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REVISTA SILVA – Humanidades em Ciências Militares

Vol 2, n.2 – Jul – Dez 2018 – ISSN: 2594-8199

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GUERRA
PSICOLÓGICA
NOS NOVOS TIPOS DE
GUERRA
Prof Darc Costa
___________________________________

RESUMO
Introdução
O artigo apresenta as formas e meios do
uso de operações psicológicas vocacionadas A concepção de que havia uma
para os novos tipos de guerra, que revolução se processando em assuntos
surgiram no século XXI e destinadas a militares (RAM) capturou o centro das
alteração de imaginários, para a imposição discussões que se processavam nos debates
de vontades. sobre temas estratégicos, nos EUA, logo
após a guerra fria e durante vinte anos. A
PALAVRAS-CHAVE RAM tinha se colocado, entre 1989 e 2009,
Estratégia, Poder, Guerra Assimétrica, para os norte-americanos, no fulcro das
Guerra Hibrida, Operações Psicológicas e suas discussões sobre a segurança nacional
Informativas. e das suas necessidades militares.

Havia, nesta época, muitas


discordâncias entre os teóricos, quanto à
ABSTRACT afirmação que efetivamente se processava
The article presents the forms and means of uma revolução em assuntos militares,
the use of psychological operations directed sendo que muitos viam, como nós, neste
to the new types of war, which arose in the discurso, apenas uma nova maneira para se
21st century and destined to the change of enfocar o tema bélico. Contudo, há uma
imaginaries, for the imposition of wills. concordância nos estudos estratégicos
hodiernos, no que diz respeito ao
aparecimento de novas causas de
KEYWORDS: insegurança no cenário internacional,
Strategy, Power, War, Asymmetric, Hybrid, decorrentes de novo tipo de guerra, que se
Operations, Psychological and Informative. expressaram, claramente, nas duas últimas
décadas, com suas ações e seus atentados
e que nomeamos, a exemplo de outros,
como novos tipos de guerra: a assimétrica
e a hibrida.

Sobre a existência deste tipo de guerra


assimétrica há grande concordância dos
chineses aos norte-americanos. Merecem
destaques nas análises que fazem deste
novo tipo de fenômeno político e social,
pelos chineses, os Coronéis QiaoLiang e
Wang Xiangsui, do Exército Popular de

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Libertação da China (que lançaram, em que se dispõe para se atingir os objetivos.


1998, um livro, sobre este tema, intitulado
Guerra Irrestrita), e pelos norte- O poder não é senão uma forte
americanos, em artigos publicados, dentre influência. Uma influência tão vigorosa, que
outros, por Steven Metz (artigo publicado aquele sobre o qual ela se aplica comporta-
na MilitaryReview, Jul/Aug 2001) e Winn se da maneira desejada por quem a
Schwartau, (artigo publicado na ORBIS, aplicou. Uma demonstração de poder visa
Spring 2000, Findarticles). Estes artigos convencer aos adversários, de não ser
balizaram as discussões que se possível eles impedirem, àquele que o
processaram, desde então, sobre este demonstrou, de alcançar seus objetivos. O
tema. poder nacional exerce sua influência pelo
conjunto integrado de meios de toda ordem
Em paralelo, a esta visão, desde o de que dispõem a nação, acionados pela
término da Guerra do Vietnam, um conjunto vontade nacional para conquistar e manter
de estrategistas norte-americanos concluíram os objetivos nacionais. O conceito se refere
que os Estados Unidos haviam sidos ao conjunto completo de ferramentas à
derrotados, naquela guerra, pela conjugação disposição, bem como à seleção da
de técnicas de guerra convencional com ferramenta ou da combinação de
ações de guerra irregular, algo que só podiam ferramentas adequadas para cada situação,
explicar pela coesão da sociedade vietnamita. quais sejam: a de meios diplomáticos,
Desde então, eles tem se dedicado ao estudo militares, políticos, jurídicos, econômicos e
de mecanismos de construção de um novo psicossociais.
tipo de guerra, que alguns especialistas
nomeiam como guerra hibrida e que objetiva Hoje, quando se fala de estratégia de
a destruição da coesão de sociedades guerra, deve-se destacar que esta não é
nacionais e o surgimento de Estados falidos. vista como era antigamente, somente como
a arte de empregar forças militares para se
Os novos tipos guerra, portanto, são a alcançar um determinado objetivo
assimétrica e a hibrida. Nós, brasileiros, estabelecido pela política. Segundo o
temos de olhar estes novos tipos de guerra, conceito moderno, a estratégia de guerra é
pois, podemos nos ver ora, como pedra, ora, muito mais a arte de empregar o poder
como vidraça. Foi dentro desta ótica de uma como tal, seja como força, seja como
visão dual, que envolve estes dois novos influência de qualquer outro tipo, para se
tipos de guerra: a assimétrica e a hibrida, atingir objetivos políticos. Quando há um
que estamos fazendo esta apresentação choque de vontades, a arte de impor uma
sobre os temas, para promovê-los e para das vontades se traduz em uma estratégia
colocá-los no centro do debate das questões de guerra.
estratégicas no Brasil. News nas redes
sociais, particularmente nas mídias.
A estratégia militar é necessariamente
uma estratégia de guerra e quando há o
emprego de violência, isto é, de meios
ESTRATÉGIA, PODER E GUERRA bélicos, um dos meios específicos do poder.
A estratégia militar caracteriza-se pelo
Cabe, aqui breves digressões. Antes de recurso à violência para impor uma vontade
analisar o fenômeno da guerra é ao inimigo.
interessante fazer algumas considerações
sobre política, estratégia e poder. Política, Mas, a melhor arte da guerra como
estratégia e poder estão sempre estratégia consiste em alcançar um objetivo
conjugados em qualquer ação humana. A político sem se recorrer ao emprego da
política é a arte de estabelecer objetivos. A violência. Isto pode ser conseguido através
estratégia é a arte de se empregar o poder de uma demonstração de poder econômico,
para se alcançar os objetivos colocados pela financeiro ou de uma exclusiva
política. O poder é a conjunção dos meios demonstração de poder militar. A estratégia

