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Língua Portuguesa 1 Nota



cadete
turma data

Unidade 5: Produção Textual

1 - Leia com atenção os textos a seguir. Escolha um dos textos e elabore um resumo em
um único parágrafo, com o mínimo de 20 e o máximo de 30 linhas. Observe,
atentamente, em cada texto produzido por você, aspectos fundamentais como clareza,
concisão, coerência, coesão e correção gramatical. (Obs.: Não serão aceitas colagens do
texto original, nem enumerações que tornem o texto esquemático).
TEXTO 1

MUDANÇAS CLIMÁTICAS1

Jacqueline M. McGlade2

Apesar dos resultados frustrantes da COP-15, muitos cientistas afirmam que responder ao
aquecimento global é tarefa para já.
O frágil texto de encerramento da Conferência do Clima de Copenhague, que não fixa metas
obrigatórias de redução de emissões de gases-estufa, mostra que muitos países ainda não se deram
conta das consequências do aquecimento global. Responder aos desafios que ele impõe é tarefa de
todos e deve ser iniciada já.
O clima está mudando – mais rápido do que nunca. Desde o início dos tempos, ele passa por
alterações. Ao longo de períodos mais quentes e outros frios, a vida teve de se adaptar e evoluir.
Mas agora as atividades humanas afetam a dinâmica do próprio planeta. E, o mais alarmante, o
ritmo da mudança foi dramaticamente alterado, ameaçando levar muitas plantas e espécies animais
à extinção.
Ao queimar combustíveis fósseis, temos acrescentado gases de efeito estufa, que retêm o
calor na atmosfera, às emissões feitas pela natureza. Como resultado, a concentração desses gases
no ar está bem acima do nível calculado em qualquer momento nos últimos 800 mil anos.
Inevitavelmente, as temperaturas têm subido também.
Em 2007, o Painel Intergovernamental sobre Mudança Climáticas (IPCC, na sigla em
inglês) publicou seu último relatório científico, mostrando que a temperatura média global
aumentou 0,74°C ao longo do século passado. Na região ártica, a temperatura média das partes
emersas aumentou em até 5°C durante o mesmo período, e agora há uma forte probabilidade de que
o Polo Norte esteja livre de gelo durante o verão nas próximas duas ou três décadas.
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Disponível em: https://www.revistaplaneta.com.br/mudancas-climaticas/ Acesso em: 14mar19
(texto adaptado para fins didáticos)
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Jacqueline M. McGlade é diretora da Agência Europeia do Ambiente. Ela é bióloga marinha e professora de
informática ambiental da Universidade de Londres.
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As geleiras estão derretendo mais rapidamente do que o esperado, acelerando a elevação do


