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A TRANSDISCIPLINARIDADE E A INTERDISCIPLINARIDADE EM ESTUDOS DA LINGUAGEM Ida Lucia Machado Jerénimo Coura & Mendes organizadores Discurso, Argumentacao e Modalizacao dos processos avaliati' Wander Emediato UFMG Introdug3o Na chamada “Grami ‘auld ¢ Lancelot afir- ‘mam que “As palavras so sons distintos e articulados de que os homens fizeram sinais para indicar 0 que se passa em seu espirito’ Se, na Gramé- tica, os autores de Port Royal jé reconhecem que as estruturas da lingua servem a expressio do que se passa no espirito do homem, é na Logique ‘ouart de penser, conhecida como Légica de Port Royal, de 1662, que Ar- Nicol buscam descrever o que pepasa no esprito humano, Para eles, em nosso espirito ha trés operagdes ou faculdades: '2) CONCEBER: operagio que corresponde ao olhar de nosso es coisas Pela Identificacio de objetos. Por exemple: “Homen, "Virude’ 'b) JULGAR: operagio que consiste em afirmar de algo concebido (a ident Go) que ele & tal, ou se, do ser concebido se afirma um aributo, fomando uma proposigi. Por exemplo: “O homem é «)_ RACIOCINAR: eperagio que consist em de dots ulgament zados para produzir um terceiro. “O homem ¢ virtuoso’; “José & um home “José € virtuoso, ou ands; “O homer é bondoso’; “A bondade ¢ uma virtude"; logo, "© hhomem é virtuoso A tercelra operagio€ uma extensio das demi. to sobre as Sem entrar na vasta discussio que poderia sugerir que a propria operacio de “conceber” j& comporta um julgamento, como nos casos das identificagoes exemplares (Charaudeau, 1992; Emediato, 2000) que in- cidem sobre a escolha, no discurso, de nomes comuns, 0 fato é que as duas operagdes seguintes, “julgar” e “raciocinar” é que mover o espirito humano, jé que ele, o espirito humano, nao se reduziria a primeira ope- ago sem retirar dela algumas consequéncias. Isso significa dizer que predicar (julgar, dar atributos aos objetos, enfim, avaliar) é a operagao essencial que nos leva a formular raciocinios, interpretagdes e a agir s0- bre o mundo, construindo-o subjetiva e intersubjetivamente. A avaliagio é, portanto, um fendmeno de grande relevancia para os estudos do discurso, pois ¢ parte integrante de diferentes praticas sociais, manifestando-se em diferentes aspectos da atividade discursiva. Além de constituir uma das fungdes fundamentais da linguagem, que Roman Jakobson chamou de funcao expressiva, a avaliago desempenha um pa- pel bem mais amplo no processo de producao do discurso. De modo ge- ral, o termo “avaliagio’, como um conceito a ser explorado, nio se reduz apenas 20 campo da modalizagao enunciativa. Ela é um aspecto consti- tutivo do discurso, atuando tanto no espaco externo do fazer situacional, onde atuam os seres sociais, parceiros da relagio comunicativa, como ‘no espaco interno do dizer, onde atuam os protagonistas da encenacao discursiva (Charaudeau, 1986). A avaliagao se situa tanto no lugar social dos posicionamentos, espaco axiologizado dos sistemas de valores e de «crengas, como no lugar social dos condicionamentos comunicativos, es- pago da regulagio e da adequacao psicossocial e comunicati to, 2008). Dai a relevancia e a complexidade de seu est Ossentimento de que a avaliagao & constitutiva do discurso se deve 20 iando analisamos estamos nos refe- rindo ao comportamento enunciativo adotado, e nio a uma propriedade de referenciagao absoluta da linguagem. O discurso “objetivo” é, apenas para efeito de anilise e categorizaca estratégia do “apagamento enunciativo” (Vion, 2001), a0 passo que o dis- curso “subjetivo” seria aquele em que o enunciador, de modo explicito ou implicito, se coloca como a fonte avaliativa (Kerbrat-Orecchioni, 1990), adotando o regime do “investimento subjetivo” (Parret, 1983). lebatido e pesquisado, ,, aqui, de um assunto amplamente debati mas que, por fara de sua complexidade, pode e deve ainda receber mul tas contribuigées, sobretudo sobre o uso efetivo as arallagioen ras citar 0 - discursivas determinadas. Em