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de guerra é, então, uma estratégia de principal, procura desgastá-lo,


dissuasão. Nesta, não há o emprego da progressivamente, de tal forma, que no
força, somente a ameaça do uso da força. final da guerra, ele estará exaurido. Na
estratégia da ação indireta, o adversário
Ou, também pode ser conseguida não é decididamente derrotado, mas é
mediante o enfraquecimento progressivo da vencido pela manobra.
visão de objetivo político do adversário. Isto
pode ser feito sem o emprego da força Guerra
militar, mas pelo emprego do poder, através
da estratégia do uso de operações A guerra é uma forma de fazer política,
psicoinformativas - Opsinf - (que serão ou pelo menos um meio de fazer política, já
explicadas adiante) e instrumentos que, na verdade, a guerra é a luta pelo
midiáticos no interior do adversário. A poder. Guerra é o estado em que vivem
criação de um caos na ordenação das aqueles que lutam. Na guerra, ambos os
metas políticas do oponente pode ser o lados buscam impor uma vontade e uma
resultado estratégico de um desses novos paz da sua conveniência.
tipos de guerra.
O recurso à violência na busca ao poder
A estratégia de guerra, a partir da qual é o que tem caracterizado o conceito de
a demonstração de poder é intensificada guerra. Contudo, a guerra é um fenômeno
até o emprego real da força é a estratégia muito mais abrangente que o conflito
militar. A estratégia militar sempre é uma armado. Guerra só existe se houver choque
possível forma de aplicação da estratégia de vontades, tem que haver uma dialética
de guerra. Na verdade, a estratégia militar de vontades. Entretanto, uma vontade não
deve ser vista como a última forma do necessita, obrigatoriamente, de se explicitar
emprego da estratégia de guerra, posto que formalmente.
é a forma resultante do emprego do poder
militar. Ela se caracteriza pelo emprego da Influir psicologicamente não é apenas
violência, quando o sucesso desejado não determinante no conflito político, mas,
pode ser alcançado através de outros também, o é na guerra, que é,
meios. fundamentalmente, uma batalha pela alma
e pela vontade do adversário. A guerra não
A estratégia da guerra, em muitos deve ser vista como a conquista do terreno
casos, leva a estratégia militar a tentar ou de determinadas posições. Apossar-se
atingir seus objetivos mediante uma do terreno e conquistar certas posições são
confrontação direta e imediata de forças apenas instrumentos para se estruturarem
oponentes. Neste caso, temos a estratégia de forma prevalente os desejos expressos
de ação direta, onde se busca uma grande na vontade de alguém sobre a vontade do
batalha decisiva, na qual o objetivo é outrem. Enquanto esse objetivo não for
destruir a parte essencial das forças atingido, a guerra não será vencida.
adversárias, através de alguns golpes Repetindo, o que importa são os desejos
potentes. expressos na vontade de alguém sobre a
vontade do outrem.
Outras vezes, a estratégia da guerra
levará a estratégia militar a procurar Tipos de Guerra
vencer, pela manobra, um adversário,
usando o espaço e o tempo e evitando o Até o século XVIII, era claro como a
confronto direto com a força principal do guerra se processava: a guerra ocorria
inimigo, ou com as forças oponentes. Esta entre dois ou mais estados nacionais,
forma é conhecida como estratégia de ação representados por duas ou mais casas reais
indireta e busca desorientar o adversário, e normalmente eram conduzidas através de
atraindo-o para uma posição mais exércitos de mercenários. Mas, isto mudou
desfavorável. Sem se engajar na batalha muito, em especial nos últimos duzentos

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anos. Hoje, não se pode prever com certeza É a seguinte a explicação de cada forma
como se dará uma guerra em um de guerra:
determinado espaço e em um dado tempo.
Reconhecem-se, hoje, cinco tipos diferentes Guerra com Armamento Usual; A
de guerra, a saber: forma de guerra usual é aquela que é feita
empregando-se armas brancas, de fogo e
1. a guerra convencional; explosivos convencionais.

2. a guerra de destruição em massa; Guerra Radiológica. A forma de


guerra radiológica é aquela que é feita
3. a guerra irregular; mediante o emprego de materiais físseis.
Podem ser radioativas, pelo emprego de
4. a guerra assimétrica e materiais radioativos ou, nucleares
mediante o emprego de artefatos
nucleares.
5. a guerra hibrida.

Guerra Biológica. A forma de guerra


Nos estudos estratégicos, todos os
biológica é aquela que é feita mediante o
diferentes tipos de guerra devem ser
emprego de agentes patológicos. Pode ser
analisados. Ainda mais, pelo fato de que,
bacteriológica ou virótica.
hoje, em um conflito, não é mais possível
admitir no seu desenrolar a existência de
um só tipo de guerra. Todas as Guerra Cibernética. A forma de guerra
considerações estratégicas, bem como cibernética é aquela que é feita mediante o
todas as possibilidades de defesa ao ataque emprego de equipamentos e máquinas
do inimigo, devem acolher dos estudiosos centradas basicamente em informação e
em estratégia, mentalmente, a energia.
possibilidade dos vários tipos de guerra.
Guerra Química. A forma de guerra
Não se deve confundir tipo de guerra química é aquela que é feita pelo emprego
com forma de guerra de agentes químicos.

Formas de Guerra Guerra Econômica. A forma de guerra


econômica não é assim classificada por
muitos puristas que a nomeiam como um
As formas de guerra são:
conjunto de agressões econômicas, já que
entendem que a guerra é um fenômeno que
1. guerra com armamento usual; necessariamente implica em uma ação
física violenta. Contudo, a guerra é um
2. guerra psicológica; fenômeno decorrente do choque de
vontades, em que as vontades se
3. guerra econômica; pretendem afirmar com o uso dos meios
que dispõem o que necessariamente implica
4. guerra radiológica, nuclear ou em agressões. Agressões que podem não
radioativa; ser físicas. Agressões que podem ser
psicológicas e econômicas. Guerra da forma
5. guerra biológica, bacteriológica ou econômica é toda aquela decorrente de
virótica; uma agressão de natureza econômica. Suas
formas mais usuais são agressões
6. guerra cibernética, eletrônica ou financeiras dirigidas a moedas, tidos, agora,
informática; e como ataques especulativos e que podem
desestabilizar a economia de um país, ou,
agressões comerciais decorrentes da ação
7. guerra química.
do poder econômico para abrir ou para

