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PEERS ALTE CAPITULO Vill Brincadeiras e brinquedos na TV para criangas: mobilizando opinides de professores em formagao inicial } Maria Felisminda de Rezende e Fusari | ou temendo) 1988, p.78) intuito deste texto 6 contribuir para as reflexdes sobre | praticas comunicacionais € educacionais de professores que trabalham com criangas nas escolas, mediados por programas tidos pelo piiblico infantil. Expde, para isso, Bringuedo na TV uma pesquisa realizada com um grupo de professorandos telespectadores sobre um programa televisivo para criancas. Objetiva tecer nexos com estudos voltados a formacao inicial de professores de criancas no ambito da produgao social de Comunicacao televisiva sobre brincadeiras e brinquedos. © trabalho de educacéo escolar infantil exige de seus professores (veteranos ¢ em iniciacao profi © priticas sobre as vivencias comunicacionais seus alunos. As criangas praticam, desde pequenas, comuni interpessoais na convivéncia com pessoas de suas fami vizinhanga, escola, elas também no cago social (as m As complexas relagdes comunicacionais entre “criancas/ outras criancas/midias /adultos educadores” desenvolvem-se, 20 longo da vida infantil, em um conjunto de miltiplas erecipro- «as influéncias. Enquanto professores participantes de conjuntos de comunicagies de varias origens nas quais se encontram os alunos podemos nos perguntar: com que finalidades emanci- Patérias sobre a vida no mundo contemporaneo, como e com que saberes praticos e tedricos j4 atuamos como professores mutnicadores, incluinde tivainfantit com midias? Essas praticas podem ser aperfeigoadas? Como e por qué? Co- nhecemos as formas e contetidos das midias preferidas pelas criangas? Com que praticas e teorias trabalhamos na educagao infantil quando se trata de participar da produgao social da comunicacao com midias sobre brineadeiras e brinquedos? Na presencialidade das ambiénciasescolares, o processo de ‘comunjcagio interpessoal entre alunos bem como entre profes- sores alunos vem mobilizando educadores na busca de conhe- cimentos profissionais mais aprofundaclos sobre essas relagbes. Considerando-se que o desenvolvimento dessas comunicagies » J0G0, BRENQUEDO, RINCADERAE AEDUCAGAO presenciais cotidianas, nas escolas infantis, encontram-se cada vez mais entremeadas de significados do processo de comuni- cagio a distancia, experienciados pelas criancas via televisdo, video, revistas, livros, cartazes, discos, radio, multimidias etc., esses saberes profissionais precisam ser elaborados desde a formagao inicial de professores. Em cursos de graduagdo que formam professores (Ma- icenciaturas), 0 estudo sobre Educacao, curricular voltada para essa finalidade. A formacao continua de professores em cursos de graduagao e em servico nas escolas deve incluir préticas e andlises que ajudem esses nais a saber aperfeigoar-se como recepcao ativa e co- municadora com midias. Além disso, devem saber organizar e produzir, nos cursos escolares sob sua responsabilidade, compe- tentes e criativas atividades de comunicagao cultural com seus alunos, levando em consideracao a participacao das diversas ‘midias na vida das criangas, dentre as quais a televisao. Ao relacionarem-se com as formas e os contetidos de dese- nhos animados, programas infantis, comerciais, novelas da por exemplo, ¢ com as pessoas presentes na sua vida familiar, escolar etc,, as criangas mostram-se como sujeitos ativos e inte- rativos. Enquanto participantes dessas inter-relagdes, recebem, influéncias de diversas qualidades e niveis para viverem no mundo contempordneo mas também, e a sua maneira, pro- duzem suas influéncias infantis ao elaborar, recriar, expressar suas emocées, ideias, histérias junto a seus familiares, colegas, professores, com significados