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As vezes, nos esquecemos que, um dia, nossos pais também foram criancas. MINHA MAE CRIANCA Cheguei da escola e vi a porta do quarto aberta, a porta do armario aberta, e minha mae sentada no chdo, descalca, toda despenteada, com uma caixa fechada na mao. Dei um beijo nela e olhei para a caixa. Era a coisa mais linda do mundo, toda de madeira, mas madeira de cores diferentes, umas mais caras, outras mais escuras, formando um desenho, uma paisagem, onde tinha um morro, uma casinha, um pinheio, umas nuvens no eu. Ai minha mae abriva caixa e tou de dentro, bem la do fundo, um envelope de papel pardo, velho © meio amassado. — Que & que tem ai dentro, mae? Nem me lembromais, minha fila. Vamos ver. Deve ser muita coisa, que o envelope esta bem gordinho, E era mesmo. Um monte de retratos. Tinha um com pessoas sérias numa praga. Tinha outto com uma familia toda, cheia de criangas @ até um cachorro, bem debaixo da estatua do Cristo Redentor. Tinha mais um de uma menina com dois lagarotes de fta na cabega, no meio de ura Planta esquisita, uma espécie de moita em forma de camelo, imagine sé. Fiquei espantada, —Como & que poce, mae, planta que parece bicho? = E que eles cortavam a moita assim, era moda, umas redoncinhas, outras em feito de poltrona, outra com formato de bicho. Era na Praca Paris, um lugar com laguinho e reouxo, chafariz {ue acendia colorido de noite, Parecia um balao d gua bem aceso no chao. — Como é que voo’ sabe disso tudo, mse? Eure lembro, minha fa. Essa menina af sou eu. — Nao é possivel. Vooé esta brincando.. Eu olhava para mnha mae e para o retrato da menina, achava meio engragado aauilo, minha mde ctianca, brincando no galho de um camelo, pensando em baldo d'agua. E era meio esquisito, ela grande ali na minha frente, sentada no chao, expicando coisas, toda armada: — A gente ia de bande, era étimo, fresquinho, todo aberto. As vezes tinha reboque. Quando a gente pagava a passagem, 0 motomeiro puxava uma cordinha e focava uma campainha, ai mudava um numero numa espécie de relogio que ficava la no alto marcava quentas pessoas Viajavam no bonde. Eu ficava imaginando como seria aquilo, sabia que bonde era uma espécie de trem de ‘cidade, i que tinha visto em filme na televisdo, queria saber mais: — E quando © motomeiro puxava a cordinha, no tinha que largar do motor? Nao era pperigoso? ‘Mamae achou graca: — Néo, que ideia! Bonde era a coisa menos perigosa do mundo. E o motomeiro néo tinha nada a ver com 0 motor, ele sé cobrava, o nome é que parece... Quem dirigia era 0 condutor. (MACHADO, Ana Maria, Bisa Bia, Bisa Bel. Rio de Janeiro: Salamandra,) Vocabulario: pardo — de cor pouco brihante, ertre o amarelo e 0 castanho feitio—jeito, forma repuxo — chafariz em lago ou fonte ‘chafariz — font artificial com uma ou varias bieas, por onde jorra agua motorneiro — funcionario que cobrava as passagens no bonde 1) “Eu olhava para minha mae e para o retrato da menina, achava meio engragado aquilo, minha mae crianea, brineando no galho de um camelo. pensando em baldo d aqua E era meio esquisito, ela grande ali na minha frente, sentada no chao, explicando coisas, toda animada: — A gente ia de bonde, eva étimo, fresquinho, todo aberto. As vezes tinha reboque. Quando 2 genie pagava 2 passagem, 0 moiomeito puxava uma cordinha © tocava uma campainha, ai mudava um numeso numa espécie de seldgio que ficava I no alto © marcava ‘quantas pessoas viajavam no bonce.” Do trecho acima, rete as palavras destacadas e insira na tabela levando em ‘considerapéo a silaba ténca: coxitonas

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