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Ilustração: Revista Novo Ambiente/Marco Jacobsen

Desenvolvimento com equilíbrio


3
Maio/2011
Índice
Í
CApa ÁGUAS

54 SÉRIE

9 Editorial
10 No Meio
Saúde
alimentação 24 18 Carros
H de Híbrido, H de Honda
Flexitarianismo
22 Infopágina
100 lugares para lembrar

28 11 Atitudes
Atitudes em Verde e Amarelo

34 11 Atitudes - Ongs
Do meu lixo cuido Eu

40 11 Atitudes - Administração
Boa gestão nelas!

44 Amazônia
Muralha Verde

52 Rio
11 Atitudes
30
Além da animação

nestlé 74 Artigo
Gustavo Fruet
Nutrindo Valores
80 Manejo Faber-Castell
Traçando uma meta

82 Especial EUA
O gigante do Norte

88 Tecnologia
90 Artigo
Código de Mineração

94 Velho Ambiente
96 Da Redação
Economia
IBGC 76
Governar a si mesmo
Fotos: Revista Novo Ambiente/Alex Hekavei

Atenta ao fenômeno da urbanização no Brasil e no mundo, a Revista Novo


Ambiente abre a série de reportagens intitulada Vida Urbana com uma visão
sobre a água e seus desafios. Estudos recentes publicados pelo governo
federal apontam a possibilidade de escassez de água em centenas de
municípios brasileiros na próxima década caso não ocorram investimentos
importantes e imediatos para garantir o abastecimento. Ouvimos gestores
públicos de dois estados brasileiros – São Paulo e Rio de Janeiro – que têm
papel-chave nas soluções possíveis contra uma seca generalizada no futuro
próximo, já que abrigam nada menos que 30% da população nacional.
O pioneirismo de um e o dinamismo de outro são exemplos de gestão dos
recursos hídricos e, como um rio, podem desaguar boas notícias para as
gerações futuras.

Rio Tietê: sua despoluição é uma questão de honra para São Paulo.

Desenvolvimento com equilíbrio


7 Maio/2011
Uma publicação da Novo Ambiente Editora e Produtora Ltda.

fsc
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Ano 01 - Edição 12 - Maio/2011
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Editorial
Editorial

S obrevoando as lentas e caudalosas


águas do rio Negro, fica difícil imaginar
que tamanha imponência encontra suas
primeiras nascentes a algumas centenas de qui-
lômetros de Manaus.
A força econômica não precisa ser a forca am-
biental, pois, em última análise, os pescoços na
ponta da corda serão os nossos e dos nossos filhos.
Também não é crível que, no atual estágio
da evolução humana, legiões de miseráveis pe-
Pequenos fios d’gua que, depois de brotarem rambulem pelo globo, à margem da mesa farta
do solo peruano, iniciam um caminho de encon- posta para poucos.
tros. Encontros com outros pequenos córregos A busca por notícias e iniciativas que per-
o tornam rio. Encontros com outros rios o tor- mitam crer que uma nova era de iluminismo se
nam um gigante amazônico. Em sua trajetória, a avizinha manterá nossa crença no jornalismo de
vida em abundância. imersão. A esta busca, acrescentaremos a certe-
A Revista Novo Ambiente há um ano vive za de que, ao retratar os grandes temas da atua-
seus dias de nascente. Almeja ser grande. Am- lidade, a Revista Novo Ambiente, tal qual a nas-
biciona proporcionar encontros. Encontros ca- cente do rio Negro, irá lentamente encontrando
pazes de levar o tema contemporâneo do de- nas parcerias com os mais diversos setores da
senvolvimento com equilíbrio aos mais diversos sociedade os “rios” que a tornarão grande, do
pontos deste Brasil complexo e continental. tamanho dos que ousam sonhar com a educação
Sonha ser cada vez mais, referência nos bancos como única porta de acesso a uma nova realida-
acadêmicos, elevando o debate de ideias a res- de. Realidade que contemple homem em desen-
peito da relação do homem com o planeta. volvimento e meio ambiente em equilíbrio.

Central de Jornalismo
Virada Sustentável em São Paulo
A primeira edição da Virada Sustentável será realizada nos dias 4
e 5 de junho, com atrações espalhadas em diversas regiões e par-
ques da cidade de São Paulo, envolvendo cinema, teatro, exposi-
ções, workshops, oficinas e shows de música cuja temática está
ligada à sustentabilidade (meio ambiente, biodiversidade, direitos
humanos, mudanças climáticas, mobilidade urbana, lixo, qualida-
de de vida). A Virada Sustentável contará com ações das principais
organizações que trabalham com o assunto no país, como WWF,
Greenpeace, SOS Mata Atlântica, Instituto Akatu, Rede Nossa São
Paulo, Instituto Saúde e Sustentabilidade, Slow Food, Carta da Ter-
ra, entre outras. Realizada em parceira com o poder público, par-
ceiros estratégicos e empresas patrocinadoras, a Virada Sustentá-
vel conta até agora com o apoio das Secretarias Municipal e Esta-
dual do Meio Ambiente (SVMA e SMA), que também promoverão
ações educativas nessas datas.

Saiba mais em: www.viradasustentavel.com

NOMEIO
Energia limpa em Goiás
O Governador de Goiás, Marconi Perillo, inaugu-
Foto: Divulgação

rou em maio a Bionasa. A empresa, especializada


na produção de biodiesel, foi instalada na cidade
de Porangatu. A Bionasa tem capacidade para pro-
duzir 653 mil litros de biocombustíveis ao dia, 235
milhões de litros ao ano, e foi instalada numa área
próxima ao terminal de transbordo da ferrovia Nor-
te-Sul. “A Bionasa certifica Goiás como grande pro-
dutor de energia limpa”, disse Marconi. A Onasa,
outra empresa do grupo, vai se instalar na mesma
cidade, que está se tornando um polo de desenvol-
vimento da região Norte. Quando entrar em fase de
produção, a Onasa terá capacidade para esmagar 1
milhão de toneladas de grãos por ano. A empresa
será construída numa área de 387 mil m2.

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Maio/2011 10
Dia do Silêncio
Dia 7 de maio é considerado o Dia do Silêncio. A causando estresse, insônia, irritabilidade, perda de
poluição sonora é a causa de grande parte dos audição, de memória e de rendimento profissional
processos por infrações ambientais nas prefei- e escolar. Os principais causadores de incômodos
turas do Brasil (no Rio de Janeiro, corresponde a sonoros apontados são os bares, os templos reli-
quase 70% das queixas). A Organização Mundial giosos, sistemas de transporte e indústrias. Apesar
de Saúde (OMS) aponta que a partir de 50 deci- disso, menos de 2% das cidades brasileiras pos-
béis os sons começam a ser nocivos aos humanos, suem legislação restritiva e fiscalização apropriada.

Nível de ruído aproximado Limites de ruído com base na resolução


- Torneira gotejando: 20 dB Conama e NBR 10151/20000
- Música baixa: 40 dB
(entre 19h e 7h / entre 7h e 19h)
- Conversa tranquila: 40-50 dB
- Restaurante com movimento: 70 dB
- Secador de cabelo: 90 dB - Nas áreas de sítios e fazendas: 35 dB / 40 dB
- Caminhão: 100 dB - Nas áreas residenciais, de hospitais ou de escolas: 45 dB / 50 dB
- Britadeira: 110 dB - Nas áreas mistas com vocação comercial e administrativa: 55 dB / 60 dB
- Buzina de automóvel: 110 dB - Nas áreas mistas com vocação recreacional: 55 dB / 65 dB
- Turbina de avião: 130 dB - Nas áreas industriais: 60 dB / 70 dB
- Tiro de arma de fogo próximo: 140 dB

Uma força na piracema


A piracema deste ano no rio Suaçuí Grande, no leste de
Minas Gerais, tem ganhado um importante reforço. No tre-
cho onde se encontra a Pequena Central Hidrelétrica (PCH)
Paiol, usina que pertence à Ersa – Energias Renováveis S.A.,
que começou a operar em 2010, foi realizado o resgate ma-
nual de peixes, para que transpusessem a barragem e pu-
dessem continuar sua corrida rio acima para desovar. Por
meio do Programa de Resgate da Ictiofauna, os peixes fo-
ram capturados no leito do rio, logo abaixo da barragem, e
Foto: Divulgação

transportados em recipientes para serem soltos no reserva-


tório, concluindo, assim, a migração rio acima. Alguns estão
ameaçados de extinção, como o dourado. A Ersa ainda rea-
lizou o repovoamento com peixes nativos da bacia, como o
corimbatá e o piau, soltando cerca de 30 mil peixes juvenis.

Desenvolvimento com equilíbrio


11 Maio/2011
Biscoitos mais verdes
A Kraft Foods, dona de marcas como Lacta, Tang, Club So-
cial, Nabisco, Milka, entre outras famosas, acaba de inau-
gurar uma fábrica verde de biscoitos. Trata-se de um in-
vestimento de mais de R$ 100 milhões que vai empregar
diretamente 600 pessoas.
A nova fábrica conta com recursos modernos para a re-
dução dos impactos ambientais. A nova estrutura possui,
por exemplo, claraboias prismáticas para utilização de
iluminação natural, aquecimento solar da água, sofistica-
da estação de tratamento de efluentes, equipamentos de
baixa emissão de carbono e estacionamentos “eco-pavi-
mentados”. No Brasil, a companhia já possui outras ini-
ciativas sustentáveis em suas fábricas, como programas

Foto: Divulgação
de reaproveitamento de água da chuva, redução de uso
de gás, água e luz, destinação adequada dos resíduos de
produção, além da preocupação constante com o uso ra-
cional dos recursos naturais e matérias-primas.

Dez ministros

Carlos Minc, Marina Silva, José Carlos


Carvalho, José Sarney Filho, Gustavo
Krause, Henrique Brandão Cavalcan-
ti, Rubens Ricupero, Fernando Couti-
nho Jorge, José Goldemberg e Paulo
Nogueira Neto. Esses nomes, embora
envolvam concepções políticas dife-
Foto: Fabio Rodrigues Pezzobom/Abr

rentes, têm duas coisas em comum:


todos foram Ministros brasileiros do
Meio Ambiente e assinaram um ma-
nifesto contra o substitutivo da lei de
Aldo Rebelo para o Código Florestal.
A reunião de tantos ex-Ministros em
torno de uma causa é inédita.

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Maio/2011 12
NOMEIO
Bicicletas na Lei
Muito se fala em bicicleta como modal limpo e ce, entre outros assuntos, a destinação de 5% das
saudável de transporte, uma solução inteligente vias urbanas para a construção de ciclovias e ciclo-
que não polui, não ocupa espaço e custa pouco. faixas, em modelo funcional, integradas aos outros
Pouco se faz efetivamente a respeito. Diante de sistemas, como os ônibus, por exemplo.
obras de urbanismo que devem brotar instantane- A proposta para a Lei da Bicicleta está em votação
amente para a Copa de 2014 – visto o andamento desde o ano passado e promete atingir um objetivo
lento das obras –, quando tanto se fala em utiliza- inédito: a aprovação de uma lei por meio de uma
ção de espaços funcionais (e não apenas de lazer) iniciativa popular que utiliza a internet. A Lei Orgâ-
para o tráfego de bicicletas, é necessário refletir nica de Curitiba prevê a iniciativa popular de pro-
sobre a integração definitiva deste sistema às ci- jetos de lei de interesses específicos, e essas leis
dades. E dada a inação do meio político, ao menos terão validade se forem de vontade expressa de ao
para um projeto de grande escala, um grupo de ci- menos 5% do eleitorado, o que, no caso de Curitiba,
clistas curitibanos resolveu fazer a lei, ou melhor, representa 65 mil votos.
fazer valer o artigo primeiro da Constituição Bra- A iniciativa pode ser acessada no endereço <www.
sileira de 1988: todo poder emana do povo e pode votolivre.org>. Para participar, é necessário dar o nú-
ser exercido diretamente. mero do título de eleitor e morar em Curitiba. Existem
O Projeto de Lei Complementar de Iniciativa Popu- outras ações em andamento; consulte em sua cidade,
lar que trata da chamada Lei da Bicicleta estabele- ou você mesmo pode tomar a iniciativa.
Foto: Revista Novo Ambiente/Oberti Pimentel

A quantidade de ciclovias tem aumentado nas grandes cidades, mas a forma de


transporte ainda não conquistou a atenção necessária para se integrar de vez à urbe.

Desenvolvimento com equilíbrio


13 Maio/2011
NOMEIO
Contra a ocupação irregular
Agnelo Queiroz, Governador do Distrito Federal,
disse que será implacável nas ações de prevenção,
controle e erradicação de ocupações irregulares
no Distrito Federal lançando o Comitê de Combate
ao Uso Irregular do Solo. Cada órgão que compõe
o Comitê possui uma competência específica. A

Foto: Revista Novo Ambiente/Paulo Negreiros


criação do Comitê trará ainda outras atribuições,
além das que eram características da Força-Tarefa,
como fiscalizações fora do expediente administra-
tivo e fiscalização sobre novas instalações de redes
e ligações de energia e água em áreas de parcela-
mento irregular do solo. Não será permitida a liga-
ção de energia e água para novas invasões. Desde
o início do seu mandato, centenas de famílias fo-
ram retiradas de áreas de risco no DF.

Banindo as Bifenilas Capacitor eletrolítico encontrado em aparelhos eletrônicos.

Os Deputados Federais José Luiz Penna (PV-SP) e Sarney


Filho (PV-MA) querem acabar com as Bifenilas Policlora-
das (PCBs) e seus resíduos, apresentando um projeto de
lei que prevê também a descontaminação e a eliminação
de transformadores, capacitores e demais equipamentos
elétricos que contenham a substância. O PCB é um orga-
noclorado sintético constituído de óleos isolantes utiliza-
dos nesses equipamentos elétricos, muitos dos quais são
classificados como resíduos perigosos em função da sua
Foto: Revista Novo Ambiente/Oberti Pimentel

toxicidade. O projeto de lei proposto por Penna requer a


eliminação progressiva da substância até 2020, também
em total acordo com os compromissos assumidos pelo
Brasil na Convenção de Estocolmo, que prevê a elimina-
ção até 2025. Os PCBs podem causar, entre outras ano-
malias à saúde humana, problemas nos sistemas imuno-
lógico, cardiovascular, endócrino, gastrointestinal, respi-
ratório e reprodutivo. Também apresentam a capacidade
de causar interferências hormonais durante a gestação, o
que pode levar a malformações congênitas.

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Maio/2011 14
Foto: Revista Novo Ambiente/Leonilson Gomes

“Uma questão é buscar sempre


melhorar o transporte público, e a outra
é substituir o uso do carro particular
pelo serviço público, mas isso só
acontece se houver qualidade.”

Marcos Kassab,
do Departamento de Planejamento e Expansão do Metrô
Foto: Revista Novo Ambiente/Leonilson Gomes

Estação Sacomã, São Paulo

Mais conexões e possibilidades


CARROS CIVIC HÍBRIDO

H de híbrido,
H de Honda
Representada com grande peso no segmento de motocicletas de baixa e média
cilindradas, a Honda do Brasil guinou de acordo com as estratégias de expansão
da marca e passou a investir em nosso mercado automobilístico. Conhecido há
tempos nos Estados Unidos, ela trouxe para cá o Civic, inicialmente um sedã
comportado, com uma ou outra versão um pouco mais “apimentada”. Porém,
a sobriedade definitivamente deu lugar a um perfil tecnológico. O Civic Híbrido,
que poderá chegar por aqui, traz inovações além de seu hibridismo.
Foto: Divulgação

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Maio/2011 18
A decisão da Honda de tornar o Civic o seu
representante da nova geração de carros que

E
combinam duas naturezas de propulsão é, na
le chegou como quem não queria nada, verdade, cercada de pragmatismo. O Civic é
herdou a aura de confiabilidade de pro- um projeto e bem resolvido (há décadas). Um
dutos com os quais tinha pouco a ver, a produto que atende diferentes perfis de com-
não ser o fato de ter rodas e motor a combustão, pradores e que possui excelente comporta-
e, pelas bordas, foi se aninhar no coração de um mento dinâmico, boa mecânica e dirigibilidade.
pessoal que “adora carros”. O H da logo presente
nos capôs dos automóveis Honda também é uma
lembrança que desperta um sentimento nos-
tálgico nos brasileiros – o ídolo Ayrton Senna foi
O que vem sob o capô?
campeão com um desses símbolos desenhado no
nariz de seu McLaren Honda. Memórias à parte, a A “fórmula” não é novidade e terá o mes-
marca do sol nascente é mais conhecida por pen- mo raciocínio aplicado em outro produto de su-
sar no futuro. E justamente por enxergá-lo bem cesso no Brasil, o Fit: trata-se de um propulsor
é que ela optou, assim como demais fabricantes, de 1.500 cilindradas acoplado a um motor elé-
por adotar uma solução imediata para atender trico. O conjunto entrega até 110 cavalos e, de
consumidores que, além de economizar combus- acordo com a Honda, é 12% mais eficiente do
tível, querem respirar melhor. que a geração atual, que já é bastante econô-
mica, haja vista que, segundo testes da revista
Quatro Rodas, a publicação com maior autori-
dade em automóveis no país, o Civic EXS Flex
faz pouco mais de 7 km com um litro na cidade
e percorre cerca de 10 km na estrada rodan-
do com o álcool, que notoriamente apresenta
maior consumo. Ainda não ficou claro se have-
rá uma versão flex do híbrido para o Brasil (ele
roda com gasolina lá fora), mas o fato é que,
para compensar esta “falha”, ele apresenta
outros atributos Hi-Tech, como um sistema de
gerenciamento integrado dos motores. Há tam-
bém o “Econ Button”, que faz o carro operar em
“modo econômico”, sendo monitorado pelo
“Eco Assist”, que é o dislay no painel que faz a
diagnose do desempenho em tempo real.

Roupa nova?
Não, obrigado.
À primeira vista, os mais distraídos podem
não reparar na grade nova nem em outras sutis
alterações na estética do modelo. O novo hí-
brido difere pouca coisa do visual apresentado
pelo New Civic, que vemos por aí. Um “lifting”
nos para-choques foi suficiente para diferenciá-
-lo sem mexer ainda mais nos custos. Precisar,
não precisava, pois o apelo estético do modelo
sempre foi unanimidade entre seus motoristas
e admiradores.

Desenvolvimento com equilíbrio


19 Maio/2011
100 100 para lembrar
A organização não governamental di-
namarquesa CO+Life desenvolveu o pro-
jeto “100 Lugares para Lembrar Antes que
Desapareçam” (100 Places to Remember
Before They Disappear) com o intuito de
alertar o mundo para as questões globais
relacionadas às mudanças climáticas. O
tema central pode não ser novidade, mas
o enfoque, sim. Com fotografias e vídeos
de 100 lugares paradisíacos em seu site, a
lugares
Climáticas da Organização das Nações Uni-
das (IPCC-ONU) para produzir as imagens.
Em seu portal (www.100places.com/
en/), é possível “viajar” por estes luga-
res e conferir suas paisagens. Desde a
Groenlândia e seus fiordes de gelo, pas-
sando pelo coração da Amazônia, até as
Greater Blue Mountains, na Austrália. Na
Groenlândia, o degelo já fez regredir 7 km
da geleira de Ilulissat desde 1992, a qual
mais fina. Segundo a CO+Life, a Groenlân-
dia é um dos lugares onde o aquecimento
atua mais rapidamente. Do outro lado
do mundo, na Malásia, o modo de vida
dos pescadores bajaus está igualmente
ameaçado pelas mudanças culturais de
sua pesca milenar, aliado ao aumento da
temperatura da água do mar, fato que
põe também em risco a existência de um
de seus principais objetos de pesca: o pe-
campanha baseia-se nas informações do integra o gelo continental daquele país e pino do mar, considerado uma iguaria em
Painel Intragovernamental de Mudanças possui 3 km de espessura em sua camada diversos locais da Indonésia.