encontrados em programas as- sistidos pela TV. ‘Trata-se, portanto, de uma grande “teia de influéncias” de muitas naturezas, poderes, procedéncias e na qual atuam criangas (telespectadoras, sim, mas no s6) em seus espacos sociais mais favorecides ou nao, tecendo diferentes histérias. — nao reduzidos apenas a dos, dentre outros pesquisa rano (1989, p. 61-65), a partir de da comunicacao televisiva com e por criangas. Diz ele: Ainformagio que se adquire de uma fonte de comunicagio pode e deve ser diferenciada da que ¢ obtida por outras entradas, Na comunicagio, a informagio esti mediada. (..) ainformagio dos meios de comunicacao de massa pode ser a mesma, mas 0 uso dessa informagéo, 0 valor que possui para a crianga na ela- boragao de uma imagem da realidade, se explica pelo sistema social, econdmico, familiar, de trabalho, escolar, de vizinhan¢a, ‘em que a crianga se desenvolve, mais do que pelos contetidos da comunicacao. Mesmo em se tratando da comunicacao infé conjunto de formas ¢ contetidos audiovisuais produ novas e novissimas tecnologias informatizadas (TVs, videos interativos), as responsabilidades, compromissos ¢ reflexes sobre o sentido dessas agdes comunicacionais se colocam para 68 adultos que convivem com criangas no dia a dia, sobretudo os educadores. ce Jembra artista Fayga 990, p: Seria preciso ver, no entanto, até que ponto essas formas se tornam expressiv 4qualificagies de vida. Pois, 6 como demonstragdes de tecnologia, criando formas isentas de sentimentos e afetos, equivaleria a produzir uma espécie de «atélogo ilustrado do desempenho téenico da maquina. Mesmo «que certos efeitos visuais possam ser excilantes num primeito ‘momento — o nfvel 6tico ainda nao € 0 ético; mas o estético sempre encerra o ético. co aNQUEDO SONCADEDA 2A EDUCAGAO 168 No plano ético contido no estético dos textos verbais, vi- nese conjunto composto por seus participantes, suas midias, seus sentimentos e concepcdes sobre a vida humana. Na histéria dessa grande teia de transmissoes, influéncias eelaboracées comunicacionais encontram-se, dentre outros, os, sentimentos ¢ ideias referentes a brintcadeiras eb mediadlos pelos textos apresentados em vi dades, audiovisualidades, verbalidades, poéticas na sociedade e posicionar-se sobre os mados de brincar e os brinquedas presen- tes nesses textos € no cotidiano da crianga contemporanea, & importante estudé-los. ‘Ao se emocionar e pensar diante de cenas de brincadeiras € de brinquedos veiculados pelas micias eletronicas — que produtores adultos Ihes oferecem —, os jovens usuérios participa de um conjunto de praticas comunicacionais pra- zerosas relacionadas a elas e desdobradas em seu cotidiano de contatos com pessoas em outros ambientes. Tais cconstatagdes sobre mfdias como TV na vida infantil, inclusive na escolar, mobilizando a formacao continua de professores de criangas, levam-nos a perguntas para estudo e pesquisa como as seguintes: éncias comunicacionais infantis com a midia (dentre outras), bem como com as pessoas de sua familia, seus vizinhos, sua escola, na atualidade, desen- volvemsee renovam-se com que preferéncias ou gostos, estéticos? E com que ideias? Como se processa esse desenvolvimento de preferénciase de ideias quando se trata, por exemplo, de brincadeiras e bringuedos? Ao participarem dessa rede viva de miiltiplas influén- cias, que sensibilidades ¢ entendimentos as criancas ‘TO MORCHA KISHIMOTO desvelam sobre suas vidas, as vidas das pessoas com as. quais interagem e do mundo da natureza e da cultura a0 qual sao contemporaneas? Que desvelamentos sobre as relagdes sociais se dao, permanecem ou se tra ‘mam na infancia, no caso de brincadeiras e brinquedos? Por qué? Para qué? Que sentimentos e conceitos os adultos educadores (pais, parentes, professores) assumem, desenvolvem e interferem