nível do mar e aumentando o número de casos de inundações oriundas de degelo e de escassez de
água fora de época em algumas das regiões mais densamente povoadas do mundo.
É claro também que, mesmo se pudéssemos parar as emissões relacionadas às atividades
humanas amanhã, a enorme quantidade de gases-estufa despejada na atmosfera provocará um
aquecimento adicional entre 0,5ºC e 1ºC.
Podemos ver com o que um aumento de 1ºC na temperatura global se parece. E podemos
antecipar o que um aumento de 2ºC na temperatura (o limite máximo aceitável de elevação, de
acordo com o IPCC) traria: mudanças na maneira pela qual as plantas crescem, para onde os
animais migram e na forma como os ecossistemas funcionam.
Mas um mundo com um incremento de temperatura de 3ºC poderia ser muito diferente. Um
número crescente de inundações, tempestades e secas impactaria severamente a maneira como
vivemos – nosso acesso à água, aos alimentos, além da questão da segurança dos nossos
suprimentos energéticos.
No momento em que chegarmos a um aumento de 4°C, a elevação das temperaturas poderia
destruir a própria estrutura das nossas sociedades. Algumas áreas atualmente habitáveis poderiam
ser incapazes de prover as sociedades humanas, menos ainda de comportar os números
populacionais que antecipamos no planeta nos próximos 20 a 30 anos.
E nem sequer falamos de um mundo onde as temperaturas médias subiriam 5ºC ou mais.
A explosão da vida moderna é construída em torno de suprimentos aparentemente ilimitados
de carvão, petróleo e gás, fontes de energia para atender a uma demanda que cresce
implacavelmente. Todo o processo tem como pressuposto a ideia segundo a qual nosso ambiente
natural é capaz de fornecer suprimentos infinitos de combustíveis e de acolher cada vez mais os
subprodutos da produção de energia.
Na realidade, é claro, queimar combustíveis fósseis para impulsionar nossa economia tem
gerado as emissões de gases-estufa que estão causando o aquecimento global agora. A produção e o
consumo de energia respondem por 70% das emissões humanas de dióxido de carbono. Metade
dessas emissões é gerada pela China, pelos Estados Unidos e por países da União Europeia (UE).
A demanda de energia nas economias emergentes, incluindo China, Índia, Brasil e
Indonésia, deve crescer rapidamente, talvez 100% nas próximas décadas.
Se optarmos por continuar a queima de combustíveis fósseis até que se esgotem os estoques,
vamos simplesmente aumentar a quantidade de gases-estufa na atmosfera e experimentar um
aquecimento global ainda maior.
Mas há uma alternativa. Mudar para um novo paradigma de geração e utilização de energia,
baseado em fontes renováveis e eficiência energética, permitiria evitar muitos problemas próprios
de um mundo mais quente.
Atualmente, tanto as indústrias como as residências desperdiçam a energia que produzimos.
Na luta contra as alterações climáticas, esse é um lugar óbvio para começar, porque uma eficiência
energética maior não é apenas reduzir as emissões de gases-estufa: isso realmente nos faz poupar
dinheiro. A Agência Internacional de Energia (AIE), por exemplo, estima que cada dólar gasto em
medidas de poupança energética evita um investimento de mais de US$ 2 na produção de energia.
Pequenas ações em residências, tais como trocar eletrodomésticos por outros mais eficientes, podem
ter um efeito enorme quando praticadas na sociedade.
Estima-se, por exemplo, que a proibição das lâmpadas incandescentes na UE, a vigorar nos
próximos anos, produzirá uma economia de R$ 12,5 bilhões a R$ 25 bilhões, aproximadamente, a
cada ano e poupará a energia equivalente ao consumo anual de eletricidade da Romênia.
Da mesma forma, muitos lugares na América têm proibições locais sobre secar as roupas em
varais externos, o que obriga as pessoas a usar máquinas de secar elétricas. Estima-se que as
necessidades energéticas dessas secadoras sejam equivalentes à produção total de 15 centrais
nucleares.
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Assim, as ações para diminuir a demanda de energia são, obviamente, cruciais, porque têm
um efeito imediato sobre as emissões de gases-estufa de usinas. Mas essa é apenas uma parte do
quebra-cabeça. Precisamos ainda gerar quantidades significativas de energia, até porque a demanda,
no mundo em desenvolvimento, deverá aumentar rapidamente. Para atender a essa demanda, temos
de nos distanciar de nossa dependência dos combustíveis fósseis e nos concentrar, em vez disso, nas
energias renováveis.
A UE está a meio caminho de sua meta de atender 20% de suas necessidades de energia
oriunda de fontes renováveis, como eólica e solar, em 2020, mas há uma grande variação nas
realizações de cada país. Na vanguarda, a Suécia gera mais de 40% de sua energia a partir de fontes
renováveis – um exemplo do que pode ser conseguido com as ambições e as políticas corretas.
Para manter a mudança climática dentro de patamares razoáveis, é preciso limitar a mudança
da temperatura média a 2ºC ou menos. Na prática, isso significa que até 2050 teremos de ter cortado
as emissões de gases-estufa em pelo menos 50% na comparação com os níveis de 1990. Para os
países industrializados, cujas emissões per capita de gases-estufa ainda excedem imensamente a
população, a redução terá de ser de algo como 80%.
A eficiência energética e as energias renováveis têm, obviamente, um papel crucial a
desempenhar. É importante salientar, no entanto, que há diferentes possibilidades de redução das
emissões de gases-estufa e não devemos nos concentrar apenas na identificação das abordagens
mais baratas, sem considerar seu impacto total. Fazer mais com nossos escassos recursos exige que
evitemos soluções para um problema, as quais podem criar novos problemas em outras áreas.
Os benefícios de algumas fontes de energia renováveis, por exemplo, podem ser
neutralizados pela poluição que causam ou por seu impacto sobre os recursos hídricos. Algumas
medidas para combater a poluição do ar vão ajudar a reduzir o aquecimento global; outras medidas
vão exacerbá-lo. [...]
Alcançar as mudanças necessárias nas formas de gerar e utilizar a energia exigirá,
obviamente, esforços de toda a sociedade. As decisões das empresas e dos consumidores vão, em
última instância, determinar o destino do nosso ambiente. Mas os governos têm um papel
particularmente importante na criação de incentivos que orientem essas decisões.
Um elemento crucial aqui são os sinais de preço que todos nós enfrentamos como
produtores ou consumidores. Nas economias de mercado, contamos com os preços para orientar
nossas decisões de compra. Frequentemente, porém, os preços de mercado apresentam uma imagem
distorcida dos custos de produção – excluindo, por exemplo, os custos impostos à sociedade, hoje
ou no futuro, como resultado da poluição, das mudanças climáticas e assim por diante.
Neste momento, os preços dos combustíveis fósseis muitas vezes refletem o custo de
extração e distribuição, mas estão longe de representar a carga total no ambiente. Corrigir essas
deficiências, utilizando mecanismos como a taxação verde aumentaria significativamente o
incentivo para que empresas e indivíduos investissem em eficiência energética e em energias
renováveis.
O desafio é considerável e exigirá esforços de todos os setores e todos os países. É crucial,
porém, que não adiemos a ação enquanto se debate a atribuição de responsabilidades, porque isso só
tornará mais difícil atingir a meta.
A AIE calcula que cada ano em que adiamos a mudança para a energia de baixo carbono irá
adicionar US$ 500 bilhões (cerca de R$ 850 bilhões) ao custo total do cumprimento da meta de 2ºC.
Alguns anos de atraso podem tornar o alvo inatingível.
É claro, então, que os custos da demora são muito maiores do que os da ação. Portanto, a
mensagem é simples: é preciso agir agora.

Disponível em: https://www.revistaplaneta.com.br/mudancas-climaticas/ Acesso em: 14mar19


(texto adaptado para fins didáticos)
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TEXTO 2

O DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO É APLICÁVEL ÀS NOVAS


TECNOLOGIAS DE GUERRA?
Gabriel Pablo Valadares3
Nos últimos anos, têm crescido exponencialmente as reinvindicações políticas, étnicas,
nacionais ou religiosas e a luta pelo acesso a recursos-chave como vetor das dinâmicas que
originam ou dão continuidade aos conflitos armados. As tensões não resolvidas em diferentes partes
do planeta continuam se acumulando, os recursos essenciais para as sociedades são cada vez mais
escassos, e o tecido social e os meios de resiliência das populações afetadas se desgastam
perigosamente.
Por um lado, os meios de comunicação expõem a devastação das aldeias e cidades; milhares
de pessoas mortas, feridas, deslocadas ou cruzando fronteiras, devastadas pela dor, desespero e
miséria, muitas vezes a partir do uso, por exércitos regulares ou por grupos armados, de novas
tecnologias de guerra. A sofisticação da maquinaria militar e a distância física dos soldados no
campo de batalha não são novidade. No entanto, recentes avanços no campo da robótica e da
informática, combinados com as demandas operacionais militares, apresentam a possibilidade de
reduzir ou eliminar completamente o controle humano direto em sistemas de armas e no uso da
força, o que pode ser altamente arriscado para pessoas e bens protegidos pelo direito internacional
humanitário (DIH).
Essas novas realidades sem dúvida geram uma sensação de insegurança que nos questionam
sobre o devido respeito às regras e normas do DIH e a pertinência de sua aplicação às novas
tecnologias de guerra.
O DIH, conjunto de normas internacionais que, por razões humanitárias, trata de limitar os
efeitos dos conflitos armados, de um lado serve para proteger as pessoas que não participam ou que
deixaram de participar dos combates e, de outro, limita os meios e métodos para a condução das
hostilidades.
Não é fácil compreender o valor e a pertinência das normas do DIH se ao menos não se
tentar superar a apatia generalizada que existe sobre seu respeito e aplicação – uma apatia em parte
gerada pelo desgaste emocional e o desalento que acarreta ver a morte e a destruição cometidas
indistintamente pelas partes envolvidas no teatro de operações ou, às vezes, pela utilização de
tecnologias militares não tripuladas que são comandadas à distância.
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Este artigo, submetido em outubro de 2016, é de exclusiva responsabilidade do autor e não
necessariamente representa em todo o texto a posição oficial do CICV. O autor agradece a colaboração da
senhora Monica Paulina Espinoza Raggi e de Diogo Alcantara pela revisão do português.
Gabriel Pablo Valladares é advogado pela Faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires
(Argentina), desde 1998 é assessor jurídico da Delegação Regional do CICV para Argentina, Brasil, Chile,
Paraguai e Uruguai. Até 1997, foi professor adjunto interino de direito internacional público e de direito
internacional humanitário da Faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires e da Faculdade de
Direito da Universidade de Flores (Argentina). Entre 2005 e 2007, foi professor convidado de pós-graduação
lato sensu em direito dos conflitos armados da Universidade de Brasília. Entre 2004 e 2009, foi professor
titular de direito internacional humanitário do Mestrado em Direitos Humanos da Universidade Nacional de
La Plata (Argentina). Tem sido correspondente do Asser Instituut da Holanda para seu Yearbook of
Internacional Humanitarian Law. É autor de obras e artigos de direito internacional e tem participado de
centenas de eventos acadêmicos como expositor na América, África e Europa.
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O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), uma organização independente,


imparcial e neutra que se esforça por prestar proteção e assistência humanitária às vítimas dos
conflitos armados e de outras situações de violência, também é promotor e guardião do DIH,
cumprindo um importante papel na promoção e no desenvolvimento de suas normas tanto para a
proteção de vítimas quanto para a limitação de certos métodos e meios de combate. Ser o guardião
não é ser o garantidor do DIH — essa função cabe aos Estados.
A natureza dos conflitos armados contemporâneos continuamente apresenta desafios para a
aplicação e o respeito ao DIH em muitas áreas. É preciso compreender esses desafios e solucioná-
los para que o DIH continue cumprindo sua função de proteção em situações de conflito armado.
Um dos desafios atuais é a aplicabilidade de suas normas à vasta gama de novas tecnologias que
têm entrado, ou que entrarão em mais algum tempo, nos teatros de operações bélicas, entre elas os
drones armados, os sistemas de armas autônomas e a chamada “guerra cibernética”.

As novas tecnologias de guerra

Muitos dos novos desenvolvimentos tecnológicos são funcionais para novos métodos e
meios de guerra. Por exemplo, os drones armados, os sistemas de armas autônomas e a denominada
“guerra cibernética”. Todos eles apresentam novos desafios humanitários, éticos e jurídicos.
Embora as novas tecnologias de guerra não sejam regulamentadas especificamente nos tratados de
DIH, seu desenvolvimento e uso não caem em um vazio jurídico.
Como acontece com todos os sistemas de armas, eles devem ser capazes de ser usados sem
infringir o DIH, em particular as normas sobre a condução das hostilidades. Essa responsabilidade
cabe a cada Estado que desenvolve essas novas tecnologias de guerra em conformidade com as
normas específicas do DIH — que dispõem que, quando um Estado estuda, desenvolve, adquire ou
adota uma nova arma, ou novos meios e métodos de guerra, tem a obrigação de determinar se seu
uso está proibido pelo direito internacional. Essas normas são para assegurar que as forças armadas
de um Estado sejam capazes de conduzir as hostilidades em conformidade com suas obrigações
internacionais e que novas armas não sejam utilizadas prematuramente em condições nas quais não
se possa garantir o respeito ao DIH. No entanto, apesar desse requisito jurídico e da grande
quantidade de Estados que desenvolvem ou adquirem novos sistemas de armas a cada ano, sabe-se
que apenas alguns têm aplicado procedimentos para realizar exames jurídicos de novas armas.