Confira outros exemplos apontados pela ONG:

Nunavut
Canadá
A população indígena, e milenar, de
26 mil indivíduos da etnia inuit que vive
no norte do Canadá está ameaçada, jun-
tamente com as focas, morsas e ursos
polares que vivem no círculo polar ártico.
Enquanto a temperatura sobe e o gelo de-
saparece, a relação entre os inuit e os ani-
mais – predador e caça – também deixará
de existir. Os animais, que dependem do
gelo para viver, comer e procriar, são fonte
de alimento dos inuit há milhares de anos.
Com o aquecimento, sua cultura fica ame-
açada, assim como o meio ambiente.

Floresta Amazônica
Brasil
Representa mais da metade das flo-
restas tropicais que restam no planeta.
Nos últimos 30 anos, mais de 600 mil km2
foram derrubados. Se continuar neste rit-
mo, segundo a CO+Life, em 2050 mais de
30% da floresta terá desaparecido.
Lago Balaton Sibéria
Hungria Rússia
Os romanos foram os primeiros a produzir vinho na Hun-
gria há 2 mil anos. Os vinhedos nas encostas próximas ao lago Não bastasse o passado difícil na história da Sibéria,
Balaton, também conhecido como “mar húngaro”, recebiam agora seu futuro também pode se mostrar um novo dra-
mais luz solar graças ao reflexo das águas do grande lago, com ma. Na era Stalin, milhões de pessoas foram deportadas
mais de 600 km² de águas quentes e rasas. Sua profundidade para a inóspita e fria região como prisioneiras exiladas
média é de apenas 3 m, mas, com a queda nos níveis de chuva (desde criminosos, inimigos do Estado contrários ao an-
e o excesso de turistas dos últimos anos, o lago tem encolhido. tigo regime, até nacionalidades inteiras). Estima-se que,
Seu nome, que significa “lago lamacento”, pode se tornar uma entre os anos 1929 e 1953, pelo menos 14 milhões de
realidade pouco atrativa. A lama está dando lugar à água. pessoas foram enviadas para os gulags, os antigos cam-
pos de trabalhos forçados onde se exploravam minérios,
gás e petróleo. Os gulags originaram as grandes cidades
industriais de hoje, e os 36 milhões de habitantes da re-
gião agora podem ter de enfrentar problemas catastrófi-
cos advindos do degelo da crosta permanente. As ferro-
vias, estradas, edificações, gasodutos e as cidades são to-
dos construídos sobre o gelo permanente. Algumas cons-
truções já apresentam instabilidade devido ao problema.

Perth
Austrália
As peculiaridades da cidade austra-
liana são ao mesmo tempo interessan-
tes e preocupantes. Além de ser a me-
trópole mais isolada do mundo (a cida-
de grande mais próxima fica a 2 mil km
de distância) e estar em uma região de
clima desértico entre os mais secos do
mundo, Perth sempre precisou utilizar
a água subterrânea para abastecer seu
1,7 milhão de habitantes. Sua sede está
secando um aquífero de 40 mil anos de
existência. Reservatórios foram constru-
ídos na superfície para reter água das
chuvas, mas as mudanças climáticas se
encarregaram de diminuir as precipita-
ções na região. Agora – desde 2007, na
verdade –, a metrópole partiu para a
dessalinização da água do mar (já que
sua planta urbana fica no litoral); no en-
tanto, esta solução provê somente 17%
das necessidades hídricas da cidade.

Baía Mahajamba
Madagascar
A ilha de Madagascar é o lar de espécies únicas de plan-
tas e animais que não existem em nenhum outro lugar do
planeta. A quarta maior ilha do mundo possui mais de 3.300
km² de mangues onde vivem inúmeras espécies de molus-
cos, crustáceos, tartarugas e peixes tropicais. Estes seres
servem de alimento a outras espécies raras de aves. Mudan-
ças no nível dos oceanos significariam sério risco ao delica-
do equilíbrio salino desta área de mangue.
SAÚDE ALIMENTAÇÃO

Vegetarianismo flex
Os benefícios do vegetarianismo, tanto para os animais quanto para nosso
próprio organismo, atraem cada vez mais pessoas para esse estilo de vida.
Mas, em um país com uma cultura que não dispensa o churrasquinho, isso
pode ser um grande desafio para muitos dos que se aventuram a cortar de
vez a carne de suas dietas. Por isso, muitos deles optam pelo flexitarianismo,
um modo de diminuir consideravelmente o consumo de carne sem sentir-se
culpado por comer um hambúrguer de vez em quando.

O
Brasil é um dos maio- zantes da atitude: para aqueles que Monday”, tem como um dos seus
res produtores de gado se dispuseram a reduzir a carne de mais famosos colaboradores o ex-
bovino do mundo. E, seu regime alimentar, mas não a -Beatle Paul McCartney. A cam-
mais do que apenas uma estatísti- cortá-la completamente, foi criado panha, que angaria cada vez mais
ca, a ampla quantidade de carne se o termo flexitarianismo. O neologis- adeptos, demonstra que a diminui-
tornou parte não apenas da nossa mo, criado a partir das palavras “fle- ção do consumo de carne não pre-
cultura, como da de muitos países xível” e “vegetarianismo”, foi popu- cisa ser um sacrifício e que, com o
do mundo. O churrasco no final de larizado pela especialista em dietas tempo, pode se tornar até mesmo
semana, o pastel de carne, o ham- Dawn Jackson Blatner, em seu livro um hábito.
búrguer. Eis que, entre os humanos The Flexitarian Diet ou A Dieta Fle- Apesar de tudo, é conveniente
com uma dieta basicamente carní- xitariana. A autora afirma que o fle- lembrar que esse comportamen-
vora, se torna cada vez mais comum xitarianismo é diferente de um sim- to não é considerado de fato
um comportamento: o vegetarianis- ples onivorismo ou de um consumo vegetarianismo, pois o pró-
mo. Aos ouvidos daqueles que não moderado de carne, portanto mere- prio termo inclui riscar as
abrem mão do bifinho, parecia um cia receber um desígnio próprio. carnes da dieta. A melhor
absurdo. Mas, em nome da saúde, Para ser considerada flexitaria- definição se aproximaria
do respeito aos animais ou simples- na, é necessário que a pessoa dê de uma transição entre
mente gosto próprio, cada vez mais prioridade à alimentação vegeta- o consumo exacerbado
pessoas aderiam a essa dieta. riana. As condições e restrições par- de carne e a restrição
Para uma população cujo há- tem da iniciativa particular. Podem total do vegetarianis-
bito de comer carne já se enraizou incluir alimentação exclusivamente mo. Para aqueles que
na cultura, no entanto, abrir mão vegetariana apenas em determina- querem seguir o vege-
de vez da carne pode ser um gran- dos dias da semana, ou permitir-se tarianismo por qual-
de desafio. Influi no planejamento o consumo de carne apenas fora quer motivo, não deixa
financeiro e pode causar restrições de casa. Vários padrões podem ser de ser um começo. Ou
durante reuniões sociais. Além dis- criados, dependendo da disposição simplesmente uma dieta
so, substituir as proteínas que a car- e da vontade pessoal. A Sociedade alternativa, sem a obrigação
ne oferece exige um controle rígido Vegetariana Brasileira lançou no de cortar a carne em definiti-
sobre a dieta. Assim, um comporta- Brasil a campanha “Segunda-Feira vo. De qualquer maneira, é pre-
mento derivado do vegetarianismo sem Carne”. A iniciativa, conhecida ciso tomar a iniciativa. Que tal nesta
atraiu a atenção de muitos simpati- mundialmente como “Meat Free segunda-feira?

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Maio/2011 24
Fotos: Revista Novo Ambiente/Leonardo Pepi

25 Maio/2011
Desenvolvimento com equilíbrio
Alimentação diferenciada

Vegetariano: Crudívoro:
definição generalizada para aquele que não come consome apenas alimentos crus.
carne (vermelha ou branca) nem os seus subprodu-
tos (bacon, salsicha, mortadela, etc.). Frugívoro ou Frutívaro:
aquele que só permite frutas em sua alimentação.
Ovo-lacto-vegetariano:
subdivisão do vegetarianismo em que o indivíduo Freegano:
não come nem carne nem seus subprodutos, mas adaptação ainda mais radical dos veganos, os
sua dieta inclui ovos, leite e laticínios. freeganos comem apenas o que encontram
no lixo. Eles desenvolveram técnicas para não
Lacto-vegetariano: tornar o seu hábito algo ainda mais perigoso
subdivisão ainda mais restrita do vegetarianismo, à saúde, e não são exatamente vegetarianos,
não admite o consumo de carne nem de ovos. De uma vez que podem consumir carne, desde que
origem animal, apenas leite e seus derivados. tenha sido jogada fora. O objetivo deles é evitar
dar dinheiro àqueles que exploram os animais.
Vegano:
nessa versão mais restrita do vegetarianismo,
não é permitido o consumo de nenhum produto
de origem animal. Além de carnes, peixes, aves
e laticínios, também são proibidos os ovos, mel,
gelatina, etc. Mais um estilo de vida que uma
simples dieta, no veganismo também se evita o
uso de lã, couro, seda e até mesmo itens menos
óbvios, como cosméticos e produtos de limpeza
que possuam em seus componentes qualquer
composto de origem animal.

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Maio/2011 26
ATITUDES CONCEITO

11 atitudes
em verde e amarelo
U
m dos fundamentos da linha editorial
da Revista Novo Ambiente é o jor-
nalismo útil, aquele que participa de
forma integrada com a sociedade, buscando seu
aprimoramento evolutivo. Esta série de repor-
tagens tem um objetivo relativamente simples,
mas importante: mostrar boas atitudes. Exemplos
produtivos, inspiradores, que possam melhorar,
em maior ou menor escala, toda a vida do plane-
ta. Compartilhar esta informação é parte deste
processo capaz de tornar mais harmônica a vida
em nossas comunidades, cidades, estados.
O que os governos estão criando, pensan-
do e executando para melhorar a vida dos cida-
dãos? Como fazem? Com quais recursos? Como
as organizações não governamentais (ONGs)
estão trabalhando no país? O que fazem? Como
contribuem de forma determinante para o futu-
ro do Brasil? E é na iniciativa privada que a sus-
tentabilidade se torna um profícuo negócio, in-
teligente e lucrativo.
Até o final do ano, serão 11 exemplos de
boas atitudes em cada uma dessas três áreas
– Governo, Empresas e ONGs. Adotando o 11
como número simbólico, devido ao ano decisi-
vo em que nos encontramos, esperamos tra-
zer, ao todo, 33 sugestões para um Brasil. Uma
contribuição para um segmento de informações
cada vez mais detalhado. Apontar é certificar de
maneira simples a existência de tais ações, uma
forma de dar visibilidade a estes temas e enga-
jar pessoas na tomada de decisões e na busca de
soluções, no caso da Sociedade Civil; comunicar
boas práticas corporativas aos consumidores, no
caso do Setor Privado; e fortalecer a cidadania e
a transparência do Setor Público.

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Maio/2011 28
Foto: Dreamstime

Atitudes em verde e amarelo


que já foram mostradas:
Governo
São José do Rio Preto Drenagem urbana sustentável
Estado de São Paulo Projeto Mina d´Água
Governo Federal ICMBio
Estado Tocantins Gestão de unidades de conservação

ONGs
Várias Movimento SOS Florestas
Akatu Conscientização do consumidor
SOS Mata Atlântica Proteção da Mata Atlântica
Do meu lixo cuido EU Compostagem

Empresas
TAM Biocombustível a partir de pinhão
Vale Fertilizantes Redução de 80% na emissão de gases
AmBev Movimento Cyan
Nestlé Criando valor compartilhado

Desenvolvimento com equilíbrio


29 Maio/2011
ATITUDES EMPRESAS

Nutrindo
valores
Ela é de origem Suíça, mas faz parte da vida das famílias de todo o planeta.
Completando 90 anos da instalação de sua primeira fábrica no Brasil, a Nestlé
entendeu como poucas a interdependência entre as empresas e a sociedade.
Transferindo para a sociedade conhecimento nutricional, acadêmico e
científico, criando e apoiando projetos sociais e ambientais, a marca ganha
cada vez mais respeito da população e, com isso, consumidores mais assíduos.

É
difícil imaginar que em um passado “Uma empresa não pode sobre-
não muito distante muitas famílias viver em uma sociedade falida, e nem
perderam seus filhos por desnutri- sociedade alguma pode prosperar sem
ção em países da Europa hoje tão ricos, como uma forte economia”, aponta
a Suíça. As sucessivas guerras do século XIX, a Ivan Zurita, Diretor-Presidente
instabilidade econômica e política abalaram da Nestlé Brasil, na introdução
o sistema social e esgotaram as reservas dos do Relatório Criação de Valor
europeus. A falta de alimentos levou à fome e Compartilhado Nestlé Brasil.
à desnutrição. A mortalidade infantil era uma Sim, o foco de se ter uma co-
realidade presente entre muitas famílias, mas nexão entre a vantagem com-
um casal, cujo filho não podia se alimentar do petitiva dos seus produtos e
leite materno e tinha como certa a morte, teve a responsabilidade de uma
a sorte de ter como amigo um homem chama- empresa perante a sociedade
do Henri Nestlé. Ele desenvolveu um compos- que a mantém veio lá do velho
to alimentício para ajudar esta criança e a sal- Henri, que cedo vislumbrou
vou. Sua farinha à base de leite de vaca, muito que a sustentabilidade só se
eficiente contra a desnutrição, dali em diante dá por meio de um ciclo vir-
salvaria outros milhares de crianças mundo tuoso. Em 1874, ele vendeu
afora. Assim nascia a Farinha Láctea, logo de- sua empresa para uma socie-
pois exportada para outros países da Europa, dade suíça por um milhão de
América e Oceania. A Nestlé lançou outros francos. Mudou-se para Glion
produtos que ganharam mais do que o gosto e se dedicou ao ramo de hote-
no paladar dos consumidores, ganharia credi- laria e turismo, mas não per-
bilidade por sua preocupação com a nutrição. deu sua predileção por ajudar
Foi Henri quem estendeu o significado da pala- a sociedade que o ajudou, e
vra “nutrir” e gravou na essência de sua marca passou até seus últimos dias
de alimentos um conceito que ela traz consigo desenvolvendo importantes
até hoje: o Valor Compartilhado. trabalhos sociais.

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Maio/2011 30
O legado de Henri Nestlé
A saída de cena de seu fundador não im-
plicou na perda da essência da marca. Pelo
contrário, as décadas seguintes deram vazão às
preocupações sociais e mesmo ambientais já
embutidas no ainda não intitulado conceito de
sustentabilidade. Em 2011, a Nestlé comemo-
ra 90 anos de atividades no Brasil, e, em terras
nacionais, sempre mostrou preocupação com
a interdependência entre a empresa e a socie-
dade na qual se inseriu, apoiando o Programa
Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) e par-
ticipando ativamente do Codex Alimentarius,
organismo da Organização Mundial da Saúde
(OMS) e da Organização das Nações Unidas
para a Agricultura e Alimentação (FAO), na luta
contra a desnutrição mundial.

Fotos: Revista Novo Ambiente/Oberti Pimentel

Desenvolvimento com equilíbrio


31 Maio/2011
Nutrindo a mente Águas
A educação alimentar para a população de baixa Uma das maiores preocupações com a instala-
renda é uma das três ações do programa Nutrir. Em ção de uma indústria é o que sairá pela porta de trás
dez anos de existência, o programa já capacitou 11 mil dela, ou melhor, pelas tubulações de rejeitos, não
educadores em mais de 4 mil escolas, dando acesso a raro injetados como venenos mortais em rios e ou-
uma boa educação nutricional a mais de 1,2 milhão de tros corpos d´água. Já em 1963, a Nestlé instalou sua
alunos, segundo o relatório da Nestlé, e isso inclui pro- pioneira estação de tratamento de efluentes no Bra-
gramas para controle da obesidade infantil e outros sil, 13 anos antes de o governo de São Paulo ter sua
programas de extensão. Mais saúde, menos mortali- primeira legislação ambiental.
dade e menos gastos públicos com saúde. E, sim, con- Como uma das líderes mundiais de envase de
sumidores mais assíduos dos produtos, que acabam bebidas, a Nestlé tem a água como matéria-prima
ganhando mais confiança da população. principal, e tem desenvolvido diversos programas de
A educação alimentar, agora voltada para a ca- diferentes escalas para a preservação das nascentes
deia de produção, também é estendida ao setor e economia de água.
rural de baixa renda. A Nestlé possui laboratórios e
centros de pesquisa de fazer inveja, e parece quase
desnecessário dizer o impacto benéfico que gera a
transferência dessa alta tecnologia para produtores Valor compartilhado
rurais de baixa renda. A inclusão social e tecnoló-
gica traz mais recursos para os produtores, mais
renda. Para a Nestlé? Fornecedores mais eficientes Nesta matéria, discorremos sobre alguns ele-
e matéria-prima de alta qualidade, muitas vezes a mentos que constroem o conceito que a Nestlé bus-
custos menores. ca seguir. Uma essência do bem. Um ciclo virtuoso
A contribuição científica da empresa para a co- em que todos ganham. Mas esse é um trabalho com-
munidade nacional é imensa. Uma vasta literatura plexo que só pode ser feito com uma rigorosa clareza
gerada a partir de projetos coordenados ou patroci- de ideias, como os princípios expostos nos infográ-
nados pela Nestlé traz importantes ferramentas para ficos destas páginas. O Valor Compartilhado é, sem
o desenvolvimento tecnológico brasileiro. No campo dúvida, o maior legado da marca Nestlé, presente
dos direitos, também tem mostrado atitude: foi a pri- em 98% dos lares brasileiros. Reforçar esse conceito
meira empresa a apoiar a Sociedade Brasileira de Pe- que completa quase um século de Brasil é uma gran-
diatria na ampliação da licença-maternidade. de atitude em verde e amarelo.

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Maio/2011 32
Desenvolvimento com equilíbrio
33 Maio/2011
ATITUDES ONGs

Do meu lixo
cuido EU
A partir da consciência e responsabilidade sobre seu próprio lixo orgânico, pessoas
unem as comunidades para colocar em prática ações de sucesso que passaram
a servir de exemplo para universidades, empresas e outras comunidades. O
movimento “Do meu Lixo Cuido Eu” remete a uma criativa e eficiente cadeia de
produção de alimentos, aliada a práticas de vida “desapegadas” do estresse da vida
cotidiana, como o almoço diário coletivo, que alimenta o corpo e o espírito. Quem
diria que tudo isso poderia ser conseguido por meio do lixo? Esta é a atitude em
verde e amarelo de iniciativa da sociedade desta edição.