cotidianamente junta as criangas espectado- ras de televisdo e outras midias? Com que finalidades € projeto educativo para a infancia? Como se caracte- rizam tais intervengdes quando se trata de brincadeiras brinquedos na vida infantil contemporanea? Que praticas educativas significativas e prazerosas ‘queremos/devemos criar, enquanto educadores, para ajudar criangas pequenasa transformarem para melhor, em suas vidas cotidianas, as brincadeiras e brinquedos que praticam, vinculados a vivéncias comunicacionais também com as telas televisivas? Que sugestdes e recomendagies queremos/devemos fazer, enquanto educadores, aos comunicadores que produzem felevisio para a infincia em nosso pats? ¢ na América Latina? E para o fluxo televisivo entre os diversos paises deste nosso planeta? Que sugestoes especificas devemos fazer a respeito de bons progra- ‘mase comerciais de TV sobre brinquedos e brincadeiras tendo em vista os processos inteiros de comunicagao com e para poraneos? iangas nos tempos e espacos contem- 1 sugestées para melhorar a televisio ‘recebida na infancia sabendo que a comunicagao com criangas inclui outras fontes e acdes informacionais mais htidicas ou nao sobre a vida e a cidadania? Por: qué? Para qué? > 0Go,BRPIQUEDO, RDICADERA ER EDUCAGEO 1 Questdes como essas nos mobilizam, entio—como pais, professores, futuros professores —, a buscar perceber melhor a largueza, a profundidade e a historia dessas comunicagSes sensiveis e cognitivas das criangas entre si, com as outras pessoas mais adultas (suas educadoras) e com os produtos culturais televisivos. Essa busca requer dos educadores e pesquisadores um longo e consistente caminho de estudo e formagao a partir de seus priprios conceitos, sentimentos © preconceitos existentes (@ a ser transformados) sobre essas comunicagies. Ora, se as finalidades da educagao escolar de criancas, adolescentes e adultos (inclusive os alunos que se formam para ser professores) sao as de contribuir para que seus participan- tes — educandos e educadores — aperfeigoem sua maneira de compreender, interpretar e ajudar a transformar, para melhor, ‘0 mundo contemporaneo da natureza e da cultura, tomna-se necessiria a criagao de condigdes para que tal contribuigao tadas) acontega também considerando-se seus nexos ¢ transformagées com relagéo a encontrada nas diversas midias e fora da escola. Neste texto, no pretendemos dar conta de reflexdes a uestdes (¢ outras) continue, em. lises sobre praticas comunicacionais com a infancia e midias como a televisio. Noambito dessas indagagdes e para mobilizar anslises dos leitores, abordaremos a seguir algumas opinides de estudantes em cursos formadores de professores, a respeito de brincadeiras e brinquedos veiculados em um programa de TV muito apreciado por um grande ntimero de criangas em nosso pais. Conside- ramos que 0 fato de tomarmos consciéncia de concepgies € sentimentos emitidos em programas de TV para criangas, nessa 1s paragrafosanterio—— "ako MORCHDR RSAMOTO area de vivéncia comunicacional Itidica, constitui um dos pas- 80 para frente nos estudos, com vistas ao aperfeigoamento de nossas priticas educativas com midias e seus usudrios presentes nos cursos escolares. Opinides de professorandos sobre brincadeiras e ‘brinquedos €m um trecho televisivo para criancas Com o objetivo de estudar priticas de anélise e reflexio sobre caracteristicas de brincadeiras e brinquedos propostos em programas de TV que as criancas vem, realizamos, entre 1987 e 1989, um trabalho com 235 alunos quese formavam para atuar como professores. Participaram desse estudo 69 alunosde quatro turmas de Pedagogia da Faculdade de Educacao da USP € 166 alunos de cinco turmas em escolas de 2° Grau-Magistério, na cidade de Sao Paulo. j Em uma primeira fase da pesquisa, todos esses estudantes