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' eal te Acdes h Episodios | 7.0 awe al cE C pac a) = Econom ch = CAMPUS wou Preencha a ficha de eadastro no final deste livro e receba gratuitamente informagdes sobre os lancamentos e as promogoes da Editora Campus/Elsevier. Consulte também nosso catalogo completo e uitimos langamentos em www.elsevier.com.br ©2009, Elsevier Ecitora Lida. ‘Todos 08 direitos reservados e protegidos pela Let n® 9.610, de 19/02/1998. Nonhuma parte deste livro, sem autorizagao prévia por escrito da ecitora, poderd ser reproduzida ou ‘ransmitida sojam quais form os meios empregados: clatrGnices, mecanices, fotograticos, gravagao ou quaisquer outros. Copidesque: Shirley Lima da Silva Braz Rovisdo: Andréa Campos Bivar ¢ Jussara Bivar Ealtoragao Eletrénica: Estudio Castellani Elsovier Editora Lida, Conhacimento som Frontoiras Pua Sete de Setombro, 111 - 16: andar 2050-008 — Centro — Ria de Janeiro — RJ — Brasil lua Quintana, 759 - 9° andar (04569-011 — Brooklin - Sao Paulo - SP Sarvigo da Atondimento ao Ciionto ‘0900-0265940 sac@ elsevier comer ISBN 078-85.252.9528-9 Nota: Muito zelo¢ técnica foram empregados na edieao desta obra. No entanto, podem ocorrererros de digtagao, impressao ou divida conceltual. Em qualquer das hipéteses, solicitamos a camunicagao ao nosso Servigo de ‘Atendimento ao Cliente, para que possamos esclarecer ou encaminhar a quastao. Nom @ editora nem 0 autor assumem qualquer responsabilidade por aventuais danos ou perdas a passoas ‘oubens, originados do uso desta publicagao. CIP-Brasil, Catalogagao-na-tonte Sindicato Nacional dos Exitoras de Livros, AJ Paam Portinho, Paulo (© mercado de ages em 25 episédios : historias, estuco @ Grbnicas sobre o mercada de agdes / Paulo Partinho. - Rio de Janeiro : Elsevier, 2000. ISBN 079-85.952.9528.9 4. AgBes (Finangas).2. Investimentos. 9. Mercado de ages. |. Thue. 09-2493, Db: 22,6322 CDU: 336.76 Apresentac¢ao E com grande prazer que apresento este livro, que considero mais uma importante iniciativa no caminho da consecugao do objetivo do Instituto Nacional de Investidores (INI), tio bem retratado em seu slogan: Forman- do Investidores Conscientes. Hoje, avaliando 0 passado, podemos contabilizar 0 resultado de um tra- balho que, de certa forma esta retratado nas histérias, estudos e cronicas que compéem o livro. Em 2003, quando assumi a implantagao do INI, sabia que se tratava de um grande desafio: partir do zero e ajudar a construir uma cultura de investimento no mercado de acoes brasileiro especialmente voltado para as pessoas fisicas, individuos com pouco ou sem nenhum conhecimento dessa matéria, num ambiente onde pairavam grandes diividas em relacio ao futuro da politica econémica do pais, Como primeiro passo, convidei Paulo Portinho, com quem ja tivera oportunidade de trabalhar em projetos de avaliagdo de empresas, para ser parceiro no processo de levar adiante aquela instigante empreitada. Desde 0 principio, Portinho — como gosta de ser tratado — entregou-se a tarefa de formatar 0 contetido educativo do nosso instituto, participando da tradugao do nosso livro-texto bisico, Guia Oficial do INT e escrevendo, em coautoria com Ueliton de Carvalho, o Manual Técnico, que trata do roteiro do Método INT de selecao de empresas de crescimento, com exemplos aplica- dos a empresas brasileiras. Portinho elaborou 0 modelo bisico dos cursos da metodologia adotada, utilizado pelos nossos Membros Orientadores e, 1 Como Constituir ¢ Administrar um Clube de Investimento Rentivel, de Thomas E. O'Hara Kenneth 8, Janke, autores do original Starting and Running a Profitable Invest ment Club, da National Association Investor Corporation, atualizado pela edisio de 1998. desde junho de 2005, tem sido o articulista dos textos do Informativo INI, de periodicidade mensal, que ilustra os cinco principios de investimentos do INI, ¢ aspectos gerais do mercado, sempre com perspectiva educativa. A edicao deste livro baseia-se, em grande medida, justamente nos arti- gos elaborados para o informativo, a0 longo de suas 48 edig6es, e foi com satisfacZo que aceitei a incumbéncia da revisdo técnica dos textos, trabalho que realizei com grande prazer. Com uma linguagem clara, despretensiosa, longe do academicismo, um estilo agradavel de prosa, Portinho consegue transmitir, e esclarecer, de forma altamente didatica, desde os conceitos mais simples até as opera- des mais complexas existentes no mercado de capitais, permeando temas to diversos quanto a explicagiio dos problemas ocorridos com 0 subprime americano, valuation, ou um simples ajuste de cotagdo das agées em fungao de direitos distribuidos, como dividendos e bonificag6es. Certamente, os associados do instituto e investidores que compdem nossa comunidade ja estio familiarizados com alguns dos temas dos capitulos que integram o livro. Mas, mesmo para eles, muitas surpresas ainda estao reserva- das no decorrer do texto, incorporando os aspectos vivenciados nesses tiltimos tempos da crise que o mercado de agdes mundial vem atravessando. Um aspecto bastante interessante na formatagao desta obra é a indepen- déncia relativa de seus “episddios’: pode-se ler alternadamente qualquer capitulo, sem prejuizo da compreensao do contexto da obra. Assim, pode-se iniciar a leitura pela histéria do “Arnaldo”, um inves- tidor de sucesso, que aprendeu a ter uma atuacdo consciente; migrar para entender 0 que houve com o mercado de agdes do Japio; aprender como se calcula o prego ex-direito de uma ago, ou aprofundar-se em qualquer um dos cinco princfpios bisicos de investimento do INI, com exemplos extremamente claros e pertinentes. Tenho conviccao de que os leitores terio o sabor de “passear” por seus temas — que, tratados de outra forma poderiam parecer terreno arido — de maneira extremamente agradavel. Desejo entao boa leitura e um bom proveito, em companhia de Paulo Portinho, na caminhada de tornar-se um investidor consciente! ‘Théo Rodrigues Diretor Geral Instituto Nacional de Investidores maio de 2009 Prefacio Ea simplicidade se apresenta... Sao Paulo, 25 de agosto de 2004, dia da inauguracao oficial do Instituto Nacional de Investidores (INI). Evento grande, com Aula Magna do entio presidente da CVM, Marcelo Trindade, ¢ a presenga de importantes per- sonalidades do mercado de ages. Para quase todas as pessoas, naquele momento, o INI poderia parecer apenas mais uma iniciativa - como tantas outras - que surgia para apoiar e desenvolver o mercado de agées. Poucas pessoas, naquele momento, devem ter percebido o grande diferencial que se estava trazendo para o mercado de agoes brasileiro. A simplicidade. O instituto tornou-se o representante oficial de uma filosofia de in- vestimento em acoes aplicada em mais de 20 paises, e principalmente por nao iniciados nas sofisticadas técenicas de mercado. Sao pessoas comuns, que absorveram com grande facilidade os principios sugeridos por Tom O'Hara e 0 método inventado por George Nicholson. Tom O’Hara uniu investidores, no final da década de 1940 inicio da década de 1950, em torno de trés princfpios de investimento: (1) inves- tir regularmente; (2) reinvestir todos os ganhos e (3) investir somente em empresas de crescimento. Construiu uma organizacdo intitulada NAIC (National Association of Investors Corporation) e teve seus principios di- fundidos em mais de 20 pafses para um nimero superior a 10 milhées de investidores, ao longo dos tiltimos 60 anos. George Nicholson, alguns anos depois, introduziu uma ferramenta am- plamente utilizada por investidores nos quatro cantos do mundo, o Stock Selection Guide (SSG). Com essa ferramenta, o investidor deixa de lado os “achismos” ¢ as “dicas” para fazer uma investigagio séria sobre a companhia em que deseja investir. Com as criagGes e o empreendedorismo desses dois visiondrios, um grande contingente de cidadios comuns, em atividades alheias a0 mercado de agées, como donas de casa, motoristas de Gnibus, enfermeiras, advo- gados, médicos, atendentes de supermercado etc., pode investir de forma consciente e racional, sem que, para tanto, tivesse de comecar se especia- lizando em anilises de balango ou em técnicas para calcular fluxo de caixa descontado. Ah, e mais importante, longe dos comportamentos de risco dissemina- dos sem qualquer restrigao aos iniciantes em bolsa de valores. Episédios versus capitulos Normalmente, os livros sobre mercado de ages trazem uma légica li- near entre seus capitulos. As vezes, o entendimento de um capitulo requer a leitura prévia de um anterior ou, ainda, necessita de algum pré-requisito para sua compreensao. Este livro é diferente. O leitor j4 deve ter assistido e acompanhado alguma série ou novela de televisio, Mesmo que nao seja assiduo, esta familiarizado com a diferenga entre um capitulo de novela e um episédio de série. Enquanto nas novelas ha um encadeamento légico das cenas e dos capitulos, para que a trama se construa ao longo dos meses, nas séries, normalmente, essa dramatizagao de longo prazo é secundaria. Cada episddio costuma ter comeco, meio fim, de modo que a mensagem de cada um é tinica e independente da tra- ma que atravessa a série. Em principio, a divisio do livro se assemelha ao modelo das séries de televisio, ou seja, cada episédio, ou artigo, foi escrito para transmitir um ensinamento especifico, independentemente da leitura prévia de outras partes do livro. Cada “episddio” tem a propria identidade, transmitindo sua mensagem com come¢o, meio e fim. Dessa forma, a leitura devera ser mais dinamica e ganhar fluidez. Aprendendo por experiéncia Nenhum texto vai substituir a experiéncia do investidor. Nos cursos do INI, quando alguém pergunta: “Como posso aprender a comprar e a vender agoes?” A resposta é: “Comprando e vendendo agoes!” E simples assim. Nao ha teoria que substitua a experiéncia de se tornar cliente de uma corretora, enviar seu dinheiro e dar uma ordem de compra ou de venda. Apesar de nao ser possivel substituir a experiéncia, o livro que o leitor tem em mios deriva das experiéncias e duvidas de investidores reais. A compilacio, ao longo de cinco anos, das principais duividas priticas ¢ tedri- cas dos membros da comunidade INI levou a construgao desse texto, Nao ha episédio que nao seja fruto de uma dtivida ou de um questionamento de investidores, iniciantes ou experientes. Questées abordadas no livro Vocé jd teve dtividas quanto a: indice P/L, dividend yield, apasentar-se em agées, hora de comprar ou vender, bonificagées, subscrigées, desdobramentos, gestéo de carteira, imposto de renda, baixas contabeis, perdas com derivatives, indice Bovespa, valuation, preco-justo, se a bolsa pode cair para sempre, gover- nanga corporativa, diversificazao, racionalidade do mercade? Se vocé teve essas ditvidas, saiba que todas (e algumas mais) serio abor- dadas neste livro, sempre ambientadas em situagdes cotidianas, corriquei- ras. Dificilmente vocé nao ira se identificar com algumas delas. Sumario Introducao PARTE I POR QUE INVESTIR EM ACOES? 