) Não seja calado: Seja calado só por educação, até o ponto em que isto não o
prejudicar. Se prejudicar, só cale a boca quando deixar de prejudicar.
4) Não seja ignorante: Não ser ignorante é um dos mais sagrados direitos que você tem
e, se você não usa voluntariamente esse direito, merece tudo o que de adverso lhe
acontece.
5) Não seja submisso: Reconheça suas faltas, mas não se humilhe. (...) Toda tentativa
de submetê-lo é muitíssimo grave.
6) Não seja indiferente: Ser indiferente em relação ao semelhante ou ao que nos rodeia,
quer você seja religioso ou não, é um dos maiores pecados que existem, porque é um
pecado contra nós mesmos, um suicídio.
7) Não seja amargo: As coisas acontecem, aconteceram, ficam acontecidas (...).
Construa sempre.
8) Não seja intolerante: Alegre-se com a diversidade humana. Procure honestamente
entender os outros. Só não seja tolerante com os inimigos conscientes e comprometidos
com o seu fim.
9) Não seja medroso: Todo mundo tem medo, mas a pessoa não pode ser medrosa.
Para viver e fazer é necessário manter uma coragem constante e acesa.
10) Não seja burro: Normalmente, quando você está infeliz, você está sendo burro.
Quando você está sendo explorado, você é sempre infeliz.

Você também pode gostar