ja haviam se manifestado (individualmente e por escrito) sobre seguinte questo: “quais so os problemas enfrentados por professores, em escolas piiblicas, 4 so de televisa video com e por seus alunos com idades entre 5 a 11 anos?” A maioria dos 235 professorandos, quase todos do sexo _ feminino, com idades entre 15 e 30 anos, explicitou um alto indice de problemas enfrentados por professores com telespec- tadores infantis presentes nas escolas. Apontaram problemsticas enfrentadas sobretuco quanto as préprias criarigas telespecta-_ doras (por se mostrarem imitadoras acriticas de personagens € conceitos televisivos, bem como pouco criativas nas aulas ¢ brincadeiras desenvolvidas na escola) e quanto a suas escolas ¢ Professores (por se mostrarem com saberes insuficientes sobre 05) > G0, ouEDo wemcaDen FA EDUCAGO 8 modos de trabathar pedagogicamente com a TV nas escolas e com as concepgdes distorcidas da realidade, assimiladas pelas criangas via TV). Para estudar melhor essa problematica e os modos criati- Vos e éticos de superé-la, alguns professorandos participantes da pesquisa manifestaram-se (durante aulas de Didatica e de Educagao e Meios de Comunicacao) a respeito de um dos Programas de TV para criaucas. Encontram-se expostos nesta Publicacao aspectos mais ampliados (que em outras publica- ‘$0es) dessa parte da pesquisa," Serdo apresentadas as opiniGes € discusses de 67 dentre 0s 235 professorandos (sendo 22 de 's de Pedagogia e 45 de duas turmas de Magistério), incadeirase brinquedos" existentes em um trecho de cinco minutos de um programa de TV brasileira (Globo) para a infancia, veiculado durante a "Semana da Crianga”’, em 5 de outubro de 1987: 0 “Xou da Xuxa”® Para se ter uma ideia da “audiovisualidade” do referido texto televisivo, segue-se um resumo que descreve aspectos de sua sequéncia sonora e de sua ambiéncia visual: a) a sequéncia sonora (verbal, oral, musical, cantada) de- senvolvendo a brincadeira com os bringuedos bambolés __coloridos (a serem acertados em garrafa gigante de 1. REZENDE E-FUSARI, Maria F. de. Meas de comunisagio na _refessors: televise video em questi, 1990, Tese (Doutorado) —— Psicologia, Universidade de Sto Paulo, So Paulo; REZENDE E FUSARI, Mara F dle Televisio e video na formacio de professors de criangas. Ifercom —— Revista ‘Brasileira de Comunioagi, So Pao, 170: p. 42-57, 19, 2 Os ertérios de escoha do trecho do programa Xow da Xua veiculado ‘os anos 1989, diariamente (entre 8h e para a escola ou voltando dea; a /um dos desenhos animados de grande preferéncia Proximidacte com a semana eo Dia da Crianga ‘genlado nio apenas pela TY, mas também pelo comérco, familias e escola, ‘Mauro ORCHID KSENOTO guarand Antarctica) no tempo e espaco de cinco minu- tos do programa foi a seguinte: (fundo musical do Xou da Xuxa) Xuxa: Grande astral, grande mesmo... Vocé jé sabe? Ai, Praga, que ¢ isso Praga? Contenha-se, Praga, por fa- vor! Voc® jd sabe que més de outubro é més de qué? Ah, voeé ja sabe? Deixa eu ver, deixa eu ver: quem ta a fim de falar pra mim? Entao, vem, Fernanda. Més de outubro é més de qué, Fernanda? Crianga (Fernanda): Da Crianga, Xuxa: E 0 que mais, pra voce? (Crianga (Fernanda): da Xuxa. Xuxa; Aaaai. Ald, al6, calma, calma, calma. Boa ideia, boa ideia, adorei a sua ideia, me amarrei. De novo, més de outubro... quem té a fim de falar pra mim? més de outubro... Criana (Marcele) Xuxa: Quem ¢, Marcele? Més de outubro é més... Crianga (Marcele): Da paz, do amor, da Xuxa. 0C0.gRNQUEDO, ENCADEEAEAEDUCAGRO m ia a brincadeira, acompanhada do coro de torcida 16 criangas: primeiro a menina, depois, o menino, jentando acertar 0 bambolé na garrafa gigante.) Criangas: Pique fraco, pique fraco, pique fraco, pique fraco, pique fraco, pique fraco, fraco, pique fraco, pique fraco, pique fraco.. Xuxa: Nenhuma, ein