1 Investindo na bolsa por 13 anos: A historia de Arnaldo, uma crénica motivacional Aposentadoria com acdes? Vamos fazer as contas? Aposentadoria com agdes? 0 décimo terceiro pode fazer muito mais do que vocé pensa PARTE II COMO INVESTIR EM ACOES? mn Vocé sempre soube investir em bolsa de valores, acredite! 0 12 principio do INI de investimento em acoes 0 que 0 12 principio do INI poderia ter feito por vocé. Testando 0 1° principio entre 1996 e 2008 3% parecem pouco, mas fazem diferenca! 0 2° principio do INI de investimento em acdes 0 que 0 28 principio do INI poderia ter feito por vocé. Testando 0 2° principio entre 1996 e 2008. Qual empresa devo comprar? 0 3° principio do INI de investimento em acoes xv 21 28 35 41 45 49 53 9 Diversificacdo 6 facil de entender, mas dificil de fazer. 0 4 principio do INI de investimento em acoes 10 Governanga Corporativa, Aprenda a se proteger! 0 5° principio do INI de investimento em acdes PARTE IIT 0 QUE £ FUNDAMENTAL SABER? 11 De onde vem o prego de uma ago: Introdugao ao valuation 12 O significado do maltipto Preco/Lucro (P/L) e sua relacéo com a renda fixa 13 0 miltiplo Prego/Lucro (P/L) e sua relago com o financiamento das empresas 14 A empresa pagou R$3,00 por acao de dividendo, mas a acao caiu exatos R$3,00. Perdi ou ganhei? 0 que é dividend yield? Dividendos em tempos de crise 16 Ajuste nos precos: Desdobramentos, bonificacdes, subscrigdes etc. PARTE IV OQUEE INTERESSANTE SABER? 17 Imposto de Renda: Estrategia para um investidor de longo prazo 18 Gesto de carteira: A importancia de estabelecer metas na estratégia do investidor 19 Como se calcula o indice Bovespa? 20 Acbes ON e PN: Por que elas diferem tanto? 21 O verdadeiro longo prazo PARTE W TOPICOS AVANCADOS Os cuidados com agdes com miltiplo Preco/Lucro muito baixo 23. Mercados irracionais, perspectivas de recessao, medo de depressao: Cuidados com a leitura do indice Preco/Lucro 24 Entenda o que sao baixas contabeis, as principais fontes de prejuizos e luctos no operacionais Entenda o que sao derivativos de cémbio e seus impactos no balanco 60 65 77 85 91 97 102 110 117 125 133 137 145 161 165 171 184 APENDICES APENDICEA Impacto do investidor estrangeiro na bolsa brasileira APENDICE 5 Toquio 1989: A bolsa que nao se recuperou APENDICE € Somos todos diferentes: Diferencas entre os enfoques dos investidores APENDICE p “Comprar aces de uma sé vez” versus “Comprar regularmente” APENDICEE A crise do subprime: £ facil entender os porqués 193 202 209 213 221 Introdugao Parte I: Por que investir em acoes? O Brasil é um pais que tinha, ao final de 2008, pouco mais do que 500 mil investidores ativos registrados na CBLC (Companhia Brasileira de Li- quidagao e Custédia), Para uma populagao de 190 milhoes de pessoas, isso representa espantosos 0,26%! Em paises desenvolvidos, essa porcentagem ultrapassa, facilmente, 30% ou 35% da populacto. Em alguns, como na Suécia, é rarissimo encontrar um cidadao que nao tenha agdes em seu portfolio de investimentos. Se tivéssemos “massa critica” de investidores, certamente a resposta 4 pergunta do subtitulo estaria respondida no inconsciente da maioria das pessoas. Mas nao temos... A primeira parte do livro tenta encaixar a realidade de todos nés dentro de uma experiéncia de médio/longo prazo de investimento em bolsa de valores. O livro abre com uma crénica que relata a experiéncia de um investidor hipotético de renda média ao longo dos anos pés-Real. Praticamente todas as experiéncias relevantes que um investidor, iniciante ou experiente, deve encontrar sfo relatadas numa breve “mitologia” da bolsa. Arnaldo, Alice e Bianor atravessam 13 anos em algumas paginas, ilustrando, com dados ab- solutamente reais, as agruras dos bear markets e as benesses dos bull markets que o Brasil viveu durante esse perfodo, Na continuacao da primeira parte, ilustra-se um evento absolutamente corriqueiro nos paises desenvolvidos: a aposentadoria em agoes. No pri- meiro “episédio” sobre o tema, demonstra-se com nimeros 0 que seria necessatio para se aposentar na bolsa de valores. No segundo, mostra-se que essa facanha nio est tao longe da realidade do brasileiro médio. Ao contrario, esté bem mais proxima do que se pode imaginar. Parte II: Como investir em acoes? Na segunda parte do livro, busca-se espantar fantasmas e falsos mitos que envolvem o investimento em bolsa de valores. Sempre com dados reais, os cinco principios basicos do investidor consciente sao ilustrados: 1. investir regularmente, independentemente das condigdes de mercado, 2. reinvestir todos os ganhos obtidos no mercado, 3. comprar exclusivamente empresas com histérico consis- tente de crescimento nos lucros e nas vendas e com boas perspectivas de manté-lo, 4. diversificar a carteira e 5. prestigiar empresas com boa governanca corporativa. As evidéncias demonstradas nos “episddios” da Parte IT s4o matemati- camente trabalhadas, apesar de abordarem dados passados. Mesmo saben- do que o futuro sempre é incerto, o importante nesta parte é transmitir a seguinte mensagem: 0 comportamento que se mostrou vitorioso na bolsa ao longo dos tiltimos 60 anos esta ao alcance de qualquer investidor. Parte III: 0 que é fundamental saber? Nao rato, perguntam aos orientadores virtuais do INI: “Tenho agdes da Petrobras. Qual o risco de cairem até R80,01, de virar po?” Na Parte III, ha subsidios para que o investidor tenha condigées de saber, com clareza, de onde vem o prego de uma acto. Ele deverd ser ca- paz de entender os principais multiplos fundamentalistas, além de ter suas principais diividas sanadas de forma bem simples. Quem nao acha estranho uma empresa distribuir dividendos de R$3 por acdo e, no dia seguinte, ja abrir valendo R$3 a menos? O investidor perdeu, ganhou ou ficou no “zero a zero”? Quem entende bem isso? De onde vém os tais “pregos justos”? Por que o dividendo é tao impor- tante na formagao do prego? Por que os miltiplos P/L no exterior sao, historicamente, maiores do que no Brasil? Qual a diferenca entre um des- dobramento e uma bonificacio? Sao dividas corriqueiras e que, na maior parte das vezes, sdo respon- didas de forma superficial pelos atendentes das corretoras ou pelos sites disponiveis. Os “episédios” da terceira parte deste livro investigam o que nunca fica claro a respeito dessas questdes recorrentes. Parte IV: 0 que é interessante saber? Poucos investidores sabem, com excegio daqueles assiduos leitores dos informativas do INI, que, com uma boa gestao de carteira, pode-se evitar carregar um “estoque” de Imposto de Renda no médio prazo. Pela legisla- co vigente atualmente, torna-se muito simples agir no sentido de reduzir a carga tributaria sobre um investimento em agées. O primeiro “episédio” da Parte IV demonstra o passo a passo dessa estratégia. Outros tépicos como as diferencas, as vezes inexplicaveis, entre as ages ON ePN, a matematica por tras do indice Bovespa e técnicas simples para gestao de carteira também sao abordados nessa parte. Parte V: Tépicos avancgados A contabilidade vem avangando no sentido de aproximar a visio conta- bil da visio financeira quando se trata de registrar o valor de uma empresa. Essas mudangas tém sido responsaveis por incrementar ainda mais a per- cepcao desastrosa da crise que o mundo comecou a experimentar em mea- dos de 2007. Como se destroem trilhdes de délares? Pois as baixas conta- beis, por forca das mudancas nos balangos, sio as principais responsiveis. Derivativos, igios, amortizagées ete. nem sempre representam “prejuizo” financeiro. A Parte V deste livro trata desses assuntos, entre outros. Apéndices A bolsa nunca mais vai subir? Pergunta muitissimo frequente. Entra ano, sai ano, entra Bear market, sai Bear market, e os investidores sempre sofrem infinitamente quando o mercado esta “no fundo do poco”. Infe- lizmente, hé historias de bolsas que nunca se recuperaram, e a da bolsa de Téquio é contada em um “episddio” especial neste apéndice. Hi ainda outros tépicos interessantes como a relagio de dependéncia que nossa bolsa ainda mantém com o humor do investidor estrangeiro, as diferencas entre as estratégias de pessoas fisicas, bancos ¢ fundos de pensio, as recessdes de 2001 e 2007/2009, em termos de miltiplos fundamentalis- tas e estudos sobre “comprar tudo de uma vez e comprar regularmente”. Sem tecnicismo... Tudo escrito em linguagem cotidiana, sem firulas matematicas e técni- cas. E um livro para quem nunca experimentou a bolsa de valores e tam- bém para aqueles que tém experiéncia, porém atropelaram alguns conceitos fundamentais, que nao fazem falta na hora de operar, mas que, se assimila- dos, modificariam sobremaneira suas visdes sobre a bolsa. Ao final, a visto de que “vocé sempre soube investir em bolsa de valores” deverd ficar um pouco menos estranha, um pouco mais interiorizada. Nao duvide! PARTE Por que investir em agoes? 