Os drones armados

O DIH não proíbe expressamente os drones nem considera que sua índole seja
inerentemente discriminatória ou pérfida. Eles não são diferentes das armas disparadas de aeronaves
tripuladas, como helicópteros ou outras aeronaves de combate. Contudo, é importante notar que,
embora não sejam ilícitos em si, seu uso está sujeito ao direito internacional. Por outro lado, deve-se
mencionar que nem todos eles portam armas e são usados para o combate. Na verdade, muitos dos
drones utilizados pelos militares não carregam armas e são usados com fins de vigilância ou de
inteligência militar.
Há quem defenda que os drones melhoram a precisão dos ataques, o que reduziria o número
de vítimas e causaria menos danos materiais. Esse é um assunto para debate, porque faltam
informações confiáveis sobre os efeitos da maioria dos ataques efetuados com drones e porque, pelo
menos em algumas ocasiões, os ataques com drones já mataram ou feriram indevida ou ilicitamente
pessoas civis.
Os tratados de armas e demais instrumentos jurídicos do DIH não se referem expressamente
aos drones. No entanto, está claro que o uso em conflitos armados de qualquer sistema de
armamento está sujeito às normas de DIH. Isso significa, entre outras coisas, que, ao usar drones
armados, as partes em um conflito devem sempre distinguir entre combatentes e civis e entre
objetivos militares e bens de caráter civil, bem como tomar todas as precauções viáveis para
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proteger os civis e seus bens, e devem suspender ou cancelar um ataque quando seja suscetível de
causar incidentalmente danos a pessoas civis ou a bens de caráter civil que sejam excessivos em
relação à vantagem militar concreta e direta prevista. Do mesmo modo, os drones não devem de
modo algum ser utilizados para transportar armas proibidas, como agentes químicos ou biológicos.
Em conformidade com o DIH, nos conflitos armados é permitido usar força letal contra
combatentes e civis que participam diretamente das hostilidades.
Embora os operadores de sistemas de armas controladas à distância, como os drones,
possam estar longe dos campos de batalha, são eles que operam o sistema, identificam o alvo e
disparam os mísseis. Em geral, essas pessoas operam sob o comando de um responsável; portanto,
em conformidade com o DIH, os operadores de drones e sua cadeia de comando são responsáveis
por suas ações e consequências. O fato de que estejam a centenas de quilômetros do campo de
batalha não os isenta de suas responsabilidades, entre elas a obrigação de aplicar os princípios de
distinção e proporcionalidade e a de tomar todas as precauções necessárias no ataque. Assim, os
operadores de drones não são diferentes dos pilotos de aeronaves tripuladas — como helicópteros
ou outras aeronaves de combate — no que diz respeito à sua obrigação de respeitar o DIH e, da
mesma forma, também podem ser objeto de ataques lícitos conforme as normas de DIH.

A guerra cibernética

O CICV entende a “guerra cibernética” como as operações lançadas contra um computador


ou um sistema de computadores por meio de uma corrente de dados quando usados como meios e
métodos de guerra em um contexto de conflito armado, segundo definido no DIH. Pode-se recorrer
à guerra cibernética como parte de um conflito armado que, em outros aspectos, é poupado de
operações cinéticas.
Felizmente, até agora a guerra cibernética não tem conduzido a consequências humanitárias
dramáticas. Embora ainda não se conheça completamente o potencial militar do ciberespaço,
aparentemente os ciberataques contra os sistemas de transporte, as redes elétricas, os diques e as
usinas químicas ou nucleares são tecnicamente possíveis. Tais ataques podem ter consequências
graves, com elevado número de mortos ou feridos civis e danos consideráveis aos bens de caráter
civil. Talvez haja mais probabilidade de que as operações cibernéticas sejam usadas para manipular
a infraestrutura ou os serviços civis, acarretando problemas de funcionamento ou perturbações que
não necessariamente causem mortes ou lesões imediatas.
Apesar de ser relativamente nova e se desenvolver rapidamente, a tecnologia cibernética,
como já dito, não atua em um vazio jurídico.
O CICV acolheu com agrado o fato de que os relatórios de 2013 e 2015 do Grupo de
Especialistas Governamentais das Nações Unidas sobre os Avanços no Campo da Informação e das
telecomunicações no contexto da segurança internacional tenham confirmado que “o direito
internacional e, em particular, a carta das Nações Unidas é aplicável…” a essa temática, e que
tenham destacado que se aplicam “os princípios jurídicos internacionais estabelecidos, com
inclusão, quando proceder, dos princípios de humanidade, necessidade, proporcionalidade e
distinção”. Um número crescente de Estados e organizações internacionais afirmou publicamente
que o DIH se aplica à guerra cibernética.
Em 2011, o CICV declarou que o uso das capacidades cibernéticas em conflitos armados
deve observar todos os princípios e normas do DIH, como acontece com qualquer outra arma, meio
ou método de guerra, novos ou antigos. Não faz qualquer diferença o fato de que o ciberespaço seja
considerado um novo domínio para a guerra, semelhante a ar, terra, mar e espaço exterior; que seja
considerado um novo domínio diferente, por ser de origem humana, enquanto os outros são
naturais; ou que não seja considerado um domínio como tal.
Durante os últimos quatro anos, o CICV tem mantido um diálogo bilateral e confidencial
com vários Estados, especialistas e think tanks sobre o possível custo humano da guerra cibernética
e os desafios destacados.
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Sistemas de armas autônomas

Durante os últimos anos, tanto o desenvolvimento quanto a utilização de sistemas robóticos