A Quinta da Videira traz uma filosofia de vida responsável, cooperativa e produtiva.

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Maio/2011 34
“Q

Fotos: Revista Novo Ambiente/Leonilson Gomes


uinta” é o termo usado para
designar um terreno que pos-
sui uma casa e uma grande
área verde ao redor onde existem hortas, árvo-
res frutíferas e mesmo alguns animais. Não se
admiraria que muitos nem mesmo conheces-
sem a palavra, pois já caiu em desuso na língua
portuguesa. E não à toa. Estas áreas que dis-
ponham de um espaço físico de tamanho sufi-
ciente para uma pequena plantação particular
não pertencem mais ao cotidiano das pessoas.
A imagem de um quintal vasto e de pomares
cheirosos está restrita a vagas e nostálgicas
memórias, talvez, da casa dos avós.
Mas eis que em Curitiba, capital do Paraná,
existe uma destas quintas, com hortas de ver-
de vibrante, leguminosas coloridas, galinhas e
cabras. Apenas um recanto de descanso? Nada
disso. O plácido lugar repleto de cores vivas na
rua Pedro Nico é a sede da cooperativa Quinta
da Videira, que desenvolve projetos com o pro-
pósito de processar o lixo orgânico caseiro e be-
neficiá-lo de todas as formas possíveis, transfor-
mando-o de adubo a comida para animais.
Na quinta, eles produzem alimentos nas hor-
tas, produzem ovos, leite de cabra e seus deriva-
dos. Mas esse é apenas o subproduto do objetivo
principal: conscientizar as pessoas de que jogar
seu lixo na frente de casa é apenas um meio de
transferir o problema. E pretendem mostrar que
é possível facilitar esse serviço, diminuir o mon-
tante de lixo produzido na cidade e ainda usufruir
os benefícios que a boa utilização desses resíduos
pode acarretar. Esse projeto é chamado “Do meu
Lixo Cuido Eu” e, desde sua instalação em Curitiba,
onde a cooperativa já une muitas dezenas de famí-
lias direta ou indiretamente ligadas, outras cidades
vêm aderindo, tal como Jaraguá do Sul, em Santa
Catarina, Porto Alegre e São Paulo.
A casa que serve de refinaria biológica é tam-
bém o lar de um dos coordenadores do movi-
mento, Eduardo Feniman. O primeiro fato para o
qual se atentar é que não há nenhum outro odor
senão o de terra. Apesar de lidar com resíduos,
não há moscas ou insetos, não há mau cheiro. A
compostagem do lixo é limpa e inodora e pode
ser feita com uma sequência de caixas (veja ta-
bela) devidamente adaptadas, muito fáceis de
manejar. O cascalho que forra o chão é separado
da terra por carpetes reaproveitados. As próprias
cercas da casa são feitas do descarte das madei-
reiras e do refugo de construções. Toda a simplicidade um pouco do seu tempo para o meio ambiente. Hoje
contrasta com os resultados massivos: aquela unidade eles fazem suas reuniões e seus almoços juntos, e a
tem a capacidade de processar de três a quatro tone- necessidade de trabalho coletivo volta a integrá-los
ladas de lixo orgânico por mês em suas imediações, o em uma comunidade, em uma época em que o in-
equivalente ao que é produzido em mais de cem ca- dividualismo é uma das características marcantes.
sas. E, enquanto muitos projetos atuais creditam a Além de dar um fim adequado ao seu lixo, os interes-
solução dos problemas ambientais à aplicação de tec- sados aprendem a cultivar seus hortifrúti e a produ-
nologia, eles demonstram que o caminho neste caso zir seus próprios alimentos orgânicos e descobrem
é exatamente o inverso. “Se existe futuro, ele está no que cabras e galinhas podem, sim, ser animais de es-
passado”, afirma Cláudio Oliver, que também encabe- timação. Os benefícios vêm embutidos na prática, e
ça o projeto. O modelo deles não é diferente do que quem aderiu jura que é viciante.
as gerações passadas já faziam; é apenas o resgate dos “Se nós tivéssemos transformado isso em uma
velhos hábitos, acrescentando a eles novos estudos. empresa, eu provavelmente estaria em um escritório,
Mas, mais do que resgatar os antigos meios de controlando por telefone três ou quatro pessoas, e
lidar com o lixo, Eduardo Feniman acrescenta que não teria mais contato com tudo isso.” Eduardo frisa,
apenas um costume antigo foi capaz de dar vida a enquanto estamos ao lado das “lixeiras vivas”, que em
todo esse projeto: o diálogo. Um projeto deste porte muitos países da Europa e também nos Estados Uni-
não poderia ser conduzido sem o apoio de todo um dos são fonte de renda de instituições especializadas
grupo disposto a mudar os seus hábitos e dispor de em produção de húmus.

Animais convivem em ambiente extremamente limpos e sem odores. Eles não são para o abate, e sim para produzir adubo.

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Maio/2011 36
Cláudio Oliver faz questão de ressaltar que
nunca houve uma ideia inicial. Segundo ele,
em nenhum momento eles sentaram e co-
meçaram a planejar um local que se chamaria
Casa da Videira, onde seriam criadas cabras
e plantadas leguminosas. O projeto foi se de-
senvolvendo sozinho, a partir de pequenas
iniciativas. Ele próprio, quando ainda vivia em
um apartamento e dispunha apenas de uma
diminuta sacada, construiu seu aparelho de
compostagem e começou a dar destinação ao
lixo provindo de sua cozinha. Este, aliás, é um
dos primeiros pontos que Cláudio sugere para
uma pessoa que queira diminuir seu consumo
de lixo: começar a comer em casa. Isso e trocar
as sacolas plásticas pelas de papel.
Preparar as refeições dentro de sua pró-
pria cozinha, com a maior frequência possível,
ajuda o indivíduo a ter outra relação com os
restos de alimentos. Cláudio acrescenta que
muitas pessoas não aderem a grande parte
das iniciativas porque não gostam de arcar
com problemas, mas que é dos problemas
que surge a busca por novas soluções. E o mo-
vimento “Do meu Lixo Cuido Eu” foi crescen-
do desse mesmo modo, em um jogo de erros
e acertos, apenas com boa vontade, um bom
projeto e disposição de mudar o ambiente ao
seu redor. Um exemplo que traz grandes bene-
fícios ao mundo e que deveria ser seguido.

Na Quinta, prioriza-se o convívio harmônico entre homem e natureza. Mais que isso, é um lugar pragmático, uma vez que,
se o lixo orgânico de sua vizinhança não tiver destinação correta, o próprio morador sofre as consequências disso.

Desenvolvimento com equilíbrio


37 Maio/2011
A ESCOLHA DO MELHOR MODELO
É possível compostar utilizando diversos recipientes por
meio do mesmo processo. O importante é pensar naque-
le que melhor se adapta ao seu espaço.

Baia: estrutura montada em madeira, formando uma grande


caixa. É possível fazer com paletes, utilizados no transporte
de cargas. A vantagem é a facilidade na montagem e a capa-
cidade de processar grandes quantidades, ideal para quem
tem um quintal que produz muita poda de jardinagem.

Barrica: é um tambor plástico com vários furos pequenos


(uma broca n.° 8) para aeração e uma portinhola na sua base
para retirar o composto pronto. Você coloca os materiais pela
tampa de cima de retira o composto pronto pela parte de baixo.

Lixeira viva: são três recipientes (caixas ou baldes)


empilhados. As duas de cima são furadas no fundo, por
onde passam as minhocas e o líquido, que fica acumulado
no recipiente de baixo. Esse é o modelo mais eficiente na
cidade. A retirada do composto é feita sem a necessidade
de grandes ferrasmentas e o kit é muito compacto, cabendo
em qualquer lugar, servindo até mesmo para quem mora
em um apartamento.

COMO COMEÇAR?
Em todos os modelos, o princípio é o mesmo.

1. Coloque uma primeira camada de vegetais secos (carbo-


Eduardo Feniman diante de uma das plantações da Quinta. Ele ministra
no) no fundo. Se você escolher a baia, faça antes uma ca- oficinas gratuitas e disponibiliza informações para aqueles que querem
mada com galhos picados para que não acumule água no dar melhor destinação ao seu próprio lixo orgânico.
fundo e coloque uma tela nas frestas da madeira e sobre a
caixa para evitar que apareçam baratas ou ratos.

2. Começe a colocar seus restos orgânicos fazendo ca-


madas com os vegetais secos. A falta de carbono sobre
a compostagem deixará os vegetais frescos expostos,
podendo aparecer muitas moscas e outros animais em
O que é?
busca de alimento.
Um movimento com o intuito de ensinar as pessoas
gratuitamente a lidar com o seu próprio lixo orgânico,
3. O processo de decomposição ocorre entre 90 e 120
transformando-o em um fertilizante natural inclusive de
dias. Você pode acelerar isso com a presença de minhocas,
especialmente da espécie vermelha-da-Califórnia (Lum-
valor econômico. No site, estão disponíveis manuais gra-
bricus rubellus), utilizada na agricultura para a produção tuitos sobre como construir sua própria composteira ca-
de húmus. Se optar pela ajuda delas, evite colocar na seira. Em caso de dúvidas, é possível entrar em contato
composteira vegetais de sabor forte, como pimenta, alho com os coordenadores do projeto.
e cebola e as frutas cítricas. Eles contêm muita acidez, o
que prejudica as minhocas. Alimentos cozidos em grande Contato: Cláudio Oliver e Eduardo Feniman
(41) 3016-9609
quantidade também ficam ácidos (azedam) muito rápido,
edufeniman@gmail.com
evite-os. O melhor destino para esse tipo de restos são as claudiofoliver@gmail.com
galinhas. Você saberá que está pronto quando aquele ma-
terial orgânico estiver parecidos com uma terra bem preta.
www.domeulixocuidoeu.wordpress.com

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Maio/2011 38
atitudes ADMINISTRAÇÃO

Boa gestão nelas!


Uma boa administração é uma grande atitude. Mostra coerência, viabilidade e
sensibilidade. E isso serve para qualquer empreendimento, seja uma fábrica de
brinquedos ou uma unidade de conservação natural. No Brasil, cartões-postais
como Foz do Iguaçu e Pantanal têm uma boa fiscalização e controle ambiental,
e isso só é possível porque se tornou economicamente viável. Enquanto isso,
outras centenas de unidades Brasil afora sofrem com a falta de tudo: pessoal,
investimentos e, principalmente, ferramentas de gestão. O estado do Tocantins
está disposto a mostrar como mudar radicalmente esta realidade.
O Parque do Jalapão é um santuário onde muitas espécies encontram condições
perfeitas para viver entre as exóticas mudanças em sua vegetação.

D
entro do maior parque estadual do estado de To- O Brasil possui 1.278.190 km2 de unidades de
cantins, o capim dourado brota sob o sol de 30 conservação (UCs), o quarto país em extensão de áre-
graus médios do cerrado. Ele só existe no Jalapão, as de proteção. Mas isso não significa que elas estão
onde as mãos das descendentes de escravos que ali vivem realmente protegidas, pois o Brasil apresenta graves
colhem o capim e confeccionam espetaculares peças de arte- problemas de gestão, principalmente por ter um baixís-
sanato dourado. Veados-campeiros, tamanduás-bandeiras, simo orçamento por hectare e poucos funcionários, se-
antas, lobos-guarás, macacos, onças vivem entre a vegetação gundo um estudo realizado pelo próprio Ministério do
rasteira do cerrado e as matas fechadas no entorno das fas- Meio Ambiente (MMA) em parceria com o Programa
cinantes formações rochosas. Rios transparentes cruzam as das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
dunas deste deserto à brasileira, seco, mas não muito. Belo Muitas UCs encontram-se em estado de abandono,
e hipnótico. Tudo isso é muito bonito, mas vale pouco sem a pois não basta delimitar a terra sem um sistema efi-
capacidade de administrar essas riquezas naturais e culturais. ciente de gerenciamento e fiscalização da área.

Foto: Divulgação

Desenvolvimento com equilíbrio


41 Maio/2011
O documento aponta que o Brasil possui um fun- O MMA ainda aponta que as UCs do país geram
cionário para cada 186 km2, enquanto nos Estados cerca de US$ 4,5 bilhões com a exploração maneja-
Unidos há um funcionário para cada 26 km2. Os par- da de recursos naturais como a madeira, a borracha,
ques brasileiros, em muitos casos, poderiam ser mais o açaí e a castanha. O capim de ouro do Jalapão é
bem aproveitados no emprego de mão de obra de um desses recursos, e tanto sua produção sustentá-
comunidades que vivem no entorno dos parques. O vel quanto a catalogação da fauna local, a pesquisa
investimento por hectare, no relatório, mostra uma e a fiscalização precisam de organização e rigor na
diferença ainda muito maior entre unidades brasi- apuração dos dados, para a certa e eficaz tomada
leiras e americanas: enquanto aplicamos míseros R$ de ações, coisa que está longe de ser a realidade da
4,43 anuais por hectare, lá são aplicados R$ 156,12. grande maioria de UCs do país.
Diante deste quadro, não é surpresa que ameaças O Parque Estadual do Jalapão, assim como os
como o desmatamento, a expansão agropecuária, parques do Cantão e do Lajeado, no Tocantins, serão
as queimadas, a caça e a poluição atinjam em cheio, os primeiros a adotar um sistema de gerenciamento
quase sem resistência, muitas áreas paradisíacas e que pode mudar a história da gestão de parques no
de importância estratégica para o clima, para o regi- país, fazendo com que estas áreas se tornem susten-
me das águas e para a conservação da biodiversida- táveis, menos vulneráveis e menos suscetíveis à de-
de e da riqueza cultural do interior brasileiro. vastação dos ecossistemas nativos.

Tocantins como referência


Apontamos nesta edição uma iniciativa em
verde e amarelo do governo de Tocantins, que, por
meio de uma parceria com a The Nature Conservancy
(TNC), desenvolveu o primeiro sistema da América
Latina capaz de gerenciar as UCs, desde os trâmites
necessários para sua criação até seu gerenciamento
Foto: Nacim Borges

financeiro e administrativo. O Tocantins é o primei-


ro estado brasileiro a implantar o sistema na sua
totalidade. “Pretendemos replicar essa ferramenta
em todo o Brasil. A ideia é colaborar com a quali-
dade da gestão das UCs brasileiras, pois muitas de-
las sofrem com ameaças externas, como caçadores
que buscam suas espécies, ou com as indefinições
de seus limites”, afirma Henrique Santos, Coorde-
nador da Estratégia de Terras Privadas do Programa
das Savanas Centrais da TNC.
O Gesto, nome do sistema, disponibiliza infor-
mações para o público em geral, comunidades do
entorno, pesquisadores, investidores e para os
próprios gestores das Unidades. “Essa ferramen-
ta ajudará aqueles que se interessam pelas nossas
Unidades de Conservação. Isso pode colaborar com
a proteção dessas áreas e com o aumento da visi-
tação, que gera renda para as comunidades do en-
torno das UCs”, diz Divaldo Rezende, Secretário do
Meio Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável
do governo do estado do Tocantins.
O sistema apresenta informações para visi-
Divaldo Rezende, Secretário do Meio Ambiente e tantes, como fotos e atrativos das áreas, as formas
Desenvolvimento Sustentável do Estado do Tocantins. de acesso (por estrada, via fluvial ou pista de pou-
so), lista de espécies da fauna e flora localizadas,

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Maio/2011 42
pesquisas geradas na Unidade, entre outras. Além
disso, o sistema colabora para o trabalho de fisca-
lização da área, uma vez que apresenta as rotas de
fiscalização e também os pontos de risco para quei-
madas e pressões externas. E ainda possibilita saber
quais são os programas sociais e ambientais existen-
tes ao redor da UC. Entre as Unidades que já fazem
parte do sistema, estão os Parques Estaduais do Jala-
pão, do Cantão e do Lajeado.
A parceria entre o governo do Tocantins e a ONG
ambientalista TNC tem proporcionado ao estado des-
taque no que se refere à proteção e gestão de Unida-
des de Conservação de Proteção Integral. O acordo
foi firmado em fevereiro de 2008 pelo Governador
Marcelo Miranda e o Diretor de Programa de Conser-
vação das Savanas Centrais da América do Sul, João
Campari. Ao longo de um ano de parceria, a ONG,
com o apoio do Naturatins e da Secretaria de Recur-

Foto: Fred Borges


sos Hídricos e Meio Ambiente, já desenvolveu uma
série de trabalhos voltados para o monitoramento e a
implementação de projetos e sistema para a proteção
do cerrado brasileiro.

SOBRE A TNC
A TNC é uma organização não conservação para a Mata Atlânti-
governamental que desenvolve ca e Savanas Centrais, estabelece
projetos de conservação em mais parcerias com os diversos setores
de 35 países. Atuando no Brasil da sociedade a fim de proteger e
desde 1988, a organização tem a restaurar áreas prioritárias den-
missão de proteger plantas, ani- tro desses biomas. Atualmente,
mais e ecossistemas naturais, pro- a TCN e seus mais de um milhão
tegendo os recursos necessários de membros ajudaram a proteger
a sua sobrevivência. Desenvolve 130 milhões de hectares em todo
Para mais informações, acesse iniciativas como o programa de o mundo.
<www.nature.org/brasil>.

Fotos: Marcio di Pietro

Desenvolvimento com equilíbrio


43 Maio/2011
SÉRIE

Muralha verde
Com a explosão agropecuária do Centro-Oeste exercendo uma forte pressão
para o desmatamento do sul do Amazonas, governo federal e o governo do
estado lançam o programa Desmatamento Ilegal Zero, com foco nos sete
municípios que compõem uma espécie de barreira final entre o agronegócio
e o coração da Floresta Amazônica. Um trabalho de precisão estratégica tem
sido aplicado para converter conflitos em sinergia entre setores produtivos e
órgãos ambientais.

Vista aérea da floresta ao sul do estado do Amazonas. Uma área ainda bastante
preservada, mas que está ameaçada pelo avanço do desmatamento.