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fechar mercados ou para controlar fluxos de de conflitos armados deste tipo, foram
recursos. Guerra da forma econômica tem guerras irregulares. A guerra irregular foi
sido usualmente praticada no final do progressivamente tomando o lugar das
século XX e no início do século XXI, sob o guerras convencionais. Contudo, as
manto da paz e do discurso da estabilidade. experiências em guerra convencional têm
pouca aplicabilidade na guerra irregular.
Guerra Psicológica. Das formas Recentemente, foram feitos estudos
citadas, a que é menos entendida é a forma teóricos importantes referentes à guerra
de guerra psicológica. Uma guerra irregular, já que esta foi uma forma
psicológica pode estar sendo travada sob conhecida desde a época de Napoleão e que
um aparente discurso de paz. Ela é uma se tornou usual tipo de guerra pós Segunda
forma de guerra que aparentemente não Grande Guerra. Daí a motivação para o
mata, não aleija, não machuca fisicamente. estudo que foi desenvolvido, nos últimos
Contudo seu poder destrutivo pode ser trinta anos, deste tipo de guerra.
imenso. Pode colonizar, pode subordinar,
pode escravizar. É uma forma que quando A GUERRA ASSIMÉTRICA
vem sozinha é a expressão virtual da
guerra. Mas se há uma guerra real ela Após os atentados de onze de
estará sempre presente. setembro, surgiu, contudo, um novo tipo de
guerra, que figurava, exclusivamente, no
Em tempos recentes, em decorrência da plano das hipóteses, a guerra assimétrica,
influência do longo período da guerra fria, o que nada mais é que uma guerra irregular
estudo da guerra foi concentrado na teoria travada no espaço mundial. Voltemos à tese
das guerras de destruição em massa. A do conceito moderno - a estratégia de
imagem bélica da guerra de destruição em guerra é muito mais a arte de empregar o
massa, em especial sua vertente nuclear, poder como tal, seja como força, seja como
requereu diferentes planejamentos influência de qualquer outro tipo, para se
estratégicos, diferentes armamentos, atingir objetivos políticos. Guerra
diferentes organizações de unidade, e assimétrica, talvez pudesse ser definida,
finalmente, o que não é menos importante, como foi dito, de guerra irregular em escala
um diferente treinamento dos oficiais e de mundial, ou como a guerra irregular, que
suas unidades, algo que normalmente não se cinge a um espaço nacional.
manteve relação direta com os padrões
convencionais. Assim, também, se passa Alguns preferem conceituar a guerra
com todos os demais tipos de guerra, assimétrica como guerra irrestrita. A
inclusive para estes recentes tipos que adjetivação assimétrica nos parece mais
surgiram, a guerra assimétrica e hibrida. apropriada que irrestrita, pois assimétrica
conceitua melhor, em nossa opinião, a
Contudo, hoje, está claro que a guerra guerra que é composta, entre outras, das
de destruição em massa parece ser a mais seguintes assimetrias;
improvável das futuras guerras. Na
verdade, a sua possibilidade nuclear, De um lado:
demonstrada em Hiroshima e Nagasaki,
diferentemente do que muitos pensavam, Assimetria de poder econômico e
não acabou com a guerra. Enfatizou outros financeiro, muitos recursos versus poucos;
tipos ou ensejou novos tipos de guerras. Só
as transferiu para outros espaços de
Assimetria de capacidade bélica, relativa
concepção e de realização. Como a guerra
e absoluta;
nuclear tornou-se, de certa forma,
impensável, a humanidade transferiu seus
conflitos armados para as sarjetas, para as Assimetria de estruturação
cavernas e para as florestas. A maioria dos organizacional, hierarquia versus rede;
conflitos após a Segunda Grande Guerra foi
e entre outras, das seguintes

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assimetrias, do outro lado: intervenções de toda ordem preparada


sobre um Estado Nacional, para exercer um
Assimetria de objetivação, quase fim fundamentalmente político. Ou qualquer
número infinito de alvos versus poucos para tipo de agressão organizada que procura
o adversário; causar dano a um Estado Nacional,
buscando desestruturá-lo, transformando-o
Assimetria de resultados, indiferença de em um estado falido, com o fim de
resultados no curto e médio prazo contra a apropriar-se de seu território, e/ou de seu
necessidade de resultados expressivos do imaginário coletivo, e/ou de seus recursos.
adversário no curto prazo; e,
Pode-se considerar que a guerra híbrida
Assimetria comportamental, não sujeito é um conflito no qual todos os agressores,
a nenhuma regra, inclusive admitindo o exploram todos os modos de guerra,
suicídio na ação versus o adversário preso a simultaneamente, empregando armas
regras e as convenções; convencionais avançadas, táticas
irregulares, tecnologias agressivas,
terrorismo e criminalidade, visando
A guerra assimétrica, assim como a
desestabilizar a ordem vigente em um
guerra irregular, é, devido a sua natureza, a
Estado Nacional.
guerra dos fracos contra os fortes, a guerra
dos pobres contra os ricos. Como
mostraremos a guerra irregular e os novos Para muitos autores, a primeira ação da
tipos de guerra; hibrida e a assimétrica, são guerra hibrida se processa por um
fundamentalmente guerras de desgaste. movimento que denominam de revolução
colorida. Este movimento se caracteriza por
manifestações que se utilizam de
Contudo, isto não as coloca
resistências não violenta ao governo de um
obrigatoriamente como guerras defensivas.
Estado Nacional, pelo menos no que dizem
Se elas forem guerras revolucionárias elas
seus militantes. Apresenta-se através de
conseguem serem ofensivas. Tanto a guerra
um discurso democratizante, liberalizante,
assimétrica como a guerra irregular não são
quase anárquico e é apoiada por ONGs,
apenas guerra nas sombras, elas são guerra
entes do mercado, agencias de inteligência
na paz.
externas e mídia.
Só se será efetivo na condução de uma
Essas revoluções apareceram no final do
guerra assimétrica se ela for efetivamente
século passado no leste europeu nos países
empreendida como se fosse uma guerra
que faziam parte do bloco soviético e a
irregular em escala mundial. Como
partir da virada do milênio, aconteceram
veremos, o mesmo se processa como uma
também nesses espaços já com
guerra hibrida, mas que se faz em um
democracias recentes, buscando a
espaço restrito, que, também, em algum
derrubada de governos pró-Rússia e a
momento, adota as características de uma
ascensão de grupos ou partidos políticos
guerra irregular e aí a questão se traduzirá
pró-EUA. Alguns autores consideram que
numa maior determinação e numa melhor
tais revoluções foram patrocinadas
delimitação de objetivos.
diretamente pelos Estados Unidos,
enquanto outros defendem que isso só foi
A GUERRA HIBRIDA possível devido à existência de movimentos
de oposição locais ou nacionais.
Seguindo o conceito moderno, a
estratégia de guerra é muito mais a arte de Muitos autores usam, também, como
empregar o poder como tal, seja como exemplos de revolução colorida as
força, seja como influência de qualquer manifestações que se processaram no
outro tipo, para se atingir objetivos Oriente Próximo e no Leste Europeu que
políticos. A Guerra Híbrida é o emprego do antecederam as tentativas de troca de
poder através de um conjunto de

