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Retrofit de fachadas: tecnologias européias

A primeira discussão sobre retrofit diz respeito à sua definição, surgindo dessa
forma alguns questionamentos: os diferentes tipos de intervenção num edifício
acabado são todos considerados como retrofit? Quando se fala em renovação,
fala-se em retrofit? Qual a diferença entre renovação, retrofit e reabilitação? As
operações de restauro coincidem com alguma dessas? Buscando conceituar
esses termos para facilitar a explicação do objeto deste artigo, adotam-se,
baseado em bibliografia francesa e suíça (Choay, 1992 e Koelliker et al, 1999),
as seguintes definições:

• reabilitação: ação de restabelecer o empreendimento ao seu estado de


origem, utilizando tecnologias disponíveis, restabelecendo seu valor venal
e prolongando sua vida útil, mas não necessariamente incorporando
novas tecnologias;
• renovação: ação de restabelecer o empreendimento ao "novo" por
"profundas" transformações que tornam o empreendimento em melhor
estado e com "novo" aspecto, incorporando modernas tecnologias. A
renovação, diferente da restauração, é sinônimo de perda de
características históricas;
• restauro: ação de restabelecer o edifício ao estado original, buscando
salvaguardar tanto a obra de arte quanto o testemunho histórico. As
operações de restauro são geralmente feitas em edifícios tombados como
patrimônio histórico e devem obedecer às regras específicas ditadas em
documentos como a Carta de Veneza de maio de 1964.

A norma de desempenho brasileira (NBR


157575-1) define retrofit como
remodelação ou atualização do edifício ou
de sistemas, pela incorporação de novas
tecnologias e conceitos, o qual,
normalmente visa valorização do imóvel,
mudança de uso, aumento da vida útil e
melhoria da eficiência operacional e
energética.

Comparando a definição de bibliografias


européias e brasileira, conclui-se que na
Europa está sendo denominado de
"renovação" o que o setor da construção
civil brasileira tem denominado de retrofit.

No Brasil, o mercado de conservação e


renovação de edifícios, ou seja, aquele que considera operações de reabilitação,
renovação, restauro e conservação, é ainda pequeno comparado ao Europeu,

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mas apresenta um grande potencial de crescimento, especialmente nos grandes


centros urbanos, como São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e outros, em
razão:

• da necessidade de modernizar fachadas e instalações face às novas


tecnologias e exigências funcionais ou estéticas atuais;
• do número crescente de edifícios com mais de 40 anos, quase sempre
carentes por renovação;
• do surgimento de leis fiscais que visam incentivar ações para
revitalização ou renovação de fachadas, como por exemplo as leis da
cidade de São Paulo no 12.350 de 1997 e no 14.223 de 2006 (ambas
prevêem descontos de IPTU para edifícios que recuperem ou renovem
suas fachadas) etc.

Na Europa, o mercado de renovação é


reconhecidamente importante, tanto ou mais
que o mercado de construções novas. Na
França, por exemplo, o volume de negócios
do setor de construção, particularmente do
segmento de edificações, é expressivo para
obras de conservação e renovação, conforme
ilustra a figura 1.

Observa-se que a participação das atividades


de manutenção e renovação é bastante
expressiva no setor da construção francesa,
em razão, entre outras, das várias operações
de reurbanização das principais cidades da
França (veja www.grandsprojets.paris.fr) e da
quantidade de edifícios antigos que precisam
ser conservados, renovados ou reabilitados
(grande quantidade de edifícios construídos no início do século 20).

As operações de reabilitação, ou renovação, especialmente das fachadas dos


edifícios europeus acontecem porque essas já não atendem a algumas
exigências de desempenho, sejam estéticos, de durabilidade, de segurança ou
outro. Especialmente na França, uma das razões para renovar ou reabilitar as
fachadas é o incremento do desempenho térmico dessas fachadas, visando
melhorar a eficiência energética do edifício (o desempenho térmico de um
edifício depende, entre outros, do comportamento interativo da fachada,
cobertura e pisos). Cabe observar que a renovação na Europa não significa
necessariamente alterar totalmente as características arquitetônicas da
fachada; pois caso as fachadas tenham alguma importância no contexto
histórico da região, pode-se, por exemplo, substituir os componentes antigos
por outros tecnologicamente mais apropriados, mantendo-se as características
arquitetônicas originais.