Nadege, é mole? Nenhuma Nade~ ge? Duilson, se voce conseguir acertar bambolé na Antarctica, vocé jé ¢ 0 vencedor, ein? Boa sorte pra pique fraco, pique total, pique total, ique total ique total! oh, Duilson, quase, quase... Se voce fizesse 8, seria nosso record. Pra bater nosso record teria queser 9, Volta outro dia pra ver se vocé ganha nessa, ein, que tal? Vai ganhar muita coisa, mas 0 vencedorainda é 0 Duilson. E a Nadege tirou 2’ lugar 36, gostaram Bom, agora vai set a brincadeira do “Acerte a Minh: Colega de Trabalho Antarctica que E Pura e Natur ‘Temosa Na... Nadege como Duilson. £ isso? Duilsone Nadege, né? Entao, voces, cada vez.que vocds jogarem © bambolé na Antarctica, se errar, € pique fraco, se acertar, pique total, ? Onosso record foram 8.Se voces conseguirem 9, vocés sero os vencedores, assim de record, 48? Vio ganhar alm da Antarctica, brinquedos, revista, disco, péster etc, etc. ete, tébom? Vamos ver, entéo, quem vai ganhar? An? Prr.. jimbo pra quem’ Nadege: Pra minha mae, pras minhas irmas e pra vood. Xunxa: Brigada, Nadege, parabéns, viu... Agora oDuilson, mesmo, queéo vencedor, vai dizer comigo: Guarana Antarctica que é puro e natural, guarand Antarctica que é puro e natural, guarané Antarctica é puro, puro, puro e natural... Mas tem que falar rapido, ta? Duilson (falando répico): Guarand Antarctica queé puro natural, guarané Antarctica que é puro e natural, guarand Antarctica é puro, puro, puro e natural... Xuxa: Boa, Duilson... E vai mandar beijinho pra quem? Duilson: Pra minha mae, pro meu pai e pra voce. ‘Xuxa: Brigada, Duilson, parabéns, viv... Eagora vamos curtir Ewoks ¢ eu volto.... Legal ver vocé, que bom que voc’ td af. (Xuxa dirige sua fala para os telespectadores; em se= guida, dubla e dana trecho de mtisica cantada por ela ‘mesma e que estava servindo de fundo musical durante a brincadeira.) Xuxa (cantando e dangando): “Todo mundo diz. que ‘eu sou louca por vocé/ nada do mundo me da tanta ‘emogao/ de sentir que vocé conquistou meu coracio/ ‘diz bem baixinho que s6 gosta de mim/ nao sei o que fazer/ tudo 0 que eu faco (..)" (inicia-se © Desenho Animado Ewoks: Rampage of the Philogs — O ataque dos Phlogs produzido por Paul Dini ‘uma distribuigao Fox Filme do Brasil — verso brasi- leira Herbert Richard.) b) a ambiéncia visual desse trecho do Xou da Xuxa apre- sentou uma Xuxa vestida de cor-de-rosa, rodeada do ‘personagem Praga ede criangas em movimento, muitas ‘cores, além de uma garrafa de guaran Antarctica (pou- ‘co maior que a apresentadora) e de grandes bambolés coloridos destinados a uma agao lidica competitiva + entre criangas presentes naquela situagao comunicacio- nal. As imagens iniciais do referido segmento televisivo apresentaram-se com tomadas (em Grande Plano) em queapareciam na tela o grupo todo Xuxa-criangas-cend- > Go, BRIRQUEDO,BRINCADEIRAE A EDUCAGAO a rio-Praga, este tiltimo, engatinhando pelo chaoe tentan- do passar entre as pernas de Xuxa;em seguida, durante 0 didlogo da Xuxa com a primeira crianga (Fernanda), 0s telespectadores as viram desde a cabeca até pouco, mais que os ombros (ou seja,em Plano Médio Fechado) e, de novo, em imagens do grupo todo, incl garrafa gigante do guarana Antarctica, Nos trocados entre Xuxa e a erianga (Marcele), mostrou-as mais de perto pouco mais que seus rostos (em close). Apés isso, as imagens abriram-se (em Plano Geral), apresentando na tela a Xuxa, a garrafa gigante de guarana Antarctica, as criangas competidoras eas do coro de torcida na brincadeira. De novo, 0s telespecta- ores viram (em close) 0s rostos até pouco mais que os, ‘ombros das criancas competidoras (Nadege e Duilson) da Xuxa, quando enviaram beijinhos, beijaram a Xuxae quando umadelas repetitt varias vezes e rapidamente a frase sobre oguarané Antarctica. Finalmente, aimagem da Xuxa apareceu