especial, gostaria de so subs- tancil de Sophie Moirand (2009) publicado nos Carnets dn Cedisors) ‘Trta-se de um levantamento preciso do problema de valiagso 20 vel enunciativo, associado ao problema da modalizacéo apt também aos estudos de Jean Peytard sobre a questo. Um desses estudos, mas te6rico, dedica-se ao problema da alteraso¢ das reformalagies no discurso e seus aspectos aaliativos?; um outro do mesmo autor desen wove o problema, integrando-oaaspectossemiticos,didaticos profis- sionas, artigo que jé se tornou cisco? sobre oassunto. Nao vou entrar nos detalles de nenhum desestfabalhos, apenas rssalta a importncia de todos eles para a compreensio do problema da avaliaglo como, modal e enunciativa e recomendar vivamente a sua leitura. am Buscando contribur para discussie do problems, vou propor um percurso de reflexo que transtar pela avalagio como um problema Eiscursvocapaz de integra diferentes nivls, como a modalizaso enan- Gitiva, 0 probléma da construsio da gestio ds opinito e do dialog: erno ¢ extern), sua fangfo na argumentasio e nos process fenciae de regulacdo das atividades comunicativas, Proponhos portant, tréscriterios para a andlise da avaliagdo, que correspondem : jes em que ela atua: Rec dtc pte a om mensio interna do discarso, ea diz respeito diferentes estratgias de nto ou de apagamento modal do sujeto enunciador. | Nesse ‘qitério, a modalizagao axiolégica, através da qual o sujeto enunci de 3 PEYTARD, J, De Teva formatique. Sytagines 4, Besancon, 1982 Wie ‘sore julgunetos,éa mas evident, le mundo’ ou “pontos de vista” propres do dialogismo interno, ou sj Pontos de vista f Pois permite representa “visdes ou de outrem, através da gesta : , la gestio emo, ou ses, pela dstribuigd, na superficie textual, de > €anti-orientados (Rabatel, 2005). Mas também a incidéncia da avaliacio em outras modalidades : modals, 0 que equivale a mo. © exo epstmico que caracterin « modlnargs uo seat ruir os. objetos, do discurso, mas de impé-los ao canto (aude pon impos v2). Eo sujeito comunicante que busca agit sobre o ou cional, a5 decisoes juridicas, as deliberagées iva. Em sentido amplo, esse eri itucional, p 08 € das aches dos suj dos sujeitos sociais. Os atos avaliativo, dimensio pragmética importante da linguagem, easing oe cesso de produgao do discurso, prodded pasts OFS ax parte de sua condges de als que operam no funcionamento ¢ no estabelecimento das situagdes comunicativas regulares. Nesse senti- do, apontamos, por exemplo, para o problema da avaliagio intersubjetiva entre os parceiros, ou seja, a expectation croisée, nas palavras de Claude Chabrol (2000), e também as imagens elaboradas entre A e B, comoem Michel Pécheux; a avaliagao da situagéo, como diria Bakhtin e também Peytard, as imagens elaboradas entre os interlocutores, segundo Grize, a avaliagdo reciproca entre os sujeitos da linguagem, de acordo com Charaudeau. Também é importante resgatar aqui a proposi¢ao de Ghi- glione (1986) para quem as ages de ajustamento ¢ de regulacdo entre 0s interlocutores permitem jisituacdes até entio potencialmente co- ‘municativas se tornarem cofitratos de comunicagao efetivos, ou ainda as reflexes de Goffman que apontaram para a importincia do trabalho de face (facework) no funcionamento das interagdes verbais. Todas es- sas contribuigdes tedricas apontam para a natureza avaliativa da relagio intersubjetiva, como uma premissa fundamental para a instituicéo do discurso. ‘O conceito de avaliagao é, pois, multiforme e pode agrupar diferen- tes dimensdes e dominios, mais interdependentes do que exclusivos, que merecem ser discutidos neste artigo. Aan \¢80 como uma questav modal: o critério enunciativo (© estudo da modalizacao remonta a uma longa tradigéo. Embora sua relevancia no campo da linguistica se dé pelos estudos relativamente recentes sobre a enunciacio, o problema se estende a controvérsias mais remotas, como a diviséo entre légica e retorica, por exemplo. Antes mes- ‘mo de se pensar em uma légica