Ainda, no processo de renovação e/ou reabilitação deve-se analisar a


viabilidade técnico-econômica dessas operações. Para tanto, quanto menos for
necessário interferir nas fundações e na estrutura do edifício, maior a
probabilidade de que essas operações sejam viáveis.

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Assim sendo, o emprego de componentes leves nesse tipo de operação é quase


obrigatório. Por isso, as tecnologias de fachadas leves são as tecnologias
comumente empregadas nas operações de renovação e reabilitação dos
edifícios europeus.

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Dessa forma o objetivo deste artigo é descrever algumas tecnologias de


fachadas leves empregadas nas operações de renovação de edifícios europeus,
isso baseado em visitas a obras e consultas a catálogos técnicos e à
bibliografia.

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O que são fachadas leves?


A norma francesa NF P28-001 (Façade Légère - Définitions - Classifications -
Terminologie), 1990, e a UEATC (Union Européenne pour l'Agrément Technique
dans la Construction) definem fachada leve como "um elemento construtivo
constituído por componentes pré-fabricados, com função de vedação vertical
externa, constituído de várias camadas, sendo que pelo menos a camada mais
externa tem massa inferior a 100 kg/m²". As fachadas leves são geralmente
constituídas pelos componentes mostrados na figura 2.

• componentes de fechamento e/ou revestimento: placas de vidro, placas


cimentícias, placas metálicas, placas de rocha, placas cerâmicas, painéis

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de materiais sintéticos etc. (componentes pré-fabricados cujo peso é


menor que 100 kgf/m²);
• isolantes térmicos: placas de poliestireno expandido ou extrudado, placas
em lã mineral etc.;
• estrutura secundária: na Europa utiliza-se estrutura secundária em
madeira ou metálica. No Brasil, esse tipo de estrutura é mais comumente
encontrado em perfis metálicos, que têm a função de apoiar os
componentes de fechamento, revestimentos e materiais isolantes,
suportar cargas laterais, como a ação do vento, e absorver deformações
provenientes da estrutura principal e também da própria fachada;
• dispositivos de fixação: são responsáveis por fixar a estrutura secundária
da fachada à estrutura principal do edifício, e/ou fixar os componentes de
fechamento ou revestimento à estrutura principal, quando esses são
autoportantes;
• componentes de preenchimento das juntas: selantes, gaxetas em perfis
termoplásticos extrudados e membranas flexíveis.

A NF P28-001 (Façade Légère - Définitions - Classifications - Terminologie)


também classifica as fachadas leves segundo seu posicionamento com relação à
estrutura principal do edifício (face exterior das vigas de borda) em:

• fachada-cortina: fachada leve, constituída de uma ou mais camadas,


posicionada totalmente externa à estrutura do edifício formando uma pele
sobre o mesmo. Em francês essa classificação é conhecida pela expressão
façade rideaux e em inglês curtain-wall;
• fachada semicortina: fachada leve, constituída de uma ou mais camadas,
cuja camada exterior é posicionada externa à estrutura do edifício e a
camada interior interna e entre pavimentos. Essa norma considera que a
camada interior não deve ser obrigatoriamente leve, existindo casos em
que a camada interior da fachada semicortina é uma parede em
alvenaria, ou em concreto, e a camada exterior um revestimento não-
aderido constituído de componentes pré-fabricados leves. Em francês
essa classificação é conhecida como façade semi-rideaux. Algumas
bibliografias americanas e inglesas tratam essa classificação como
cladding wall.

As figuras 3 e 4 ilustram as fachadas leves segundo seu posicionamento no


edifício.

As tecnologias de fachadas leves, classificadas como fachada semicortina,


tendem a ser as mais convenientes para aqueles casos de renovação de
fachadas nos quais se pretende aproveitar a parede (vedo) existente que, em
função de diversos problemas, já não atende integralmente sua função como
vedação vertical externa. Dessa forma, adicionam-se à parede existente outras
camadas, gerando uma parte adicional, cujo conjunto deve atender aos
requisitos de desempenho de uma fachada. A expressão em inglês utilizada
para esses casos é overcladding e quando se faz necessária a substituição de
todos os elementos da fachada, inclusive do vedo existente, utiliza-se
comumente a expressão recladding.