1 Investindo na bolsa por 13 anos: A histéria de Arnaldo, uma crénica motivacional do pouquissimas os brasileiros que tém histérias prolongadas de investimentos na bolsa. Justamente por isso, ha tao poucas refe- réncias. E dificil encontrar uma pessoa préxima que ja tenha pas- sado por grandes turbuléncias no mercado, e que possa transmitir um pouco de sua experiéncia. A cronica sobre o engenheiro Arnaldo vai suprir, em parte, essa lacuna de historias e mitos que poderiam traduzir os beneficios de se investir em bolsa, com visto de longo prazo e disciplina. Muitos dos leitores devem se identificar com 0 personagem ficticio, Arnaldo, recém-formado em enge- nharia na Pontificia Universidade Catélica do Rio de Janeiro. Voltando a 1995... Contexto inicial Arnaldo se forma no curso de Engenharia Mecanica no segundo semes- tre de 1995. Consegue um emprego na drea de manutengio de aparelhos industriais de refrigeragao, seu sonho. Arnaldo havia entrado cedo na fa- culdade e era um aluno mediano. Conseguiu se formar apés 5,5 anos de curso, aos 22 anos, e estava muito feliz por ter conseguido emprego justa- mente na dea ¢ na especialidade desejadas. 4 O MERCADO DE ACOES EM 25 EPISODIOS Seu avG, um sujeito austero e experiente investidor na bolsa, sugere, en- tao, que Arnaldo siga o principio mais basico para ter as finangas pessoais saudaveis: guardar entre 10% e 20% de tudo o que ganha, Como sugestio, indicou ao neto investir em agoes ordinarias da Cia. Vale do Rio Doce, s6- lida empresa brasileira que estava com grandes chances de ser privatizada. Arnaldo, sujeito pouco ambicioso, mas obediente, resolveu seguir os conselhos de seu avé. E onde nossa historia comega.! 1996: A primeira compra e o primeiro susto, a gente nado esquece! O salério liquido inicial de Arnaldo era de R$1.500,00 e ele decidiu, seguindo os conselhos de seu avé, investir um valor em torno de 20% de seus vencimentos em ages ordinarias da Cia. Vale do Rio Doce - VALE (Simbolo: VALE3). A abertura de conta na corretora teve aquela burocra- cia tradicional, mas, depois de alguns dias, tudo Ok. 31/1/1996 - Decepcionante... Recebe seu salario, R$1.500,00 e liga para seu corretor: —Bianor, estou com R$300,00 aqui e quero comprar umas ages ordi- narias da VALE. — Amaldinho, meu filho, seu avé avisou que vocé iria ligar. Olhe, uma acao VALE3 custa R$245,00. Com trezentos reais... s6 se for comprar umazinha, né? A corretagem seré de 2%, Ok? — Ok, pode comprar. Quanto tenho que depositar? —R8249,90. Arnaldo pensou muito e achou que o avé tinha indicado um investi- mento fora do seu alcance. Sentiu-se um pouco “pobre” por sé conseguir comprar uma ago da VALE. Pensou: “E se a agao for para R$400,00, nao vou conseguir comprar nem umazinha?” A partir dessa compra, comegou a se interessar um pouco mais e sempre aproveitava para dar uma olhada na Gazeta Mercantil, que sua empresa assinava, para ver a cotagio da VALE3. ‘Ha aproximagdes necessérias que incorporam algumas facilidades que temos hoje em dia, mas que niio existiam & poca. As aproximagées tém por objetivo manter a boa diditica ¢ facilitar a compreensio do leitor. POR QUE INVESTIR EM ACOES 5 Nove dias depois, a ago havia atingido R$265,00. Arnaldo pensou: *Vovd é craque. Ele disse que o negécio era de risco, mas quase 10% em 10 dias, néo esté nada mal!” 29/2/1996 - Desconfianca... Quando liga para o corretor para comprar mais aces, ele acha estranho, pois o valor era R$244,99, dai pergunta: — O, Bianor, isso est estranho! Més passado era R$245,00, agora é R$244,99? Isso parece loja de desconto! Esse preco esta certo? — Amaldo, o prego é esse agora, mas daqui a pouco pode mudar. Foi coincidéncia isso. Posso mandar comprar mais uma? — Manda brasa, agora tenho duas ages da VALE. — Vai ficar rico, garoto! E deram boas risadas. 11/4/1996 - Um susto pelo qual todos acabam passando... Apés consultar a Gazeta, Arnaldo liga tenso para a corretora, pois 0 valor da ago indicado pelo jornal era R$25,70. Esbaforido, pergunta: —Caramba, Bianor! Eu sabia que era um negécio de risco, que poderia perder muito, mas nao pensei que fosse tao rapido! Minhas ag6es cai- ram quase 90%. © que houve? — Rapaz, nao seja tdo apressado. Nao é nada disso. E que as agdes eram cotadas em lote de 1.000. Na realidade, aquela 1 (uma) agao que vocé tinha, correspondia a 1.000 agdes. A VALE fez um gru- pamento de 1.000 para 1. Eu sei que parece maluquice, mas antes vocé tinha 1.000 acoes que valiam R$0,2570 cada, mas a cotacao era MOSTRADA por lote de mil, por isso é que vocé via R$257,00, entendeu? — Nao, nao entendi nada. Se ela fez esse grupamento, minhas agdes nao deveriam continuar valendo duzentos e poucos reais? Nao esqueca que sou engenheiro, nimero é comigo mesmo! —Calma, ainda nao acabou. Como esse valor é muito alto, a VALE fez uma bonificacdo de 700%, ou seja, para cada ago que vocé tinha, ela deu mais 7. 6 O MERCADO DE ACOES EM 25 EPISODIOS — Bianor, vocé esta de brincadeira! Como é que ela me da 700% de ganho assim? —Nao é ganho nenhum. E sé um ajuste no prego. Se vocé tinha 10 ages a R$80 cada, agora tem 80 acdes valendo R$10 cada, Nao ganha, nem perde. E sé para dar mais liquidez a acao. Viu, agora, em vez de comprar uma acio com seus R$300,00, vai comprar 10! —E, Bianor, no ha almogo de graca. Esse negécio de bolsa 6 meio complicado. Espero que essas coisas nao acontecam muito... 31/5/1996 - Dividendos no inicio... Arnaldo estava comprando 11 acoes da VALE, que estavam cotadas a R$26,20. Mas havia algo estranho em sua conta. Ele depositava exata- mente o montante necessério para comprar as ages e pagar os custos de transagao, zerando seu saldo na corretora. Eis que aparece em sua conta a quantia de R$0,04 (quatro centavos). E liga de novo para Bianor. —Bianor, esta me dando dinheiro, rapaz? Que 4 centavos so esses na minha conta? E um cafezinho de cortesia? — Amaldo, a VALE declarou um dividendo de R80,0016 por acao, vocé tinha 24 ages na época da declaracio, entio recebeu R&O,04. Nao é bom? — Bianor, o dividendo ¢ isso? Ta brincando, né? E muito pouco, cara. Onde é que meu avé estava com a cabe¢a? Quatro centavos?!?!?! E meu avé ainda diz que vive de dividendos. Deve ser dono da VALE! Resumindo o ano de 1996 * 12 aportes, totalizando R$3.373,20. Média mensal de R$281,15. + 128 agées VALE3, R$12,43 de dividendos em conta (a VALE de- clarou dividendos no final de 96), totalizando um patriménio de R$3.468,43. Nao foi possivel reinvestir esse valor, pois nao compra- va nem uma aco sequer. * A rentabilidade média de seu investimento ficou em 6,38% ao ano, muitissimo abaixo das taxas de juros da renda fixa brasileira no ano de 1996. 20 método numérico para cilculo da rentabilidade da cartcira é o da TIR (Taxa Intema de Retorno). Consiste em montar um fluxo de caixa de desembolsos, ao longo dos anos estu- dados, ¢ compari-lo com o patrimonio obtido, achando-se uma taxa anual que equilibre 0 fluxo de caixa com esse patriménio. POR QUE INVESTIR EM ACOES 7 Arnaldo ligou para o avé e contou suas afligbes. Disse que se tivesse co- locado em renda fixa teria um resultado muitissimo melhor e sem qualquer transtorno, Disse também que achava meio complicado esse negdcio de bolsa e que estava pensando em reconsiderar seus métodos. Reclamou dos dividendos e dos custos de transacao. O avd Ihe disse: “Arnaldo, vocé tem 23 anos. Esta comegando sua carreira agora. Bolsa é para quem tem paciéncia e para quem tem vontade de estudar as companhias e o mercado. Dé mais algum tempo para vermos o resultado.” 1997: Um péssimo ano para as acoes da VALE A empresa de Amaldo estabeleceu como politica de remuneragio que to- dos os salirios seriam reajustados pelo IPCA, calculado pelo IBGE. Passou a ganhar, com o aumento, R$1.643,40 Iiquidos. Seu aporte poderia subir. No comego de 1997, a situacdo parecia promissora. A VALE3 bateu R$33,00 em 04/03/1997. Arnaldo ficou animado. Comecou a estudar um pouco sobre a empresa e a confiar no negécio e nas perspectivas com a pri- vatizacao iminente. Passou a se abalar menos com as quedas, até que a VA- LE3 despencou a R$17,50 em 12 de novembro de 1997. Aquela altura, ele investira pouco menos de R$7.000,00 e tinha em conta R$4.400,00. Ape- sar das boas perspectivas, aquele negécio de investir na bolsa parecia fadado ao fracasso. Ao menos, estava conseguindo comprar uma bela quantidade de ages com seus trezentos e poucos reais. Quase 17 agoes. Em 29/12/1997, ao ligar para o ji amigo Bianor, ouve o seguinte: — Arnaldo, vocé tem quase R$160,00 em dividendos parados na conta, por que nfo reinveste? Compre mais agées, elas esto a prego de banana. Pela primeira vez, Arnaldo conseguiu utilizar seus dividendos para com- prar um pouco de acées, mais precisamente, seis agdes. Resumindo até o ano de 1997 + 24 aportes, totalizando R$7.225,63. Média de R$301,07. * 283 agoes VALE3, R$157,04 de dividendos reinvestidos em agées, totalizando um patriménio de R$5.974,04. * A rentabilidade média de seu investimento ficou negativa. -19,41% ao ano. 8 O MERCADO DE ACOES EM 25 EPISODIOS 1998: Muitissimo pior que 1997. Ninguém achava possivel! Arnaldo comegou, mais um ano, confiante em seus investimentos. Afinal, 1997 tinha sido um ano péssimo para as ac6es da companhia, mas os resulta~ dos eram sélidos e crescentes. © ane de 1998 nao poderia decepcionar... Comegou com um pequeno reajuste em seu salirio, conforme politica da empresa jé definida. Agora, recebia R$1.730,00. Nao era muito ambi- cioso e gostava demais de seu trabalho técnico, nao visltumbrava grandes promogées. Até maio, o ano de 1998 parecia bom. Tinha investido R$8.700,00 e ja estava quase no “zero a zero”, pois a cotagao chegou a R&26,00 ¢ ele tinha, a época, 340 acdes. Até julho, um ano fraco. Dai em diante, um desastre para as acdes. De 15 de julho até 12 de setembro, as acdes chegaram a cair 49%! Desanimado, Amaldo liga para Bianor: —Bianor, teve algum desdobramento ou bonificacto da VALE? E. que as ages cairam 50% em dois meses... —Dessa