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governos nestes espaços. Nos novos tipos de guerra, tanto a


assimétrica como a hibrida, a exemplo da
Acontece que muitas vezes a guerra guerra irregular, não deve haver uma
hibrida encontra o Estado Nacional distinção tão objetiva, como existe em
praticamente hibernado em um período de outros tipos de guerra, entre civil e militar,
comodidade ou acomodação. Cônscio ou entre armas e não armas, entre espaço de
irrefletidamente sabe-se o que precisa ser guerra e espaço de paz. Uma guerra do
feito e alterado, mas falta força de vontade novo tipo é uma guerra sem delineamento
ou capacidade de gestão. Então surge a definido. É uma guerra de várias facetas. O
figura do caos, da desestabilização e a novo tipo de guerra é uma guerra em que
desagregação da máquina do Estado, e não se combate e, sim, se vive.
como o caos leva a imprevisibilidade,
muitas vezes não conseguimos perceber REBELIÃO E REVOLUÇÃO
precisamente o que ele nos traz, fazendo
com que a dúvida e a insegurança dominem Toda a guerra busca objetivos políticos.
todas as ações e a capacidade de reagir. O recurso à violência na busca do poder,
como vimos, caracteriza a estratégia militar.
Entende-se o que se busca numa guerra Contudo, a definição clara de um tipo de
hibrida é a criação do caos no território guerra é muito difícil. Mas, tanto a guerra
inimigo. Sobre o caos há uma teoria, a irregular quanto os novos tipos de guerra se
teoria do caos que estabelece que fatores inserem no contexto de uma rebelião ou de
insignificantes, distantes, podem, uma revolução.
eventualmente, produzir resultados
catastróficos imprevisíveis e absolutamente Rebelião difere de revolução.
desconhecidos no futuro. Tais eventos
levariam o adversário a se defrontar com Revolução se dirige a certo objetivo,
desdobramentos imprevisíveis e a perdas enquanto que rebelião se refere a certo
dos monopólios de gestão intrínsecos a um comportamento. Existem revoluções, sem
Estado Nacional. rebelião, e rebeliões, sem revolução.
Revolução une credo, vontade, decisão e
Alguns autores divulgam que a Guerra ação na política e buscam a mudança
Híbrida, para a conquista do Poder, pode integral na ordem, seja ela política, social e
ser interpretada como a militarização da ou econômica.
teoria do caos. E bom colocar que o caos
está sempre presente em convulsões Rebelião busca a fuga a uma
políticas, em transformações econômicas e dominação. A perda na fórmula política
na modificação de costumes e regras pode conduzir a uma revolução ou esta
morais. pode decorrer da inexistência de
desenvolvimento econômico e social.
SIMILARIDADE Todavia, rebelião sempre está relacionada à
tensão que deriva da percepção de que há
Os novos tipos de guerra não têm uma privação na sociedade de bens e
começo. Só historicamente é que se define serviços econômicos, ou de prestígio social
o tempo da guerra. Tem aí total e ou de poder político. Expectativas
similaridade com a guerra irregular. Os religiosas ou de caráter nacional que não
envolvidos nessas guerras têm um são correspondidas também podem dar
interesse notório em prolongar um falso lastro a uma rebelião.
período de paz, antes da definição explícita
de seu início. A mobilização exige muito Os novos tipos de guerra assim como a
tempo. Ambas, devem ser vistas como o guerra irregular não se dão clara e
combate em sua totalidade, tendo sempre necessariamente no mesmo contexto de
como atributos tanto a longa duração uma guerra convencional. Diferentemente
quanto a baixa intensidade. da guerra irregular que é normalmente

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revolucionária, nos dois novos tipos de tipos novos de guerra é a periodicidade de


guerra, tanto rebelião quanto revolução não seus atos e o teatro de operações em que
se separam de forma nítida. Na guerra ambas se desenvolvem. Enquanto a guerra
assimétrica como na guerra hibrida, irregular é travada mediante ações
revolução e rebelião apresentam sempre continuadas contra o poder constituído de
uma vinculação direta. Comportamento e um determinado país, com fundamentos
objetivo caminham juntos. políticos e com objetivos que vão ficando
mais claros na medida em que ela
A NOVIDADE avança, a guerra assimétrica se dá por
ações mais espaçadas e no plano
A teoria de guerra de destruição em internacional, assim como a guerra hibrida,
massa e a teoria da guerra irregular ajudam sendo que esta, contudo, se dirige,
à compreensão do novo fenômeno especificamente, a uma nação.
sociológico e político dos novos tipos de
guerra. Contudo, ambos os tipos, tanto o de Já a figura adiante explica a conexão
destruição de massa quanto o irregular entre guerra irregular e convencional
necessitaram, diferentemente da teoria da levando a guerra hibrida:
guerra convencional, na sua elaboração de
teorias, de esboços mentais, pelo fato de Diagrama de Venn explicativo da
não existirem experimentações em número Guerra Hibrida
suficiente para dar base às suas
formulações empíricas. O mesmo se dá
agora com os novos tipos de guerra. A
despeito das contradições, entre a guerra
de destruição em massa e os novos tipos de
guerra, em muitos aspectos, submetidas a
uma forte tensão dialética, tanto em
sucessão no tempo, quanto em
desenvolvimento territorial; elas, apesar
disto, detêm um notável paralelismo.
Ambas trazem a procura do efeito de
imobilização que procuram exercer sobre as
forças convencionais do adversário.

Os novos tipos de guerra também


podem vir a anular a distância entre países
grandes e pequenos. Um país como a
Coreia do Norte, se provido de armas de
destruição em massa, pode se colocar tão
forte como a Rússia ou a China. Se tiver OBJETIVO
vontade e capacidade de conduzir uma
guerra hibrida ou assimétrica, um pequeno Como já vimos, o objetivo da guerra é
país pode vir a se contrapor com razoável impor uma vontade. De forma mais clara, o
êxito contra a pretensa múltipla objetivo dos novos tipos de guerra é o
superioridade de uma potência. Um caçador mesmo da guerra irregular, ou seja, exaurir
de feras, munido de fuzil de alta precisão e o inimigo busca desgastá-lo internamente,
de mira telescópica, pode ser abatido, se de tal modo, que com o correr do tempo,
quiser atirar numa colmeia, pelo ataque de ele estará enfraquecido de tal forma, não só
um enxame de abelhas. Basta a estas física como psicologicamente, que se
abelhas o buscarem de forma coordenada e mostrará incapaz de uma volição política. O
objetiva. objetivo central é a imobilização operacional
do adversário. A imobilização do adversário,
O que distingue a guerra irregular dos a sua perda de iniciativa, significa sempre,

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numa guerra, o começo da vitória. Assim o conseguir um efeito psicológico. Seus