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Maio/2011 44
“H
oje, eu considero Apuí a capi-
tal brasileira do meio ambien-

Fotos: Revista Novo Ambiente/Oberti Pimentel


te.” Essa declaração, vinda de
um técnico, um funcionário de carreira que
hoje preside o Instituto Brasileiro do Meio Am-
biente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama),
dando esta condição verde a um dos municí-
pios mais ameaçados pelo desmatamento do
Amazonas, parece um tanto surpreendente.
“Aqui nós temos os setores produtivo, de fo-
mento, a sociedade e os órgãos ambientais
falando a mesma linguagem. O Cadastro Am-
biental Rural (CAR) realmente uniu a coletivi-
dade”, logo explica Curt Trennepohl, Presiden-
te do Ibama, contextualizando sobre um tema
que tem ganhado notoriedade nos últimos me-
ses: a regularização fundiária e ambiental.
De fato, toda a pequena cidade de Apuí, no
sul do estado do Amazonas, fechou o comér-
cio no último dia 9 de maio para participar do
lançamento de dois programas, que ocorreu
no ginásio da cidade e reuniu autoridades am-
bientais e do setor produtivo. A primeira ação
lançada foi o programa de Prevenção e Contro-
le do Desmatamento no Sul do Amazonas, com
foco nos sete municípios (Lábrea, Apuí, Boca
do Acre, Canutama, Humaitá, Manicoré e Novo
Aripuanã) que compõem essa região e sofrem
forte pressão do chamado Arco do Desmata-
mento (veja ilustração). “Esses sete municípios
requerem a atenção e prioridade, porque re-
presentam 20% de todo o Amazonas. Embora
o desmatamento tenha reduzido nos últimos
anos, a pressão sobre o sul do estado nunca foi
tão grande”, aponta a Secretária de Desenvol-
vimento Sustentável do Estado do Amazonas,
Nádia Ferreira, peça-chave na articulação da
produção sustentável da Amazônia que tem
transformado conflitos em ações conjuntas.
O segundo programa lançado foi a Regula-
rização Ambiental/Cadastro Ambiental Rural
(CAR), em conjunto com representantes locais,
por meio do qual estes reafirmaram um com-
promisso pelo desenvolvimento sustentável, em
áreas legalizadas, conciliando produção e prote-
ção ambiental. A base econômica de Apuí é a pe-
cuária de corte e, embora quase 97% da área do
município seja conservada, em números abso-
lutos cerca de 2 mil km2 de árvores e vegetação
nativa já tombaram para dar lugar ao gado e às
plantações. Ainda assim, de 2005 a 2009, o mu-
nicípio reduziu os índices de desmatamento em
69%, um avanço considerável que o coloca entre
as grandes esperanças verdes de contenção da derru-
bada da floresta amazônica. O governo agora conta
Novos tempos
com os próprios produtores para conter novas ameaças
de grandes madeireiras irregulares que estão se insta- Vindos em sua maioria do Sul à época da constru-
lando na região. “Aventureiros vão chegar sabendo que ção da rodovia Transamazônica, segundo o Incra, os
esta é uma terra de oportunidades e vão tentar macular produtores de Apuí foram estimulados pelo governo
essa imagem de colaboração que estabelecemos hoje, federal a ocupar a região Norte do país. “Na década
para desmatar. E precisaremos dos senhores para auxi- de 60, os assentamentos exigiam que se beneficiasse
liar os órgãos federais e estaduais a impedir isso”, disse 50% da propriedade para que fosse possível sua regu-
o Presidente do Ibama. larização. Nesta época, o governo federal entendia o
As argumentações entre os representantes do desmatamento como um benefício da propriedade.
governo, tanto dos setores produtivos e de fomento Muitos dos senhores aqui presentes atenderam este
quanto dos representantes ambientais, se deram sob chamado do governo e viram-se diante de uma revira-
os olhares curiosos e cuidadosos da população, forma- volta nesses conceitos”, disse Trennepohl, que, assim
da quase que inteiramente por pequenos agricultores como o Prefeito do município, Marcos Maciel, e o Se-
do assentamento Juma, o maior do país, implanta- cretário de Agricultura do estado, Eron Bezerra, reafir-
do pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma mou a mudança de conceito sobre estes homens de
Agrária (Incra). Do pequeno aeroporto até o local da desbravadores estimulados pelo estado a contraven-
assinatura do pacto, dezenas de faixas colocadas em tores ambientais, para tentar pagar essa dívida históri-
frente às casas comerciais mostravam a grande expec- ca e conter o desmatamento, que tem avançado a par-
tativa da população em regularizar suas condições e, tir do Mato Grosso, Rondônia e Pará (cujas apreensões
quiçá, livrar-se de multas ambientais que muitas vezes do Ibama vêm sendo desautorizadas pelo governo do
chegam a um valor dez vezes maior do que o da pro- estado), exercendo uma forte pressão sobre os sete
priedade em questão. municípios que compõem o sul do Amazonas.

Uma nova postura entre representantes do governo


federal e do estado do Amazonas está conquistando
avanços fundamentais: em vez de conflitos, ações
conjuntas de desenvolvimento sustentável com a
sociedade. No aeroporto de Apuí, Ademir Stroski, Pre-
sidente do Ipaam; Nádia Ferreira, Secretária da SDS; e
o Presidente do Ibama, Curt Trennepohl, comemoram
a adesão dos agricultores ao CAR.

Foto do presidente do
IBAMA, da secretária do SDS
e do presidente do Ipaam no
aeroporto

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Maio/2011 46
Desenvolvimento com equilíbrio
47 Maio/2011
Se por um lado os agricultores foram quase que
obrigados a desmatar para garantir o direito sobre
Educar para não desmatar
suas terras, por outro lado o exercício de órgãos am-
bientais como o Ibama, cuja missão é evitar crimes Outro foco da SDS é a educação ambiental com o
contra a natureza, também não foi nada fácil, e com programa “Educar para não Desmatar e Queimar”, que
as multas por desmatamento o clima tornou-se cada será realizado em parceria com o Instituto de Desenvol-
vez mais tenso, a ponto de, no ano passado, cogitar- vimento Agropecuário e Florestal Sustentável do Estado
-se a intervenção da Guarda Nacional para garantir a do Amazonas (Idam), vinculado à Secretaria de Estado
segurança dos agentes do Ibama, cautelosos diante da da Produção Rural (Sepror); o Sistema Nacional de Pre-
revolta dos agricultores. venção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo),
Diante de manobras inteligentes, principalmente coordenado pelo Ibama; a Federação da Agricultura do
da Secretaria de Desenvolvimento Sustentável do Es- Amazonas (Faea); o Serviço Nacional de Aprendizagem
tado do Amazonas (SDS), a situação tomou um rumo Rural (Senar); e prefeituras. O programa é direcionado
quase inesperado: a união de esforços para a regula- a produtores rurais e técnicos extensionistas e tem por
rização e contenção do desmatamento, a qual se deu objetivo discutir estratégias para prevenção e controle
na forma de um compromisso, o Cadastro Ambiental do desmatamento e queimadas.
Rural (CAR), que será emitido pelo Ipaam (Instituto de Também vai ocorrer uma interação com produ-
Proteção Ambiental do Estado do Amazonas). “Hoje tores rurais por meio de vídeos-aulas para discutir es-
anunciamos a abertura de um posto do Ipaam aqui tratégias de prevenção e controle do desmatamento e
em Apuí, para nos fazermos mais presentes, onde os queimadas, por meio do programa “Canal Aberto com
agricultores poderão encontrar todas as informações o Produtor”, direcionado a um público de 280 pesso-
sobre o CAR”, informou Ademir Stroski, Presidente do as. Serão formadas, ainda, as “Brigadas em Ação”, com
Ipaam, que deixou esclarecido que “este documento é o objetivo de apoiar a estruturação das brigadas mu-
apenas para a regularização das questões ambientais, nicipais de incêndio no combate ao fogo, prevendo o
e não fundiárias”. treinamento e formação de 210 brigadistas.

Curiosidades sobre o Apuizeiro


Apuí é o nome do fruto doce do apuizeiro. Uma
de suas traduções do guarani é “braço forte”. Com
tal nomenclatura, seria natural que uma cidade
com o nome da árvore tivesse os “braços fortes”
dos agricultores a lhe respeitar; no entanto, uma
outra curiosidade sobre o apuizeiro remete a uma
história um tanto interessante.
Apreciado pelas aves, sua semente atravessa
o tubo digestivo dos animais, que a deposita em
forma de fezes sobre a folha das árvores, princi-
palmente as palmeiras, onde germina. Logo, suas
raízes começam a se espichar até tocar o solo.
Uma vez dentro da terra, suas raízes começam a
ficar grandes e vigorosas, envolvendo a palmeira,
alimentando-se dela até cobrir completamente
sua hospedeira, matando-a e dando origem a um
imponente apuizeiro.

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Maio/2011 48
Assentamento agrário do rio Juma
Com 689 mil hectares, o Assentamento Juma pelo governo, pois projetou sobre o mapa áreas
tem capacidade para 7.500 famílias e, segundo o improdutivas, e muitas famílias se viram em si-
Incra, hoje lá vivem mais de 5 mil famílias. Gran- tuação difícil ao tomar posse de suas terras, ten-
de parte destas pessoas foram para lá na década do que posteriormente abandoná-las ou apelar
de 1970, por ocasião da construção da rodovia para o desmatamento para subsistir. Enquanto
Transamazônica, uma das estratégias do gover- cerca de 97% das áreas totais do município estão
no militar para ocupar a região Norte do país. O conservadas, 31% das áreas de assentamento já
assentamento, no entanto, que acabou por dar foram desmatadas, origem da preocupação dos
origem ao município de Apuí, foi mal elaborado órgãos ambientais.

Foto: Revista Novo Ambiente/Oberti Pimentel

Pressionado pelo avanço da fronteira agrícola, o sul do Amazonas já sofre com o desmatamento.
A chapa tá
esquentando
O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais e o Met Office Hadley
apresentam relatório que mostra que a Amazônia está se tornando
rapidamente mais seca e mais quente e que existe a possibilidade de
que ela praticamente desapareça em menos de um século se medidas
não forem tomadas para conter o desmatamento.

Menos chuva e mais calor. Essa é a conclusão Seca. Cheia. Seca.


do relatório final do projeto “Risco das Mudanças
Climáticas no Brasil”, desenvolvido pelo Instituto O relatório aponta que o desmatamento da Ama-
Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e o Met zônia diminuiu de 27 mil km2 em 2004 para 6.500 km2.
Office Hadley (MOHC), apresentado neste mês Segundo o Inpe, o Brasil está mantendo os compro-
de maio. Financiado pela Embaixada Britânica, o missos assumidos na Conferência Climática de Cope-
documento é resultado de três anos de estudos nhague, de reduzir 80% do desmatamento em 2020 se
de pesquisadores brasileiros e ingleses no intui- comparado a 2005. Ainda assim, o cenário é preocu-
to de mostrar a importância da Amazônia para o pante. Somente nos últimos cinco anos, aconteceram
equilíbrio do clima global e como provedora de duas grandes secas e a pior enchente já registrada na
indispensáveis serviços ambientais. Amazônia, e, embora as variações climáticas sejam
O objetivo do projeto é subsidiar os formula- naturais, a chegada delas a extremos como esses em
dores de políticas com evidências científicas das um curto espaço de tempo preocupa quando essas
mudanças climáticas e de seus possíveis impac- variações são projetadas para um futuro próximo. As
tos no Brasil, na América do Sul e em nível glo- projeções dizem que, até o final do século, o aumento
bal. “A experiência do MOHC do Reino Unido, de temperatura mínimo será de 2,3 graus, podendo
líder mundial em modelagem climática, aliada à chegar até a 8,9 graus, dependendo das variáveis apli-
experiência do Inpe em estudos sobre mudanças cadas. Já a chuva, fundamental para o abastecimento
climáticas na América do Sul, possibilitou a iden- da grande bacia amazônica, pode diminuir entre 11%
tificação de possíveis cenários e impactos, com e 41%. Tanto o calor quanto a diminuição na precipita-
projeções inovadoras dos efeitos das mudanças ção pluviométrica já são relatados por moradores de
climáticas antrópicas na região”, afirmou José municípios da Amazônia.
Marengo, pesquisador do Inpe que coordenou o A interferência do homem no sistema hidrográ-
projeto no Brasil. fico e a derrubada da floresta podem ser as causa-
O projeto utilizou um conjunto de modelos doras de tais fenômenos, já que inegavelmente o
globais e regionais desenvolvidos pelo MOHC e desmatamento libera carbono na atmosfera e po-
pelo Centro de Ciência do Sistema Terrestre do tencializa o efeito estufa, que mantém a temperatura
Inpe para projetar os efeitos das emissões de ga- da Terra aquecida. Consequentemente, o aumento
ses de efeito estufa no clima do mundo todo e da temperatura e a falta de chuva podem acabar por
fornecer mais detalhes sobre o Brasil. Embora as exterminar uma incalculável quantidade de ecossis-
projeções abranjam todo o país, o foco do relató- temas, criando um ciclo vicioso que pode levar à ex-
rio se concentra na Amazônia. tinção da floresta em menos de um século.

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Maio/2011 50
Fotos: Revista Novo Ambiente/Oberti Pimentel
Em 2010, o rio Negro, que banha Manaus, atingiu seu nível mais baixo nos últimos
100 anos. No ano anterior, havia atingido sua maior alta neste período.

Foto: Revista Novo Ambiente/Paulo Negreiros


Generosa
floresta
A floresta amazônica é um lugar onde o potencial de biodiversidade e a extração
sustentável dos produtos da floresta ainda não conhecem limites. Basta apenas algumas
horas para que um especialista aponte dezenas de usos das plantas para os mais diversos
fins. E não são processadas, são daquele jeito ali, in natura. Servem como remédio,
alimento, proteção. Presentes da mãe-natureza.
O imenso valor da biodiversidade da floresta de breu do índio (que não umedecem nem diante
amazônica nem sempre é palpável a todos. Fonte do mais forte temporal) e um tanto do inflamável
de imensa riqueza farmacológica, a selva fornece breu-branco, uma resina inflamável. Um álcool
muitos outros elementos úteis e que podem ser ex- para churrasco em plena selva; e, na falta da car-
plorados de forma equilibrada e sustentável. ne, com elementos fáceis de encontrar você faz
“É um shopping onde você encontra de tudo”, diz uma vara de pescar rapidinho, e com um pouqui-
Eraldo Cruz, sargento do Centro de Instrução de Guerra nho de sorte consegue pescar um dos deliciosos
na Selva (CIGS) do Exército Brasileiro. Mateiro, conhe- peixes amazônicos. Frutas generosas e altamente
ce a floresta em torno do rio Negro como poucos, com proteicas o esperam: o açaí, o camu-camu, o cupu-
seus mais de 20 anos de experiência de treinamento de açu, a graviola não são difíceis de encontrar.
guerreiros de selva. Se você estiver perdido na floresta e nem sinal
Ele guiou uma equipe da Revista Novo Ambiente de rios, o que é um tanto difícil na Amazônia, e a
para um dia de caminhada em mata fechada, cerca sede apertar, vai gostar de descobrir que existe o
de 60 km ao norte de Manaus. Nosso guia, no en- cipó-d´água, que é praticamente um reservatório
tanto, não é a personalidade durona que projetamos de água fresca. Chegamos a ver um destes arma-
de um sargento guerreiro de selva. Cruz é calmo e zenando cerca de 10 litros de água. Mas cuidado,
organizado, ávido por mostrar a beleza que a flores- tem o jeito certo de cortar, senão a água “azeda”.
ta possui. Mas é quando ele vai em direção às pri- Mas o mateiro também pode produzir, em algu-
meiras plantas que sua vocação surge. “Pode-se tirar mas horas, cerveja a partir de plantas, pode obter
leite de uma árvore chamada amapá-branco, muito poderosos antibióticos comprovados pela ciência.
comum por aqui”, diz Cruz, que lembra que o látex Os aromas de cada árvore encantam, mostrando
branco, além de ter várias propriedades medicinais, a fábrica inesgotável de inspiração que a selva é
tem seu sabor muito semelhante ao leite de vaca. para a indústria cosmética, com suas essências,
Alimentos e “utilidades em geral” também apa- óleos e pigmentos vivos.
recem à medida que vamos entrando na floresta. De
uma lasca fina do tronco do matamatá (Eschweilera
coriacea), cujas fibras são extremamente resistentes, Serviço
pode-se trançar uma superfície como uma parede, ou Cruz conta que, mesmo em seus momentos de folga,
usá-la para atar a estrutura de uma cabana coberta sua paixão mesmo é a selva e aprende com ela todos os
por palha de pariri ou palha de ubim. Tudo relativa- dias. Ele desenvolve incursões à selva e até pacotes para
mente rápido de fazer. Com um pouco de concentra- atividades de integração entre funcionários de empresas.
ção, em algumas horas você consegue construir um Se você estiver em Manaus ou se pretende conhecer mais
abrigo razoável. Se tiver um fósforo (e, se não tiver, sobre o espírito da selva, uma lição de respeito e genero-
tem jeito de fazer fogo a partir de elementos da flo- sidade da maior floresta tropical do planeta, sugerimos
os serviços do nosso guia: Eraldo Cruz: (92) 9194-2638 /
resta também), a vida no seu acampamento será
(92) 9229-7231.
uma beleza. Basta juntar umas sempre secas lascas

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Maio/2011 52
A fibra de matamatá é muito resistente e flexível, pode O cupuaçu possui gosto forte e único, apreciado em sucos
ser usada para amarrar qualquer coisa com segurança. e sorvetes. É uma rica fonte de proteína, cálcio e fósforo.

Fotos: Revista Novo Ambiente/Oberti Pimentel

Sargento Cruz torce a palha de pariri de tal forma que suas folhas As sementes do urucum produzem um pigmento natural ató-
tornam-se propícias para a confecção de utensílios e abrigos na selva. xico que pode ser utilizado assim que sua casca é aberta.

Desenvolvimento com equilíbrio


53 Maio/2011
capa ÁGUA

Águas
passadas a limpo
Atenta ao fenômeno da urbanização no Brasil e no mundo, a Revista Novo Ambiente
abre a série de reportagens intitulada Vida Urbana com uma visão sobre a água e seus
desafios. Estudos recentes publicados pelo governo federal apontam a possibilidade
de escassez de água em centenas de municípios brasileiros na próxima década caso
não ocorram investimentos importantes e imediatos para garantir o abastecimento.
Ouvimos gestores públicos de dois estados brasileiros – São Paulo e Rio de Janeiro –
que têm papel-chave nas soluções possíveis contra uma seca generalizada no futuro
próximo, já que abrigam nada menos que 30% da população nacional. O pioneirismo de
um e o dinamismo de outro são exemplos de gestão dos recursos hídricos e, como um
rio, podem desaguar boas notícias para as gerações futuras.

Após centenas de anos de descaso com os recursos hídricos, o


homem moderno tenta estabelecer novas formas de convivência
com a maior riqueza natural de que dispõe, a cada vez mais cara e
fonte vital de sobrevivência, o líquido da vida, a água doce e po-
tável. Vale lembrar que toda água potável é doce, porém nem
toda água doce é potável. Segundo a Organização das Nações
Unidas para a Água (UNWater), a oferta total de água doce
utilizável para os ecossistemas e os seres humanos é de cer-
ca de 200.000 km3 de água – menos de 1% de todos os re-
cursos de água doce do planeta (veja infográfico).
No Brasil, apesar da sempre noticiada “posição privilegia-
da” no que diz respeito à oferta e disponibilidade de água doce
em relação a outros países do mundo – o que em grande parte se
deve ao fato de a maior bacia hidrográfica do planeta estar na região
da Amazônia –, o cenário atual parece dar sinais de “estresse” em
diferentes localidades do território nacional.
Além da questão do saneamento, estratégica para o desenvol-
vimento, o abastecimento é outra fonte de preocupação, ou me-
lhor, fonte que pode secar, gerando uma crise em parcelas conside-
ráveis da população. Nas regiões mais populosas do Brasil, sobre-
tudo as metropolitanas, algumas bacias hidrográficas apresentam
níveis abaixo dos considerados mínimos ideais em termos de pro-
dução de recursos hídricos. Sem um esforço rápido e conjunto, o
título da página 58 pode deixar de ser uma pergunta para se tornar
uma afirmação.

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Maio/2011 54
,

O volume total
de água na Terra é de
cerca de 1.400 milhões
de km3. O volume de
recursos de água doce é
de cerca de 35 milhões
de km3, ou cerca de 2,5
% do volume total.