modal ou nos desenvolvimentos recentes das teorias da enunciacio, a propria retdrica jé se ocupava de uma defi- nigdo do logos como base da argumentacao e da organizacio discursiva, seja no ambito da disposico do material probatério, seja nos diferentes ‘modos e caminhos do convencimento ou da persuasio. Afinal, a retorica 6 aarte de encontrar os argumentos proprios a persuadir (a invengdo) € ide ating disposicao), 0 que nos leva desde jé a uma teoria do sujeito em acdo, quanto a légica, como problemtica da demonstracao, abstém-se de um .gua natural, lugar de ambiguidades indesejéveis. através da invengao (Inventio) 0 orador jé se confronta com 0 problema da intersubjetividade, pois deve avaliar nao s6 o valor explica- tivo dos argumentos (logos), mas também seu valor persuasivo e relativo 40 auditério que busca persuadir (pathos) e ainda apresentar-se como alguém digno de confianga (ethos). Tudo isso sugere um processo de sabjetivagio e de avaliacao atuando no dispositivo retérico e que ques- tiona o valor dos argumentos, a organizacao dos valores comunitatios, 0 ligicas subjetivas e ldgicas objetivas. As logi- «as subjetivas dizem respeito & acdo do sujeito sobre o mundo, ao fazer, € uuma I6gica dedntica. As légicas objetivas se ligam ao ser, e correspondem uma légica Ontica e al io é, para Laureandeau, insufi- a subjetiva do conhecer , de um lado, a dimensio demonstrativa everiditiva, de outro lado, e uma terceira, relativa ao-dever ao querer. ‘Com as teorias da enunciagao, o fendmeno da modalizagao ganha ‘um contorno mais linguistico € menos logicista, fazendo avancar a re- flexio sobre o sujeito e a sul Com a Anilise do Discurso e a Pragmatica, 0 ponto de partida i de Benveniste, apesar de sua relevancia e pioneirismo, sera superado, rio mais reduzindo a subjetividade ao sistema de coordenadas pessoais, ‘espaciais € temporais organizado em torno de um centro déitico equiva- lente ao locutor (a subjetividade déitica), para atribuir ao sujeito toda a sua complexidade e, sobretudo, a partir de Ducrot, operando a disjungio entre locutor ¢ enunciador pela quebra da unicidade do sujeito, Em Charles Bally a encontramos 0 questionamento da relagio entre alinguagem e 0 sujeito, Para ele, “A frase ¢ a forma mais simples possivel de comunicagao de um pensamento: pensar é reagir a uma represent 0 constatando- a, apreciando-a ou desejando-a’ (Charles Bally, 1965). Constatar, apreciar e dese dimens6es da subjetividade ti tivo-apreciativa, logica mista de6ntico-volitiva). A distingio Bally entre Modus e Dictum, que propde diferenciar os aspectos légicos (dictum) e psicol6gicos (modus) da comunicacéo, j sugere uma cisio importante no interior do pe6prio logos, ou do discurso, presente tam- bém nas diferentes dicotomias que surgirao na linguistica: contewdo x toria (récit) x discurso; componen- ; etc. Essas dicotomias sio impor- de que hé um “como dizer” que aporta ento avaliativo do sujeito se ‘encontra, portanto, no centro da problemtica do discurso e da enuncia- cao. Para Herman Parret (1983), a vida do discurso inclui investimento € Gesinvestimento da instincia de enunciagéo. Nesse processo de investi- mento subjetivo e de desinvestimento que opera o seu apagamento enun- fica (tornando-se um indice) ou se ausentifica jeito - (um simbolo). Para o autor, onde 0 é representado (por exemplo, no discurso 1, didatico, econdmico) 0 sujeito se ausentifica, demonstrando ou aparentando demonstrar, colocando-se como um representante da norma de argumentacao abjetiva. E nesse sentido que, para o autor, 0 ‘mundo surge como estruturado em aparéncia, reivindicando a norma de validacdo objetiva. De outro lado, quando 0 sujeito se investe no discur- 0, se mostrando, 0 mundo coincide com os seus pontos de vista, com a argumentacao s 0 que o torna desestruturado em aparéncia, jé que se encontra em um terreno pessoal e de controvérsia. A emergéncia da controvérsia torna o mundo instavel e sujeito & luta discursiva. modalidades nos permite