é também na guerra assimétrica e na objetivos serão o de fazer os seus próprios
guerra hibrida. objetivos políticos parecerem
historicamente necessários, inevitáveis, e
Ao término de um novo tipo de guerra até mesmo, imprescindíveis, aos olhos do
se tem muito mais uma vitória política do adversário.
que uma vitória militar. Tanto a guerra
assimétrica como a guerra hibrida é muito A estratégia nos novos tipos de guerra,
mais a guerra do político. Por isso, quem portanto, é sempre a estratégia de ação
conduzir uma guerra do novo tipo deve indireta. O que existe em termos de
procurar evitar testar diretamente o poder estratégia nos novos tipos de guerra são os
e buscar, ao invés disso, tirar a mesmos princípios gerais de estratégia
estabilidade, surpreender, exaurir o militar. Surpreender o inimigo, romper a
adversário, para desequilibrá-lo. O seu continuidade de suas forças, atacar seus
maior objetivo deve ser o de mitigar pontos fracos e contra-atacar, aproveitando
intelectual e moral, local e universalmente, o esforço do adversário, permanecem
o adversário. elementos válidos e metas a serem
perseguidas na construção e no decorrer
dos combates.

LIDERANÇA Os novos tipos de guerra apresentam


um sentido claro para se desencadear as
Ninguém vence um inimigo mais forte ações militares por parte dos militantes: as
pela força, mas, sim, devido a uma causa operações caminham daquelas
justa e através de uma liderança dedicada. desconhecidas e não dominadas pelos
Todo ato de guerra é um trabalho de adversários, para aquelas em que eles são
equipe. Líder e liderados, planejadores e especialistas. Caminham da periferia para o
operadores, todos trabalham em conjunto. centro. A luta pode surgir em qualquer
A ligação, entre comando e execução, é espaço e a qualquer tempo. A liberdade
importantíssima. Respeito e para operar nestes tipos de guerra constrói
reconhecimento geral do comandante são a sua própria força. Liberdade vista aqui
fundamentais para quem exerce a como liberdade sobre o espaço e sobre o
liderança. A guerra assimétrica e a guerra tempo. A guerra irregular é a guerra do
irregular são guerras da liderança espaço amplo. A guerra assimétrica é a
democrática. Manter a todo custo disciplina guerra do espaço ilimitado. A guerra
é o objetivo maior do seu líder. Contudo, é hibrida é a guerra do espaço delimitado.
como estrategista e como tático que o líder Nas três, não existem frentes de combate.
deve exercer o seu poder. É usando o A retaguarda não existe para elas. Nas três,
tempo e o terreno e aproveitando as o poder de fogo é menos relevante que a
oportunidades que ele se consolida na mobilidade. São guerras de mobilidade. Nas
liderança. três, o espaço não é mantido, nem
ocupado. O espaço é contaminado. Mas a
contaminação exige a presença do
ESTRATÉGIA
adversário. Em quase todas as condições,
nesses três tipos de guerra, mais que a
Os novos tipos de guerra se colocam força, os determinantes últimos da vitória
como tipos de guerra praticados pela são o espaço e o tempo. O espaço e o
estratégia da ação indireta. Mas, os novos tempo se materializam nos movimentos.
tipos de guerra, da mesma forma que a Não são guerras de posição. São guerras de
guerra irregular, não é o único meio para se movimento e não de poder de fogo.
conduzir uma estratégia de ação indireta.
Tanto os novos tipos de guerra quanto à
Dentre estes movimentos fundamentais
guerra irregular são sempre instrumentos
são os movimentos de infiltração. Os
de ação da estratégia indireta e pretendem

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movimentos de infiltração são determinados tipos de armas militares e no


características centrais, tanto operacionais outro há a ampla possibilidade de se
quanto táticas, dos três tipos de guerra. empregar qualquer facilidade como arma.
Nestes movimentos sempre estão presentes
dois momentos: o de reunir e o de A guerra irregular e os novos tipos de
dispersar. Infiltração, reunião, ação e guerra diferem da guerra convencional,
dispersão resumem um movimento destes muito mais, nas formas de condução da
tipos de guerra. As formas de infiltração guerra do que nas formas de emprego das
diferem quanto à natureza e ao grau de forças. Todas as formas de guerra podem
conhecimento do terreno que os militantes ser empregadas nessas guerras. A escolha
possuem. A infiltração normalmente requer do tipo de guerra faz sempre parte da
um terreno coberto que impeça não só a estratégia do agressor. A escolha da forma
clara percepção como a rápida perseguição da guerra também. Aduz-se a esta clara
pelo inimigo. Uma área urbana grande pode vantagem, outra, que é a possibilidade que
ser um excelente espaço para infiltração. ele tem, se mantiver a iniciativa, de mudar
Florestas e zonas montanhosas se prestam não só o tipo, mas, também, a forma da
muito bem a infiltrações. Em terrenos guerra. Cabe aqui colocar uma regra para o
abertos as infiltrações devem se processar agressor na condução da luta que é a de
no escuro. A guerra assimétrica, portanto, fazer prevalecer a sua forma de guerra, que
não condiz com o agrupamento de forças. É logicamente deve ser buscada naquelas
uma guerra com um mínimo emprego da formas que o adversário não espera e para
força buscando o máximo de efeito. Na as quais não está preparado. Quem tem a
verdade, é a organização do adversário que iniciativa determina a forma da guerra. A
se busca destruir. mudança da forma que se processa a
guerra está na base da doutrina dos novos
O sistema de montagem e tipos de guerra e pode resultar no sucesso
desmontagem das bases operativas pode do desempenho de um ou dos dois lados ao
ser o sucesso para a condução de uma longo do processo. O limiar nuclear, ou
guerra assimétrica e de uma guerra hibrida químico, ou biológico, pode decorrer dos
em sua forma violenta. Grandes bases são resultados até então alcançados no
sempre inadequadas. A descentralização desenrolar dos combates. Mas, neste ponto
operativa e a formação de pequenos grupos deve-se entender que uma forma de guerra
também estão na base dessa guerra. A pode servir a outra forma. Ou seja, há a
guerra assimétrica bem como a guerra possibilidade, exemplificando, do emprego
hibrida (no inicio de sua forma violenta), é da forma radiológica de natureza nuclear,
feita com muitas pequenas unidades ou ou da biológica de natureza bacteriológica,
grupos de ação. Seus desfechos não como instrumentos para o emprego da
decorrem de poucas grandes batalhas, mas forma de guerra psicológica.
sim, de muitas pequenas escaramuças. São
guerras das sombras e seguem o princípio As guerras do tipo convencional e de
de que valem mais mil alfinetadas do que destruição em massa buscam a imposição
uma única estocada. Os novos tipos de de uma vontade pela ação militar. As
guerra excluem a delimitação exata dos reações psicológicas decorrem da ação
alvos ou de qualquer linha ou definição militar. A guerra de forma psicológica é
nítida de terreno. normalmente derivada nestes tipos de
guerra das outras formas de guerra.
Sabemos que toda arma tem um alvo
adequado. A guerra assimétrica e a hibrida, OS NOVOS TIPOS DE GUERRA E AS
na sua fase inicial da violência, não deve OPERAÇÕES PSICOLÓGICAS
oferecer alvos a um dos lados e aproveitar INFORMATIVAS
qualquer oportunidade a ser aproveitada no
outro. Em função disso, em um dos lados As guerras do tipo irregular e as de
há muita dificuldade no emprego de novo tipo buscam a imposição de uma