,
Da água potavél existente no
planeta muito pouco esta acessivel
e desse pouco a maior parte é utiliza-
Fonte: UNWater Statistics da de forma irracional.

SÉRIE
Principais rios e bacias
do Brasil
Bacia Tocantins-Araguaia
Bacia Amazônica Palco de paisagens paradisíacas, abriga a
A mais extensa do mundo, passa por sete ameaçada e “famosa” Ilha do Bananal, também
estados brasileiros – Acre, Amazonas, Ama- chamada de a “maior ilha fluvial do mundo”.
pá, Rondônia, Roraima, Pará e Mato Grosso Com biodiversidade única e responsável por
–, e quase 65% de sua extensão total fica embelezar o “deserto brasileiro” do Jalapão, faz
no Brasil. Também está presente em outros suas águas presentes em cinco estados (Goiás,
6 países – Colômbia, Peru, Bolívia, Equador, Tocantins, Pará, Mato Grosso, Maranhão) .
Guiana e Venezuela. São quase 7 mil km de
extensão da nascente no Peru até a foz no
Oceano Atlântico, e sua largura média (dis-
Bacia do Paraná
tância entre margens) é de 5 km.
Tem posição estratégica no território na-
cional, ocupa 32% da população brasileira e
está presente (divisas) nos estados do Paraná,
Bacias do Nordeste Santa Catarina, São Paulo, Mato Grosso do Sul,
Na região dos estados do Maranhão e Minas Gerais, Goiás, e Distrito Federal. Recebe
Piauí, abrange também uma parte do Pará, o nome do rio que é seu principal formador, o
e integra uma área com 233 municípios. Nos rio Paraná. Sua importância se destaca ainda
demais estados da região (Ceará, Rio Grande pelo número expressivo de usinas hidrelétricas
do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas), instaladas na região: 176, dentre elas, Itaipu,
a dimensão reduzida dos rios acarreta baixa Furnas, Porto Primavera e Marimbondo.
disponibilidade hídrica em relação à deman-
da local, formada por muitos municípios e
significativo parque industrial. Bacias do Atlântico Leste
Desde estados nordestinos (Bahia, Ser-
gipe), até o Sudeste, região mais populosa do
Bacia do São Francisco país. Por isso, a região hidrográfica possui gran-
O “Velho Xico” é conhecido também de importância no cenário econômico nacio-
por seu papel de integração nacional, tem nal. Por ser a mais populosa e industrializada,
mais de 2.700 km de extensão e função im- a região tem uma grande demanda de água
portante no transporte hidroviário, fazendo (10% do total nacional), sendo 41% para a área
ligação entre a região Sudeste (a partir de urbana e 15% para a área industrial.
Minas Gerais) e o Nordeste (Bahia, Sergipe,
Alagoas, Pernambuco) e ainda abriga 33 usi-
nas hidrelétricas em operação.
Bacia do paraguai
Sua bacia integra a grande Bacia do Prata
Bacia do Sul ao juntar com as regiões hidrográficas do Para-
Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do ná e Paraguai. Com 2.200 km de extensão, o rio
Sul integram a região da bacia que vai até Uruguai nasce da junção dos rios Pelotas, Peixe
o extremo sul do país, no Arroio Chuí. Nela e Peperi-Guaçu. Além de ter grande potencial
predominam rios de pequeno porte que es- hidrelétrico, também atende a agroindústria.
coam para o mar. Os de maior porte encon-
tram-se no Rio Grande do Sul.

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Fonte: Plano Nacional de Recursos Hídricos
Fotos: Revista Novo Ambiente/Alex Hekavei

Faltará água no
Brasil em 2025?
O Brasil precisará investir R$ 22 bilhões nos próximos anos para evitar
que mais da metade de seus municípios tenham problemas com o déficit
no abastecimento de água. O diagnóstico é da Agência Nacional de Águas
(ANA), que, com o perdão do trocadilho sobre o desperdício, jogou um
balde de água fria nos setores mais otimistas, responsáveis pela visão de
que o Brasil não precisa se preocupar com a oferta de água, dado o seu
potencial hídrico.

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O Atlas Brasil, divulgado pela Agência, acen- Belo Horizonte, Porto Alegre e o Distrito Federal,
deu a luz de alerta ao revelar que mais de 55% as quais representam 71% da população urbana
dos 5.565 municípios brasileiros podem enfrentar do país, ou seja, 125 milhões de pessoas, já consi-
falta de água até 2015. Isso quer dizer que 3.059 derando o aumento demográfico registrado pelo
municípios precisam de investimentos prioritários IBGE. Por isso é que, dos R$ 22,12 bilhões previs-
no setor, sobretudo em obras nos mananciais e tos pelo Atlas Brasil como necessários até 2025 no
nos sistemas de produção. Caso essas obras não setor de abastecimento, 75% se referem às grandes
sejam concluídas até o ano de 2015, o déficit no regiões metropolitanas e de adensamento popula-
fornecimento de água será inevitável a partir de cional, sobretudo nos sistemas integrados da região
2025. O maior problema se concentra em grandes Nordeste e no Sudeste. Os 25% restantes estão para
cidades, como São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, municípios de até 50 mil habitantes.
Foto: Revista Novo Ambiente/Oberti Pimentel

Rios da Amazônia, como o Negro, tem sofrido grandes secas na última década.

Desenvolvimento com equilíbrio


59 Maio/2011
O Atlas é responsável pelo planejamento da dos grandes centros urbanos que disputam as
oferta de água a partir do diagnóstico dos ma- mesmas fontes mananciais, além de possibilitar
nanciais e da infraestrutura hídrica existente, ou uma avaliação de suas infraestruturas para dar
seja, os sistemas de captação de água, elevató- conta de atender ao abastecimento público.
rias, adutoras e estações de tratamento, além da É importante ressaltar que a urgência de
identificação das melhores alternativas técnicas. investimentos não se restringe à produção de
De acordo com a Agência Nacional de Águas, o água. O Atlas evidencia a necessidade de inves-
levantamento é resultado do trabalho feito em timentos em coleta e tratamento de esgotos. É
articulação com órgãos do governo federal, esta- que, embora o volume de recursos não seja su-
duais e municipais, e a expectativa é que esses ficiente para universalizar os serviços de sane-
dados sejam base para as políticas do setor. O le- amento no país, poderia reduzir a poluição de
vantamento ajuda a identificar os gargalos e ca- águas que são utilizadas como fonte de captação
rências de várias regiões e evidencia os impasses para abastecimento urbano.

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Investimentos
Serão necessários investimentos na ordem
de R$ 70 bilhões até o ano de 2025 para obras
de água e esgoto, sobretudo nas regiões Norte
e Nordeste. Na Amazônia, por exemplo, região
que concentra 81% do potencial hídrico do
país, menos de 14% da população urbana da
região tem acesso a um bom sistema de abas-
tecimento. A região requer investimentos de
R$ 1,9 bilhão.
No Nordeste, o percentual da população
sem um abastecimento satisfatório de água
sobe para 18%, situação que se agrava porque
a região também concentra os maiores proble-
mas com disponibilidade de mananciais, por
conta da escassez de chuvas.
Amazonas e Pará necessitam, segundo o
levantamento da Agência Nacional de Águas,
de R$ 1,5 bilhão de investimentos no setor, o
que representa 77% dos investimentos do Nor-
te, destinados a 167 centros urbanos. Belém
e Manaus ficariam com R$ 756,7 milhões, ou
seja, 39% do montante para toda a região. Já
Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia e Pernambu-
co somariam 51% dos investimentos em obras
concentradas em 730 cidades.
Com 399 municípios e uma população de
8,9 milhões de habitantes, o Paraná, conforme
descreve o levantamento, está inserido, em
sua maior parte, na Região Hidrográfica do Pa-
raná. Os municípios que são abastecidos exclu-
sivamente por mananciais superficiais repre-
sentam 22% e estão concentrados nas porções
leste e sul do estado.

Fotos: Revista Novo Ambiente/Leonilson Gomes

Uma das duas usinas atômicas instaladas em Angra dos Reis.


A sede do futuro
Nesta edição, a Revista Novo Ambiente Nos dois estados, estão em andamento
concentrou seus esforços para conhecer a re- diversos projetos e programas de governo em
alidade de dois dos principais estados brasilei- parceria com municípios, para garantir o abas-
ros: São Paulo e Rio de Janeiro, onde vive boa tecimento, ampliar a disponibilidade de água
parte da população brasileira. A situação de em bacias sobrecarregadas, afastar o esgoto e
seus recursos hídricos para o abastecimento universalizar o seu tratamento – afinal, o sane-
urbano e rural é cada vez mais crítica, e esses amento é crucial para o abastecimento, já que
estados já se deram conta disso. os mananciais e rios recebem grande parte do
Hoje, algumas bacias hidrográficas já dão esgoto das cidades, e é mais caro tratar água
sinais de “cansaço” em sua produção de água poluída para utilizá-la posteriormente do que
doce para abastecer as mais de 41 milhões de manter as suas fontes limpas.
pessoas, no caso do estado de São Paulo, e as Em São Paulo, no fim de maio, o Governa-
quase 16 milhões, no Rio de Janeiro – soma- dor Geraldo Alckmin anunciou um conjunto
das, representam 29,9% da população brasi- de obras que prometem ampliar a oferta de
leira. E a disponibilidade hídrica dessas bacias água para 6,6 milhões de pessoas. São R$ 498
está diretamente ligada à questão do sanea- milhões em investimentos para os próximos
mento e do uso racional de seus recursos. dois anos. São nove obras no total: ampliação

Rio Tietê em Pereira Barreto, a 620 km da capital paulista.

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do sistema de produção da Estação de inauguração das obras em São Paulo. décadas em que o estado cresceu
Tratamento de Água (ETA) Taiaçupeba E no Rio de Janeiro, um amplo sem cobertura de saneamento bási-
(primeira Parceria Público-Privada da programa da Secretaria de Estado do co, que é fundamental para a saúde
Sabesp, a chamada PPP Alto Tietê, fir- Ambiente (SEA), o Pacto pelo Sanea- das pessoas”, disse Cabral à época do
mada em 2009 com a Galvão Engenha- mento, tem a meta de dobrar a coleta lançamento do pacto.
ria S.A. e a Companhia Águas do Brasil, e o tratamento de esgoto em todo o Um ponto é claro como o líquido
por meio de uma sociedade para fins estado (de 30% para 60%) em um pra- da vida: é preciso trabalhar, e rápido,
específicos que criou a Cabspat – um zo de quatro anos. O Governador Sér- para garantir água para as gerações
investimento de R$ 300 milhões), mais gio Cabral lançou o programa no início de um futuro muito próximo. Para
cinco novas adutoras e três novas esta- de 2011, e os investimentos totais po- se ter uma ideia geral dos desafios a
ções elevatórias de água. dem chegar a R$ 5 bilhões. serem enfrentados e das ações em
“Essa inauguração é muito impor- “Estamos resgatando uma dívida andamento para resolvê-los, nossas
tante. Vai dar uma grande tranquilida- histórica das autoridades com a po- equipes entrevistaram gestores públi-
de para não ter falta de água no perío- pulação do Rio de Janeiro. Estamos cos no Rio de Janeiro e em São Paulo
do da seca nos bairros mais distantes, fazendo o mesmo na Baixada e em responsáveis pelos projetos e pro-
nas regiões mais altas das cidades da São Gonçalo. Recuperar os investi- gramas que podem mudar o cenário
Região Metropolitana de São Paulo”, mentos em saneamento. Estamos atual e garantir a “água de beber” do
disse Alckmin durante o evento de em busca do tempo perdido. Foram amanhã.

Principais aspectos da Gestão de Recursos Hídricos


Mananciais
Preservação e conservação de represas, córregos, nascentes, lagos, lagoas e rios.
Esgoto
Coleta, afastamento e tratamento em áreas urbanas e rurais.
Enchentes
Combate com a construção de reservatórios (piscinões), canalizações, criação de áreas de preservação e manejo
sustentável de várzeas, parques, matas ciliares e vegetação próxima a cursos de água.
Drenagem
Importante no combate a enchentes, também pode prover água para reúso e ainda reabastecer mananciais.
Foto: Revista Novo Ambiente/Leonardo Pepi

Desenvolvimento com equilíbrio


63 Maio/2011
Pioneiro das águas
Entre uma reunião e outra, o Secretário de Saneamento e Recursos Hídricos
do Estado de São Paulo, Edson Giriboni, encontrou espaço em sua agenda para
receber uma de nossas equipes para uma entrevista exclusiva sobre os temas
de sua pasta, e mais precisamente para conversar conosco sobre o objetivo
desta reportagem de capa: a água. Sua mesa, repleta de papéis, livros, estudos
e relatórios, reflete de certa forma a própria realidade que a gestão dos recursos
hídricos de uma região complexa como São Paulo demanda: muito trabalho.
Foto: Revista Novo Ambiente/Leonardo Pepi

Represa Billings, que abastece grande parte da população da Região Metropolitana de São Paulo.
Fotos: Revista Novo Ambiente/Alex Hekavei

São Paulo é pioneiro na gestão de


recursos hídricos. Ainda assim, é
preciso ficar atento ao uso racional de
água; as pessoas precisam começar
a ter consciência, usar de forma mais
responsável. Trabalhamos na recuperação
dos mananciais, nossos rios e nossos
córregos, para que eles, que têm função
de abastecer, possam voltar a prover
recursos hídricos. Temos um grande
programa de recuperação de córregos e
outro em andamento, o grande programa
de despoluição do rio Tietê, além de um
trabalho forte com os municípios.
Edson Giriboni
Secretário de Saneamento e Recursos
Hídricos do Estado de São Paulo.

O
engenheiro civil demonstra seguran- sentido de garantir a disponibilidade dos recursos
ça e vai direto ao ponto logo no iní- hídricos para as próximas gerações”, disse Giriboni
cio da conversa: “Hoje, no estado de ao comentar a questão levantada pelo Atlas Brasil,
São Paulo, nós temos algumas bacias que apre- da Agência Nacional de Águas (ANA).
sentam já uma redução em sua disponibilidade, “Nós temos que fazer a gestão do uso da
estão com um nível de produção menor do que água, e algumas ações importantes precisam
o mínimo recomendável. Algumas produzem bem ser feitas. No planejamento, para aumentar essa
menos, o que é um problema, principalmente disponibilidade, sobretudo quando falamos da
na questão da Bacia do Alto Tietê”, alerta Edson macrometrópole (região da Grande São Paulo),
Giriboni, Secretário estadual de Saneamento e que representa 70% da população do estado”,
Recursos Hídricos, sobre um dos principais desa- acrescenta.
fios de sua gestão, mas reforça também que São No reúso, por exemplo, um novo programa in-
Paulo é “pioneiro” no assunto e que “possui uma centiva o tratamento de esgoto para gerar água a
grande agenda ambiental”. ser utilizada para fins industriais, como já aconte-
Pelas palavras do Secretário e pela quantida- ce, segundo o Secretário, no Polo Petroquímico de
de de informações disponíveis, não faltam proje- Capuava, na região do ABC Paulista.
tos e programas de governo. São programas de Outro programa que figura entre os maiores
recuperação de mananciais, córregos, rios, reser- de saneamento do Brasil, o Projeto Tietê, acaba
vatórios, coleta e tratamento de esgoto, reutili- de entrar em sua terceira fase (veja box) e repre-
zação de água para fins industriais, atendimento senta um dos principais desafios não só para o
a pequenos municípios e combate a enchentes, estado de São Paulo como para todo o Brasil, já
apenas para citar alguns. que é um rio que passa por uma metrópole que
“Tanto no Brasil como no estado de São Pau- “é de todos”. Sua despoluição já se tornou uma
lo, vejo que é preciso tomar todas as medidas no questão de honra.

Desenvolvimento com equilíbrio


65 Maio/2011
Chuva artificial
Desde a década de 1940, o homem com um tanque de 300 litros de água po-
tem conseguido provocar precipitações tável e dispersores especiais nas asas e fu-
artificialmente utilizando-se dos avanços selagem. As nuvens são detectadas por ra-
científicos. Muitos países utilizam a chu- dares adaptados e, depois de enxertadas,
va artificial para irrigar seus campos agrí- demora de 20 a 30 minutos para chover.
colas, umidificar o solo contra incêndios, A precipitação ocorre com sucesso numa
fornecer água para a população de regiões média de 64% dos voos.
áridas e até mesmo garantir um céu sem A Sabesp (Companhia de Saneamento
nuvens, como fez a China para os Jogos Básico do Estado de São Paulo) utiliza a tec-
Olímpicos de 2008. O processo consis- nologia desde 2001 em parceria com a em-
te, geralmente, em jogar iodeto de prata presa ModClima, provedora do serviço, para
dentro das nuvens, que funciona como contribuir com o enchimento das represas
catalisador, liberando hidrogênio. Este que abastecem a Região Metropolitana de
se mistura com o oxigênio da atmosfera, São Paulo. Em 2005, a empresa socorreu
transformando-se em água. Há contradi- Santa Catarina, que sofria por causa da es-
ções acerca do uso de elementos químicos tiagem, e em diversos outros casos Brasil
e seus efeitos na saúde humana. afora as chuvas artificiais contribuíram para
O Brasil possui uma tecnologia 100% a agricultura, o combate a incêndios e o con-
limpa e livre de elementos químicos para trole da desertificação.
fazer chover. A técnica desenvolvida pelo Em 2005, também, a tecnologia foi lau-
engenheiro Takeshi Imai consiste em bor- reada com a medalha de ouro da ciência no
rifar, dentro de nuvens propícias, gotícu- 7.º Simpósio Internacional da Água em Can-
las de água que se juntam às já presentes, nes, na França. Recentemente, a empresa
estimulando o crescimento das nuvens e a foi convidada a participar da Convenção da
precipitação da chuva. O trabalho é feito ONU de Combate à Desertificação (UNCCD)
por um pequeno avião bimotor, equipado expondo a tecnologia brasileira ao mundo.

Ilustração: Revista Novo Ambiente/ Fernando Becker

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Maio/2011 66
O rio Tietê tem uma característica diferente em relação
a outros rios, que normalmente nascem no interior e desá-
guam no oceano Atlântico: suas águas fazem o caminho con-

Projeto Tietê trário, correm para o interior do estado, após nascer na Serra
do Mar, próximo ao município de Salesópolis.

Prazo de entrega: 2015

Investimentos já efetuados desde o início, em 1992:


US$ 1,6 bilhão
Execução:
Governo do estado
Secretaria de Saneamento
Estágio atual: e Recursos Hídricos
Terceira fase Sabesp
Obras previstas:
580 km de coletores-tronco e interceptores
1.250 km de redes coletoras
200 mil ligações de esgotos domiciliares
Ampliar a capacidade de tratamento de esgotos em 7,4 m³/s

Principais benefícios esperados:


Ampliação da coleta de esgotos de 84% para 87%
Aumento do tratamento dos esgotos coletados de 70% para 84%
Redução da carga orgânica lançada no rio Tietê a montante da
barragem de Pirapora

Parceiros:
Cetesb
Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE)
SOS Mata Atlântica

Desenvolvimento com equilíbrio


Fonte: http://www2.sabesp.com.br/projetotiete/ 67 Maio/2011
Fotos: Revista Novo Ambiente/Alex Hekavei

Limpa na origem
A água que abastece milhões de habitantes das concentrações urbanas muitas
vezes viaja centenas de quilômetros por grandes rios ou pequenos córregos até
matar nossa sede. Manter sua qualidade na origem é comprovadamente mais
barato do que ter de despoluir antes de abastecer as residências, a indústria e a
agricultura, além de ser um gesto de respeito à natureza. Os municípios têm seu
papel nesta lógica, e sua participação é necessária. Os programas Limpa Rio (RJ)
e Água Limpa (SP) andam de mãos dadas com as cidades para alcançar a meta da
despoluição universal dos recursos hídricos.