pelas forças armadas têm experimentado um aumento notável, especialmente no que diz respeito a
diferentes sistemas não tripulados que operam no ar, na terra e na água. Essa mudança de paradigma
não é um acontecimento inesperado, mas o resultado do aumento gradual, ao longo do tempo, da
autonomia dos sistemas de armas, especialmente em suas “funções críticas”, ou seja, a seleção e o
ataque de objetivos.
Nos últimos anos, multiplicaram-se as discussões sobre sistemas de armas autônomas,
ocorridos em vários fóruns. Entre esses debates, figuram reuniões de especialistas no âmbito da
Convenção sobre Proibições ou Restrições ao Uso de Certas Armas Convencionais que Podem Ser
Consideradas como Excessivamente Nocivas ou Ter Efeitos Indiscriminados, realizadas em 2014 e
2015, e as reuniões de especialistas convocadas pelo CICV em 2014. As opiniões sobre esse tema
complexo, incluindo as do CICV, continuam a evoluir para uma melhor compreensão das
capacidades tecnológicas atuais e potenciais, o propósito militar da autonomia em armas e as
questões resultantes relacionadas com o respeito ao DIH e à aceitabilidade ética.
Um dos principais problemas é que não há uma definição internacionalmente aceita de
sistemas de armas autônomas, mas um elemento comum em várias definições propostas é a ideia de
um sistema de armas que pode selecionar e atacar objetivos de forma independente.
O CICV propôs que “sistemas de armas autônomas” é um termo amplo que cobriria
qualquer tipo de sistemas de armas que operam no ar, na terra ou no mar, com autonomia em suas
“funções críticas”, ou seja, uma arma que pode selecionar e atacar objetivos sem intervenção
humana. Após a ativação inicial, é o próprio sistema de armas — usando seus sensores, programas e
armas — que se encarrega dos processos de seleção de alvos e de ações que são normalmente
controladas diretamente por seres humanos.
Quer dizer que é a autonomia das funções críticas o que distingue os sistemas de armas
autônomas de todos os outros sistemas de armas, inclusive dos drones armados, em que, como
mencionado anteriormente, as funções críticas são controladas à distância por um operador humano.
Alguns sistemas de armas usados hoje são autônomos em suas funções críticas, entre eles os
sistemas de defesa aérea e antimísseis, os sistemas de armas de “proteção ativa” para veículos
terrestres e os sistemas de armas sentinela, entre outros.
Dado o atual ritmo dos avanços tecnológicos, é urgente examinar as implicações jurídicas,
humanitárias e éticas dessas armas. Com base no estado atual e previsível da tecnologia robótica,
assegurar que os sistemas de armas autônomas possam ser utilizados de acordo com o DIH será um
desafio tecnológico muito difícil de resolver à medida que se atribuam a essas armas tarefas mais
complexas e que elas sejam aplicadas em ambientes mais dinâmicos.
Um dos principais desafios é se o sistema de armas seria capaz de diferenciar
autonomamente os objetivos militares dos bens de caráter civil, os combatentes dos civis e os
combatentes ativos das pessoas fora de combate. Outro desafio é se poderia ser programada uma
arma para detectar e avaliar os numerosos fatores e variáveis contextuais necessários para
determinar se pode ser esperado que o ataque cause danos civis incidentais e a bens de caráter civil,
ou uma combinação desses danos, que seriam excessivos em relação à vantagem militar concreta e
direta esperada, em conformidade com os requisitos da norma da proporcionalidade. Além disso, a
capacidade de programar uma arma para cancelar ou suspender um ataque — se é evidente que o
objetivo não é militar ou que é sujeito a proteção especial, ou que o ataque violaria a norma da
proporcionalidade, conforme exigem as normas sobre precaução nos ataques — levanta uma
questão muito problemática. Assim, quanto aos sistemas de armas autônomas previstos em
contextos nos quais provavelmente se encontrem pessoas ou bens protegidos, existem graves
dúvidas sobre a possibilidade técnica de programá-los para realizar avaliações complexas,
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dependentes do contexto, como exigem as normas de DIH sobre distinção, proporcionalidade e


precaução no ataque. Essas são avaliações inerentemente qualitativas, nas quais continuarão a ser
necessários os razoamentos e julgamentos que apenas os seres humanos podem realizar.
Por sua condição de máquina, não se poderia responsabilizar um sistema de armas
autônomas por uma violação ao DIH. Além da responsabilidade daqueles que empregam as armas,
apresenta-se a questão sobre quem seria juridicamente responsável se as operações de um sistema
de armas autônomas provocasse um crime de guerra.
Se não pode ser determinada a responsabilidade em conformidade com o DIH, é lícito ou
ético empregar tais sistemas? O CICV insta os Estados a considerar as questões jurídicas e éticas
fundamentais relacionadas com a utilização de sistemas de armas autônomas antes que sejam mais
desenvolvidos ou utilizados em um conflito armado. Em especial, o CICV tem comunicado sua
preocupação com o potencial custo humano dos sistemas dessas armas e se podem ser utilizados em
conformidade com o DIH.
Conclusão
O DIH é questionado de forma permanente pela evolução dos conflitos armados
contemporâneos. Para obter maior proteção dos civis em conflitos armados, é necessário respeitá-lo,
aplicá-lo e implementá-lo. Para o CICV, é prioridade permanente garantir que o DIH enfrente
adequadamente a realidade dos cenários bélicos e que preste proteção às vítimas dos conflitos
armados.
Suas normas, que desde muito tempo regem a condução das hostilidades, em especial as
normas de distinção, da proporcionalidade e da precaução no ataque, aplicam-se a todos os novos
armamentos e desenvolvimentos tecnológicos na guerra, incluindo os drones, a guerra cibernética e
os sistemas de armas autônomas. Isso não é um impedimento para que novas normas de DIH sejam
criadas para atender às especificidades técnicas desses sistemas e métodos de guerra.
Além disso, esses sistemas de armas também levantam sérias questões éticas, em especial os
sistemas de armas autônomas, uma vez que seu uso generalizado representaria uma mudança de
paradigma na condução das hostilidades. A pergunta fundamental para todos nós é se os princípios
da humanidade e os ditames da consciência pública podem permitir que as máquinas tomem
decisões de vida ou morte.
Para finalizar, é importante lembrar que a Opinião Consultiva sobre a Legalidade da
Ameaça ou Uso de Armas Nucleares da Corte Internacional de Justiça lembrou que os princípios e
as normas estabelecidos no DIH se aplicavam “a todas as formas de guerra e a todos os tipos de
armas”, inclusive “as do futuro”.

Disponível em:https://guiadefontes.msf.org.br/o-direito-internacional-humanitario-e-aplicavel-as-novas-
tecnologias-de-guerra. Acesso em: 12 set 2017
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Texto 3
O que é plágio acadêmico e como evitar4
(Letícia Albuquerque)5
É normal, ao escrever um trabalho acadêmico, usar ideias de outros autores para compor seu
texto. Na universidade, é esperado que os alunos saibam articular suas ideias e reflexões a partir de
outros autores da área. Ou seja, não é errado usar as ideias de outras pessoas. Mas é errado plagiar.
O plágio é considerado crime, já que é uma violação de direitos autorais. Mas qual é o limite? Onde
começa um e acaba o outro?
O plágio acontece quando alguém reescreve frases, citações ou conceitos de outros autores,
seja de livros ou da internet, sem dar os devidos créditos. É muito importante que o uso de qualquer
referência seja explicitado no próprio trabalho. Em junho [de 2020], o então ministro da Educação,
Carlos Alberto Decotelli, deixou a pasta antes mesmo de assumi-la oficialmente, ao ser acusado de
plágio em sua dissertação de mestrado.
Infelizmente, plágio é uma prática comum no mundo acadêmico. Mas, muitas vezes, não
entendemos o que é considerado plágio, na prática. Por isso, explicamos aqui os três tipos de plágio
mais comuns e também como evitar cometê-los.