refletir sobre o papel que a avaliasdo, como fendmeno enunciativo, desempenha no fenémeno mais amplo da moda~ lizacéo, Notaremos, por exemplo, que a avaliacéo pode surgir em todas as modalidades e nio deve ser reduzida a modalidade apreciativa. = como modalidade objlia, correspondendo 20 modo como o sueto representa raus de certea ede evidénca associados a0 conted- em sua enunciagho die we me 3 pooner ign pti ts de 2s, etc). B evidente que, aqui, a avaliagdo nio é cae ces sees noel ape san os tespsoseumpodcnient nilpcomu pees le oper ase dn decanted sco absolut ou relativa, no conteido ou no valor de verdad Lowe nae sc evel ae apn woe degra gr deiner smo ope edo deers Fakes sea dal sej ado apagamento enuncat enuncatv, 0 conte da astergéo impli sujet na verdade expressa, da assergéo implica a crenga do lando-a como absoluta ou com ibsoluta ou como apenas provivel, ‘assim como no caso do debntco, pela avaliagdo de uma étcaalgada ao nivel de um imperativo soca como modalidade tebe cjfxma grams csi do per resenaumaenunio cura, ou um ato de fa dito ue slg es. doo meme ep gue um Ge una el der ea pele onder pl sgt pelo conch cio, pela proibigio, pelo pedo, pea inerrogagdo, ee. Aqu ambé lo equaled expresso de uma stevia preci, mas ara arias emer equa ene oes 0 ue impos um pce dintnce de aan 0 reciproca dos pa ~aima ten como das condiges de ade acto dos atos de linguagem or Aa sos de linguagem dietivos, considerando Associada mais foremente a inne eee ee eee: aeons iperi Come 61 once oderos nts, 0 fendmeno avalatvo perpassa cada uma ves de maneira distinta: na modalidade objetiy lar que a situago assim exge; na modalidade intrsubjtiva pela awaliasdo da propria relacdo entre os parceiros da interacio que ‘ce regulagées especifcas representadas pelos diferentes graus de alocusio € diretividade, de hierarquia e de poder; enfim, na modalidade apreciativa, 1 0 niicleo nfs visivel das atitudes avaliativas explicitas do 10s, por Ande transitam as indugGes afetivas ¢ a5 reagdes ‘em que o logos é investido pela expressividade humana ¢ pelo path (0 fato da subjetividade nfo estar marcada no discurso em termos do aparetho formal da enunciago nao significa que ela nfo esteja pre ‘sente (a modalizagdo zero nao existe), pots as marcas podem nao apare- cer no regime enunciativo de apagamento do sujeito pelo aparelho for- mal. Assim, como diria Parret (1983), embora o sujeito nao se mostre, sua auséncia 6 apenas uma estratégia modal do locutor que consiste em ‘mostrar 0 mundo aparentemente estruturado, enquanto a organizago discursiva se ocupa de desestruturé-lo através da controvérsia relatada no dialogismo interno, ou, a0 contrario, da predominancia dos pontos de vista de terceiros co-orientados com 0 ponto de vista do locutor prin- cipal. Ao atualizar em seu discurso esses pontos de vista de terceiros, 0 ences de influéncia. Pelo apaga- wvés do modo de apresentacio dos mento, a subjetividade se mostr pontos de vista de terceiros distribuidos no texto. Assim, as atitudes ava- Iiativas podem ser destacadas no discurso tanto no regime do apagamen- to como no regime do investimento subjetivo. Esses diferentes regimes enunciativos caracterizam, de modo predominante, certos géneros ou si- do investimento subj ‘uma reportagem jornal Investimento e apagamento po que 0 locutor se constréi uma s6 posicao enunc Go argumentativa monolégica, ou pela pluralidade, em que o locutor se Sonstroi varias posigdes enunciativas; co-orientadas e/ou anti-orienta- das, o que confere a0 seu discurso um plano nao s6 dialégico, mas tam- bbém dialético, Na unicidade, a gestéo do dialogismo interno é represen- tada por uma orientagdo argumentativa coercitiva e néo heterogeneidade de vozes é apenas uma encenagao. Embora varios locu- tores sejam convocados no discurso, o que sugere pluralidade de pontos de vista, todos eles cantam em unissono, ou seja, sustentam um ponto poisa ee devista comum, portanto, hom: i n 1ogéneo e nao polif6nico. Com efeito, um tate