ver, filo, é queda mesmo. Se formos pensar na cotagao de um ano e meio atrds, a queda é de quase 65%. Nao esta facil por aqui, ga~ roto, Tem gente furiosa. Mas a empresa esta forte. Olhe os resultados, Os dividendos serdo étimos em 1998. Bola pra frente! Com a agao a R$14,00, nao tem espaco para cair mais! Pois caiu... Fechou o ano a impressionantes R$11,20!!! No Natal de 1998, Arnaldo deu para o av6 uma camisa do Vasco. O avé era fundador da Charanga Rubro-Negra e do fa-clube do Zico. Vové nao reclamou... Resumindo até o ano de 1998 * 36 aportes, totalizando R$11.327,09. Média de R8314,64. * 520 agoes VALES, R81.140,85 de dividendos reinvestidos em acoes, totalizando um patriménio de R$6.964,85. + A rentabilidade média de seu investimento ficou negativa -33,15% a0 ano. * © que impressionou Arnaldo foi, além das quedas vertiginosas, 0 volume pago de dividendos, que chegou a quase R$100,00 por més de média. Era 1/3 do que ele aportava mensalmente. POR QUE INVESTIR EM ACOES 9 1999: Enfim, algum retorno! O ano comegou com uma inacreditavel recuperacio das agoes. Em ape- nas um dia, a bolsa chegou a subir 33% e a VALE subiu quase 100% no periodo de 1 més. Tinha chegado a impressionantes R$20,50, tendo parti- do de R$11,20 em 29/12/1998. O ano prometia... e entregou. A VALE encerrou 1999 cotadaa R$42,00, quase 300% de aumento. Apés trés anos terriveis, Arnaldo, enfim, comega- va a acreditar que poderia dar certo. Resumindo até o ano de 1999 * 48 aportes, totalizando R$15.504,02. Média de R$323,00. * 736 ac6es VALE3, R$1.634,89 de dividendos reinvestidos em aces, totalizando um patriménio de R$32.546,99. * A rentabilidade média de seu investimento ficou POSITIVA em 38,9496 ao ano. + Arnaldo recebia uma média de R$140,00/més de dividendos, o que comegou a deixa-lo muito interessado. Comecou a perceber que, se continuasse investindo em empresas solidas e boas pagadoras de di- videndos, um dia poderia ter uma boa renda. * Apesar do ano espetacular, Arnaldo ja conhecia de perto 0 que sig- nificava um dear market e sabia que nao deveria sair de sua politica: 20% de seu salario todo més e muito estudo sobre a companhia. 2000: Um gigantesco zero a zero! Arnaldo comegou o ano com um salério de R$1.912, 73. Ja tinha quatro anos de empresa e nenhum sinal de promogaio. Mas gostava muito do que fazia, sentia-se feliz em acordar sabendo que ia trabalhar com dutos, com- pressores, retentores, parafusos etc, Arnaldo comegou a sentir necessidade de crescer no emprego para au- mentar sua renda e comprar um apartamento, um carro melhor etc. Ouviu de seu avé o seguinte: — Neto, vocé tem 26 anos, seus pais sao maravilhosos, nao deixam faltar nada e néo cobram nada de voca. Aproveite esse momento raro de sua vida e cuide de seu futuro. Logo virio outras obrigagdes e vocé nao tera mais a facilidade e a disponibilidade para investir tanto quanto faz hoje. 10 O MERCADO DE ACOES EM 25 EPISODIOS O ano de 2000 nao foi li grandes coisas. Foi um ano calmo para © pais, mas tio calmo que a emogio na bolsa foi quase zero. Arnaldo seguiu seu ritmo e continuou seus aportes. Agora, que tinha R$30.000 de patriménio, aqueles R$400,00 por més quase nao faziam muita di- ferenga, compravam muito poucas agoes diante das quase mil que ja ti- nha. Porém, aportar se tornara um habito para ele. Ja havia incorporado aquilo as obrigagoes do més. E ainda conseguia juntar um pouquinho na renda fixa para trocar de carro ou dar entrada em um apartamento. Estava bem equilibrado, pois nao tinha compromissos relevantes e ain- da era muito jovem. Resumindo até o ano de 2000 * 60 aportes, totalizando R$19.941,19. Média de R&332,35. * 871 agdes VALE3, R$2.908,84 de dividendos reinvestidos em ages, totalizando um patriménio de R$43.410,34. + A rentabilidade média de seu investimento ficou POSITIVA em 29,78% ao ano. * Arnaldo recebia uma média de R$240,00/més de dividendos, 0 equi- valente a 12% de seu salirio. 2001; Também um ano de poucas emocées para a VALE, mas de muito fluxo de caixa Pela primeira vez, apés cinco anos no emprego e aos 27 anos, Arnaldo ganhava mais de R$2.000,00 liquidos ao més. Comegou a fazer alguns projetos por conta prépria, nas horas vagas da companhia, o que lhe rendia uma graninha extra de vez em quando. Essa grana, Arnaldo guardava para seu projeto de trocar o carro. Sua Brasilia 1981, presente de seu pai, ja esta- ya um pouco ultrapassada, Ou ainda dar entrada em um apartamento, Sem pressa, pois sua namorada a época tinha 23 anos e estava no meio da facul- dade de medicina. Vé-la, s6 a0s fins de semana nao precedidos por provas. Era enrolada, mas era linda e pacata. Compreendia por que Amaldo, com toda aquela grana guardada, dizia sempre: “Amor, estou sem grana. Vamos deixar 0 japonés para o dia 5?” O que mais impressionou Arnaldo em 2001 foi o volume de Juros sobre Capital Proprio SCP) distribufdos pela VALE: R84,61 por acao. Como ele chegou ao final do ano com mais de 1.000 agoes da VALE, recebeu POR QUE INVESTIR EM ACOES M1 uma bela grana, o que o fez pensar em no reinvestir: R$4.600 era muito dinheiro, dava para inteirar até um carrinho melhor. Desistiu, pois o comportamento ja estava enraizado nele, ja fazia parte de sua rotina, © dinheirinho mensal para investir tinha a mesma precedén- cia e importancia do que aquele que ia para a ajuda que dava em casa ou para o cursinho que pagava a noite. E era muito mais importante do que o dinheiro dos cineminhas com a namorada. Ah, isso sempre gerava algumas boas brigas. E Alice ganhava todas as brigas, Arnaldo se apertava em outras contas, mas nao deixava seus aportes de lado. Nem os cinemas. Resumindo até o ano de 2001 * 72 aportes, totalizando R$24.561,67. Média de R$341,13. * 1017 ages VALE3, R$4.606,53 de dividendos reinvestidos em agées, totalizando um patriménio de R$57.490,53. + A rentabilidade média de seu investimento ficou POSITIVA em 24,82% ao ano. Essa rentabilidade anual fez Arnaldo refletir, pois © investimento em renda fixa trazia algo proximo a isso, as vezes mais. Os detratores do investimento em bolsa de valores, a época, valiam-se justamente dessa visio de que é bobagem investir em bolsa com juros tio altos. Os defensores diziam que, se escolhesse boas ages, poderia obter ganhos superiores ao do Thovespa ¢ a0 da renda fixa. O que fez Arnaldo manter-se na bolsa foi o interesse crescente por eco- nomia e finangas, além do grande conhecimento que obteve ao estudar os dados da VALE nos tiltimos cinco anos. Além disso, pensava que nenhum pais do mundo havia conseguido se desenvolver sem que suas empresas pudessem se capitalizar através do mercado de capitais. E continuou. In- seguro quanto a possibilidade de ganhar mais do que na renda fixa, mas seguro de estar fazendo a coisa certa. — Arnaldo recebia uma média de R$383,00/més de dividendos, o equi- valente a 18% de seu salario. 12 O MERCADO DE ACOES EM 25 EPISODIOS 2002: Um ano de grandes sustos na bolsa e na economia, mas com desempenho excelente da VALE © ano de 2002 trouxe grandes desafios as empresas brasileiras expor- tadoras. Arnaldo viu o lucro da VALE despencar pela primeira vez desde que comecou a investir na empresa. Ao contrario das outras pessoas, ele no se importava tanto com as oscilagdes do papel, mas sim com os ca- minhos da companhia. Arnaldo entendeu que o impacto das mudancas econémicas, cambiais principalmente, no balango nao deveria se repetir nos anos seguintes, visio que o deixou menos apreensivo com a forte queda nos lucros. O ano de 2002 trouxe uma inovacdo na empresa em que Arnaldo tra- balhava. Mesmo se mantendo (feliz) na posicio em que entrou, Arnaldo comecou a receber um extra, na forma de bénus anual. Era um funciondrio excepcional e seus chefes nao queriam mové-lo para uma fungio de chefia. Poderia ser desastroso. Arnaldo agradeceu, pois nao queria mesmo ficar mandando em seus colegas ou nos novatos. No primeiro ano, ao final de 2002, seu bonus foi equivalente a seis sa- larios. Pouco mais de R$12.000,00. Ficou muito tentado a colocar toda essa grana na bolsa, pois 2002 havia sido um ano espléndido paraa VALE. Manteve-se quieto, colocou essa grana junto daquele dinheiro que estava guardando para dar entrada no apartamento, pois o carro ja fora trocado por um Monza 1996. Com ar-condicionado e direcao hidraulica. Faltava apenas 1 ano para Alice completar sua faculdade de medicina. O namoro estava firme e até a menina comecou a colocar uma graninha em agdes, dado o exemplo bem-sucedido, até entio, do namorado. Isso deixou 0 namoro um pouco mais interessante, pois Alice nao se cansava de perguntar: — Amaldo, por que vocé nao vende na alta e compra na baixa? Vai ga- nhar muito mais! Arnaldo respondia: —Nio faco porque nio sei fazer, s6 sei reparar ar-condicionado. Nisso, eu sou bom. Estou ganhando até um extra da empresa! POR QUE INVESTIR EM ACOES 13 Resumindo até o ano de 2002 * 84 aportes, totalizando R$29.466,59. Média de R$350,79. * 1.168 acdes VALE3, R$3.151,22 de dividendos reinvestidos em aces, totalizando um patriménio de R$123.338,42. * A rentabilidade média de seu investimento ficou POSITIVA em 38,119 ao ano. * Os dividendos decepcionaram um pouco, mas Arnaldo entendia que nao € possivel manter 0 mesmo nivel de dividendos com a enorme queda nos lucros, mesmo que por eventos nao recorrentes. * O ano de 2002 trouxe uma grande alegria para Arnaldo: em outubro de 2002, pela primeira vez, ele atingiu R$100.000 de patriménio em agdes. Chegou mesmo a pensar em retirar uma parte e juntar com os outros R$30.000,00 que havia juntado na renda fixa. Mas manteve- -se firme as instrugdes de seu avé: pouco e sempre, até chegar a hora de colher. Arnaldo também tinha um desafio pessoal, que era elevar 08 dividendos ao mesmo patamar de seu saldrio. Sabia que demoraria bastante, mas nado esmoreceria. 