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vontade pela ação psicológica. As reações Todavia, propaganda sozinha nada faz.
militares decorrem da ação psicológica.
Nesses tipos de guerra a forma Quando falamos em Opsinf, estamos
predominante é psicológica e todas as falando de um conceito revolucionário que
outras formas de guerra a ela se está se transformando em elemento central
subordinam. nas ações políticas entre Estados Nacionais,
nas ações de ataque e defesa que se
Em nenhuma outra forma de que guerra processam tanto em época de paz quanto
o elemento psicológico é tão nítido quanto em época de guerra.
na guerra irregular e nos seus sucedâneos
os novos tipos de guerra. A guerra da forma Opsinf são operações planejadas que
psicológica tem grande importância nos envolvem várias ações para gerar e divulgar
novos tipos de guerra. Os novos tipos de informações e indicadores específicos para
guerra, assim como guerra irregular, são audiências também específicas, com o
baseados, principalmente, na guerra de propósito de influenciar suas emoções, seus
forma psicológica. Conspiram contra a fins, seus raciocínios objetivos e, por
moral do adversário. Devido a isto, extensão, o comportamento de indivíduos,
entender a maneira de pensar e de sentir de grupos, organizações, coletividades e
do inimigo é fundamental nos novos tipos governos estrangeiros.
de guerra assim como o é na guerra
irregular. Opsinf devem ser encaradas como um
princípio fundamental de orientação na
Nos dois novos tipos de guerra, mais do nova situação mundial, em que a mediação
que em qualquer outro tipo de guerra, o da informação se faz cada vez mais
que se busca é exercer influência presente, ora sozinha, ora ao lado da
psicológica, por isso ela deve ser conduzida ciência e da ciência e do trabalho, no
com meios psicológicos. processamento da natureza. Num mundo
que se diz globalizado, as Opsinf - por
OPSINF conta de sua natureza modeladora de
imaginários e formuladores de opiniões em
A guerra psicológica tem de ser tempos de paz - estruturam um conjunto
conduzida por operações psicoinformativas de instrumentos indispensáveis também à
– Opsinf. Opsinf são fundamentais para condução bem-sucedida de crises e
entender os novos tipos de guerra. Guerra conflitos, em escala local ou global.
de forma psicológica é feita basicamente
utilizando-se as Opsinf. São nas Opsinf que Cada vez mais, o domínio do campo da
os novos tipos de guerra se sustentam. percepção e do processamento criará
Durante todas as fases dos novos tipos de condições para o direcionamento e o
guerra, como acontece na guerra irregular, controle das ações. Estes espaços, da
as Opsinf estarão presentes. percepção e do processamento, são
exatamente os da atuação essencial e
O plano de propaganda é peça excelente das Opsinf – cujos resultados
importante para uma guerra, mas é peça reverberam e se refletem sobre o momento
fundamental para o detalhamento das de ação.
Opsinf de uma guerra irregular ou de um
dos dois dos novos tipos de guerra. Este Objetivo das Opsinf
plano deve conter a identificação dos
instrumentos disponíveis, seus alvos O objetivo das Opsinf é o de manter em
setoriais, ou de áreas, a indicação dos seus um dado espaço (teatro de operações,
caminhos, mas, principalmente, quais são espaço do conflito, país ou região, ou
os seus objetivos. A arte da propaganda mundo) não só o domínio das informações,
consiste em colocar o êxito do inimigo como mas muito mais a administração das
fracasso e o nosso fracasso como êxito. percepções com vistas à construção de

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consensos para a estruturação e história e desprezando a tradição colocada


desestruturação de imaginários. Os numa pessoa através da sua educação
objetivos das Opsinf são o de acordar formal e familiar, as ideias que representam
ideias, ou de promover associações a motivação central dos participantes das
mentais, ou mexer com imaginários. Com últimas guerras estão reduzidas às ideias
as Opsinf busca-se formar quadros; difundir que derivavam de certa fórmula política que
ideias, para mobilizar simpatizantes; e se impuseram, ou de ideias em cujo centro
enfraquecer o poder do inimigo e sua estava a conexão do indivíduo com um
vontade de resistir, diminuindo a sua fé na território em que nasceu ou, em outras
vitória. palavras, com a sua terra natal, e com o
discurso iluminista da liberdade.
Entendendo a Opsinf
As Opsinf dependem também dos
A guerra leva a muitos sacrifícios; o discursos políticos e dos eventos militares.
sacrifício da vida, o sacrifício da saúde, o Elas visam tanto o público interno, como a
sacrifício da liberdade e principalmente à mídia, como as sociedades amigas, neutras
privação das comodidades favoritas. As e inimigas. A Opsinf tem de se ajustar ao
únicas pessoas que buscam um sacrifício de nível de audiência para o qual ela se dirige.
forma voluntária são aquelas que acreditam
que existe um valor muito maior que o Os argumentos racionais e puramente
sacrifício, algo que para eles parece lógicos, por mais corretos que se possam
profundamente significativo. O apresentar, raramente têm um efeito
estabelecimento de um valor transcendental convincente e suficiente à mobilização. A
é a base sobre a qual se estrutura todo e emoção na Opsinf tem de ser dominante.
qualquer sacrifício. Daí porque a Opsinf deve explorar e utilizar
primordialmente os instrumentos e
Portanto, ao se engajar em um combate argumentos que mexem com a emoção.
deve-se buscar lançar mão de todos os
meios disponíveis para se estabelecer este O conflito, por sua vez, realimenta as
valor transcendental. O objetivo de toda a ações derivadas dos princípios das Opsinf. A
ação psicológica deve ser o de procurar movimentação da informação será cada vez
convencer cada cidadão de que ele deve se mais relevante em situações de conflito,
colocar a serviço deste valor transcendental podendo-se sobrepor até mesmo à
que pode ser uma ideia, transfigurada movimentação de tropas ou de
numa formulação política, ou retratada num equipamentos nos espaços e antecedendo-
imaginário e que deve justificar todo a, necessariamente, no tempo. Para estas
sacrifício necessário. operações o tempo é um fator essencial.
Incidentes, no mundo, são hoje
Aqui está o armamento psicológico: na comunicados em tempo real. Para tanto,
ideia e no seu valor, que são os pré- faz-se necessário compreender as Opsinf
requisitos necessários para a condução bem como parte de uma política de Estado
sucedida de qualquer guerra. A formulação Maior, como reflexo e voz da vontade
política ou o imaginário não apenas torna política de um Estado Nacional.
possível a cada indivíduo fazer sacrifícios,
mas, também, agrega o valor do O ser humano se distingue de tudo que
compromisso a quem nela acredita. Cria a o cerca por dois atributos: razão e vontade.
comunidade e é essa comunidade que vai Opsinf podem levar a que a vontade altere
apresentar as pessoas que lutarão na a razão ou a razão altere a vontade, mas
guerra. Há uma importância enorme no não que as duas se alterem
conceito da comunidade e na ideia de concomitantemente, já que é o exercício de
camaradagem que este conceito traz. uma sobre a outra que caracteriza a
operação.
Olhando os últimos duzentos anos de