O estado quer proteger milhares de nascentes de água potável, como esta no interior de São Paulo, em Bonsucesso do Itararé.
Enquanto a universalização do saneamento no O programa apresentou resultados que levaram
Brasil não for conquistada, os recursos hídricos se- o atual Governador, Sérgio Cabral, a solicitar sua am-
guirão sofrendo as consequências desta deficiência pliação. Ao trabalhar em parceria com as prefeituras,
estrutural. Os números já foram colocados; os pra- uma nova realidade surge na gestão das águas. “Atu-
zos, estipulados; as necessidades, apontadas. amos junto às prefeituras para as contrapartidas am-
Sanear significa “tornar higiênico, remediar, tor- bientais, fazendo com que elas passem a encampar
nar habitável, sanar”, segundo os dicionários. A re- reflorestamentos e fiscalizem a mancha urbana que
levância do saneamento para a qualidade de vida e por vezes invade as áreas lindeiras ao rio, se necessá-
o meio ambiente extrapola suas faces perceptíveis. rio fazendo reassentamentos. Inclusive, esta é uma
Impactos intangíveis, e positivos, como na saúde questão tão fundamental que, em determinados ca-
pública, são notórios. Para cada US$ 1 investido em sos, estamos condicionando a continuidade do pro-
saneamento, mais de US$ 4 são economizados na grama na área à apresentação, por parte delas, des-
saúde pública, e a afirmação vem da Organização das tes resultados”, acrescenta Marilene Ramos.
Nações Unidas (ONU) e do Instituto Trata Brasil, que
já desenvolveram diversas pesquisas e estudos que
corroboram a informação.
Além da saúde, o meio ambiente igualmente é
beneficiado ao poder seguir com seus cursos de água
e mananciais limpos, respeitados. Entretanto, esta Água Limpa | SP
não é, ainda, uma realidade. Muitos municípios bra-
sileiros contam com rede coletora de esgotos, mas
não possuem sistemas de tratamento, o que significa No estado vizinho e mais populoso do Brasil,
que o esgoto é despejado bruto na água que os cir- outro programa foi desenvolvido, também pelo go-
cunda, atravessa ou simplesmente contempla. É uma verno estadual, para enfrentar o problema na fon-
agressão grave à natureza e um comprometimento te, ou melhor, nos municípios com até 50 mil habi-
da qualidade da água para abastecimento futuro. tantes. O Água Limpa tem como objetivo principal
implantar sistemas de tratamento de esgotos em
municípios pequenos que não são atendidos pela
Companhia de Saneamento Básico do Estado de
São Paulo, a Sabesp.

Limpa Rio | RJ O programa, criado em 2005, resulta da atuação


conjunta da Secretaria de Saneamento e Recursos
Hídricos e do Departamento de Águas e Energia Elé-
trica (DAEE). Seu Superintendente, Alceu Segamar-
No Rio de Janeiro, graças ao programa Limpa Rio, chi, também contou mais sobre este e outros pro-
criado em 2007, mais de 60 municípios foram atendi- gramas em andamento em São Paulo, durante entre-
dos com melhores condições para a garantia da qua- vista exclusiva para a Revista Novo Ambiente. “É um
lidade de seus recursos hídricos. programa que tem um alcance social muito grande,
A Presidente do Instituto Estadual do Ambiente porque estamos falando de futuro. O Água Limpa
(Inea, vinculado à Secretaria de Estado do Ambien- pretende tratar 100% do esgoto. Afastar, que é cole-
te do Rio de Janeiro), Marilene Ramos, conversou tar, e levar até uma estação de tratamento. É muito
com uma equipe da Revista Novo Ambiente e, du- mais barato fazer isso, agir neste momento, evitar
rante a entrevista, falou sobre as ações em anda- que se polua as nascentes dos rios e os mananciais,
mento no estado fluminense, além do programa antes que a poluição comece. Um exemplo bom dis-
Limpa Rio. “Trata-se de um programa inovador, so é o município de Aparecida, onde já se iniciaram
cujos objetivos, respeitando a dinâmica hidrológica, as obras. É uma obra de R$ 17 milhões. Até agora,
são permitir melhores condições de drenagem e a Aparecida joga 100% do esgoto in natura no rio Pa-
viabilização da subsistência do ecossistema aquáti- raíba, e são 50 mil habitantes fazendo isso, mais 9 mi-
co”, explica a Presidente do Inea. lhões de visitantes por ano”, exemplifica Segamarchi.

Desenvolvimento com equilíbrio


69 Maio/2011
Rio de Janeiro Marilene Ramos
Entrevista
Presidente do Inea
Fotos: Revista Novo Ambiente/Estanis Neto

Fundamental sob vários aspectos que tangem à questão ambiental no Rio de Janeiro, o Instituto
Estadual do Ambiente tem uma nova presidente. Elegante, assertiva, diligente e simpática, Marilene
Ramos conversou com uma das equipes da Revista Novo Ambiente, demonstrando parte do profundo
conhecimento de uma das maiores autoridades do país quando o assunto são os recursos hídricos, sua
preservação e seu uso eficiente.
Conhecemos seu comprometimento com as ques- lecemos uma parceria com o FunBio, que é o Fundo
tões ambientais, em especial às relativas à água, Brasileiro para a Biodiversidade, o que por si só já dá
aos recursos hídricos. Agora à frente do Inea, o que uma ideia da agenda intensa que teremos pela fren-
podemos esperar da sua gestão? te nas questões afetas à biodiversidade e sua prote-
Entre os principais desafios está o de gerir o nosso ção. Por outro lado, o Estado está experimentando
grande patrimônio ambiental, que ao mesmo tempo um momento de desenvolvimento econômico muito
é um ativo econômico. Temos um conjunto de par- grande, o que se reflete em um esforço de licencia-
ques estaduais maravilhosos, de unidades de con- mento e fiscalização ambiental. Em relação a estes
servação, que vem crescendo, pulou de 120 mil hec- procedimentos, evoluímos muito. Outra atribuição
tares no início de 2007 para quase 200 mil hectares que particularmente julgo muito importante é a re-
em 2011, considerando somente as unidades de con- cuperação ambiental. Estou assumindo o Inea com
servação integral. Para auxiliar na execução de todas uma carteira de projetos com recursos já assegura-
as ações, criamos o “Fundo Mata Atlântica”, estabe- dos, que somam mais de R$ 600 milhões.

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Maio/2011 70
Já que você falou em recuperação de passivos, o Ainda falando sobre os recursos hídricos, o maior projeto
Inea tem um programa interessante, o “Limpa Rio”, que vocês tem em termos de investimentos hoje é o do
que executa dragagens e obras de limpeza de cor- Iguaçu. Quais são as premissas dele?
pos hídricos, não? O Projeto Iguaçu é o mais abrangente projeto que temos em
É um programa que nós criamos em 2007. Trata- andamento, pois ele trata da recuperação da bacia hidro-
-se de um programa inovador, cujos objetivos, res- gráfica da Baixada Fluminense. É uma área extremamente
peitando a dinâmica hidrológica, são permitir me- ocupada, com mais de 3 milhões de habitantes e que vinha
lhores condições de drenagem e a viabilização da sofrendo constantemente com inundações, perdas de bens
subsistência do ecossistema aquático. É uma de- materiais, prejuízos à saúde da população e até mesmo, em
manda enorme. Por isso, atuamos junto às prefei- alguns casos, perda de vidas. Foi contemplado na primeira
turas para as contrapartidas ambientais, de forma fase do PAC 1, quando o governo federal repassou R$ 270
parceira, fazendo com que elas passem a encam- milhões para que executássemos dragagens, a desocupação
par reflorestamentos e fiscalizem a mancha urba- das margens, a recuperação das nascentes e a construção
na que por vezes invade as áreas lindeiras ao rio, de habitações para fazer o reassentamento. Até o momento,
se necessário fazendo reassentamentos. foram retirados mais de 4 milhões de metros cúbicos de lixo,
lama e detritos diversos e reassentadas mais de 2 mil famílias.
Até por uma questão de riscos a estas populações... Procedemos à limpeza dessas áreas e, para garantir que elas
Sem dúvida, mas também pela questão ambien- não fossem reocupadas, criamos uma série de equipamentos
tal, de termos o corpo hídrico mais equilibrado. públicos, tais como ruas marginais, ciclovias, parques, praças.

Limpa Rio: de 2008 até agora, mais de 5,1 Toneladas de Lixo foram retiradas.
Um plano urbanístico, pode-se dizer? Além de ser uma garantia de abrangência na fisca-
Exatamente, que inclusive resultou na valorização lização dos próprios serviços...
dos imóveis da região. Foi considerado na época, pelo Perfeitamente. E há uma característica, por
Ministério das Cidades, como o melhor projeto do exemplo, de que o pagamento somente cabe
PAC nas áreas de saneamento e urbanismo. quando o usuário capta água diretamente do rio
ou que lança nele efluentes para diluição, mes-
Há um trabalho seu, uma tese, intitulada “O impacto da mo que tratados. Quem paga é o setor industrial
cobrança pelo uso da água no comportamento do usuá- e as concessionárias de saneamento. Quando
rio.” Esta é uma questão que está também associada ao isso era feito sem nenhum tipo de taxação, a
saneamento. Neste contexto, existe o chamado “Pacto quantidade de água captada era indiferente, o
do Saneamento”, você poderia detalhar melhor? que sem dúvida resultava em desperdício. A co-
Bem, a “cobrança pelo uso da água” é um instrumento brança é valiosa também sob o viés da educação
que o estado do Rio de Janeiro está usando de forma ambiental. A cobrança se conecta ao Pacto pelo
bastante intensa e avançada em relação aos demais Saneamento a partir do momento em que hou-
estados do país e ao próprio governo federal. Nós con- ve a constatação de que a situação sanitária do
seguimos, por meio de leis e decretos, aumentar a ar- Rio de Janeiro é incompatível com sua situação
recadação de R$ 3 milhões para R$ 40 milhões ao ano. econômica. O Rio é a segunda maior economia
Estes recursos são aplicados pelo Inea junto aos comi- do Brasil, e tem que conviver com esgoto sem
tês das bacias hidrográficas, fazendo uma verdadeira tratamento e lixões, como se estivesse na Idade
gestão participativa da águas, atendendo plenamente Média. Logo, o Pacto pelo Saneamento foi uma
ao que preconiza a lei federal de recursos hídricos. A declaração que o governo do estado na figura
cobrança pelo uso da água é um dispositivo inovador, é do Governador Sérgio Cabral e toda sua equipe,
um instrumento econômico de gestão ambiental. fez de romper com esta situação.

Entre os principais desafios está o


de gerir o nosso grande patrimônio
ambiental, que ao mesmo tempo
é um ativo econômico. Temos um
conjunto de parques estaduais
maravilhosos, de unidades de
conservação, que vem crescendo,
pulou de 120 mil hectares no início
de 2007 para quase 200 mil hectares
em 2011.
são paulo
Alceu Segamarchi Junior Entrevista
Superintendente do DAEE
Fotos: Revista Novo Ambiente/Leonardo Pepi

O departamento responsável por boa parte da “engenharia hídrica” capaz de manter o estado de São
Paulo em lugar de destaque quando o assunto é gestão dos recursos hídricos também é responsável
pelas outorgas de uso da água dentro das diretrizes da Política Estadual de Recursos Hídricos. Seu
Superintendente, Alceu Segamarchi Junior, recebeu uma equipe da Revista Novo Ambiente para uma
entrevista exclusiva, demonstrando otimismo para o futuro dos recursos hídricos em terras paulistas.

Quais são as metas do programa Água Limpa? o Banco Interamericano de Desenvolvimento, o finan-
São pouco mais de 200 municípios, e já traba- ciamento da primeira parte do Parque Várzeas do Tie-
lhamos em 70, e a meta é atender todos até 2014. tê. São US$ 200 milhões para criar um parque linear
Como boa parte dos nossos municípios capta água de 75 km. Sua primeira fase tem duração prevista de
diretamente dos rios para abastecimento, eles têm cinco anos. Seu primeiro núcleo, de um total de 33, já
que tratá-la, e o custo de tratamento com uma água está pronto, no Parque Ecológico do Tietê, que é o início
mais limpa é menor. Só traz benefícios. Inclusive, do Parque Várzeas do Tietê. E só na primeira fase serão
neste projeto embutimos uma sala para ser um espa- realocadas mais de 5 mil famílias que moram nas várze-
ço de Educação Ambiental com crianças da cidade, é as, que são áreas de inundação. O projeto é justamente
muito bacana e dá muito certo. para preservar as várzeas e as nascentes. É um projeto
E os projetos? muito grande e inclui o controle da qualidade da água,
Estou assumindo o Inea com uma carteira de pois é do Tietê que saem várias captações e o controle
projetos com recursos já assegurados, que somam das enchentes, pois uma várzea limpa e desimpedida
mais de R$ 600 milhões. Estamos falando de toda serve de reserva de chuvas. É um projeto para 11 anos.
a parte de recuperação de bacias hidrográficas, de E o plano 300%?
controle de inundações, de esgotamento sanitá- Como disse o Governador Geraldo Alckmin, esta
rio, de descontaminação de áreas e remediação de é a meta: 100% de tratamento de água, 100% de co-
lixões. Enfim, é uma vasta gama de obras voltada à leta de esgoto e 100% de tratamento de esgoto. E es-
recuperação de passivos ambientais. tamos muito próximos de conseguir. Não é fácil, pois
Outro programa de grande porte é o Parque Vár- depende muito do poder público municipal. Mas in-
zeas do Tietê. Como andam os trabalhos? clusive preparamos um plano para orientar os traba-
Foi aprovada faz poucos dias no plenário do Se- lhos posteriores das prefeituras, e vamos conseguir
nado a nossa autorização para assinar o contrato com alcançar os 300%.

Desenvolvimento com equilíbrio


73 Maio/2011
artigo Gustavo Fruet

Foto: Divulgação
Transporte coletivo:
romper o círculo com
sustentabilidade
O reajuste aplicado à tarifa do transporte cole- por ano só em deslocamento. O assunto ainda repercu-
tivo de Curitiba/PR de R$2,20 para R$2,50 expõe no- te de forma limitada, como se a questão do transporte
vamente os dilemas do transporte público no Brasil: a só dissesse respeito à parcela da população que depen-
redução no número de passagens pagas, excluídas as de de ônibus, fiel ao transporte, muitas vezes, por falta
isenções, acarreta novos problemas para o sistema, de alternativa. É um problema de todos, na medida em
evidenciando uma questão que ocupa espaço central que o transporte urbano é elemento estruturante da
entre as preocupações dos administradores das gran- vida econômica e social das cidades e afeta as condições
des cidades, que é o modo como tornar o transporte de mobilidade.
coletivo atraente para um maior número de pessoas. É A renda da população brasileira não cresceu na
um problema que envolve temas cada vez mais urgen- mesma proporção dos reajustes aplicados às tarifas
tes na agenda mundial, como a sustentabilidade, a mo- de transporte coletivo urbano. O transporte passou a
bilidade urbana e a emissão de substâncias poluentes. consumir fatias cada vez maiores do orçamento fami-
Muitas cidades brasileiras estão presas a um círculo liar – mais de 30% – e deixou de ser atrativo para quem
vicioso: não conseguem atrair mais passageiros para o tem outros meios de deslocamento. Dados do Instituto
transporte coletivo porque as passagens são caras, e não de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostram que
podem conter os aumentos das tarifas porque a perda de mais de 55 milhões de pessoas no país não têm renda
passageiros ameaça a equação econômico-financeira do suficiente para arcar com o custo da tarifa de ônibus. A
sistema. O resultado desse círculo é danoso: de um lado, queda na demanda e o aumento nos tempos de viagem
há cada vez mais brasileiros deslocando-se a pé por ab- elevam os custos das operadoras de transporte, alimen-
soluta incapacidade de pagar a passagem de ônibus, e tando outro círculo, este ruinoso: custo maior, tarifa
com isso o transporte, fundamental para a inclusão social, mais alta, demanda menor. Naturalmente, essa é uma
assume papel excludente; de outro lado, aumenta o nú- questão que envolve múltiplos aspectos além do custo
mero de pessoas que utilizam automóveis, contribuindo do transporte. Há barreiras culturais, problemas geren-
para a formação de engarrafamentos, com todos os cus- ciais e limitações na infraestrutura urbana que precisam
tos decorrentes (econômicos, ambientais, relativos à qua- ser enfrentados. Mas dificilmente medidas de outra na-
lidade de vida). tureza serão suficientes se não forem encontradas for-
A Rede Globo divulgou estudo que mostra que o mas de tornar o transporte coletivo mais barato.
usuário de ônibus em São Paulo gasta quase um mês Apresentei na Câmara dos Deputados, na legislatu-
ra passada, uma série de projetos prevendo mudanças urbano como forma de reduzir o volume de carros nas
na tributação de insumos utilizados no transporte co- ruas centrais. Modelos bem-sucedidos em determinados
letivo, reduzindo a alíquota de ISS e ICMS e a isenção países nem sempre se aplicam a outros. É preciso anali-
de PIS/Cofins nos itens que compõem os insumos do sar, além de aspectos técnicos, o custo-benefício de cada
transporte e a redução da Cide sobre o diesel. Um es- solução.
tudo da Associação Nacional das Empresas de Trans- Um exemplo: depois de arquivar, por falta de fi-
portes Urbanos (NTU) indica que entre 1998 e 2008 nanciamento, o projeto do metrô elevado que correria
o peso do diesel na composição das tarifas saltou de sobre o trecho urbano da antiga BR-116, a prefeitura
10,3% para 25%. Portanto, uma redução na carga tri- de Curitiba partiu para a busca de um novo modelo de
butária incidente sobre esse insumo certamente teria transporte que pretende implantar nas canaletas do
impacto significativo sobre as tarifas. A expectativa é eixo Norte-Sul. Qualquer investimento dessa propor-
que dos debates resulte solução favorável à desonera- ção exige clareza, como a dimensão origem/destino
ção do transporte, associada a mecanismos que asse- dos usuários. Fundamento, pois afeta a capacidade de
gurem sua repercussão sobre as tarifas, estabelecendo endividamento do município e representa necessidade
condicionantes para a concessão dos benefícios, como de subsídio para a tarifa. É preciso mobilizar a socieda-
transparência nos contratos de concessão, garantia de de para o debate. Numa realidade urbana cada vez mais
qualidade na prestação de serviços, uso de tecnologias complexa, é urgente que os sistemas públicos de trans-
com menor potencial poluidor. Em qualquer caso, a re- porte sejam tratados como prioridade, o que exige ação
dução das alíquotas só pode ser aplicada para as em- conjunta entre todos os níveis de governo.
presas que firmarem compromisso de ajustamento de O governo federal – que se distanciou do problema
conduta, visando assegurar a repercussão, nas tarifas, do transporte urbano a partir de 1988, quando a Consti-
da diminuição da carga tributária. tuição Federal outorgou aos municípios a competência da
Grandes cidades brasileiras vivem séria crise de gestão do setor – deve assumir postura de apoio efetivo
mobilidade, com problemas como congestionamentos, às prefeituras. O tema enquadra-se em qualquer priori-
altos índices de acidentes de trânsito e degradação das dade, ao lado do assustador sentimento de insegurança,
condições ambientais. Estes índices tendem a agravar da qualidade da saúde e sob a ótica do desenvolvimento
com os dados do Censo 2010/IBGE: 84,5% da popula- sustentável, que deixa de ser sinônimo de crescimento de
ção mora em áreas urbanas, concentradas nas maiores alguns setores para se transformar em proposta de aper-
metrópoles. O poder público precisa renovar-se. Supe- feiçoamento contínuo de múltiplos fatores que influen-
rar-se. Capacidade de encontrar soluções viáveis. Ana- ciam o bem-estar social. Atender às necessidades sem
lisar a eficiência do transporte público, que tem proble- comprometer o futuro.
mas estruturais, avaliando a equação custo-qualidade Com o conceito de sustentabilidade estratégica e go-
do serviço. vernança. O conforto urbano com suas novas emergên-
Em muitas capitais, os números relacionados à ope- cias. As cidades estão sempre em transformação e, ao
ração desses sistemas são guardados em verdadeiras analisar características de cidades sustentáveis, destaca-
“caixas-pretas”. Abri-las é fundamental. Também é ur- -se que, além da qualidade da água e do ar, política de
gente pensar em novos modais, capazes de aumentar a energia, base de conhecimentos e inovação da cidade,
eficiência do transporte coletivo, tornando-o atraente e há a importância da análise do trajeto casa-trabalho com
garantindo que seja acessível a quem mais precisa para boa conectividade e o potencial de congestionamento do
estancar o processo de agravamento desses problemas. transporte de massa. É uma discussão que parece avan-
Evitar que cheguemos, um dia, ao ponto de adotar solu- çar para o bem não apenas de quem vive nas grandes ci-
ções drásticas – como fez Londres ao instituir o pedágio dades, mas também do meio ambiente e do país.
ECONOMIA IBGC

Governar a si mesmo
Para ser genuinamente sustentável, uma empresa precisa investir em boas práticas
de gestão. Hoje, a governança corporativa compõe a base de sustentação para
negócios mais lucrativos, eficientes e justos com a sociedade e o meio ambiente.
Uma entidade, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC, atua há
mais de 15 anos pela difusão das boas práticas de governança no Brasil e na América
Latina e reúne algumas das principais ideias deste conceito em um guia.

