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Portugués- 112 ano Padre Antonio Vieira, Sermdo de Santo Anténio sintese dos capitulos EXORDIO — Capitulo! Este capitulo inicia-se com o conceito predicével (citaco biblica que serve de mote ao serméo) ~ Vos estis sal terrae ~ a partir do qualo discurso se desenvolve O texto estrutura-se em torno da importancia da palavra dos pregadores ~ equivalente ao “sal” ~ na preservagio da moralidade e integridade dos homens — a “terra” Tal como o sal impede a corrupedo da matéria, também os pregadores devem impedir a corrupco das almas, porém, tal no se verifica Vieira elogia aqueles que espalham adoutrina divina, ou seja, os pregadores que ensinam e, 20 mesmo tempo, fazem 0 que devem; e acusa aqueles outros que no cumprem a sua func3o, ou seja, os pregadores que pregam ao contrario, sendo por isso, merecedores de desprezo. Vieira levanta também ahipétese dea culpa poder estar do lado dos ouvintes, porque preferem imitar 0 atos dos pregadores ou porque se detxam levas pelos seus desejos. O terceiro paragrafo introduz a figura de santo Anténio e 0 milagre da pregacao aos peixes. Vieira narra um episéclo da vida do santo, em Italia, quando os habitantes da cidade nao o quiseram escutar, tendo, entéo, Anténio dirigido as suas palavras 20s peixes, que o ouviram. Vieira enaltece Santo Anténio; comparativamente aos outros doutores da lgreja, este santo “foi sal da terra, e foi sal do mar” Refere, iguaimente, que se sente préximo do santo, porque as suas palavras tém “tidonesta terra uma fortuna tao parecida & de Santo Antonio em Arimino”, o que o leva a atuar como 0 seu mentor, ou seja, a pregar aos peixes e ndo aos homens. capitulo encerra com a tradicional invocacao & Virgem (“Domina maris: Senhora do Mar”) a quem Vieira pede a “costumada graca. Ave Maria”. EXPOSICAO E CONFIRMACAO Capitulo 1 No primeiro paragrafo deste capitulo, o orador afirma que nunca teve pior auditério do que 0s peixes, porque so “gente (..) que se nao ha de converter”, embora apresentam boas qualidades, Depois de referir, novamente, as propriedades do “sal”, Vieira sublinha que as pregagées de Santo Anténio devem servir de exemplo a todos os pregadores. Vieira refere ainda as palavras de S. Basilio, que sublinham que os peixes no $6 siio dignos de repreensio, mas também de louvor e de exemplo a seguir, e 0 exemplo de Cristo, que comparou a sua igreja a uma rede de pesca, sustentam a argumentacao do orador e ajudam a definir a estrutura do sermao. Ana Rita Azevedo 1 Portugués- 112 ano Padre Antonio Vieira, Sermdo de Santo Anténio Ao apresentar as qualidades dos peixes, o pregador enumera, implicita e explicitamente, os defeitos dos homens: = odeslumbramento face & adulacdo — “mas isto é Ié para os homens, que se deixam levar destas, vaidades, e é também para os lugares em que tem lugar 2 adulacéo”; ~ aaltivez e a presuncao ~ “Os homens perseguindo a Antonio, querendo-o lanar da terrae ainda do mundo”; — _avioléncia ea obstinaco ~ “os homens to furiosos e obstinados”; a crueldade irracional — “os peixes irracionais se tinham convertido em homens e os homens no em peixes, mas em feras’; = cexibicionismo e a vaidade - “longe dos homens e fora dessas cortesanias” A glorificacSo dos peixes e a critica aos homens é ilustrada por exemplos biblicos. Também é fundamentada em referencias a Aristoteles e Santo Ambrosio, que reforcam a argumentacao. capitulo termina com um novo apelo aos peixes para que sigam 0 exemplo de Santo Anténio, que tudo deixou, a sua cidade e 0 seu pais, alterando a sua propria identidade e o seu saber. Capitulo I Neste capitulo apresentam-se as virtudes de alguns peixes em particular. primeiro exemplo referido é 0 do peixe de Tobias, cujo fel serviria para curar @ cegueira, enquanto © coragéo seria usado para expulsar os deménios. Tobias confirmou 0 poder curativo das entranhas do peixe: seu pai, que era cogo, recuperaria a visio, depois de, 2 conselho do anjo S. Rafael, Ihe ter sido aplicado um pouco de fel extraido do peixe; 0 coraco, depois de queimado, expulsou um deménio que ja tinha matado sete maridos a Sara. Sara e