de “rosto € ombros” quando ela se dirigiu aos telespectadores, dangou e cantou o trecho da musica; passou-se, em seguida, para o desenho animado anunciado. Os trabalhos de anilise, pelos professorandos, desse trecho televisive do Xow da Xuxu foram organizados, como dissemos, durante as aulas de Didética e de Educagio e Meios ‘de Comunicagio—TV e Video. Os alunos de Pedagogia ede formaram, por escrito, 0 seguinte: a) seu conhe- {to anterior sobre o tal segmento de programa e sobre 08 telespectadores que o veem com assiduidade; e b) de que gostaram e de que nao gostaram do trecho; por que e 0 que mudariam no segmento analisado, pensando nos telespecta- lade, inocéncia, Tais razdes mostraram algumas das existentes no ideario de professorandos a respeito de brincadeiras e de crianga. O que os professorandos ndo gostaram no trecho do Xou da Xuxa e por qué ‘Omaior indice de nao aceitagao do trecho do Xou da Xuxa analisado recaiu também (e contraditoriamente) na categoria contetidojforma e método de comunicacio. Os alunos de Pedagogia (64.3% das opinides) ¢ de Magistério (50,9%) desaprovaram en- faticamente a brincadeira competition centrada no antincio (comer- Gal) de refrigerante (guarand Antarctica). Os professorandos -mostraram-se contrérios, também, ao seguinte: acrianga “ven- cedora” repetindo a frase do antincio (do refrigerante) como em .g0 de palavras; 0 coro de criangas gritando “pique total” ‘pique fraco” para acertos e erros dos bambolés na garrafa gigante; a esse tipo de competicao para criangas bem como ao tratamento desigual dado pela Xuxa as criangas, valorizando ‘o menino ganhador, desincentivando a menina perdedora na ‘competicao e dando brindes apenas ao vencedor; a instigacao_ ‘de competigao entre meninos e meninas; ao tamanho muito gtande do alvo (a garrafa) para acertarem os bambolés; a pro- dugio técnico-expressiva confusa em sons altos e excesso de formas visuais; a esse tipo de brincadeira competitiva entre os sexos, com intervengao desigual da animadora e organizadores adultos (no caso, a Xuxa e seus produtores), tendo em vista «que as relagées interpessoais da populagao na sociedade como ‘um todo devem ser educadas no sentido de se tornarem mais justas, menos desiguais. © segundo maior indice de nao aceitagao (18,5% Peda- gogia; 28,7% Magistério) recaiu na animadora do programa, a ¥ G0 sRQUEDO SRNCADERAEAEDUCAGRO Xuxa, pelo fato de ela se autopromover logo apés a brincadeira fa entre meninos e meninas com “comercial” para si propria (levando as criangas a responderem em coro, por exemplo, que més de outubro é més da... Xuxa... beijinhos, bejjinhos). Desaprovaram, também, 0 fato de ela se exibir em excesso, relacionar-se com as criangas (e demais personagens do programa) com trejeitos, inducionismos e de modo comer- cial desnecessarios, além de valorizar fortemente a crianga ganhadora e pouco incentivar a perdedora. Nao aceitaram (168% dos pedagogos; 8,2% de magistério) o fato de a crianga inte no programa, dentro do est gritar as indugdes comerci ‘Quanto aos telespectadores e aos objetivos de comunicagéo do programa para as criangas, os professorandos desaprovaram colocagao de antincios (merchandising), no interior de uma agao de brincar com brinquedos, ¢ voltados a “ganhar” o consumo de produtos (no caso, refrigerantes) pelas criangas. As principnis razdes de ndo aceitagio (65,7% de Pedagogia; 66,7% de Magistério) por parte dos professorandos quanto aos aspectos acima referidos foram: posicionarem-se contrérios a obrigar criangas a brincarem com produtos e antincios comer- ini em programas televisivosdirgidos a clase deturpapo do brineads .da pelos prod do programa, Que mudancas os professorandos sugeriram para melhorar ‘otrecho do Xou da Xuxa O maior indice de propostas de transformacio (87,6% de Pedagogia e 