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Figura 5 - Fachada leve após renovação, do tipo semicortina, cujos


componentes de fechamento são em placas cimentícias com
acabamento incorporado

Tecnologias de fachadas leves


Uma das principais diferenças entre as fachadas leves empregadas no Brasil e
na Europa diz respeito à quantidade de componentes de fechamento
atualmente existentes no mercado europeu. Ressalte-se ainda que os
componentes europeus, antes de serem aplicados nas obras, são
obrigatoriamente objetos de avaliação, especialmente das suas características
de desempenho, até porque existe a necessidade de que tais componentes
apresentem uma certificação (marca CE). Essa certificação foi criada em função
das regras de comércio da Comunidade Européia, ou seja, os produtos da
construção a serem comercializados no mercado comum europeu devem
apresentar resultados de ensaios e controles conforme especificações de
normas européias. Alguns dos componentes relacionados com a tecnologia de
fachadas leves e que têm a marca CE são:

• placas cimentícias reforçadas com fibra de vidro, ou fibras sintéticas, com


acabamento incorporado;
• painel composto por placas metálicas (alumínio) com miolo em
poliestireno expandido ou extrudado;
• placas de resinas acrílicas, cujo acabamento superficial pode imitar placas
de granito;
• painel com placas de vidro insulado, os quais empregam venezianas ou
painéis fotovoltaicos internamente. O vidro insulado é uma combinação
de vidros float simples, formando um conjunto múltiplo de placas
intercaladas com gases inertes (como argônio ou criptônio). Um aspecto
que tem sido amplamente explorado nos painéis de vidro insulado é a
inserção de algum componente na câmara de ar, como persianas, brises
e materiais transparentes que diminuam a entrada de radiação solar.

A figura 5 ilustra uma fachada renovada, cuja camada externa é formada por
placas cimentícias com revestimento incorporado.

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Empreendimentos de renovação e/ou reabilitação com fachadas leves


A tabela 1 mostra alguns exemplos de empreendimentos de renovação ou
reabilitação realizados na França, país que pode ser considerado pioneiro em
obras de revitalização urbana em larga escala, com o emprego da tecnologia de
fachadas leves.

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Figura 6 - Fachada renovada com painéis


cimentícios

Considerações relevantes
Na Europa, diferentemente do Brasil, o mercado de renovação de fachadas é
expressivo e existem normas e legislações pertinentes, além da grande
quantidade e diversidade de produtos existentes, especialmente no que diz
respeito aos componentes de fechamento.

Os componentes de fechamento existentes atendem a requisitos mínimos de


qualidade, em função da garantia decenal obrigatória que o fabricante deve
oferecer, além da marca CE, a qual garante que o componente atenda no
mínimo à normalização européia vigente.

Entretanto, quando um produto de construção ainda não tem normas européias


nem normas nacionais reconhecidas (produto não tradicional), este, antes de
ser comercializado, deve passar por um processo especial de avaliação - ATE
(Aprovação Técnica Européia).
Pode-se dizer também que existem na Europa diversos consultores e escritórios
de projetos especializados nesse nicho de mercado, sendo, portanto, as
práticas de construção bem mais consolidadas que no Brasil.

Além disso, observa-se que uma das grandes preocupações e objetivos da


renovação é, mais que a valorização do empreendimento, o incremento do seu
desempenho térmico e energético, colocando-se em prática medidas que
contribuem com as políticas de preservação ambiental européias.

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Luciana A. Oliveira, Pesquisadora do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São


Paulo), M.Sc. Doutoranda da Escola Politécnica da USP (Universidade de São Paulo) - Departamento de
Engenharia de Construção Civil - Epusp/PCC, e-mail: luciana@ipt.br

Ercio Thomaz, Prof. Dr. Pesquisador do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São
Paulo), e-mail: ethomaz@ipt.bt

Silvio B. Melhado, Prof. Dr. da Escola Politécnica da USP - Departamento de Engenharia de


Construção Civil - Epusp/PCC, e-mail: silvio.melhado@poli.usp.br

Leia Mais

NBR 15575 - Desempenho de Edifícios Habitacionais de até Cinco Pavimentos - Partes 1 a 6.


ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), 2008.
NFP 28.001 - Façade Légère - Définitions - Classification - Terminologies. AFNOR (Association
Française de Normalisation), 1990.
L'Allégorie du Patrimoine. F. Choay, Paris, Seuil, 1992.
Évider, Rénover, Restaurer et Réhabiliter: Dix Interventions de la Ville de Genève
Sur son Patrimoine. Publication:Conservation du Patrimoine Architectural de la Ville de

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Genève. M. Koelliker; P. Marti; D. Ripoll. Département des Affaires Culturelles, 1999.


Disponível em: www.ville-ge.ch/geneve/ amenagement/patrimoine/biblio.htm.

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