pode dar voz a virios locutores que defendem o mesmo me de eae see aa ‘controversa (gestao do dialogismo interno). E1 lebate televisual, 0 jornalista animador pode tir sponte participants one partliam o meme ponte de vetion sere, tendéncia ideol6gica (gestio do dialogismo exter = Outro problema relevante€ se devemos tomar texmos aval, opi eapreiag, Charades (192) Plo dierencia “piniio” de “apreciaio: Para esse ator, a opinito re sultaria de um céleulo de probabilidade ao termo do qual a favor ou contra a verossimilhe ae ‘mundo (1992, p.96). De outro lado, a apreciagao sugere ima ears afetiva do sujeto diante de um fto ou um saber, De modo mais amplo, ‘a apreciagdo parece agrupar tudo que é da ordem da reagio afetiva rs mo sinénimos os : istemas, ae valores, ou nao axiolégico (quan- -e julgamentos), enquanto 0 afetivo seria de order emocional. A distingdo proposta se eoerents& cor ji por Charaudeau me parece coerente condita de aceitarmos igualmente a distingao entre modalizagio talo- 1h iva as sistemas de valores, e modalizagdo apreciativa, relati- a espresso ds emogies, Pree sera mesma dsinszo que Kerbrat a schioni busca fazer, ainda que elz % para referir-se A modalizagio atioligien ——— ee ‘Marcas da enunciacao enunciada A identificagao e a classificaga | a assificagdo das marcas da enunciaga 7 da uma tradicao na linguistica, mas sabemos que nem mad sane na enunciagio através do aparelho formal. 80 muitos e variados os re, uso lexical ¢ morfosintitics para indicar modalizagdo e diferentes inden pees stiva. O estudo desses marcadores vincula-se a 7 adigao linguistica de estudo do a tmalong dit gus tudo do aparelho formal da enuncia- C _ verbos performativos (en ordeno, eu permito, eu profbo, eu pro meto, etc.) ” yerbos aurxiliares modais (poder, dever, querer, etc.); ~ Yerbos de atitude proposicional ou verbos de opinio (eu creio, eu sei, en duvido, eu acho, eu estimo, etc.) formas de predicacao, por exemplo, predicados formados pelo ver- tbo ser vom adjetivo: (E bom, é claro, ¢ preciso, é provavel, € inegivel, é certo que, etc. indubitavelmente, geral ~ operadores argumentativos: (pouco, um pouco, quase, apenas meso. ete), na tradigio da teoria da argumentagdo na lingua, de Oswald Ducrot. * expressées de grau (aumentativo, diminutivo, comparativo, super lativo) ete. = uso de nomes comuns (identificas generalizantes), como “os érabes,“o paraibano’, “os petis eecanos” “os islamistas, “os ciganos” em construgdes em que so coloca- ddos como agentes cauisais de um processo de agressio que qualifica, por generalizaio, o grupo socal (o enquadramento manipulador, segund Phillipe Breton); vale destacar aqui também 0 uso da nominacio iden- titérit; no sentido de Paul Siblot (1999) e da designagio como estratégia argumentativa, como em Emediato e Guadanini (2009). vo uso de nomes préprios como lugar comum da esséncia em cons; tragbes como “esse cara um novo Pelé" “esse artista um Van Gogh!" “8 uma Giselle Bundcher rm quantifcadores (numerais, pronomes indefinidos, express6es de juantidade) usados com a intencio argumentativa, como ¢ 0 caso das falacias dos grandes ntimeros (apresentar-nuimeros grandes para impres- Sonar o leitor/interlocutor), ou das quantificagBes imprecisas (..mais de 1000 pessoas!); do uso de sondagens ou de outros quantificadores im- precisos, etc a prosédi ‘bes genéricas exemplares ou ‘os ame- , a modulagdo da voz: 0 ritmo, o tom, a altura da vor podem indica atitude aalitivaeafetiva do locutor. Sabemos, inclusi {ue a dimensio musical (pros6dica) da fala é um dos components do anos (imagem de si) do falante, na medida em que, por intermédio de aspectos vocais, 0 locutor pode surgir como sé: ico, brincalha nerve, camo, fndignado, cfiton ce “eine bene ~ Na lingua escrita, para obter efeitos de sentido similares aos pro- sédicos, usamos marcacées grificas: sinais de pontua¢do, aspas, negritos ¢itdicos,variagio de fonte ou tipo de letra, de tamanho ou corpo da fl ect notamos, com frequéncia, nos discursos