2003: Grande retomada da bolsa. Desempenho operacional excelente da VALE, das acdes um pouco menos, mas também muito bons Ao final de 2003, Arnaldo ja estava sentindo falta daquelas bonificagoes do comeco de seu caminho como investidor de longo prazo. A VALE3 fechou o ano cotada a R$169,50. O aporte mensal sé dava para comprar duas miseras ages. Cedo ou tarde, pensava ele, a VALE tera que bonificar: “Esté muito caro comprar um lote de 100. Se continuar subindo, o aporte nao vai dar nem para 1 acio!” Pela primeira vez, entendeu o motivo das bonificag6es e dos desdobra- mentos. O lucro da VALE mais do que dobrou em 2003. Os resultados, Ar- naldo sentiu na cotagao da aco e nos dividendos, que voltaram a crescer ¢ retomaram o caminho que ele havia planejado, ficando equivalentes a seu salario anual. Nesse ano, a VALE pagou dividendos trés vezes (na verdade, sao juros sobre capital proprio). Em abril, pagou R$1,62/acio; em agosto, RS1,94/ aco; e, em outubro, R$1,48/acio. 14 O MERCADO DE ACOES EM 25 EPISODIOS Resumindo até o ano de 2003 * 96 aportes, totalizando R$34.527,87. Média de R$359,67. * 1.247 acdes VALE3, R$6.320,72 de dividendos reinvestidos em agées, totalizando um patriménio de R$217.687,22. * A rentabilidade média de seu investimento ficou POSITIVA em 43,4696 ao ano. + Osdividendos representaram R$530/més, quase 25% de seu salario, 2004: Mais um ano excepcional para a VALE e para a bolsa No inicio de 2004, Arnaldo continuava em sua fungao na empresa. O ano foi dtimo para eles todos também, que conseguiram dar a Arnaldo um bénus de 12 salarios, quase R$30.000,00. Arnaldo ja tinha o suficien- te em renda fixa para comprar um apartamento (bem) modesto na Zona Sul ou algo mais confortavel na Zona Oeste ou Zona Norte do Rio de Janeiro. Completando 30 anos e com Alice formada e fazendo residéncia no Miguel Couto, nao tardaram a comegar aquelas conversas sobre com- promisso mais sério. A situagio estava relativamente confortavel para ambos. O pais parecia bem e Alice, aos 26 anos, estava progredindo na residéncia e fazendo ex- celentes contatos. A VALE atendeu aos anseios de Arnaldo. Apds atingir R$170,00 fez um desdobramento de 1 para 1 em 18/08/2004, fazendo as aces cairem 4 metade do valor e dobrar a quantidade de agées. Resumindo até o ano de 2004 * 108 aportes, totalizando R$40.586,36. Média de R$375,80. * 3.967 agdes VALE3 (por conta do desdobramento), R$7.728,16 de dividendos reinvestidos em ages, totalizando um patriménio de R$307.236,65. + A rentabilidade média de seu investimento ficou POSITIVA em 41,80% ao ano. * Osdividendos representaram R8644/més, quase 26% de seu salirio. * Na visio de Arnaldo, os resultados atingidos esto muitissimo aci- ma de suas expectativas. Ligou para agradecer ao avd, que lhe disse: “Hoje nao posso falar muito, pois estou com sua avé em Cancun. Ficaremos até a proxima semana, mas quero lhe dar os parabéns, POR QUE INVESTIR EM ACOES 15 meu neto. Vocé viu seu patriménio secar por trés anos, mas seguiu a ccartilha corretamente e hoje, além de conhecer a empresa em que investe muitissimo bem, ainda segue rigorosamente a regra do bem- -estar financeiro. Juntar sempre, no tempo de semear. Agora, ao co- Iher, faca-o sem histeria, sem extravagancias e sem deslumbramento. Dinheiro nao leva desaforo. O barco esta chegand 2005: 0 ano em que Arnaldo se questiona sobre aqueles rendimentos altissimos Arnaldo ja quase nao se lembrava dos péssimos trés anos iniciais de sua trajetéria. Jé nao falava com Bianor havia um tempo, pois usava o Home Broker para fazer suas compras mensais. Resolveu ligar para falar com 0 amigo. Ao atendé-lo ao telefone, Bianor exclama: “T com dinheiro, hem, garoto! Nao disse?” Arnaldo revelou a Bianor que ficava um pouco preocupado com essa renta~ bilidade enorme, Se continuasse assim, seria miliondrio em cinco anos. Bianor alertou: “Seu av6 ensinou que voce deveria ter disciplina e ser estudioso. Ele também opera na corretora e conversamos sobre vocé com frequéncia. Mas devo acrescentar algo. Vocé precisa ter uma meta precisa para seus investimen- tos. Defina o percentual que deseja entre renda fixa e varivel, por exemplo 50% em fixa, 50% em variavel, e mantenha esse patamar durante as grandes viradas da bolsa. Vocé ainda é jovem, pode se artiscar mais um pouco. Mas defina o que quer ter. Nao acredite que a bolsa va subir para sempre.” Arnaldo estava entusiasmado com duas ideias: uma era fazer os dividen- dos atingirem o patamar de seu saldrio anual, outra era atingir um patrimé- nio de R81 milho em ages. Nao se preocupou muito com o que Bianor disse, pois tinha uma boa reserva em renda fixa, Mas resolveu se testar ¢ impés 0 seguint 50% e colocaria em renda fixa. chegasse a R81 milhio em renda varidvel, retiraria Alice estava empolgadissima com o Home Broker. Jé tinha R$20.000,00 em ages, que usava para fazer trades constantes. Comprava e vendia bas- tante. Ligava para Arnaldo e dizia: “Ganhei 20% em 15 dias. Arnaldo! Levanta dessa cadeira, homem!” Arnaldo, como sempre, desconversava e dizia que nao nascera para grandes emogoes. Ao final do ano de 2005, ele com 31 e ela com 27, ficaram noivos e dei- xaram a data do casério em aberto. Alice havia terminado a residéncia, mas 16 O MERCADO DE ACOES EM 25 EPISODIOS ainda nao conseguira algo estével. Arnaldo estava cada vez melhor e mais feliz na empresa em que trabalhava. Mesmo sem promogées, ganhando R$2,880,97 e sendo o melhor funcionrio da empresa. A empresa compen- sava com bénus interessantes. Resumindo até o ano de 2005 * 120 aportes, totalizando R$47.306,15. Média de R$394,22. * 4.143 acoes VALE3, R$11.098,60 de dividendos reinvestidos em agées, totalizando um patriménio de R8406.755,10. + A rentabilidade média de seu investimento ficou POSITIVA em 39,19% ao ano. * Os dividendos representaram R$924/més, quase 33% de seu salério. * Arnaldo comemorou com o avé os 10 anos de investimento. Com- prou um JW Red Label para o velho. O avd, claro, reclamou: “Arnaldinho, eu merecia, no minimo, um Black!” 2006: Mais um ano excelente. Mais um desdobramento A data foi mareada para 12/03/2007, na igreja da Urea. Arnaldo comprou um apartamento no final de 2005 e ja estavam morando juntos, 20 menos nos fins de semana, para, digamos, um fest drive da vida de casado. Alice mostrou as operagdes que fizera no Home Broker para Amaldo. Sempre com algum ganho, mas com custos um pouco elevados. Alice con- seguiu transformar os R$20.000,00 em R$26.000,00, o que nao era mal: 30% no ano. Arnaldo nunca havia entrado em detalhes sobre seus investimentos. Mas, com o casamento marcado, os fins de semana sob 0 mesmo teto e a insisténcia da moga em fazé-lo “treidar” (comprar e vender no curto prazo), ele resolveu mostrar sua conta na corretora para ela. Isso foi, precisamente, no dia 31/01/2006. Ela viu e gritou: “Quatro- para chegar a esse valor?” Calmamente, ele respondeu: “Todos os meses, coloco 20% de meu salétio Iiquido na bolsa. Da uns 300 e poucos por més.” Alice reagiu exatamente assim: “Arnaldo, nao treida, Nao treida!” Resumindo até o ano de 2006 * 132 aportes, totalizando R$54.337,15. Média de R$411,65. POR QUE INVESTIR EM ACOES 7 * 8.622 acdes VALE3, R$9.869,33 de dividendos reinvestidos em agées, totalizando um patriménio de R8559.090,73. + A rentabilidade média de seu investimento ficou POSITIVA em 38,15% ao ano. * Os dividendos representaram R$822/més, quase 28% de seu salario. 2007: O ano que parecia bom demais para ser verdade Bom demais nio sé pela bolsa, mas pelo casamento, pelo bom momento que os dois estavam vivendo e tudo o mais. Arnaldo ficou interessado em fazer outra faculdade, agora de economia, pois se interessara demais pelo estudo das varidveis econémicas, da gestio das empresas etc. Pediu, tao logo chegou de lua de mel, uma renegocia¢io em seu horirio na empresa; caso contrario, pediria para ser demitido. Afinal, Arnaldo, além de investir em VALE na pessoa fisica, também colocou tudo o que podia de seu FGTS nos fundos de VALE e Petrobras. Havia uma boa grana lé também. Seu patrio concordou em flexibilizar a carga hordria, dar-lhe a sexta- -feira livre a partir de 12:00 e manter 0 pagamento integral, porém cance- lou a politica de bonus. Esse rearranjo permitiu que Arnaldo se matriculas- se na UERJ para estudar Economia, ja para o segundo semestre de 2007. 2007 foi um ano tao excepcional para a bolsa e paraa VALE que nem parecia ser verdadeiro. O valor que Amaldo tinha em ages comegou a assusté-lo, Em setem- bro de 2007, chegou a R$1.100.000,00. Cogitou a hipotese de cumprir a promessa que fizera a si mesmo e ven- der 50% para colocar em renda fixa. Mas sua vontade de ver se é possivel se aposentar com dividendos foi mais forte do que 0 conselho do amigo Bianor. Pensava também que seu ganho na bolsa fora tao expressivo que uma queda de 20%, 30%, nao Ihe traria grandes emogoes. Resumindo até o ano de 2007 * 144 aportes, totalizando R$62.187,34. Média de R$431,86. * 17.671 agdes VALE3, R$13.098,56 de dividendos reinvestidos em agées, totalizando um patriménio de R$1.061.165,57. Houve mais um desdobramento de 1 para 1, assim como em 2006. * A rentabilidade média de seu investimento ficou POSITIVA em 43,1796 a0 ano. 18 O MERCADO DE ACOES EM 25 EPISODIOS * Os dividendos representaram R$1.091/més, quase 35% de seu salé- rio de RS3.152,58. 