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Tipos de Opsinf cruzado por uma Opsinf destrutiva e outra


fórmula política deve ser posicionada por
Os imaginários se constituem de várias uma Opsinf construtiva, normalmente, em
ideias e formas de ver o mundo que se nome da liberdade.
organizam em torno de uma formulação
principal. As Opsinf atuam sobre os Outro exemplo, se a formulação
imaginários. Existem três tipos de Opsinf: principal do inimigo se baseia nos conceitos
de terra natal, o objetivo da Opsinf
1. A Opsinf destrutiva que desestrutura destrutiva deverá ser o de mostrar de
e destrói um imaginário, maneira convincente como tais ideias, do
ser nacional, da soberania são ideias
2. A Opsinf construtiva que estrutura e destituídas de credibilidade, como são
constrói um imaginário e ideias vazias e ultrapassadas e que devem
ser substituídas por outras ideias, que
correspondem, neste instante, melhor a
3. A Opsinf subversiva que modifica um
realidade e as necessidades da época. A
imaginário dissuade e atemoriza.
Opsinf construtiva apresenta então as
novas ideias que não é preciso acreditar
Identificar qual é esta formulação nem praticar, pois não se encontra na
principal é o primeiro objetivo das Opsinf. formulação principal de quem a faz.
Identificada esta formulação, o principal Portanto, nestes casos, a montagem ou
objetivo da Opsinf é tentar convencer o desmontagem de um conjunto de
inimigo de que a formulação central que lhe percepções que estruturem ou
serve de motivação é falsa, mentirosa, desestruturem um imaginário é o que se
vazia de maior significação. Dá–se início busca com as Opsinf.
então a uma Opsinf destrutiva. A Opsinf
destrutiva objetiva abalar a vontade inimiga
A Opsinf subversiva objetiva atacar
de defender a sua formulação principal que
parte das certezas ou das idéias e formas
tem que ser colocada como utópica, como
de ver o mundo que o inimigo possui, ou,
irrealista. Deve-se anunciar repetidamente
caso não seja possível destruir a formulação
a mutabilidade e a não reversibilidade de
central do inimigo, abalá-la nos seus
ditas e determinadas realidades e apelar à
fundamentos, de forma a desestruturar o
razão, ao senso da realidade, e à
imaginário do inimigo.
sobriedade das forças armadas adversárias
ou de sua população, como um todo. O
objetivo passa a ser de tornar claro ao Por exemplo, um objetivo de uma
inimigo que uma vitória da causa, porque Opsinf subversiva pode ser o de apelar para
ele luta, vai representar para ele, a a necessidade de se prover segurança às
repressão pelo menos de certas esferas da pessoas, principalmente, as pessoas que
sua vida, subjugação e principalmente, vivem nesse nosso tempo e se encontram
pobreza. nos países centrais, os mais civilizados.
Para esse fim, deverão ser utilizadas todas
as formas possíveis para ilustrar
Pode-se seguir, então, uma Opsinf
visualmente: seja por imagens, ou gráficos,
construtiva visando passar para o inimigo
os perigos à espreita de todos os soldados e
uma nova formulação principal e seu
cidadãos do inimigo. Isto numa guerra
entorno de ideias e forma de ver o mundo.
assimétrica terá mais êxito se vier
Aí também o esforço se concentra em
acompanhado de operações terroristas.
convencer o inimigo, que esta nova
formulação é verdadeira e repleta de
significados. Outro exemplo, o discurso da defesa da
liberdade do inimigo numa guerra
assimétrica deve ser combatido pelas
Por exemplo, quando essa formulação
Opsinf subversivas, de forma a acusá-lo, de
central do inimigo deriva de uma fórmula
forma convincente, de ter sido responsável
política, esta deve ser posta sob fogo

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por uma onda de repressão, de qualquer momento em que a única escala efetiva de
tipo, já realizada ou pretendida, de modo operações de alguma importância será a
que o próprio inimigo começa a questionar escala global. Os estados nacionais terão
a veracidade do apelo a liberdade em que que ser privados de sua soberania e
acreditava de forma irrefletida. O êxito será subordinados à soberania de um governo
completo caso consiga-se condenar o mundial global. Penso que esse estado
adversário aos olhos do mundo e assim, em mundial necessitará de uma polícia armada
última análise, colocá-lo como imperial e e deverá dispor de força suficiente para
totalitário ou, então, como vinculado a poder impor a paz... O povo de cada atual
uma, senão a própria minoria racista, ou estado soberano independente terá de
religiosa a ser sempre desacreditada. renunciar à soberania de seu país e
subordinar-se à soberania suprema de um
A Opsinf subversiva também pode estar verdadeiro governo mundial global... Eu
vinculada a um ato ou um conjunto de atos desejo ver um governo mundial
que buscam difundir no nosso lado a euforia estabelecido.”;
e no inimigo o ceticismo, a emoção e o
desespero, atemorizando-o e dissuadindo- Ou, por STROBE TALBOTT (C.F.R.) Vice-
o. Neste caso, a Opsinf necessita do Secretário de Estado do Governo CLINTON,
sucesso. Um dos mais efetivos êxitos da no artigo “THE BIRTH OF THE GLOBAL
Opsinf subversiva consiste em destacar a NATION”, TIME MAGAZINE (20.07.92),
falta de êxito da propaganda adversária.
“todos os países são, basicamente,
Munição das Opsinf. arranjos sociais... Não importa o quão
permanente e até sagrados eles possam ter
As Opsinf usam três munições para as parecido em quaisquer tempos, pois de
suas diversas armas: fato eles todos são artificiais e
temporários... Talvez a soberania nacional
palavras, músicas, e imagens. não tenha sido, afinal de contas, uma ideia
tão boa assim...”
As palavras podem ser faladas ou
escritas, abrangentes ou específicas, Como exemplo de música, poderíamos
corretas ou falsificadas. As músicas podem citar IMAGINE de JONH LENNON, utilizada
ser de denuncia ou de exaltação. As como uma Opsinf ante estadunidense na
imagens podem ser públicas ou restritas. Guerra do Vietnam:

Como exemplo de palavras, podemos “…Imagine there’s no country it isn’t


citar algumas que foram utilizadas nas hard to do nothing to kill or die for
Opsinf conduzidas para a venda da
globalização para a periferia: And no religion too Imagine all the
people living life in peace…”
Por BOUTROS BOUTROS – GHALI,
Secretário -Geral da ONU, 1992, no As Opsinf devem sempre explorar a
relatório AN AGENDA FOR PEACE: força que emana da repetição contínua das
palavras, das músicas e das imagens.
“os tempos da soberania absoluta e
exclusiva, entretanto, já passaram. Essa O conjunto de palavras monta um
teoria jamais se conformou à realidade” discurso, mas este discurso pode não ser
verdadeiro ou comprovado. Quando isto
por ARNOLD TOYNBEE, historiador, em acontece se tem o boato, uma potente
seu livro “SURVIVING THE FUTURE: arma. O boato tem de ser crível e tem de
se manter como boato, porque caso se
transforme em mentira além de perder todo
“estamos nos aproximando do
seu valor deprecia o seu emissor.

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Requerimentos da Opsinf objetivo final, a sua mente. As táticas e


estratégias militares convencionais são
As Opsinf requerem pessoal qualificado, substituídas por táticas e estratégias de
com complexa educação e peritas no controle social, mediante a manipulação
conhecimento dos valores e da cultura dos informativa e a ação psicológica orientada
meios em que pretendem atuar; devem ser para direcionar a conduta social. O
proficientes no uso dos recursos de politicamente correto se insere neste
comunicação, inclusive os modernos contexto. E o processo eleitoral também.
recursos de infraestrutura da mídia. A
equipe deve ser capaz de entender, por sua As Opsinf requerem a formatação e a
formação multidisciplinar de alto nível manutenção de uma estrutura
acadêmico, desde o imaginário coletivo até organizacional capaz de cooperar, de
objetivos estratégicos, táticos e competir ou de conflitar em um ambiente
operacionais de cada ação. Seu interesse de extraordinários desafios, gerindo a
central deve trafegar por espaços aquisição e operação de tecnologias
vinculados à comunicação, à psicologia modernas, a implantação de políticas e a
social, à antropologia cultural e à sociologia, delegação de ações especiais, em que a
tanto quanto os da área tecnológica e mídia é só um de seus elementos.
mesmo outros, articulando o conhecimento
científico e metodológico decorrentes do REFERÊNCIAS
estudo de culturas e aculturamentos, em COSTA, Nilder. As ONGs e a 'netwar'[on
especial para a formação e demolição de line].Rio de Janeiro, 26 de março de 1999.
imaginários. Tudo isso torna a equipe capaz Disponível em:
de integrar suas propostas e ações desde a http://www.alerta.inf.br/Geral/938.html.
estratégia nacional até o plano de
campanha de um comandante. GATES, Robert M. A Balanced Strategy:
Reprogramming the Pentagon for a New Age,
As Opsinf têm de ter acesso aos dados Foreign Affairs 88, no.1 (January-February
de inteligência em todos os níveis. Devem 2009).
ser acompanhadas em tempo real sendo
contínuas e continuadas de forma a GERASIMOV, Valery, The Value of Science in
administrar fortuitos e surpresas, pois Prediction, Military Industrial Kurier,
requerem, muitas das vezes, respostas (February 27, 2013).
prontas às mudanças comportamentais da GUINDO, MARTINEZ e GONZÁLEZ, Manuel
ambiência onde se encaixem. O seu Garcia, Gabriel, Valera La guerra híbrida,
planejamento deve se inserir no Documento de Trabajo del Instituto Español
planejamento maior do esforço pretendido de Estudios Estratégicos (IEEE), Granada, 15
e deve ser conduzido, como já foi colocado, de febrero de 2015.
observando as variáveis, tempo e espaço:
sempre o mais cedo e no maior espaço HAMMES, Thomas X. The Sling and the
possível. Stone.On War in 21st Century. Minneapolis:
Zenith Press, 2006.
Na guerra hibrida, a Opsinf mais HOFFMAN, Frank, Conflict in 21 st
relevante é a Opsinf midiática, aquela que é Century. The Rise of Hybrid Wars. Arlington:
realizada por especialistas em guerra Potomac Institute for Policy Studies, 2007 8.
psicológica infiltrados na sociedade civil.
Esses se aproveitam do meio midiático, HUNTER, E., PERNIK, P: The Challenges of
televisão, internet, celulares, rádios e Hybrid Warfare. ICDS Analysis. 2014.
jornais e utilizam o emprego planejado da
propaganda e da ação psicológica, para ISSERSON. Georgil, The Evolution of
direcionar a conduta das pessoas. O alvo Operational Art, Combat Studies Institute,
prioritário passa a não ser mais o terreno 2016
físico, mas o cérebro dos indivíduos, e o

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KORYBKO, Andrew, Abordagem adaptativa


pós-tudo da 'mudança de regime', Oriental
Review
KILCULLEN, David. The Accidental Guerrilla:
Figthting Small Wars in the Midst of the Big
One. Oxford: Oxford University Press, 2011.

TRINQUIER, Roger. Modern Warfare, A


French View of Counterinsurgency. London:
Pall Mall Press, 1964.VAN CREVELD, V. Martin
.The Transformation of War. New York: Free
Press, 1991.

/www.defesanet.com.br/gi/noticia/23752/GU
ERRA-HIBRIDA--Nova-via-Violenta-para-a-
Tomada-do-Poder/

http://www.defesanet.com.br/pensamento/n
oticia/12778/A-Guerra-em-Rede-Social-e-a-
Situacao-Atual-no-Brasil-/

http://outraspalavras.net/brasil/o-brasil-no-
epicentro-da-guerra-hibrida/-O Brasil no
epicentro da Guerra Híbrida - Por Pepe
Escobar

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