jornalistico ¢ Porém, como dissemos acima, nem tudo na enunciagao é enuncia- do, marcado na superficie discursiva. E nem tudo que nao é marcado deixa de interessar ao analista do discurso, que precisa e deseja ir além das marcas linguisticas ¢ do aparelho formal para buscar os efeitos de sentido nos discursos em que o locutor nao deseja se mostrar‘ se escon- de atrés das estratégias diversas do apagamento enunciativo. Ocritério pragmatico e retérico e o ponto de vista da argumentacéo E inegivel que as atitudes ‘© sujeito comunicante perspecti \cidem sobre a manei municante assume um ponto de vista sobre o mundo é tem a intengo de agir sobre seu destinatario para que ele assuma igualmente esse ponto de (Os buracos de minhoca existem e isso é evidente); na modal siespre ciativa (Sao maravilhosos os buracos de minhoca!); ou na modal intersubjetiva (Entenda os buracos de minhoca), 0 sujeito comunicante busca exercer uma agio sobre 0 juizo de seu interlocutor. No primeiro caso, ele assume um ponto de vista externo e se apresenta ao interlocu- tor como uma testemunha de uma verdade evidente (necessidade) que se impée a ele e, de resto, a todo mundo; no segundo caso, ele enuncia sua posigao pessoal, seu ponto de vista interno, em relagao ao que ele dir. Ele expe o seu estado afetivo em relagdo a0 contetido, na intengio de contagiar seu interlocutor levi-lo a partilhar 0 mesmo afeto ou 0 ‘mesmo juizo de valor; no terceiro caso, ele convoca o interlocutor (Ponto de vista relacional) a agit em conformidade com a intencionalidade do ato de linguagem que, nesse caso, apresenta um aspecto pedagégico. Nos {és casos, ha uma ago de influéncia sobre o interlocutor, o que justfica o nosso retérico-pragmitico da avaliacio. Para Perelman & Olbrechts-Tyteca (1958), “a maneira como formu- lamos nosso pensamento explicita algumas de suas modalidades, que ‘modifica a realidade, a certeza ou a tmportincia dos dados do dis curso” Perelman & Olbrechtrs-Tyteca buscaram apreender o sentido da modalizagao na argumentagio para além das formas gramaticais (como 6 indicativo ou 0 subjuntivo, ou expresses do tipo eu penso que, eu tenho certeza de que... eu sinto que... ec.), ou de categorias psicoldgicas ‘ou légicas que permitem representar modalidades de pensamento. Eles Duscaram, de modo mais amplo, avaliar o papel argumentativo de cer- tas expresses aparentemente descritivas, Assim, esses autores afirmam aque “toda descrigio se estabelece sobre um plano de fundo do qual se busca destacar o objeto, de um modo tal que ela s6 se torna significati- ‘va em fungio do objetivo perseguido” (Perelman & Olbrechts-Tyteca, 1p 208). Esse ponto de vista retérico, que liga 0 pensamento & ago, no festé muito longe da proposicio mais cognitiva de Grize (1990), segundo qual persuadir corresponde & produgao de um discurso organizado para intervir sobfe a opiniao, a atitude e 0 comportamento de alguém, ‘ow ainda, a producio de uma esquematizacio que leva a “ver” uma situ- aco e seus atores sob uma certa luz (éclairage). Ora, tal “mada de yer’, trazido a cena da enunciacio, objeto ” para levar 0 outro a “perceber” o enquadre com a saligncia no coloca a avaliagio zo centro da problematica do discurso? Uma esquematizacio, conforme Grize, deve fazer ver (a visio das coisas emociona e excita as paixdes), jinar, focalizar) uma de suas facetas e ocultar outras, pois toda iluminacio colora o que ¢ iluminado e o destaca em um eixo euforico/disforico. : Perelman & Olbrechts-Tyteca propdem que a argumentagdo se sus~ ou seja, deve estabelecer-se sobre a base de um laco intelectual construido entre o orador ¢ seu auditéri [As premissas ou acordos da argumentagio funcionam porque sao cons- tituidos por um fundo avaliativo comum (avaliagio comum da estru tura do real e avaliacio comum dos valores, suas hierarquias ¢ lugares comuns). Mas de onde recrutar as avaliagBes que fundam os acordos da wrt! argumentacdo? Para Charaudea fr ropve categoria o espiitosalinng joe om