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Após o meu primeiro post sobre o assunto, recebi novas perguntas sobre a questão da
guarda do Domingo, o dia do Senhor. À luz da forma como observo este dia
perguntaram-me se, na prática, o que faço não corresponde exatamente ao que é
ensinado pela tradição puritana e a confissão de Westminster. Sinto, portanto, que devo
mais alguns esclarecimentos.
2) A instituição do Sábado só foi estabelecida por Deus por meio da Lei de Moisés. (Ex
16.23; 20.8-11; Dt 5.12-15; Ne 9.13-14) Debaixo da lei mosaica, o Sábado serviu como
um sinal da aliança entre Deus e a nação de Israel e, por conseguinte, como um marco
na identidade nacional do povo escolhido. (Ex 31.12-17; 35.1-3) Daí a sua importância
vital para a distinção de Israel como a nação escolhida dentre todas as demais e o rigor
da lei em preservar esse dia. (Ne 10.31-33; 13.15-22) Além de servir como um dia de
descanso, o Sábado também serviu como um dia de assembleia solene e adoração ao
Senhor. (Lv 23.3).
É importante notar, porém, que em nenhum momento a lei mosaica embasou a guarda
do Sábado em uma instituição própria da ordem da criação (tal qual o casamento, por
exemplo); por isso, ele jamais tornou-se obrigatório a toda a raça humana. (Em vários
momentos do Antigo Testamento, o Senhor, por meio dos seus profetas, condenou as
nações pela sua idolatria e imoralidade, mas em nenhum momento Ele as condenou por
não guardarem o Sábado). O Sábado era tido como um sinal especial do favor de Deus
sobre Israel e da dependência de Israel do seu Senhor. As bênçãos e as maldições
decorrentes da guarda ou não desse dia dependiam desse reconhecimento e dessa
dependência confiante de Israel na provisão e na proteção do seu Senhor, o Criador e
Resgatador. (Ex 20.8-11; Dt 5.12-15).
Quando chegamos nos escritos de Paulo, tal descontinuidade cresce ainda mais a ponto
de ouvirmos o apóstolo dizer que cada um deve estar convicto em sua própria mente
quanto à distinção entre dias da semana, sem fazer disso uma prova de comunhão. (Rm
14.5) Paulo chega a dizer que os dias de sábado, tal qual as restrições alimentares do
Antigo Testamento, eram meras “sombras de Cristo”. (Cl 2.16-17) Portanto, fica claro
que a instituição do Sábado – com todas as suas restrições e obrigações definidas pela
lei mosaica – já foi cumprida em Cristo e não mais incide sobre a Igreja.
4) Por tudo isso, não creio que a guarda de um dia de descanso em cada sete seja uma
obrigação moral da Igreja (muito menos dos que não pertencem à comunidade dos
remidos). Como Paulo deixa claro, ninguém está proibido de enxergar um dia da
semana como sendo mais especial que os demais, nem tampouco de não enxergá-lo
assim. Porém, ninguém está autorizado a defender essa distinção de dias como uma
obrigação moral de toda a Igreja, sob pena de ser mais rigoroso que o próprio
Evangelho. (Rm 14.5-8,13; Cl 2.16-17).
Agora, embora creia que o Sábado não esteja mais em vigor tal qual exposto na lei
mosaica – com todas as suas prescrições e repreensões para os que o profanam –,
defendo a importância do princípio espiritual que ele transmitiu a Israel e que foi
ressaltado pelo próprio Senhor Jesus Cristo. Aqui, respaldo-me na própria abordagem
de João Calvino que, curiosamente, não defendeu o Sábado com o rigor dos mestres
puritanos e da Confissão de Westminster (veja as Institutas, II.viii.28,31,33,36).
1) Que separemos um dia em cada sete para nos reunirmos como Igreja, o povo de
Deus, para adorar ao Senhor e reconhecer a sua provisão soberana sobre as nossas vidas
– tal qual Israel o fazia no Sábado (Lv 23.3) e a Igreja passou a fazê-lo no Domingo (At
20.7; 1Co 16.1-2; Ap 1.10).
2) Que tiremos um dia em cada sete para descansarmos dos nossos trabalhos e afazeres
cotidianos, reconhecendo que Deus não nos criou exclusivamente para o trabalho, mas
também para o descanso e o reconhecimento do seu controle soberano sobre as nossas
vidas. (Mc 2.23-28).
3) Principalmente, que confiemos na obra consumada de Cristo Jesus, que alcançou para
nós um descanso eterno que ninguém jamais pode alcançar pelo seu esforço próprio.
(Mt 11.28-30; Hb 4.9-10).
Em suma, o Sábado não estava apenas envolto em sombras, como era uma própria
sombra de um descanso muito maior. Ele serviu de sombra para a realidade que
conhecemos e desfrutamos no Evangelho – o perdão dos nossos pecados e a salvação
eterna em Cristo. E agora, por sabedoria e gratidão, convém que descansemos um dia
em cada sete – de preferência no Domingo – para adorar ao Senhor junto com a Igreja
por esse descanso imerecido e para anunciar o descanso eterno que nos aguarda no
porvir com Cristo.