Q
ue para ser sustentável uma empresa os acionistas (proprietários) e executivos pode ganhar
precisa “respirar” o conceito que se ba- o equilíbrio fundamental para que a sustentabilidade
seia no tripé dinheiro-pessoas-meio am- faça parte do cotidiano do negócio, seja ele qual for.
biente, muitos já sabem. No entanto, na hora de pôr A governança corporativa é mais que uma boa intera-
em prática as ações capazes de fazer a empresa sair ção entre interesses, é também uma importante fer-
da teoria e entrar na prática e assim ser mais lucrati- ramenta de gestão de riscos. Gerir riscos e adiantar-se
va, respeitada e benéfica para o planeta é que as coi- ao futuro é, de certa forma, garantir que a reputação
sas se complicam. da empresa agregue valor a partir da percepção positi-
Entre os desafios que surgem na caminhada rumo va de seus negócios perante a sociedade.
à sustentabilidade empresarial, um pode ser especial- Hoje não faltam exemplos de empresas que viram
mente complicado: a relação entre o proprietário da seus lucros despencar para prejuízos abissais, princi-
empresa e o executivo contratado para gerir o dia a dia palmente por terem sua reputação abalada, como no
da companhia. É nesta relação que entra a governança caso da British Petroleum (BP) após o derramamen-
corporativa, termo que ganhou força a partir dos anos to de mais de 700 milhões de litros de óleo no Golfo
1990 no mundo empresarial e nos ambientes de negó- do México; ou da operadora das usinas nucleares de
cios. Basicamente, é por meio dela que a relação entre Fukushima, no Japão, a Tepco (Tokyo Electric Power

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Maio/2011 76
Ilustração: Revista Novo Ambiente/Marco Jacobsen

77 Maio/2011
Desenvolvimento com equilíbrio
Fotos: Divulagação/IBGC
A governança corporativa permite
às empresas refletirem sobre o seu
próprio negócio.

Carlos Lessa Brandão,


membro do conselho de administração do IBGC

Company), ao mostrar incapacidade de adminis-


trar a crise advinda do terremoto-tsunami.
O Guia de Sustentabilidade para as Empre-
sas, publicado pelo Instituto Brasileiro de Go-
vernança Corporativa (IBGC), explica de forma
sucinta: “A responsabilidade pelas externalida-
des coloca a ética de negócios numa perspectiva
comportamental mais abrangente, ou mesmo
global, com impacto na reputação da empresa.”
Investir em governança corporativa garante
boa percepção perante a sociedade e, conse-
quentemente, perante os investidores, geran-
do valor para o negócio. Os índices de Gover-
nança e Sustentabilidade da BM&FBovespa nos
últimos 12 meses (veja gráficos) corroboram,
em parte, tal afirmação.
Ainda que não se possa confiar estritamente
nos índices para se definir estratégias de inves-
timento, é fato que eles refletem as percepções
do mercado. “O índice de governança está bem
acima do Ibovespa no histórico desde 2001, e isso
é bom, obviamente, mas por outro lado não po-
demos comemorar muito, pois estes índices não
mostram o risco, e quando falamos em investi-
mento temos que olhar os dois lados”, explicou
Carlos Eduardo Lessa Brandão, membro do con-
selho de administração do IBGC, em entrevista
exclusiva para a Revista Novo Ambiente.
Para relatar suas ações e tornar-se mais
transparente, não existem fórmulas preesta-
belecidas; entretanto, a maioria das empresas
no exterior e no Brasil adotou o modelo da GRI
(Global Reporting Initiative), uma organização

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Maio/2011 78
internacional pioneira na concepção de modelos de
relatórios, sobretudo de sustentabilidade, hoje am-
plamente divulgados periodicamente pelas compa-
nhias de diferentes ramos de negócios.
“A governança corporativa permite às empresas re-
fletirem sobre o seu próprio negócio”, acrescenta Lessa,
“e a partir disso podem escolher indicadores presentes
no modelo GRI, que são de governança, sociais e am-
bientais, e implementar ferramentas de gestão para
relatar estas informações, ao mercado e à sociedade”.
Toda empresa tem governança, que pode ser
melhor ou pior, nas palavras do especialista. “Quan-
do falamos de governança, estamos falando de
boas práticas”, comenta o representante do IBGC.
Mais que adotar as boas práticas, a governança é
um processo em constante evolução para um mer-
cado igualmente em transformação. Em essência,
ela demonstra a capacidade de gestão interna e
externa do negócio e pode servir de exemplo até
mesmo para o setor público. Afinal, o ativista polí-
tico e pacifista Gandhi já alertava: “Aquele que não
é capaz de governar a si mesmo não será capaz de
governar os outros.”

Desenvolvimento com equilíbrio


79 Maio/2011
MANEJO FABER -CASTELL

Traçando
uma meta
O lápis era como um cinzel nas mãos daqueles que
queriam começar a esculpir seu conhecimento. Mas, mesmo
envolvida nessa sublime inocência, a indústria dos lápis também
podia acompanhar uma exploração predatória de madeira. De
alguns anos para cá, as fábricas focaram sua preocupação em
regulamentar sua produção para reduzir os danos ambientais.
Entre essas, a famosa Faber-Castell, que com cinco ou seis retas fez
seu castelo sobre o mercado mundial de lápis.

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Maio/2011 80
U
ma criança fazendo desenhos sobre um o objetivo for de fato levar o dano ambiental a esca-
papel, cercada por suas dezenas de lápis las cada vez menores, apenas o reflorestamento não
coloridos. A imagem parece tão singe- garantiria isso. Seria necessário, para a sustentabili-
la que é difícil ver qualquer tipo de mal na situação dade da produção, o manejo florestal que garantis-
toda. Mas as crianças cresceram, e aquela ferramen- se que o ecossistema não tivesse sua biodiversidade
ta tão útil de sua infância hoje representa algo dife- afetada pelas áreas inicialmente desmatadas.
rente. Representa números. E a criança inocente que No ano de 2011, o Ano Internacional das Flores-
via uma mudança significativa em transformar uma tas, a alemã Faber-Castell anuncia ao mundo a rea-
folha branca em um desenho agora quer ver as coi- lização de um grande objetivo ecológico: de toda a
sas saírem do papel. madeira utilizada nas fábricas, 95% são provenien-
Quando um pinheiro (Pinus caribea) está com tes de meios sustentáveis e certificados pela maior
cerca de 15 anos, ele é cortado e começa sua me- autoridade internacional no assunto, a FSC (Forest
tamorfose. A árvore é transformada em tiras muito Stewardship Council, ou Conselho de Manejo Flores-
finas, misturada a corantes e a compostos que a tor- tal). No Brasil, a empresa adquiriu terras que já ha-
nem mais macia, e, ao final do processo, um pinheiro viam sido desgastadas pela criação de gado para que
se transformará em uma quantidade que pode variar se fizesse a plantação. Seus produtos teriam passado

Ilustração: Revista Novo Ambiente/ Marco Jacobsen


entre 2.500 e 10.000 lápis. Pode parecer muito, mas por toda a cadeia do FSC-CoC, ou Cadeia de Custódia,
é fácil perdermos as contas dos lápis passam pelas que verifica as ações da empresa desde o corte do
nossas mãos em um mês. E com quantas pessoas Pinus até o lápis pronto para ser distribuído.
mais isso acontece, no mundo todo? Barato, abun- Segundo o Instituto Akatu, a madeira e subpro-
dante, difundido e ainda muito necessário, o lápis é dutos que restarem da produção são utilizados na
um objeto produzido em larga escala e consumido produção de energia ou mesmo como adubo, tal
com avidez por todo tipo de público. Mas um público como as cinzas geradas pela queima da serragem. A
em especial hoje pergunta: e os pinheiros? água utilizada é tratada, e todo o lixo possível é enca-
As mais famosas marcas de lápis do Brasil e do minhado à reciclagem. Entre pinheiros e lápis, a Fa-
mundo necessitam de amplas áreas de plantio. A ber-Castell é reconhecida hoje como um exemplo de
madeira de reflorestamento foi uma das primeiras sustentabilidade empresarial. Sem riscar os lucros,
atitudes tomadas por essas empresas para reduzir o botou na ponta do lápis os custos e os benefícios e
impacto ambiental e otimizar sua produção. Mas, se ajuda a desenhar um mundo melhor.
especial EUA

O Gigante do Norte
Nossa paixão pelo Brasil nunca foi segredo para o leitor, que é nosso principal
cúmplice nos milhares de quilômetros que nossas equipes de reportagem percorrem
pelo território nacional. Não há um só estado em que não estivemos neste último
ano, quase mil cidades brasileiras, mostrando todos os nossos biomas, nossas áreas
produtivas, a indústria, os transportes e a tecnologia nacional. E, agora, a Revista
Novo Ambiente traz para você um passeio pelos EUA, uma referência mundial, que
com ou sem crises continua criando soluções como nenhuma outra nação.
U Detroit
ma visão pragmática do país do prag-
matismo. Bom em negociações finan-
ceiras, é também pioneiro em solu-
Chegamos aos EUA via Detroit, a célebre ci-
ções ambientais, embora não seja lá o melhor
dade dos automóveis, onde Henry Ford criou a
exemplo disso enquanto Estado, tanto que não
linha de montagem e onde se concentra a indús-
quis assinar o Protocolo de Kyoto para não afetar
tria automotiva americana, e proclamada em
sua economia e não quis assumir compromissos
1929 pela revista Outlook como “a cidade mais
com causas como o aquecimento global. Curio-
moderna do mundo, a cidade do amanhã”. Os
samente, foi a partir de imagens da Nasa que os
sinais da decadência das últimas décadas são
próprios americanos fizeram os primeiros alertas
avassaladores, mas também há mostras de que
sobre o efeito estufa. E é de lá que o mundo mais
a cidade se recupera aos poucos. Desde 1950,
espera atitudes e inovações e uma nova postura
quando chegou a 1,8 milhão de habitantes, De-
do gigante norte-americano que traga mais equi-
troit já vinha perdendo população. A crise da in-
líbrio ao planeta.
dústria automobilística americana acentuou esse
declínio por conta da concorrência dos veículos
importados, especialmente os japoneses. Indús-
trias importantes como General Motors, Ford e
Números da nação mais Chrysler viram suas vendas despencar, exigindo
novas demissões de trabalhadores. Entre 2000
poderosa do planeta e 2010, a cidade perdeu 234 mil moradores,
chegando a 737 mil habitantes no ano passado.
Hoje, é possível comprar uma boa casa em De-
Os EUA se tornaram, no século XX, a maior
troit por US$ 20 mil ou US$ 30 mil. Nos bairros
potência econômica, militar e cultural do pla-
mais afastados, há milhares delas abandonadas.
neta. Os números são impressionantes: seu PIB
Mas a cidade começa a reviver. Desde meados
em 2011 equivale a um quinto do PIB mundial
de 2010, a indústria automobilística contabiliza
e é estimado em US$ 14,4 trilhões, três vezes
uma crescente recuperação. As chamadas três
maior que o da China, que está na segunda po-
grandes – GM, Ford e Chrysler – estão desenvol-
sição. Em 2008, o PIB dos EUA era apenas 5%
vendo veículos menores e mais competitivos. Os
menor do que o PIB combinado da União Eu-
chamados “carros verdes” – elétricos e híbridos –
ropeia. A Bolsa de Valores de Nova Iorque é a
começam a sair das fábricas. Também os carrões,
maior do mundo em volume de dólares. O país
apreciados pelo norte-americanos, ganharam mo-
é o maior importador e o terceiro maior expor-
tores mais eficientes e bicombustíveis, com con-
tador mundial. Maior produtor do mundo de
sumo consideravelmente menor. Para corroborar
energia elétrica e nuclear, assim como de gás
essa nova realidade, a Ford desbancou a japonesa
natural liquefeito, fosfatos e sal. É o segundo
Toyota no mercado americano no ano passado,
maior produtor de chumbo, cobre, enxofre,
voltando a assumir o segundo posto em vendas.
ouro e prata, bem como o terceiro maior pro-
dutor de petróleo, sendo também o seu maior
importador. Os EUA são responsáveis por 23%
do gás natural, 21% do petróleo e 21% do car-
vão produzido anualmente no planeta.
Apesar de ser a maior potência agropecuária Chicago, cidade design
do mundo, sua agricultura representa menos de
1% do PIB. O país é o maior produtor mundial de Próxima etapa, Chicago. Edificada a partir das
milho, soja, amendoim, trigo e algodão, além de margens do imenso lago Michigan, a cidade foi
grande produtor de frutas, como laranja, limão, praticamente destruída por um incêndio em 1871,
maçã, morango e uva. A frota americana de au- que deixou 300 mortos, 90 mil desabrigados e um
tomóveis em circulação é de 214 milhões de ve- prejuízo de US$ 200 milhões. Para sua reconstru-
ículos. São 75 carros para cada 100 habitantes ção, atraiu renomados arquitetos, definiu um so-
– frota três vezes e meia maior que a brasileira, fisticado plano urbanístico e implantou uma cida-
que é de 64 milhões de veículos. de nova, com engenharia e arquitetura reconheci-

Desenvolvimento com equilíbrio


83 Maio/2011
das mundialmente. Cento e trinta anos depois, é a
terceira maior cidade do estado de Illinois, com 2,7
milhões de habitantes.
Mesmo de longe, é possível ver a estrutura mais
alta da América do Norte, o arranha-céu Willis To-
wer, antes conhecido como Sears Tower, com 108
andares e 442 m de altura. Com as antenas de TV
que estão no topo, o edifício atinge 527 m. A área
metropolitana de Chicago tinha, em 2010, o quarto
maior PIB entre as áreas metropolitanas do mundo.
A cidade é um importante polo da indústria das te-
lecomunicações e infraestrutura. O Aeroporto Inter-
nacional O’Hare, com seis pistas, é o segundo mais
movimentado do mundo.
Chicago impressiona pela beleza, pelo trânsito
organizado e pela enorme quantidade de viadutos
e elevados que dão acesso à cidade. O rio Chicago,
outrora um dos mais poluídos dos EUA, é hoje um
dos orgulhos da cidade, com águas límpidas e reple-
tas de peixes, resultado de anos de investimentos
em saneamento básico e tratamento de efluentes.
O mesmo se dá com o lago Michigan, de onde é reti- Chicago
rada a água para abastecimento público.

Nova Iorque
Nova Iorque, cidade global
Chegamos à mais universal e cosmopolita das
cidades do mundo, Nova Iorque. Localizada na cos-
ta atlântica do nordeste dos EUA, a cidade tem cin-
co distritos: Bronx, Brooklyn, Queens, Staten Island
e a ilha de Manhattan. A cidade é chamada de New
York City (NYC) ou Cidade de Nova Iorque, para dife-
renciar do estado de Nova Iorque, do qual faz parte.
Sua população é de 8,3 milhões de pessoas e é a
cidade mais densamente povoada dos EUA. A região
metropolitana possui 19 milhões de pessoas, e a Gran-
de Nova Iorque possui mais de 22 milhões de pessoas.
A cidade é conhecida pela diversidade de seus
habitantes. Trinta e seis porcento de sua população
nasceu fora dos EUA e cerca de 170 idiomas são fa-
lados na cidade. Isto pode ser observado facilmente
tomando-se um táxi, que invariavelmente é pilotado
por um imigrante de Bangladesh, Paquistão, Índia,
Haiti, Egito ou de países da extinta União Soviética.
Considerada por anos muito violenta, a NYC
investiu no aparato policial e reduziu os índices de

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Maio/2011 84
criminalidade com várias ações e, principalmente, O mais famoso parque da cidade é o Central
com o programa Tolerância Zero, implantado na ad- Park, localizado no centro de Manhattan. Ele é com-
ministração do Prefeito Rudolph Giuliani, em que posto de mais de cem parques menores, que no total
mesmo delitos menores passaram a ser punidos possuem 4 km de comprimento e 800 m de largura.
nos termos da lei. O litoral de Nova Iorque possui 924 km de extensão,
Diferente de todas as cidades americanas, onde com 22,4 km de praias.
praticamente não se veem pessoas andando pelas Considerada uma cidade global e centro de ne-
ruas, em Nova Iorque o movimento é intenso, espe- gócios internacionais, em razão da influência que
cialmente de turistas, incluindo os próprios norte- exerce sobre o comércio mundial, finanças, cultura,
-americanos. Sua principal atração é Times Square, moda e entretenimento, a cidade abriga a sede da
chamada de “A Encruzilhada do Mundo”, um centro Organização das Nações Unidas (ONU). Wall Street,
repleto de luzes da zona dos teatros da Broadway, onde se situa a Bolsa de Valores de Nova Iorque, é
um dos mais movimentados cruzamentos de pedes- o mais importante centro financeiro global desde a
tres do mundo, importante polo de entretenimento. Segunda Guerra Mundial.