Integral
Esse é provavelmente o mais fácil de ser reconhecido e o mais conhecido pelos alunos.
Baseia-se no ato de copiar palavra por palavra uma frase, parágrafo ou, até mesmo, um trabalho
inteiro sem mencionar a fonte.

Parcial
Já nesse caso, o plágio acontece quando o texto é composto por diversos trechos e conceitos
de outros trabalhos tornando-se, ao fim, um texto único. É importante entender que a ideia de plágio
não difere se o estudante copiou ou não a ideia principal ou a conclusão de outra obra. A simples
combinação de diversas ideias ou parágrafos sem a menção de quem originalmente expressou
aquelas ideias configura plágio.
Além disso, ainda que você acrescente os trechos (palavra por palavra ou mudando alguns
termos) e mencione os autores originais, o plágio ainda pode ter acontecido. Isso porque, em um
trabalho acadêmico, espera-se que o aluno crie um texto diferente com ideias e visões próprias
baseando-se nos conceitos de outros pesquisadores. E não que ele simplesmente junte ideias de
vários autores.
Uma forma de respeitar os direitos autorais é explicando os conceitos de outro autor, mas
usando suas próprias palavras ou o que você entendeu a partir daquela ideia. É necessário, também,
acrescentar outros complementos que não estão na obra original e fazem ligação direta com seu
tema, como utilizando exemplos ou observações próprias.

Conceitual

Como o nome sugere, refere-se ao plágio do conceito de outro autor. É muito comum que, a
partir das pesquisas para a sua obra, você crie um conceito que explique determinado fenômeno.
Ou, até mesmo, que você pegue emprestado conceitos e, por consequência, nomenclaturas de
4
Disponível em: https://guiadoestudante.abril.com.br/estudo/o-que-plagio-academico-como-evitar/
Acesso em 04 de maio de 2021.
5
Letícia Albuquerque (texto publicado em 15 de agosto de 2020).
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conceitos criados por outros autores. Caso você mencione uma conceituação criada por outra pessoa
sem mencionar a fonte, será considerado um “plágio conceitual”.
Como evitar o plágio acadêmico
A melhor forma de evitar o plágio é mencionar o autor do qual as ideias usadas se originam
assim que uma ideia for usada. Geralmente, em todas as citações feitas, deve haver as seguintes
informações sobre o conceito original: nome do autor (comumente identificado pelo sobrenome),
ano de publicação da edição usada e o número da página onde se encontra a ideia usada. A ABNT
sugere dois tipos possíveis de citações, que você pode entender abaixo.
Citação Direta
Quando você quer fazer a transcrição fiel de um trecho, ou seja, “copiar e colar” uma
citação, você deve usar a citação direta. Existem duas formas muito simples, mas ambas devem
estar sinalizadas por aspas e com as informações mencionadas acima sobre a obra.
- Apenas a citação: nesse formato, você pode apenas inserir a citação do autor e adicionar as três
informações sobre a obra em parênteses ao final da citação, sendo o nome do autor em letras
maiúsculas.
Exemplo: “A desconstrução da identidade não é a desconstrução da política; ao invés disso, ela
estabelece como políticos os próprios termos pelos quais a identidade é articulada” (BUTLER,
1990, p. 213).
- Citação em parágrafo: a citação é incluída como um parágrafo do seu texto. Nesse caso, o
sobrenome do autor deve ser escrito normalmente (com a primeira letra maiúscula e as seguintes
minúsculas) seguido do ano e da página de referência entre parênteses.
Exemplo: Segundo Butler (19990, p.213), “[a] desconstrução da identidade não é a desconstrução
da política; ao invés disso, ela estabelece como políticos os próprios termos pelos quais a identidade
é articulada”
Citação com mais de três linhas: Caso você queira usar uma citação que ocupe mais de três linhas
do texto, você precisará reduzir a fonte para o tamanho 10 e aplicar um recuo na página de 4 cm na
margem esquerda. Dessa forma, o texto ficará visivelmente diferente do resto, ressaltando que toda
aquela parte é uma citação de outro autor. Nesse caso, não é necessário acrescentar aspas ao texto.
Citação Indireta
Caso você decida parafrasear o autor em vez de usar exatamente as mesmas palavras usada
por ele ou ela, você deve usar a citação indireta. Dessa forma, você pode usar suas próprias palavras
para explicar o que foi dito pelo autor. Nessa situação, mencionar a página do livro é opcional.
Além disso, você deve seguir as recomendações da citação direta na hora de mencionar o
sobrenome do autor da referência. Como pode ver nos dois exemplos abaixo:
Exemplo 1: Segundo Butler (1990, p 213), a desconstrução da identidade é o que aponta a criação
de um “gênero” como político.
Exemplo 2: A desconstrução da identidade é o que aponta a criação de um “gênero” como político
(BUTLER, 1990).
11