71,5% de Magistério) para melhorar o trecho televisivo discutido incidiu também sobre 0 seu contetido/for- ‘ma e método de comunicagio. A mudanga mais sugerida é que das indicages de permanéncia de produtos e antincios mas de modo reduzido e deslocado para outro espaco do programa. As demais mudangas sugeridas nessa categoria foram: a) garantir, realmente, a participagao de todas as criangas presentes no esttidio de produgéo do programa; nao permitir coros, torcidas constrangedoras para a crian= a; dar outras chances para as criangas que perdem nos jogos; garantir distribuicdo mais igualitaria de prémios; dar informagées mais claras sobre as brinca- deiras; garantir participacao mais natural, espontanea da crianga; b) fazer prevalecero sentido fundamental de brincadeira, debrincar na infancia; organizar brincadeiras mais vol- tadas para as criancas da realidade brasileira; garantir brincadeiras mais inventivas, bem como outras infor- mages titeis para as criangas no programa; diversificar ‘0s tipos de brincadeiras, mesmo que dirigidas; e de seu sentido na comunicagao com as criangas. A outra categoria que recebeu 0 segundo maior indice de sugestdes de mudanca (8,1% de Pedagogia e 154% os de juanto a animadora do programa. Assi cam a necessidade de a Xwxa tedi gestos, aces, indugdes & autopromogao, bem como ser redlista e menos polo centralizador da telagdo comunicacio- nal no programa, Sugerem que teduza a énfase no vencedor eno perdedor das brincadeiras. Apenas dois professorandos consideraram necessério mudar a animadora desse programa > Go saINQUEDO, BEINCADEIRAE A EDUCAGAO televisivo para criangas por outra que se apresente mais verda- deira, |. Houve a sugestdo de mudanca nutros adultos (personagens) no programa (como, por exemplo, o Praga). Solicitaram que as criangas, dentro do programa, sejam mais respeitadas em sua liberdade de criar ¢ inventar durante a brincadeira e que as criangas telespectadoras possam assistir, do outro lado da teli- noha, a brincadeiras mais interessantes, nas quais elas tenham, também, participagao de melhor qualidade para o desenvolvi- mento de suas vidas infantis. Em suma, os professorandos constataram que no referido trecho do Xou da Xuxa no foi oferecido um espaco/tempo de brrincadeira de boa qualidade as criangas presentes no esttidio de produgio televisiva. A agao de brincar nao foi realmente desen- volvida pelos grupos infantis participantes daquela situagio. F os seus pequenos telespectadores, do outro lado da telinha? que seus “olhares conheceram sentindo e sentiram_ conhecendo” sobre brinquedos e brincadeiras vivenciadas por criangas sob a coordenagao de um adulto? Com que qualidades cesses sentimentos e cognigdes desdobraram-se em seus cotidia- nos com seus irmaos, colegas, pais, professores? Bis uma inda- -gacko que precisa ser objeto de outras pesquisas e praticas. —_ Para continuar a mobilizar opinides e praticas de professores sobre a TV ea vida das criancas: realizar projetos de esperanca partir do existente A visio de mundo que as criangas adquirem, descobrem, desenvolvem em diversas dreas —dentre elasa de agdes lidicas, com brinquedos e brincadeiras — nao pode ser considerada como origindria exclusivamente, como jé dissemos, dos meios de comunicagio dos quais partilham enquanto espectadoras, usudrias ou coparticipantes de produgao. Estudar aperfeigoamentos na qualidade das brincadeiras brinquedios presentes em programas e comerciais televisivos continua sendo necessirio. Ao mesmo tempo, transformagdes pprecisam ocorrer nos modos de pais, professores e professo- randos participarem mais criativa eeticamente das elaborages € desdobramentos que as criangas fazem em suas emogdes, ideias, atitudes liidicas diante dos programas de TV. Essas intervengGes educativas podem ser organizadas com o