Perfil
Um homem-link em Nova Iorque
Não há medo de errar na afirmação de que o
Foto: Revista Novo Ambiente

gigante americano só se fez pela agilidade e efici-


ência com que resolve seus problemas, baseado
em um sistema e uma cultura financeira invejados
por todos os outros países do globo. Com crise ou
sem crise, os EUA ainda são mestres nos negócios
e nunca estiveram tão receptivos ao mercado bra-
sileiro. Desvendando os caminhos que integram
nosso mercado ao norte-americano, homens como
o mineiro Manoel Baião funcionam como links fun-
damentais para a internacionalização de negócios.
Baião, que recebeu a reportagem da Revis-
ta Novo Ambiente em seu escritório em Nova
Iorque, é CEO (Chief Executive Officer, ou Dire-
tor Executivo) da Neolink Internacional, que há
uma década e meia tem efetuado com suces-
so a aproximação de interesses explorando os
pontos comuns de culturas e sistemas diferen-
tes, atuando nas áreas de tecnologia da infor-
mação, telecomunicações, engenharia, energia,
governo e mercado financeiro. “A expertise da
Neolink está na abertura de caminhos e na con-
clusão de novos negócios”, diz o empresário e
consultor. “Nós identificamos oportunidades e
fazemos a triangulação entre as empresas pro-
Manoel Baião, CEO da Neolink International. vedoras e os clientes, facilitando o sucesso da
operação”, aponta Baião.

Desenvolvimento com equilíbrio


85 Maio/2011
Seus clientes estão no Brasil, México e também fissionais com perfis específicos para atender as parti-
nos EUA, para os quais oferece serviços que envolvem cularidades de cada cliente”, garante Baião.
desde a elaboração dos projetos até sua implantação, Entre os trabalhos mais realizados pela empre-
com acompanhamento dos resultados. Entre eles, es- sa, estão planos de fusões e aquisições, desenvolvi-
tão grandes corporações – bancos, construtoras e em- mento de alianças estratégicas, formação de canal de
presas de telecomunicações –, mas também pequenas venda e estratégias de marketing comercial, planos
e médias empresas que querem abrir portas nos EUA, de exportação, projetos de expansão regional, além
ou médias empresas americanas de olho em merca- da consultoria executiva nos negócios e gerencia-
dos emergentes como o Brasil e o México. “Temos pro- mento de projetos.

Para saber mais: www.neolinkinternational.com

Washington, a moderna capital repleta de museus


Saímos de NYC de carro com destino a Washing- Aeroespacial, o Cemitério Nacional de Arlington, o
ton. São 385 km pela I-95, uma supervia interes- Pentágono, a sede do FBI, dezenas de museus (Arte
tadual, com praças de pedágio. Cerca de 4 horas e Africana, História Americana, Mulheres nas Artes,
meia de viagem e chegamos à capital federal, uma Smithsonian, Museu da Marinha, entre tantos ou-
cidade moderna, funcional, repleta de edifícios ne- tros). O tempo para visitar algumas das atrações da
oclássicos que abrigam de órgãos públicos a gran- cidade será sempre insuficiente.
des museus e monumentos. A cidade parece imune aos efeitos da crise, em
Todos os caminhos levam a Constitution Gar- razão do grande número de funcionários do governo.
dens, enorme parque central que tem, numa ponta, O que chama a atenção em Washington são os cui-
o imponente Capitólio (sede do Congresso dos EUA); dados com a segurança de monumentos e edifícios
no centro, o Monumento a Washington (Obelisco); públicos, especialmente da Casa Branca, “ilhada” por
e no outro extremo, o Memorial de Lincoln. A cida- barreiras de acesso. Esses cuidados já existiam, mas
de é repleta de atrações – a Casa Branca, o Museu foram radicalizados a partir dos atentados de 2001.
Foto: Revista Novo Ambiente

Obelisco em Washington
Tecnologia

• Voo limpo

Fotos: Divulgação
Apresentado na segunda edição da Revista Novo Ambiente, o avião
Solar Impulse, movido totalmente a energia solar, fez recentemente
seu primeiro voo internacional. No dia 13 de maio, viajando a uma
velocidade média de 50 km/h, a aeronave partiu do aeroporto de
Payerne, na Suíça, e aterrissou na cidade de Bruxelas, na Bélgica, de-
pois de quase 13 horas de voo. “Este avião, o primeiro a funcionar
sem combustíveis fósseis nem emitir CO2, simboliza os grandes esfor-
ços que a indústria aeronáutica está fazendo para desenvolver novas
tecnologias para economia de energia e uso de fontes renováveis”,
disse o CEO da Companhia de Aeroportos de Bruxelas, Arnaud Feist.
O aeroporto faz parte do programa europeu de Crédito de Carbono
de Aeroportos, que tem como objetivo final neutralizar a emissão de
gases de efeito estufa.

• Revisão no óleo
Está em fase final de desenvolvimento o Lubricheck, um analisa-
dor portátil para óleo automotivo. O pequeno aparelho funciona
como um laboratório de mão, determinando se o óleo precisa re-
almente ser trocado na quilometragem indicada, evitando o des-
perdício, e ainda pode apontar problemas no motor. Utilizando-se
de duas variáveis de informação – permissividade, ou seja, a habi-
lidade de o material polarizar-se em resposta a um campo elétri-
co, e impedância (resistência) da molécula de óleo sob teste para
resquícios de carbono e metais –, o dispositivo pode determinar a
acidez, quantidade de metais e carbonos presentes no óleo, bem
como a presença de líquidos estranhos (exceto combustível), de
acordo com o fabricante. Essas informações podem ser cataloga-
das e ajudam o mecânico na hora da assistência. O preço estima-
do de lançamento é de US$ 30.

• Do cinema para a pista


Inspirados na clássica cena do filme De Volta para o Futuro na qual
Doc Brown (Christopher Lloyd) abastece o DeLorean-máquina-do-
tempo com lixo, um estudante e um professor da Universidade
Politécnica da Catalunha (UPC) criaram um carrinho de controle
remoto movido a anéis de latinha. Batizado de dAlH2Orean
(ou d-Alumínio-Água-rean), o pequeno veículo é abastecido
com alumínio e um catalisador de hidróxido de sódio. A reação
produz hidrogênio, o qual passa por um filtro de vinagre e água,
para remover hidróxidos, depois por um filtro de sílica-gel para
remover a umidade, indo então para uma célula de combustível,
a qual impulsiona a máquina por aproximadamente 40 minutos,
fazendo-a alcançar até 30 km/h. O sistema libera somente alumina
(que pode ser reconvertida em alumínio) e sal. O próximo objetivo
é adaptar o sistema para carros com passageiros.

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Maio/2011 88
• Fazendas de vento voadoras
Uma denominação esdrúxula há poucos anos hoje é quase realidade.
Um projeto da Nasa financiado pelo governo norte-americano estuda a
possibilidade de se capturar energia eólica a partir de grandes altitudes,
já que o vento nas alturas é consideravelmente mais previsível e muito
mais forte do que próximo ao solo, o que representaria uma geração 8
a 27 vezes maior de energia. Um dos principais empecilhos do projeto
seria a necessidade de uma área de isolamento aéreo de aproximada-
mente 4 km, atrapalhando rotas aéreas. Para resolver este problema,
Mark Moore, engenheiro aeroespacial da Nasa e participante do pro-
jeto, sugere a montagem das fazendas em alto-mar. “Há pouca ou qua-
se nenhuma demanda de espaço aéreo em águas a 20 km da costa”,
complementa. Um dos protótipos de equipamento a ser usado em uma
destas fazendas é italiano e consiste em dois balões a 2.600 pés de alti-
tude movendo-se de maneira antagônica (um para cima e outro para
baixo), a fim de girar uma turbina e gerar energia elétrica.

• Nanoeletrotecnologia
Uma das principais desvantagens dos carros elétricos é o tempo de
recarga da bateria – por volta de 4 horas são necessárias para obter
a carga máxima. Uma possível solução para este problema foi alcan-
çada na Universidade de Illinois, nos EUA. O professor de Engenharia
e Estudo de Materiais Paul Braun e sua equipe desenvolveram uma
bateria que tem sua estrutura interna moldada tal qual uma fina pe-
lícula em nível nanométrico de metal em 3-D. Essa técnica permite
que a bateria funcione como um capacitor, armazenando e liberan-
do energia de 10 a 100 vezes mais rápido que modelos convencio-
nais, mas funcionando normalmente em aparelhos que necessitem
de pouca energia. Todos os processos de montagem do dispositivo já
são usados em escala industrial, permitindo sua produção em mas-
sa. O grupo mostrou que o modelo pode ser usado tanto para bate-
rias de lítio como de níquel. “Se um dia desenvolverem uma química
melhor para baterias, o conceito ainda se aplica”, disse Braun.

•Do outro lado...


Buscando também uma solução para carros elétricos, a companhia
Better Place desenvolveu uma tecnologia para trocar a bateria em
vez de carregá-la no veículo. O processo de troca leva menos tem-
po que abastecer o carro com gasolina e permite recarregar a ba-
teria através de meios alternativos, como com energia eólica. Re-
centemente, a empresa fechou um acordo com a CSG, provedora
de energia da China. A parceria entre governo chinês, Better Place
e montadoras de carro garante que até o fim do ano haja a cons-
trução de uma estação de troca na cidade de Guangzhou, segundo
maior aglomerado urbano do mundo, com população estimada de
24,2 milhões de pessoas. Em Tóquio e em várias cidades da Europa,
a tecnologia já é empregada. Resta, como sempre, esperar que as
companhias voltem seus olhos para o Brasil.

Desenvolvimento com equilíbrio


89 Maio/2011
artigo código de mineração

NOVO CÓDIGO
BRASILEIRO DE MINERAÇÃO:
O QUE MUDA E O QUE MELHORA
Após sofrer com os efeitos de um regulamento tuições estatais e procedimentos relacionados à ex-
publicado há mais de 43 anos, o setor minerário ploração mineral no Brasil.
brasileiro enfim dá mostras de novos ares e, ao Em linhas gerais, o Departamento Nacional de
que tudo indica, o envelhecido Código de Minera- Produção Mineral será extinto e substituído por
ção brasileiro (Decreto-Lei n.o 227, de 28 de feve- dois órgãos com poderes específicos e comple-
reiro de 1967, regulamentado pelo Decreto presi- mentares: a Agência Reguladora de Mineração e o
dencial n.o 62.934, de 2 de julho de 1968) deve ce- Conselho Nacional de Política Mineral.
der lugar em breve a uma nova Lei que disciplinará À Agência Reguladora de Mineração, caberia a
a mineração no país. tarefa de promover a regulação e a fiscalização da
O Ministério de Minas e Energia (MME) se atividade de mineração no país. Sua criação teria
propôs a atualizar as regras da atividade com a co- como objetivo trazer maior eficiência à regulação
laboração de representantes do setor e da socie- do setor, que passaria a contar com os poderes de
dade civil e, apesar de o projeto ainda não ter sido uma entidade nos moldes das agências reguladoras,
divulgado, a expectativa é que o setor enfrente a exemplo de outros setores da economia nacional¹.
duas relevantes mudanças: (i) a desburocratização O Conselho Nacional de Política Mineral, por sua
dos trâmites para a viabilização da produção e (ii) vez, concentraria a competência de desenvolver e
a imposição de obrigações ambientais às compa- propor diretrizes e ações ao setor. Além disso, esse
nhias mineradoras. órgão teria como principal atividade a capacidade
O projeto do MME, segundo informações do se- de, com base no trabalho de especialistas na área,
tor, deverá trazer reorganização profunda das insti- sugerir ao Presidente da República políticas públicas
aplicáveis ao setor minerário no Brasil.
Leonardo A. F. Palhares e Caio
Iadocico de Faria Lima são,
respectivamente, sócio e advogado
do Almeida Advogados

Fotos: Divulgação
A criação dos órgãos acima citados conso-
lidará novos planos de pagamento pelo direito
de exploração da mineração e, com isso, ha-
verá captação de recursos superior à atual, de
modo a equilibrar a distribuição dos lucros en-
tre os participantes deste mercado.
Ademais, considerando que à data de pu-
blicação do atual Código de Mineração (1967)
ainda não havia discussões relevantes acer-
ca da proteção ambiental, o novo projeto em
discussão deve enfim suprir tal lacuna e prever
importantes medidas para minimizar os impac-
tos da atividade minerária no meio ambiente.
Neste sentido, o projeto do governo deverá
regular a necessidade e licenciamento ambien-
tal por parte das companhias que exploram a
produção de minérios, além de ter como ob-
jeto a estruturação de mecanismos de apoio
à sustentabilidade da mineração em todas as
suas etapas. Este é um dos pontos mais aguar-
dados do projeto.

(www.almeidalaw.com.br).
VELHO
AMBIENTE
Ruas de lixo Desde 2007, segundo fontes de notícias da Europa, a bela,
e hoje suja, cidade de Nápoles na Itália sofre com acúmulo
de lixo em sua área urbana. O primeiro-ministro italiano,
Silvio Berlusconi, disse em novembro de 2010 que o pro-
blema seria resolvido, mas neste mês de maio foi o contrá-
rio o que se viu noticiado no mundo todo: mais de 6 mil to-
neladas de lixo acumularam nas ruas da cidade litorânea,
banhada pelo Mar Tirreno. Enquanto a população deve
se perguntar se seus hábitos de consumo podem mudar
o cenário negativo causado por tanto lixo – produzido por
ela mesma, o setor público teve de convocar o exército
para recolher o entulho.
O jornal italiano La Reppublica, em uma matéria intitula-
da “Prisioneiros do lixo”, relata “montanhas de lixo com
5 metros de altura” e aprofunda o acontecimento com
detalhes e relatos de pessoas que vivem sob o fedor e a
ameaça de doenças da insalubridade generalizada. Uma
das causas do problema é a falta de aterros sanitários, e
a falta de locais para abriga-los, principalmente porque os
Fotos: Dreamstime
municípios da região não os querem em seus territórios.
Com a chegada do verão europeu, época de visita de tu-
ristas, a vergonha deve ganhar novas feições, com o vento
“soprando sacos de plástico flutuando nas ondas” como
Fotos: Divulgação

ilustra o texto do periódico italiano. A população da cida-


de afirma pagar taxas com valores mais “altos do que no
centro de Roma”, a capital do país, pela coleta de lixo que
não acontece.

Vazamento de cloro
O rompimento de uma tubulação feriu cinco trabalhado-
res na Unidade Industrial de Cloro Soda da Braskem, em
Maceió, que já havia detectado o vazamento de cloro na
fábrica. Até o fechamento desta edição, dois funcionários
estavam internados em estado grave.
Segundo a Brasken, 12 pessoas que moram na região da
fábrica apresentaram sintomas de intoxicação por cloro e
receberam atendimento médico, mas passam bem. Mas
o Hospital Geral do estado (HGE) informou que mais de
130 pessoas apresentaram problemas. O Ministério Pú-
blico Federal em Alagoas instaurou inquérito para veri-
ficar as causas e determinar se mais moradores correm
risco com o vazamento.

revistanovoambiente.com.br
Maio/2011 94
Ficou barato
A caçadora de onças e organizadora de safá-
ris, Beatriz Rondon, que possui uma fazenda
em terras consideradas Reservas do Patri-
mônio Particular, recebeu como punição
duas multas do IBAMA que totalizam R$ 220
mil. Atacar o bolso de quem é tão mesqui-
nho aponto de matar animais fabulosos por
alguns dólares, é um bom caminho, mas nin-
guém ainda foi indiciado criminalmente por
uma suposta falta de provas. A fazendeira
organizava safáris para estrangeiros, regis-
trados em vídeo, nos quais aparecem execu-
tando duas onças. Apenas o guia é procura-
do, desde o ano passado por animais amea-
çados de extinção, a sangue frio, enquanto a
fazendeira Beatriz Rondon, também aparece
nos vídeos ordenando a matança. Na casa
dela foram encontradas 16 galhadas de cer-
vos e outras partes de corpos ou peles de
animais silvestres caçados em sua “área de
proteção ambiental”. A apreensão foi um
Fotos: LaismBrazil

excelente fruto da Operação Jaguar, da Polí-


cia Federal, realizada para coibir a caça aos
grandes felinos do Brasil.

Aí, parou!
Carlos Minc anunciou, em maio, o embargo das obras de
uma unidade da Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA).
O secretário de meio ambiente do Estado do Rio de Janeiro,
disse que as obras só serão reiniciadas em Santa Cruz quan-
do a CSA resolver problemas de poluição do ar. A empresa
é suspeita de desencadear a chuva de prata, registrada em
2010 na Zona Oeste do Rio de Janeiro, e vem registrando
diversas irregularidades nos últimos anos. “Ela vai ter que
paralisar sua produção. Eles estão cometendo vários erros e
agora a gente resolveu dar uma engrossada forte. Se, em um
mês, não começar a obra pra resolver o problema mais gra-
ve, que é esse posto de emergência, que joga a tal nuvem de
prata, com ferro e carbono para cima da casa das pessoas, aí Carlos Minc, Secretário de Meio Ambiente do Estado do Rio de Janeiro.
parou!”, alertou Minc, segundo a Agência Brasil.

Desenvolvimento com equilíbrio


95 Maio/2011
Da redação

Muitas
felicidades

revistanovoambiente.com.br
Maio/2011 96
E sta 12.a edição mensal completa o primei- entre a riqueza econômica das grandes cidades,

Fotos: Revista Novo Ambiente/Oberti Pimentel


ro aniversário da Revista Novo Ambiente, como São Paulo e Rio de Janeiro, e nossos tesouros
e orgulha-nos dizer que esta tão jovem Revista já naturais, como a Amazônia e o Pantanal. Continuar
percorreu, com seu jornalismo de imersão, todos a colocar em evidência projetos exemplares, assim
os estados brasileiros. Foram mais de 200 matérias, como denunciar as mazelas dentro de economias
em que ouvimos grande parte dos maiores especia- pujantes. Iniciamos esta nova missão com mais for-
listas em sustentabilidade do país. São mais de 2 mil ça e independência editorial para o jornalismo in-
fotos, além de charges, ilustrações, infográficos pu- vestigativo e a bagagem renovada de nossos profis-
blicados, feitos com exclusividade para nossos mi- sionais, de toda uma cadeia de colaboradores que
lhares de leitores. Materiais que têm servido como amadureceram com a Revista neste último ano.
importantes registros históricos e um apoio no com- Aos nossos cada vez mais exigentes leitores,
partilhamento de novas informações, de soluções esperamos tornar sempre visível nossa evolução
exemplares, de denúncias. Uma fonte de pesquisa como veículo de comunicação, ouvindo, apren-
para uma humanidade em busca do desenvolvi- dendo e agindo rapidamente para que tenhamos o
mento com equilíbrio, para que todos tenhamos melhor produto final.
“muitas felicidades e muitos anos de vida”. Até a próxima, porque neste momento nossas
Entramos em um novo ciclo, com alguns objeti- equipes já estão saindo de viagem para nos trazer as
vos ousados, como traçar relações mais profundas novidades da edição do mês de junho.

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