2008: 0 ano da grande virada. Para baixo O ano comesou péssimo. © patriménio chegou a cair R$250.000,00 em poucas semanas e as presses em casa para retirar a grana comecaram a ficar mais fortes. Havia uma grande incerteza sobre alguns aspectos da economia. Arnal- do entendia um pouco melhor os termos, pois estava no segundo periodo de Economia e ja estudara bastante. Arnaldo pensou bastante sobre sua vida: Umassalariado, com nenhum crescimento no emprego nos tiltimos 13 anos, apenas reposi¢6es da inflacdo, havia conseguido se tornar um milionério. Seus esforcos haviam se resumido a acompanhar de perto os resultados da companhia e a aportar regularmente 20% de seu salério. Nao aportou outras rendas. Sua estrutura de vida continuava modesta. Alice ganhava o suficiente para ter uma vida de muito bom nivel, nao passava qualquer privacao e ainda conse- guia ajudar em casa. Arnaldo continuava com o mesmo sistema de vida, exceto pelo Monza 1996, que ja havia se tornado um Palio Weekend 2006. A resposta para o japonés ainda era a mesmo: “Té duro, vamos deixar para o dia 5.” $6 que a réplica de Alice, agora, era: “Deixa que eu pago.” Seu apartamento era modesto, mas bem localizado e préprio. Nao ti- nham filhos e seu plano para os préximos cinco anos era manter a situagao como estava. Arnaldo lembrou-se dos trés primeiros anos de seu investimento. Lembrou que chegara a perder quase 50% do patriménio e, também, que suas acdes chegaram a cair mais de 65%. A época, com investimentos de R$12.000,00, nao era tao assustador, mas agora... Pensou também que, se tivesse saido naquela época, talvez nio tivesse nem 1/3 do que tinha. Nao tirou nada naquele janeiro fatidico de 2008. Manteve a grana apli- cada em agdes da VALE3. Pois que a bolsa, apés uma minima em meados de janeiro, quando o patri- ménio chegou a cair para R$800.000,00, uma perda préxima a R$300.000,00, retomou seu movimento de alta e devolveu o milhio a ele ji em fevereiro. Em abril e maio, manteve seu patriménio em tomo de R$1.200.000,00. POR QUE INVESTIR EM ACOES 19 Pausa na historia! Todos sabem 0 que aconteceu depois de maio de 2008. O mundo en- frentou a pior recessto desde o pés-guerra e as bolsas mundiais sofreram quedas inéditas, rivalizando com o inicio dos anos 30 nos Estados Unidos com os choques do petréleo na década de 1970. O futuro, entretanto, sera sempre uma incdgnita para os investimentos de Arnaldo, do Jodo, da Ivone. E possivel que os anos seguintes a 2008 repitam os anos de 1997 ¢ 1998, que, como visto, foram até piores para a VALE do que o ano de 2008, A histéria tenta ser leve para mostrar as agruras pelas quais passa um investidor de longo prazo. Daqueles que comesam ganhando R80,04 de dividendos e dao uma larga risada, pensando: “Poxa, que merreca!” Daqueles que encaram trés anos péssimos e dois anos de estagnacio, logo de cara. Infelizmente, ha poucos no Brasil. Poucos exemplos. Quem conhece alguém que encarou trés anos de bear market e dois de es- tagnagao? Essa pergunta, numa sala brasileira com 100 pessoas, daria, sem di- vida, ZERO de respostas positivas. Ja nos Estados Unidos ou na Escandinavia, esse nimero seria superior a 30 e, em alguns paises, superior a 60. E evidente que 0 maior pecado de Arnaldo, dada sua caracteristica conser- vadora, foi nao diversificar em outras acdes. Mas seria uma crénica com 400 paginas se Arnaldo tivesse 15 ages na carteira. Q motivo de pegar a VALE é puramente didatico. Trata-se de uma empresa que todos conhecem, mas pou- cos se lembram de como foi complicado investir nela no final dos anos 90. Além disso, tem comportamento regular de pagamento de dividendos e de eventos societarios, tais como bonificagées e desdobramentos. O Banco Bradesco também foi estudado, mas as dificuldades envolvidas na pesquisa sdio maiores, pois, além de ter feito intimeras subscrig6es no perfodo, paga dividendos mensais. Para os curiosos, nessa mesma época, maio de 2008, o Bradesco teria dado a Arnaldo R$600.000,00, metade do que a VALE esta- va dando. Mas, ainda assim, uma rentabilidade superior a 33% ao ano. Arnaldo teria sido bem-sucedido se tivesse direcionado esses investi- mentos a um elevado mimero de empresas brasileiras. Nao teriam faltado opgoes para diversificar. Em algumas, como a Gerdau, por exemplo, o resultado seria tao absur- damente alto que nao atingiria os propésitos didaticos deste texto. Ficaria parecendo mais milagre do que politica de investimentos. 20 O MERCADO DE ACOES EM 25 EPISODIOS Viarias empresas, umas mais e outras menos, teriam apresentado grandes resultados para o hipotético investidor. Petrobras, Itai, Usiminas, CSN, Ran- don, Fosfértil, WEG, Marcopolo ¢ até empresas que tiveram perdas com deri- vativos em 2008, como a Sadia, teriam dado grandes resultados ao Amaldo. Calma! O leitor nao ser abandonado se perguntando: “E ai, o que Ar- naldo fez?” Voltando a histéria... Apesar de todos terem torcido para que ele tivesse vendido tudo em maio, mais precisamente em 16/05/2008, e comprado tudo em délar, ele nao fez nada disso. Manteve suas ages. A perda é grande, muito grande. Resumindo até 06/01/2009 * 156 aportes, totalizando R$69.966,85. Média de R$448,51. * 18.808 agses VALE3, R$19.702,54 de dividendos reinvestidos em acées, totalizando um patriménio de R$621.604,40. Quase R$600.000,00 a menos do que o topo. + A rentabilidade média de seu investimento ficou POSITIVA em 32,5396 ao ano. Muitissimo melhor do que as opgGes de renda fixa, * Os dividendos representaram R$1.641/més, quase 52% de seu sala- rio de R83.284,67. Disciplina nos investimentos. Foco nos principios do INI Arnaldo investiu todo més, reinvestiu todos os dividendos e comprou uma empresa com forte crescimento nas vendas e nos lucros. Sao ensina- mentos universais para investimento em bolsa de valores. Tém funcionado em mais de duas dezenas de paises, com milhées de investidores e por mais de cinco décadas. Vale sempre lembrar que em renda varidvel nada é 100% seguro. Até es- tratégias vencedoras ha décadas podem apresentar alguma necessidade de ajuste. Entretanto, dificilmente estratégias perdedoras ha décadas acabarao Por se tornar vencedoras. Em bolsa, é melhor nao inventar muito... Aposentadoria com acgées? Vamos fazer as contas? ergunta-se numa sala de aula brasileira: “Quem conhece algum investidor que se aposentou com agées na bolsa?” Com quase toda certeza, ninguém vai levantar a mao. Pois 6, ha poucas, pouquissimas pessoas nessa situaco con- fortavel, de nao precisar mais trabalhar porque sua renda com acoes é sufi- ciente para cobrir suas despesas e necessidades de subsisténcia. Mas, ao contrario do que o senso comum do brasileiro indica, nfo é tio inatingivel assim se aposentar com suas a¢des na bolsa. E ainda pode trazer boas vantagens em relagao 4 aposentadoria publica tradicional ou, até mes- mo, em relacao 4 previdéncia privada. A inflagao e os juros altos atrapalharam muito A inflacao recorrente que se verificava no Brasil pré-real corroeu nao sé o poder de compra dos brasileiros, mas sua motivagto para poupar. Os “ex- cluidos” do sistema bancario sé tinham uma alternativa: gastar tudo hoje, pois amanha valeria menos! E mesmo aqueles que tinham conta com “remuneragao” automatica nunca conseguiam saber ao certo se essa estratégia lhe renderia o suficiente 22 O MERCADO DE ACOES EM 25 EPISODIOS para proteger seu capital da inflacao e, muito menos, qual seria a rentabili- dade real desse investimento. Uma época muito dificil para o pais Apés a introdugao do real, o Brasil viu-se numa fase de inflagao baixa e juros altos, permitindo, as vezes, que os juros reais no pais ultrapassassem impressionantes 22% a0 ano. 2206 de juros reais a0 ano é um valor tio absurdo que R$1,00 por dia, aplicado ao longo de 66 anos, daria algo préximo a R$1 bilhao! Além de essas taxas de juros dificultarem imensamente o financiamen- to dos investimentos produtivos, ainda serviram para que os brasileiros se acostumassem a ganhar 1,5%, as vezes 2% ao més, sem qualquer esforco nem estratégia de investimentos. Nem é preciso dizer como isso afastou os investidores da bolsa de va- lores durante os anos iniciais da estabilidade econdmica. De 2005 a 2008, essa realidade de juros mudou um pouco. Os juros ainda eram altos, mas jé foi possivel encontrar empresas que remunerassem o acionista, por meio de dividendos, em taxas superiores as encontradas na renda fixa. As duas maneiras de se aposentar com acoes A experiéncia em paises desenvolvidos mostra que hi, basicamente, duas maneiras de se aposentar com agoes. Uma, em que o investidor nao necessita vender suas ages, pois a remu- neracdo com dividendos ja se faz suficiente, e a outra, em que ele precisara reduzir seu patriménio para fazer frente as necessidades de caixa do dia a dia. Primeiro modelo: Aposentando-se com base nos dividendos pagos Esse tipo é o que ainda causa certa controvérsia, pois normalmente o dividend yield (retorno com dividendos, discutido mais adiante neste livro) é algo entre 2% e 5% ao ano e, no Brasil de 2008/2009, foi facil encontrar investimentos de renda fixa com rentabilidade entre 7% e 9%. POR QUE INVESTIR EM ACOES 23 As pessoas menos experientes em bolsa costumam dizer que nao é van- tagem, entio, buscar a aposentadoria com agées, dados os baixos retornos com dividendos, em comparagio com a renda fixa, Dizem isso por nao levar em consideragao o possivel ganho de capital, ou seja, 0 crescimento no valor das cotacdes que ajuda a evoluir o patrimé- nio durante o processo de poupanga e, ainda, que pode continuar apés 0 investidor comegar a gastar os dividendos. Na pritica, funciona como se segue. Considerando duas premissas bisicas: * Ganho de capital real? médio: 15% ao ano * Dividend yield médio (ganho com dividendos): 3% a0 ano (reinves- tidos) + Investimento mensal de R$350,00. valor de R$330,00 é préximo ao teto do desconto mensal para o INSS para 0 ano de 2009, que um trabalhador com carteira assinada ob- serva em seu contracheque. SApesar de 15% reais a0 ano parecer muito, s¢ estimarmos que o investimento mensal suba, ao menos, de acordo com a inflaso no periodo, esses 15% reais tornam-se nominais, patamar bem mais modesto. 