intuito de propiciar outras experiéncias Iidicas modi sentimentos e ideias vivenciados pela mediago televisiva. Para {sso 6 necessario analisar os programas da televisdo, das outras dias, as praticas de usuarios com eles ecoma vida cotidiana. Ea psicanalista e jornalista Maria Rita Kehl (1991, p. 70) quem nos diz: “quem poderd desencantar esta crianga enfeitigada? O beijo da experiéncia talvez seja capaz disto—e aqui quero opor a experiéncia do contato direto com os objetos, a experiéncia das tentativas de transpor o: da obtengio de alguns sucessos mas também de fracassos neste 1a experiéncia no vivida ‘adquiridla’ pela assimilacao do discurso televisivo”* a 3. Valelembrar que, nesta pesquisa com professores em formagio, os progra- ‘mas de TV foram considerados apenas como um dos companentes comunicacionais 1a vida das criangas brasileira telespeetadoras. Por essa razio, na sequeéncia do ada uma terceia fase, ra qual tum trabalho mais aprofundado fo apenas com os 2estudantes de Pedagogia da USP, partcipantes da pesquisa. Tendoem mios os exists das opi- rides dos ahinos de Magistério eos seus prprios, osprofessorandas de Pedagogia vivenciaram uma aula de discusses sobre esses posicionamentos,além dereverem © trecho televisivo estudado, Em pequenos grupos, analisaram as semelhangas ¢ dliferencas enre suas opinidese as das estudantes das escolas médias. Redigiram, também, “Bilhetes Pedagogicos” sobre “ReinvengSe Telespectacoras com Criangas: , co, RINQUEDO BRDICADEIAE A EDUCAGRO Esses estudos so necessérios na atuali crianeas, as midias (e seus produtores) das q siduas usudrias e as pessoas de sua convivéncia mais préxima na infincia (pais, irmaos, parentes, amigos, professores, colegas) compdem um complexo proceso comunicacional e educativo de sentimentos, ideias e atitudes mais emancipatérias ou nao sobre a vida contemporanea. As criangas atuam e aprendem, nas relagdes comunicacionais cotidianas, a conservar ou a transformar aspectos da realidade e da imaginagao sobre a vida e sobre sua historia, partilhados com muiiltiplos textos dos meios de comunicagéo visuais, sonoros, audiovisu (informatizados ou nao) e com pessoas de sua familiaridade, inclusive seus professores. Nos cursos de graduagao e nas escolas, nés, os formado- res de educadores de criangas, precisamos aperfeigoar nossas, pesquisas e modos de organizar e de desenvolver melhores projetos de iniciacdo e de formagao continua de professores em. icagdo escolar, também, a respeito da produgao social do lidico, incluindo saber sobre as médias presentes na vida das criangas, seus alunos. No dizer da filésofa e educadora Terezinha Rios (1993, p. 75-6), 2ideia de projeto, ea de utopia, quea abriga, esta sempre ligada alideia de esperanga (..) Esperanca é movimento. Ela ¢ ‘alimen- tada’, sustentada exatamente pela agio do homem, que explora as potencialidades do presente, comegando a eriar af o futuro. (O verbo da utopia 6 esperancar. Nao se trata de esperar poralgo ‘riago de outras experinias de brincadeiras com bringuevdos na inFincia, ‘melhor, mas de, utilizando os recursos de que dispomos e que vamos construindo, planejar e mobilizar desde ja 0 esforgo na realizagio do ideal. Um dos modos de mobilizar estudantes de Educagao a aperfeicoar suas pesquisas sobre a comunicagao e midias referentes, no caso, a brincadeiras e brinquedos para criangas é ajudé-los a conhecer suas opinides nessa 4rea, conversar sobre elas, pensar por que conservé-las ou em que transformé-las no Ambito de um projeto educativo hidico para a infancia, mediado pela ética e estética, Este é um ideal que esperamos construir a .des comunicacionais e midiatizadas em que Pp; KOULOUMDJIAN, M. F. Os novos modos de compreender: a .geragio do audiovisual e do computador. 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