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Nesse campo, os símbolos, surgidos do impacto das percepções sensíveis sobre

a memória e a imaginação, aparecem como condensados de experiências e de


expectativas, formando como que o substrato imaginativo da inteligência
racional. Assim, no domínio da ação coletiva, qualquer idéia, qualquer decisão,
remetem sempre a um fundo simbólico que as emoldura, limita e, até certo
ponto, determina.

Os símbolos pairam sobre a história como possibilidades de concepção que, em


certos momentos, “descem” e se convertem em possibilidades de ação. O que
determina sua descida e seu retorno, seu aparecimento e desaparecimento no
cenário da história, parece ser um fator tão misteriosamente individual e
irredutível como aquele que, em física subatômica, determina os movimentos
de uma partícula singular. Na escala humana, porém, essa irredutibilidade não
pode ser explicada como “irracional”: o indivíduo que apreende o nexo
simbólico e o converte em ação deliberada opera, como bem percebeu Weber,
de maneira estritamente racional. O irracional, o imprevisível, está somente no
acaso que, em certos momentos, fornece ou sonega às forças históricas em
conflito o personagem individual decisivo, a mente consciente capaz de
apreender o novo sentido de velhos símbolos e, articulando-os com a situação
presente, inaugurar uma nova possibilidade e um novo estilo de ação histórica.
À análise desse personagem, o líder articulador como o chama Paulo
Mercadante, são dedicadas algumas das páginas mais luminosas deste livro.
Entre o encadeamento das ações pretéritas, a recorrência cíclica dos símbolos,
o acaso que produz ou não produz o líder articulador e por fim a interferência
do indivíduo consciente que interpreta a situação à luz dos símbolos e
desencadeia novas ações, a rede de ligações é sutil e incerta demais para poder
condensar-se num determinismo, ainda que atenuado, porém ao mesmo tempo
é coerente demais para que nela nada se veja além de uma sucessão de
casualidades furiosas. Daí o título: A Coerência das Incertezas. Trata-se de
apreender um nexo de sentido onde não é possível (ainda) falar de uma
conexão causal direta

Only he who has tasted freedom can feel the desire to make over everything in its image,
to spread it throughout the whole universe." (Philosophical Inquiries into the Nature of
Human Freedom

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