Texto 4
FAKE NEWS E COMO INVESTIGAR

Neide M. C. Cardoso de Oliveira6


Silvana Batini Goés

Uma das grandes preocupações da sociedade digital, hoje em dia, é a propagação de notícias
falsas. Uma pesquisa do Instituto Tecnológico de Massachusets (MIT)7, realizada de 2006 a 2017,
sobre um universo de 126 mil tuítes em cascata, compartilhada 4,5 milhões de vezes no site de
mensagens instantâneas Twitter, também apontou os motivos que levam uma notícia falsa a ser
largamente disseminada. Segundo o estudo, o caráter “emocionante” desse tipo de conteúdo, que
não tem qualquer compromisso com a verdade, faz com que suas chances de compartilhamento
sejam de 70% maiores do que as notícias verdadeiras – independentemente de seu teor, pode ser
algo sobre a cura do câncer com um milagroso chá ou a morte repentina de uma celebridade que,
ao contrário, vive e passa bem.
Assim como a Justiça Eleitoral está se preparando para combater este tema, que será um dos
mais importantes desafios das eleições gerais de 2018, os procuradores eleitorais também devem ter
noção de como agir no caso de eventuais denúncias, por exemplo, como a criação de dezenas ou
centenas de perfis falsos em favor de um determinado candidatado às eleições gerais ou à ideologia
de um determinado partido político. Normalmente, as notícias falsas são criadas intencionalmente
por algum motivo seja ele político, econômico ou ideológico.
Em geral, divulgar boatos não é um ato criminoso, desde que o boato não caracterize os
delitos de calúnia, difamação e injúria, previstos no Código Penal. Há também a possibilidade de a
notícia caracterizar crime de racismo, previsto no art. 20, § 2º, da Lei 7718/89.
O Código Eleitoral prevê como crime a conduta de divulgar fatos inverídicos que possam
influenciar o eleitorado, tipificando, também, de forma especial, os crimes de calúnia, difamação e
injúria. Mas esses tipos estão atrelados ao ambiente da propaganda oficial dos candidatos.
E a experiência mostra que a ameaça mais séria das fake news não deve vir da propaganda
oficial dos candidatos na internet, mas da multiplicação de postagens e perfis clandestinos e falsos.
Nesse caso, desvinculados do contexto da propaganda, o enquadramento típico será o de crime
comum e a competência, da justiça federal comum, e não eleitoral.

6Neide M. C. Cardoso de Oliveira – procuradora Regional da República na PRR da 2ª Região, membro do


Núcleo Criminal de Combate à Corrupção – Força Tarefa Lava Jato da PRR2 e coordenadora do Grupo de
Apoio sobre Criminalidade Cibernética da 2ª CCR; Silvana Batini Goés - procuradora Regional da República
na PRR da 2ª Região, membro do Núcleo de Criminal de Combate à Corrupção – Força Tarefa Lava Jato
da PRR2, procuradora Regional Eleitoral.

7Trecho do editorial do jornalista Tiago Sales, no artigo “O Combate às Fake News Em nome da verdade”,
edição da Revista Justiça e Cidadania, abril/2018.
12

Já no âmbito estrito do Direito Eleitoral, a conduta de divulgar boatos pode caracterizar


ilícitos eleitorais graves, aptos a comprometer o equilíbrio e a lisura do pleito. No ambiente aberto
das redes sociais, não será surpresa se o período eleitoral incentivar o discurso de ódio e a mentira
como ferramentas ilícitas da polarização que se apresenta, incidindo em diversas infrações
eleitorais.
Nesse contexto, a caracterização do ilícito do uso indevido dos meios de comunicação
social, tradicionalmente atrelado às mídias convencionais, merecerá um novo enfoque, a possibilitar
o enquadramento típico e atuação do Ministério Público Eleitoral, para abranger a divulgação de
notícias falsas pela internet, seja por pessoas físicas, seja quando envolverem, ainda que
indiretamente, instituições religiosas, sindicatos e pessoas jurídicas em geral.
A constatação de que houve pagamento para impulsionar postagens contendo fake news
deve caracterizar, de plano, o ilícito de abuso de poder econômico.
Em ambas as hipóteses, uma vez indiciada a anuência do candidato, justifica-se a
propositura da medida judicial tendente à cassação do registro ou do diploma, conforme o caso.
Para tanto, será necessário instaurar o procedimento de investigação quanto antes, para a coleta dos
elementos necessários.
O primeiro passo para se investigar uma notícia falsa divulgada na internet é a identificação
do provedor de aplicações de internet8 (Facebook, Twitter, Youtube / Google, WhatsApp, site na
web, etc), que publicou aquela notícia falsa/criminosa, e essa identificação é feita nos sites do
www.registro.br ou whois (informa se o provedor está no exterior), se não for de fácil percepção.
Em seguida, deve ser solicitada ao provedor de aplicativo identificado a preservação de
todos os elementos referentes àquela publicação falsa/criminosa (com identificação do nome da
URL9 ou ID10 correta do perfil, de um grupo, de um vídeo etc)11. Essa identificação exata é
essencial para que a empresa de internet identifique corretamente, nos seus serviços, a publicação,
para a qual está sendo pedida preservação, e o correspondente usuário, que a publicou. Não é
suficiente o nome do Perfil, por exemplo, no caso do Facebook, ou envio de uma imagem, obtida

8
Alterada nomenclatura, em 26.06.2018.
9
URL (Uniform Resource Locator) é a forma padronizada de representação de diferentes documentos, mídias e
serviços de rede na internet, que identifica cada documento com um endereço único.
10 ID (Identificação ou user name) é a identificação do usuário ou mais conhecido como Código de Usuário.
11
No caso de o denunciante usar o Facebook, veja o exemplo de uma URL de um PERFIL:
https://www.facebook.com/barackobama; se o uso do Facebook foi pelo celular, precisa clicar no menu do
aplicativo (3 pontinhos) e escolher a opção “copiar a URL”; Às vezes, em vez do nome, pode aparecer o
ID, veja o exemplo de URL de um GRUPO com ID: https://www.facebook.com/groups/982034701835686/
Exemplo de uma URL mostrando um vídeo no Facebook:
https://www.facebook.com/BBB18RedeGlobo2018/videos/199872690605072/
No Youtube, podemos identificar URLs de CANAL:
https://www.youtube.com/channel/UClu474HMt895mVxZdlIHXEA A URL de um vídeo específico:
https://www.youtube.com/whatch/v=2y-5hfZWADI
13