24 O MERCADO DE ACOES EM 25 EPISODIOS ‘Anos | Complemento Patrimonio ‘Anos | Complemento Patrimonio 1 RS13,36 R$4.536,15 19 | R$1.399,56 | R$559.822,27 2 RS24,72 R$9.888,81 20 RS$1.662,82 RS665.126,43 3 R$40,51 R$16.204,94 21 R$1.973,46 RS789.385,34 4 RS59,14 R$23.657,98 22 RS$2.340,03 R$936.010,85 5 RS81,13 R$32.452,57 23 R$2.772,57 | RS$1.109.028,95 6 RS107,08 | RS.42.830,18 24 | R$3.282,98 | R$.313.190,31 7 RS137,69 R$55.075,76 5 RS3.885,25 | R$1.554.100,72 8 R$173,81 R$69.525,55 26 R$4.595,94 | R$1.838.375,00 9 RS216,44 R$86.576,30 7 RS5.434,55 | R$2.173.818,65 10 RS266,74 R$106.696,18 2B R$6.424,11 | R$2.569.642,15 u R$326,09 | _R$130.437,64 29 | _ R§7.591,78 | R§3.036.713,89 12 RS396,13 R$158.452,57 30 R$8.969,65 | RS3.587.858,54 123 RS478,78 R$191.510,18 31 R$10.595,52 | R$4.238.209,23 uw RS576,30 R$230.518,16 32 R$12.514,06 | R$5.005.623,04 15 RS691,37 R$276.547,58 33 R$14.777,93 | R$5.911.171,34 16 R$a27,16 | R$330.862,29 34 | R$17.449,30 | R§6.979.718,33 av R$987,38 R$394.953,65 35 R$20.601,51 | R$8.240.603,78 18 RS1.176,45 RS470.581,46 A tabela indica 0s “saliirios mensais” detivados dos dividendos que o inves- tidor hipotético teria caso investisse R$350,00 por més ao longo dos anos. Supondo que os R8350,00 representem 10% da remuneracio mensal do investidor, ele teria um valor semelhante a seu salério (R83.500,00), através dos dividendos, entre 0 24° e 0 25° ano. Caso 0s aportes representem 20% de seus ganhos mensais, significando que seu salirio seria, entao, de R$1.750,00, sua “aposentadoria” viria entre 0 20° e 0 21% Caso ele tenha paciéncia e disponibilidade para passar 35 anos aportan- do, 0 mesmo prazo de contribuigao estipulado pela lei brasileira (para ho- mens), contaria com uma bela remuneraciio mensal, através de dividendos, R$20.601,51. POR QUE INVESTIR EM ACOES 25 Pode-se, ainda, pensar no investimento como um complemento a apo- sentadoria. Dessa forma, a partir do 17° ano, o investidor poderia contar, em média, com R$1,000,00 de complemento 4 sua aposentadoria ou a seu salario. A vantagem de se aposentar com base nos dividendos é que, caso os lucros das empresas crescam, os dividendos também deverdo crescer, pois siio derivados dos primeiros. Outra op¢io para o investidor é, no momento em que desejar se apo- sentar, modificar sua carteira de agoes, retirando empresas com bom po- tencial de crescimento e que, normalmente, pagam pouco dividendos (pois reinvestem muito dos lucros) por empresas maduras e com pouca depen- déncia do ambiente econémico, as quais, normalmente, pagam dividendos maiores. Dessa forma, a remunerasio poderia dar um grande salto. Nao ¢ dificil encontrar empresas que paguem dividendos semelhantes aos ganhos poss{- veis em renda fixa. Seja no exterior, seja no Brasil. No Brasil de 2008/2009, seria como substituir empresas com foco em crescimento como Vale, Gerdau, Petrobras, Usiminas, Fosfértil, Porto Se- guro, Randon etc. por empresas maduras em mercados maduros e pouco voliteis como Eletropaulo, AES Tieté, Souza Cruz, Telesp, Comgis etc. Segundo modelo: Aposentando-se com base na venda de acoes. Ocorre que muitas pessoas consideram investir por 15 anos ou 20 anos muito tempo. Mesmo que passem 40, 45 anos contribuindo para o INSS. Vai entender... Para essas pessoas, hi a possibilidade de mesclar os dividendos com a venda de agoes; dessa forma, necessita-se de menos tempo para acumular o capital necessario. A parte desagradavel dessa estratégia é que o investidor vai precisar de- finir uma expectativa de vida para o periodo pés-aposentadoria. Trata-se de um planejamento que ninguém fica a vontade para fazer, principalmen- te por receio do efeito ‘Jorginho Guinle”, que planejou torrar toda a sua fortuna até os 80 anos. E o fez. 56 que viveu até os 88 anos... Brincadeiras 4 parte, o pior dessa estratégia é ter de forgosamente redu- zir seu patriménio em acées. As premissas sio: 26 O MERCADO DE ACOES EM 25 EPISODIOS * Ganho de capital médio: 15% ao ano * Dividend yield médio (ganho com dividendos): 3% ao ano (reinves- tidos) + Investimento mensal de R$1.000,00 + Tempo de contribuigao: 20 anos A seguir, a tabela com 0 calculo do quanto ele poderia dispor, mensal- mente, de acordo com sua expectativa de vida. ‘Anos aposentado | Complement | | Anos aposentado | Complemento 10 R§18,314,54 26 RS8.739,06 u R$ 16.884,59 21 RS8.524,39 12 R$ 15.694,87 28 RS8.325,83 B R$ 14.689,93 29 R§8.161,71 6 R$ 13.830,19 30 RS7.970,57 5 R$ 13.086,58 31 RS7.811,17 16 R$ 12.437, 35 32 RS7.62,40 uv R$11.865,82 33 RS7.523,28 48 R$11.359,05 34 RS7.392,96 19 R$10.906,80 35 RS7.270,68 20 R§10.500,89 36 R$7.155,78 21 R$10.134,71 37 RS7.047,64 22 R$9.802, 82 38 RS6.945,74 23 R$9.500,76 39 RS6.849,58 24 R$9.224,79 40 RS6.758,74 25 R$8.971,77 Com essas premissas, 0 investidor teria obtido um patriménio de R$1,900.361,23 ao longo dos 20 anos de aportes mensais. Esse patrimé- nio, segundo a metodologia proposta, seria desconstruido para compor a remuneragao mensal do investidor aposentado, O valor de gastos mensais ¢ composto, em parte, pelos ganhos com dividendos e complementado com venda de ag6es. Dentro da legislagao POR QUE INVESTIR EM ACOES 27 brasileira atual, ndo haveria incidéncia de Imposto de Renda, pois as alie- nages seriam sempre menores do que R$20.000,00 por més. Lendo os resultados A tabela mostra que, com base nas premissas adotadas, um investidor de 45 anos poderia iniciar seus investimentos em bolsa e parar aos 65 anos, totalizando os 20 anos de aportes. Poderia viver com: * R$6.758,74 ao més até os 105 anos, ou * R$18.314,54 ao més até os 75 anos. Ex6 para o método Jorginho Guinle! Aposentadoria com acgées? 0 décimo terceiro pode fazer muito mais do que vocé pensa “episddio” anterior tratou da aposentadoria considerando um investimento mensal ao longo de periodos superiores a 15 anos. Porém, a gestio do décimo terceiro salrio ja seria suficiente para trazer algum conforto ao poupador hipotético que busca a aposentadoria no mercado de agGes. O modelo de investir mensalmente durante 20 anos e receber uma apo- sentadoria até o fim da vida lembra bastante aquele vendido pelos planos de previdéncia privada. Agora, 0 modelo de investir apenas o décimo terceiro no tem qualquer paralelo no mercado previdenciitio nacional. O modelo As premissas bisicas sao: * Salario inicial de R$3.000,00, reajustado anualmente pela taxa de inflagao. + Décimo terceiro salario pago precisamente no tiltimo dia do ano. * Dividend yield médio (retorno com dividendos): 3% ao ano. * Rentabilidade real (acima da inflagao): de 12% ao ano a 18% ao ano. POR QUE INVESTIR EM ACOES 29 Como 0 leitor deve ter percebido, por um lado estima-se que o salirio crescerd 4 mesma taxa da inflagao no periodo, por outro que a rentabilida- de real (acima da inflagdo) sera de 12%, Para facilitar o entendimento, a inflagdo sera excluida dos célculos, pois ela age no sentido de aumentar 0 resultado do investimento, através do crescimento do salario e também da diminuicao do poder de compra do montante poupado. Excluir a inflagio dara diferenga pouco relevante no resultado final, pais as contribuigées, negativa e positiva, acabam por se compensar parcialmente. Para o leitor que desejar calcular essa diferenga, segue a formula para o calculo do valor futuro de uma anuidade crescente, em que: C— pagamento a ser feito no final do primeiro periodo, r— taxa de juros, g—taxa de crescimento da anuidade (inflacao), T — nimero de perfodos da anuidade. a VFPecx|. x|F5] x(1e4) r-g r-g [ier Considera-se, entao, um ambiente de moeda estével, para facilitar o entendimento da aposentadoria por meio do décimo terceiro salario. Aposentando-se com o décimo terceiro Imagine um investimento em uma carteira de agdes com rentabilidade de 12% a 18% ao ano, de todos os décimos terceiros salérios por um perfodo entre 10 e 35 anos. O reinvestimento total dos dividendos representa mais 3% ao ano no calculo da rentabilidade total do investimento. Rendimentos mensais ¢/dividendos Resultados 12% 15% 18% 10 anos RS152,28 RS176,41 R$204,55 20 anos RS768,33 RS3.039,54 RS3.429,19 30 anos RS3.260,59 R$5,932,11 R§3.429,19 35 anos RS6.608,78 R$13.624,89 R$28.169,53 30 O MERCADO DE ACOES EM 25 EPISODIOS A leitura dessa tabela indica que: Para uma rentabilidade real de 12% ao ano, mais reinvestimento dos dividendos, um investimento de 30 anos seria suficiente para permitir ao investidor ter um rendimento mensal com dividendos levemente superior aseu salario. Essa conta é simples. Investindo R$3.000,00 por ano, durante 30 anos, com taxa de 12%, mais 3% de dividendos, 0 montante chegaria a R$1.304.235. Esse valor em acdes remuneraria o investidor em R$39.127 ao ano sé com dividendos, R$39.127 divididos por 12 meses dariam R$3.260 por més, como se vé na tabela anterior. Caso o investidor tenha condicées de continuar investindo até comple- tar seu ciclo tedrico de contribuigao 20 INSS, 35 anos, poderia contar com um rendimento mensal, através de dividendos, superior ao dobro de seu salério, R$6.608,78, contra R$3.000,00. Rentabilidades superiores a 15% ao ano As rentabilidades de 15% e 18% trazem, naturalmente, valores mui- to confortaveis de aposentadoria, mas, ao contrério do que o crescimento acentuado da bolsa entre 2003 e 2007 pode sugerir, é dificil obter essas rentabilidades em periodos prolongados. Na visio da maioria dos investidores que iniciaram suas experiéncias em bolsa de valores apds 0 ano de 2002 ¢ antes de 2006, rentabilidades de 15% ou 20% ao ano podem ser consideradas baixas, pois, no raro, conseguiram experimenta-las em periodos muito mais curtos. As médias histéricas mos- tram que nunca foi facil obter essas taxas, apesar da experiéncia recente. O que é possivel obter em termos de rentabilidade? A maior associagao de investidores do mundo, a NAIC (www.bette- rinvesting.org), estipula como meta, desde 1949, 15% ao ano. Ao longo dos tiltimos 60 anos, na média, os clubes de investimento e os investidores individuais que seguem os princfpios da associacdo norte-americana tém obtido sucesso em atingir essa meta. Naturalmente com disciplina e méto- do, atributos indispensaveis ao investidor de longo prazo. E razoavel aceitar que, se a meta de 15% ao ano para um pais desenvol- vido e de economia madura é razoavel, provavelmente também o sera para POR QUE INVESTIR EM ACOES 31 um pajs emergente e com economia interna em desenvolvimento e ainda carente de investimentos. Curiosidades