diferentes dominios de avaliag Semanticos do dis; ticos consiste 'inicos de explicacao; ~ 0 dominio estético: que define o: : : qu 8 objetos e seres em termo: Presentagoes socioculturais do belo e do feioy nt MOS de re- ~ 0 dominio ético: que define ‘05 comportamentos humanos em ter- nos de bem e de mal em relacéo a uma moral exterse Gee ne Socials) ¢ interna (regras préprias do individu); - odor @ (leis, consensos undo. Por exemplo, um ju & em si, um ato de avaliaca: ja fem si, iagdo complexo, jé que é Sigio da aceitago comum das relagoes entre o argumento por analogianéo funciona fambém a pragmadialética, tal como . g ica, Proposta por van Eer Srostendorstconsttuum code granderdeinca pans ‘tema o foro, sem a qual ‘cessos avaliativos intersubjetivos na argumentagio cotidiana. A avaliagio da argumentagio e das eventuais violagées aos critérios de uma discussio ‘deal e racional é de suma importincia. A titulo de exemplo, a avaliagdo critica da argumentagio permite reconhecer, na leitura on no debate, as diversas generalizagbes precipitarlas que habitam as discusses e os textos, as ladeiras-escorregadias (bola de neve) que ora impressionam, ora ame- drontam, o homem de palha que leva muitas vezes o eleitor a decidir medo do assinalado representante do mal, as argumentagdes ad homi ue fogem ao essencial do debate para desqualificar a imagem do adversé- rio, a habitual fakicia post ergo, ego propter hoc, que rediuz a complexidade ‘a tuma causa tinica de simples sucessdo (depois disso, logo por isso). Ocritério discursivo ou psicossociocomunicativo Adotamos aqui a visio de Bakhtin, para quem a avaliagio participa da percepgio que todo locutor se faz do contexto extraverbal no qual ele toma a palavra. Por consequéncia, todo julgamento que se faz sobre ‘8 enunciadps da vida cotidiana engloba ao mesmo tempo a palavra e a situagao do enunciado. A parte extraverbal se torna, por meio da avalia- <0 que o locutor faz, parte integrante do enunciado, e se divide em trés aspectos: a) ohorizonte espacial comum b) oconhecimento ea compreensio da situacio ©) aavaliagdo que faz dessa situacio Esses trés aspectos permitem aos locutores elaborarem 0 discurso, que nao reflete a situagio extraverbal como um espelho refletindo um objeto, Ele representa, mais especificamente, 0 seu balango avaliativo, 0 que confere ao discurso um caréter de processo em relagéo a0 qual @ avaliagio surge como um componente fundamental. Jean Peytard, como estima Sophie Moirandt, reivindica o modelo de Bakhtin, mas opera um deslocamento da nogio de avaliagao integrando- * Sophie Motrand, in: Charandeau, P & Meingueneau, D. Dictionnaire d’Analyse du Dis- cours. Pais: Seuil, 2002, p. 243. ieuiaaeiaes ~a a0 processo de apropriacao dos discursos de outrem, ou seja, o locutor se apropria dos discursos circulantes (do interdiscurso) e os insere em ‘um processo de reformulacao, de variacSo e de ajustamento, avaliando- ~08 € reavaliando-os constantemente na cadeia enunci . Nessa di- regio, podemos assinalar diferentes fontes enunciativas que servem a0 discurso citante e que softem, no processo de apropriagio, aces de re- formulagao e de ajustamento dos discursos retomados de acordo com a avaliagio que o locutor se faz da pertinéncia e dos objetivos situacionais, como as citagdes, os lugares comuns, os esterestipos e clichés, os enun- ciados proverbiais, as aforizagies, etc. Nesta dimensio, a avaliagio surge como um componente essencial do proprio processo de producio do discurso, ou seja, é uma condigio para © sew acontecimento e para o seu funcionamento, Esse critério incide so- bre a avaliagio como um componente externo (psicossocial) do processo de producio do discurso, Diferentes teorias do discurso fazem referéncia 3 essa dimensio avaliativa externa, Vale relembrar a proposigio feita por Michel Pécheux’ sobre o processo inter-avaliativo operado pelos sujeitos e que lhes permite situar-se em determinadas posigées. Imagens de si e do ‘outro surgem de avaliagées