com um snapshot da tela. A correta identificação da publicação é o maior entrave para o início de
qualquer investigação na internet, pois, sem a URL ou ID, a empresa não tem como localizar o
perfil, site ou grupo. O pedido de preservação da notícia pode ser feito diretamente pelo Ministério
Público ao provedor de aplicações de internet porque não se está pedindo qualquer dado, apenas
solicitando que a empresa preserve aquela publicação e seus dados respectivos para posterior envio
de uma ordem judicial. Esse pedido deve ser feito o mais breve possível, porque, muitas vezes, o
usuário a retira logo da internet, e, sem a publicação e sua identificação, não é possível iniciar uma
investigação.
Após, deve ser requerido judicialmente o afastamento de sigilo de dados telemáticos, nos
casos criminais e nos casos cíveis, com base no artigo 10, §§ 1º e 2º, do Marco Civil da Internet,
para que o Juízo respectivo requisite do provedor de aplicação à internet as informações de IP
(Internet Protocol Address)12 de criação, data e hora do(s) texto(s) ou imagem(ns) postada(s),
identificado pela URL ou ID, bem como demais logs (que são registros) de acesso, ou, ainda, outras
informações relacionadas, como e-mail e eventual(is) vídeo(s) ou imagem(ns) publicada(s) naquele
provedor, para configurar a materialidade.
Com o envio dessas informações, pelo número do IP indicado pelo provedor de aplicações, é
possível identificar o provedor de conexão (as operadoras de telefonia ou telecomunicações,
que ofereçam banda larga), a partir de uma consulta no site http://registro.br13 ou whois (informa
os endereços de IPs no exterior). É possível requisitar diretamente ao provedor de conexão os dados
cadastrais do usuário investigado, de acordo com o artigo 10, § 3º, do Marco Civil da Internet. No
entanto, algumas operadoras ainda só fornecem esses dados cadastrais mediante ordem judicial e,
nos casos criminais, pode ser mais prudente (novo requerimento de afastamento de sigilo telemático
dirigido à empresa de telefonia, detentora daquele IP). A operadora indicará o endereço do titular da
conta, em que estará o dispositivo, seja ele um terminal de computador, celular etc, que divulgou
aquela notícia.
A providência seguinte, no caso de investigação criminal, é a medida cautelar de busca e
apreensão (art. 240, § 1º, alínea “e” e “h”, do CPP) do material divulgado, apreendendo-se o
dispositivo para posterior perícia. Não há legislação específica para o caso, por exemplo, de essa

12 É um rótulo numérico atribuído a cada dispositivo (computador, celular, notebook, etc) conectado à
internet, justamente para identificar a máquina que fez a conexão à internet. Observe que a identificação
não é do usuário, mas do dispositivo.
13
No Brasil, o NIC.br é o braço executivo do Comitê Gestor da Internet do Brasil – CGI.br e é o responsável por alocar
os números IP para as operadoras de telefonia que, dentre o lote de IPs a ela destinado, disponibiliza um único número
IP para cada conexão de internet que algum dos seus clientes faça. A identificação do IP nessa etapa vai identificar o
usuário titular daquela linha telefônica ou de banda larga, seus dados cadastrais como endereço residencial, que as
companhias telefônicas ou outras têm justamente para realizarem a cobrança de seus serviços.
14

medida se destinar à apuração de um crime praticado pela internet. Por isso são utilizadas as normas
referentes à busca e apreensão previstas no Código de Processo Penal.
Nada impede que a cautelar seja requerida no âmbito de um procedimento investigatório de
natureza eleitoral, aplicando-se subsidiariamente a legislação processual civil e penal.
A dúvida surge quanto a arquivo armazenado “nas nuvens”, isto é, servidores remotos,
instalados em local diverso de onde o equipamento deve ser apreendido. Normalmente, para acessar
esses arquivos, é necessário fornecer uma senha. A senha pode ser fornecida espontaneamente pelo
investigado para acesso aos arquivos remotos, e, nesse caso, os agentes cumpridores da diligência
de busca e apreensão podem acessar e coletar esses arquivos e toda evidência digital relacionada a
eles.
Após a busca e apreensão, será necessária uma investigação simples, feita pela autoridade
policial ou ministerial, visando identificar a autoria, caso resida mais de uma pessoa no local onde
foi apreendido o dispositivo, entre moradores, por exemplo, sobre quem utilizava o computador ou
se um terceiro estranho à residência o utilizava, salvo nos casos de apreensão de celular, apreendido
com o próprio investigado.
No entanto, quando a investigação for cível, identificado o usuário responsável por divulgar
a notícia, pelo provedor de aplicações de internet, que informou o IP e pelo provedor de conexão, o
qual informou os dados cadastrais do usuário, que utilizou aquele IP, não há necessidade de busca
e apreensão da notícia já pública. Basta a identificação do usuário do IP, que se conectou à
internet, por meio de determinado dispositivo, e fez a referida publicação.
Os grandes provedores de aplicativos ligados à internet, responsáveis por prestar serviços no
País, como Facebook14 e Twitter15, comunicaram que estão se preparando para as eleições gerais no
Brasil, apagando perfis falsos, fazendo campanhas sobre fake news e colaborando com as
autoridades. É necessário também o aperfeiçoamento de ferramentas no próprio aplicativo, a fim de
identificar os robôs, utilizados para propagar fake news em seus serviços. Nos EUA, o Facebook
criou o programa denominado “Trust”, durante as eleições presidenciais americanas, com o objetivo
de identificar tais fake news, no entanto, segundo as notícias sobre ele16, o programa não funcionou.

Disponível em: http://www.mpf.mp.br/atuacao-tematica/ccr2/orientacoes/documentos/11-texto-


sobre-fake-news-gacc.pdf. Acesso em: 12 set 2018 (Texto modificado para fins didáticos)

14http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticias/2017-12/0-que-diz-o-facebook-em-relacao-fake-news
15Reunião realizada na sede da PR/SP, em 25.04.2018, com representantes do Twitter, Vice-PGE e
membros do GACC.
16http://www.folha.oul.com.br/mercado/2017/12/1944695-test-do-facebook-afeta-mais-a-midia-profissional-

quefake-news.shtml
15

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