Supondo que o investidor hipotético obtenha a rentabilidade de 15% reais ao ano (mais o reinvestimento dos dividendos), receberia, j4 a partir do 26° ano de investimento, R$3.039,54 de rendimento mensal com dividen- dos, equivalente a seu salirio. Caso obtenha 18% ao ano, tera R$3.429,19 a partir do 24° ano. Para os apressados, que queiram se aposentar com apenas 15 anos de investimento, deverao contar com muitissima sorte, pois terao de obter rentabilidade de 38% ao ano. Apesar de 15 anos ainda parecer muito tempo, a rentabilidade de 38% ao ano obtida em longos periodos é tao grande, mas tao grande, que sua improbabilidade pode ser demonstrada por redugio ao absurdo. Veja: Qual seria a rentabilidade mensal com dividendos para quem investiu o décimo terceiro salério (R$3.000,00) todos os anos, durante 35 anos, e obteve rentabilidade média de 38% ao ano? Preparados para a resposta? Sentem-se entao: + R$3.054.525,46 ao més, sé de dividendos. O patriménio em agdes chegaria a RS1,22 bilhao, E ou nao um absurdo? Nao ha milagre Nos Estados Unidos, ja de bergo, os pequenos comecam sua vida de acionistas de longo prazo. Muitas escolas, publicas até, ensinam a investir em ages a partir da adolescéncia. Nao raro, o primeiro presente do vové é uma pequena carteira de agdes. Quem leu os grandes best-sellers sobre finangas pessoais e formacio de patriménio publicados em portugués deve ter reparado que é co- mum encontrar sexagenarios norte-americanos e europeus com alguns milhoes de délares de patriménio, mesmo tendo vivido uma vida sim- ples, em empregos pouco sofisticados ou até mal remunerados. Para os 32 O MERCADO DE ACOES EM 25 EPISODIOS habitantes do hemisfério norte, a expressio “millionaire’s next door” é bastante real. Apesar de parecer simples, a disciplina de investir por 25, 30 anos, alia~ da a capacidade de manter uma rentabilidade de 12% reais ao ano, é uma combinacao rara no Brasil. Talvez muitos dos leitores considerem 30 anos muito tempo. Em alguns casos, 30 anos serio, mesmo, tempo suficiente para que alguns desanimem em iniciar esse caminho rumo 4 construgao de patriménio em bolsa. En- tretanto, a realidade nao sera a mesmo para seus filhos ou netos, Para um pai de 50 anos ou um avé de 60, haveré sempre um garoto ou uma garota entre 0 e 35 anos que deve estar precisando de estimulo para chegar aos 30, 40, 60, 65 anos em confortivel posi¢do financeira. Educagio financeira de berco, ja! PARTE Como investir em acoes? Vocé sempre soube investir em bolsa de valores, acredite! 0 1° principio do INI de investimento em acées ay trades, stop gain, stops méveis, derivativos de cambio, puts, EBTIDA, credit default swaps, calls, home broker, Fibonati, valuation, travas de alta, WACC... ufa! Realmente deve ser muito dificil mesmo investir em bolsa... E 0 que pensam muitos investidores iniciantes e também o que mantém uma boa parcela de poupadores longe das bolsas, a0 menos no Brasil. Ocorre que essas expresses complicadas, com calculos indecifriveis, nao estado entre os ensinamentos mais relevantes para se investir em agdes, Na maior parte das vezes, so titeis apenas para profissionais, que vivem de realizar operagGes sofisticadas ou de formatar relatérios competentes sobre 0 ativos disponiveis para investimento. Muitos, muitissimos, investidores bem-sucedidos nem sequer sonham em manipular um fluxo de caixa descontado, uma trava de alta ou um fi- nanciamento de opgdes. Esses mitos, que vagam pelo inconsciente popular, fazem com que pes- soas com talento inato para investir em bolsa busquem outras opgdes de investimento, quando poderiam estar usufruindo os beneficios da prépria disciplina. 36 O MERCADO DE ACOES EM 25 EPISODIOS Um teste Carla quer comprar um carro de R$20.000,00 a vista. Consegue juntar R$1.500,00 por més. O que Carla pode fazer? A maioria das pessoas responderia: Carla poderia aportar os R$1.500,00 em um fundo de renda fixa que Ihe rendesse, liquidos, 0,996 de juros ao més. Com isso, seria possivel comprar 0 carro em 13 meses, pois teria obtido R$20.588,54. Na realidade, o fundo de renda fixa foi uma sofisticaco, pois a maioria responderia poupanca mesmo! O mesmo teste com outro grupo de pessoas Nos anos de fartura na bolsa, de 2003 a 2007, havia histérias recorrentes como a que se segue: No inicio de 2005, Alfredo exclama para seu amigo Liicio: “Estou com R$30.000,00 para comprar um carro. Acho que vou comprar um carrinho 1.4 completago!” Licio, que havia ganho uma grana na bolsa nos dois anos anteriores, res- ponde: “Nao faga isso! Vai por mim, pegue esses R$30,000,00 e compre tudo em Gerdau PN, GGBR4. No final do ano, vocé vai andar de Honda Civic.’ E foi tiro e queda. Ainda antes do final do ano, Alfredo encontra Liicio, j4 com seu Honda Civic 0 km, pois as agoes Ihe haviam rendido mais de 7096 no periodo. Bom, ocorre que Alfredo vendeu o Honda em maio de 2008, por R$45,000,00, stimo negocio, e comprou, de novo, tudo em Gerdau. Pen- sou: “Agora vou andar de BMW!” E, no inicio de 2009, tinha miseros R$17.500,00. Dava para comprar as rodas e os pneus de uma BMW nova. Talvez o estepe. LigGes do teste Apesar de os hipotéticos investidores espertos terem transformado um Peugeot 1.4 0Km em um Honda Civic, um mercado em baixa acabou por transformar um Honda Civic em um Uno Mille usado. O teste serve para ilustrar 0 seguinte: 0 método mais comum e mais consagrado para se investir em bolsa é semelhante ao que Carla fez para comprar seu carrinho, e NAO o que utilizaram Alfredo e Licio. COMO INVESTIR EM ACOES 37 Todas as pessoas que compreendem que a formacao de patriménio se da por aportes regulares em algum tipo de investimento sabem, em tese, como devem se comportar no mercado de agées. E chato, nao tem muitas emogées, mas é o ensinamento mais basico para um investidor: poupe e aplique esses recursos regularmente! Vale para a poupanca, vale para a renda fixa e vale, também, para o in- vestimento em acoes. Pasmem, senhores! 0 1° principio do INI Investir regularments, independentemente das condigées do mercado. ¥, a te- gra ntimero um para o investimento consciente em bolsa. Todos sabem disso quando se trata de juntar dinheiro para um carro, um imdvel ou para a aposen- tadoria, mas pouquissimos aplicam essa sabedoria 4 bolsa de valores. Talvez a causa mais provavel seja o histérico de juros altos no Brasil, nos ultimos 20 anos. Com juros altos, o comportamento utilizado por Carla ja seria imensamente lucrativo em renda fixa, deixando a renda varidvel ape- nas para especulacoes de curto prazo. Com a redugao dos juros, iniciada no final de 2006, muitas pessoas co- megaram a procurar outras opgdes para remunerar suas poupangas, pois 0 que antes chegava a 29 ao més baixou para menos de 1% ao més. E de se esperar que, ao atingir niveis internacionais de juros, o pais tenha cada vez mais poupadores migrando uma parcela de seu pattim@nio para a bolsa. Um caso pratico de investimento regular Roberto decidiu que nao mais suportava a baixa remuneragao da pou- panga. Parou de aportar seus R$1.000,00 mensais em renda fixa e passou a comprar aces da companhia em que trabalhava, a VALE. Na tabela seguinte, ha uma simulagao desses aportes desde 0 inicio de 2005 até o final de 2008, quatro anos, portanto. A primeira compra feita por Roberto! foi em 31/01/2005, dia de seu aniversario. A cotacio da VALE PN (VALE5) era R$14,59 e ele gastou R$992 para comprar 68 aces da empresa. 'Com valores ajustados para as bonificaydes/desdobramentos realizados pela VALE entre 2005 ¢ 2008. 38 O MERCADO DE ACOES EM 25 EPISODIOS Como se vai perceber, pela leitura da tabela a seguir, Roberto chegou a comprar VALES a R$13,10, em 28 de abril de 2005, o que the permitiu adquiriz, com os mesmos R$1.000,00, 76 agdes, 11,7% a mais em papéis do que comprou em janeiro. Nesse mesmo ano, a VALES bateu R$19,38 em 30 de novembro. Como haviasubido bastante, Roberto comprou apenas 51 agGes, com seus R$1.000,00, 3396 menos papéis do que comprara em abril de 2005, na minima. Ao comprar regularmente, nao ha aquela divida eterna: Qual é a hora de entrar? O investidor jamais conseguird acertar a maxima ou a minima de qualquer periodo que seja. E isso se esta vislumbrando um prazo de 10, 15 anos. Qual a diferenca de comprar por R$13,10 ou R$12,90, se a aio bater R$100,00? Parece uma pergunta retérica, mas vale fazer a conta: * Crescimento percentual — R$13,10 para R$100,00: 663% * Crescimento percentual — R$12,90 para R$100,00: 675% Big deal? No big deal Preco médio Roberto, por comprar regularmente, fez um prego médio bastante inte- ressante para seu portfélio. Sua primeira compra foi a R$14,59. Apés 48 aportes e chegando a ter comprado acdes por até R$51,88, ainda assim o prego médio das agdes em sua carteira atingiu o valor moderado de R$24,28. Isso significa que seu preco médio é 6696 superior ao primeiro valor pago pelas agoes VALES e 5396 inferior ao valor maximo pago pelas ages. Muitas pessoas ironizam a formagao de prego médio, por considerarem ma ideia comprar agoes na baixa, para reduzir o prego registrado em sua carteira. Ocorre que elas teriam toda razdo, caso considerassem que a em- presa em que estZo investindo nao va crescer. Mas estariam amplamente enganadas se a companhia apresentar crescimento no futuro. O investidor deve separar as quedas. Realmente quando se tem, por hipéte- se, 1.000 acdes a R$10,00 cada, de uma empresa que apresentou um resultado sofrivel e néo parece que va conseguir recuperar sua lucratividade, é bobagem comprar mais, mesmo que ela caia a R$5,00. Vender, mesmo com prejuizo, é a decisdo mais sensata. Ao menos estard de acordo com a percepcao do préprio investidor, de que a empresa nao tera condigGes para retomar o crescimento. we [%26'0 [wade [wOO'OE [EG'ZS [WEE'SD [wEY'S6 [WBE TEE [%5L'OTT | wETET [%87'ELT | BOET6 oe OyueB/epieg Beye $Y | 6e've SU [82°42 SY [Ge've SU [EL've SU [vo'E? 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