intersubjetivas elaboradas em situagio: +1A (A): Imagem de A para A: quem sou eu para falar assim? Imagem de B para A: quem é ele para que eu Ihe fale assim? Imagem de B para B: quem sou eu para que ele me fale assim? ~ IB (A): Imagem de A para B: Quem ¢ ele para me falar assim? Nao podemos deixar de ar esse processo avaliativo de ima- gens de si e do outro, ao problema jé evocado por Gofiman, desde os anos 50, sobre o conceito de face: (Quando um individuointerage com outras pessoas, estas buscam obterinformagbes «seu respelto ou mobilizam informages de que jf dspdem. Inquietam-se de seu ‘estatuto socioecondmico, da ideia que ele se faz de si proprio, de suas disposigdes 4 respite do outro, de sua competénca, de sua honestidede ete. (Goffman, 1973, digo francesa, p.1, trad. nossa). Michel Pécheux. Analyse automatique du dscours: Paris: Dunod, 1969. (traduzida pela ceditora da Untcamp) Em Charaudeau, a avaliacio & um componente também essencial de sua teoria dos sujeitos da linguagem, pois ¢ a antecipagao que os parceiros fazem dos parimetros contratuais (situacionais) que permite a construgdo ¢ a reconstrugio da mise-en-scéne discursiva. Afinal, como em Pécheux, a co-construgio de imagens entre os parceitos da comunicagio promove intersubjetiva, a boa adequacio dos paptis sociais aos papéis 8 esperados e o desenvolvimento de um projeto de fala. interessante notar também que a proposta cognitiva de Grize, pelo ‘menos no tocante ao seu modo de representar o processo discursivo, nao é muito diferente da proposta de Patrick Charaudeau, como poderemos ver abs en SITUAGKO DE COMUNICAGAO Esquematizag30 cone A ——+ [imagem (A) tage oma) tage) Emtuncto se —_—— retinse seoeetates Petco Fonte: Jean-Blaise Grize, Logique et langage. Paris: Ophrys, 1990. P. 29. A constr6i uma representagao discursiva, uma esquema- vag, em uma suai deintelocayi ecante de un ineslotor B que reconstr6i a esquematizacio que lhe é proposta. ‘em 1) ~ Ae B nao designam individuos concretos, mas lugares dentro de quadro teérico, Em cada caso ou aplicagio concreta, esses lugares S80 ccupados por verdaeiros “sets” que comportam tragospsicalgicos € sociais. O lugar B, por exemplo, pode ser ocupado por um individuo ou por um grupo de sujeitos, ou um auditério. ee j OS __ 2) O esquema representa o que se passa quando € A que assume a iniciativa (a palavra), Em verdadeiro didlogo (situagao dialogal), cada pains mame alternativamente o lugar de Ae de B; : 3) Areconstrugao de uma esquematizagio nao sera sera nunca isomor- fa, pois cada individuo real é tinico. feme Como se pode notar, hé um consenso entre di nota, nso entre diferentes correntes dos estudos discursivos de que a avaliagao é um componente estrutu- ante do proceso de producto do discurso e de que ela opera sobre a relagio intersubjetiva (avaliagéo reciproca intersujeitos) e sobre os dalon Bers da siaasdo (avaliacdo situacional), Portanto, o critério si- tuacional da avaliagdo faz dela um componente determinat cionamento do discurso. " Steiminante do fan- Consideragées finais ‘Toda pritica discursiva envolve processos avali emtoasas rts denser ou nies aga cacudes (no uielesmnciay Vo, no nivel pragmético-retérico e no nivel situacional). discurso literdrio, em aparéncia sem pretense gumentativas, em geral aberto a pluralidade, pod ig tals doutrinria ehomogena, por exemplo, aes dos proceso de figurativizacdo, que convocam o leitor ou espectador a infer sistemas de valores especificos capazes de interpretar as figuras e transforma-las em as, ou seja, a figurativizagao convoca o leitor a fazer inferéncias ava~ em certa diresao desejével como norma moral universal (dos ho- ins de bem, dos simbolos heroicos, como nas narrativas miticas e em telenovelas). A heterogeneidade surge pela encenacio de uma polifonia fetiva (em que a humanidade ¢ plural, menos ideal e menos simbélica, como nas narrativas modernas). A gestio do dialogismo interno é domi ee ¢

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