Tobias casaram e o deménio “nunca mais tornou’. Vieira retorna a figura do santo, referindo que as suas palavras tinham o mesmo poder que as visceras do peixe, uma vez que, se os homens Ihe abrissem os seus coragées, Anténio tirar-Ihes-ia as cegueiras € livrd-los-ia dos deménios. Em seguida, Vieira apresenta outro exemplo, o da rémora, um peixe que, quando se cola ao leme das naus da india, consegue, apesar do seu diminuto tamanho, mudar-Ihes 0 rumo. Também as palavras de Santo Antnio foram uma rémora na terra, porque conseguiram “domar a firia das paixées humanas”. Vieira continua 0 seu discurso alegérico, apresentando exemplos que confirmam a afirmacio anterior: a nau Soberba, com as velas inchadas de vento, no se desfez nos rochedos, porque as palavras de Anténioa salvaram; amu Vinganga, repleta de ira e de édio, encontrou a paz através das palavras do santo: — anau Cobiga, sobrecarregada com uma “carga injusta”, foi salva das garras dos corsdrios pela ago de Santo Anténio; = a nau Sensualidade, perdida na cerrac3o e na noite, iludida pelos cantos das serzias, encontrou a salvaco, seguindo a luz das palavras do santo. Ana Rita Azevedo 2 Portugués- 112 ano Padre Antonio Vieira, Sermdo de Santo Anténio © exemplo seguinte é 0 do torpedo, peixe que produz descargas elétricas, que fazem tremer o braco do pescador que o tenta capturar; a descarga elétrica simboliza a palavra de Deus, que deveria abalar ‘a consciéncia dos homens. iltimo exempio que o pregador apresenta é 0 do quatro-olhos, peixe que, nadando a superficie das ‘guas, epresenta dois pares de olhos: um par permite-the defender-se das aves, enquanto 0 outro 0 protege dos peixes predadores. capitulo encerra com novos louvores aos peixes, porque: * do eles que allmentam as Cartuxas e os Bucacos (ordens religiosas), “que professam a mals rigorosa austeridade”; + so eles que ajudam os cristios “a levar a peniténcia das quaresma: * sSoelesque foram escolhidos por Cristo para festejar “a sua Pascoa, as duas vezes que comeu com os seus discipulos depois de ressuscitado”; * 8800s “companheiros do jejum e da abstinéncia dos justos”; * 8800 alimento que pode ser comido todos os dias da semana; * so “criaturas daquele elemento (a agua), cuja fecundidade entre todos é propria do Espirito Santo”. Finalmente, Vieira enfatiza 0 facto de Deus ter abencoado os peixes para que eles crescessem e se mubtiplicassem, podendo, assim, ser o alimento dos pobres. O exemplo mais claro deste facto séo as sardinhas que o Criador muttiplica “em numero to inumerével”, porque so “sustento dos pobres”, enquanto “Os Solhos, e os Salmées, so muito contados porque servem 4 mesa dos Reis, e dos poderosos”, Capitulo IV A frase inicial deste capitulo funciona como uma charneira que estabelece a momentos diferentes do serméo: o anterior, em quese louvaram as virtudes dos peixes, eo posterior, ‘em que se apontarao os seus defeitos. ago entre dois Sendo 0 sermao alegérico, o tema deste capitulo € 0 da exploragéo dos pobres e indefesos pelos poderosos e prepotentes, a antropofagia social. Vieira continua a criticar os peixes, afirmando que no percebe como, sendo todos imaos e vivendo no mesmo elemento, se comam uns aos outros. Para Ihes mostrar quo feio € 0 seu pecado, vai recorrer ao exemplo dos homens. Os peixes s80, entéo, convidados a olhar para a terra, ndo para os matos (oque seria previsivel, visto que a antropofagia ndo deveria se uma pratica comum entre homens “civilizados"), mas para a cidade. Desse modo, poderdo constatar nos homens os seus préprios defeitos, nomeadamente o modo como se comem, ou seja 0 modo como se exploram uns 20s outros. Em seguida, Vieira assume um tom mais violentoe interventivo, referindo-se 8 injustica e as maldades causadas por: * seem “os maiores que comem os pequenos”; Ana Rita Azevedo 3 Portugués- 112 ano Padre Antonio Vieira, Sermdo de Santo Anténio * _ serem 0s pequenos comidos “de qualquer modo”; * serem os grandes aqueles “que t8 mando das cidades e das provincias, no se contenta a sua fome de comer os pequenos um por um, ou poucos a poucos, sendo que devoram e engolem 05 povos inteiros”; + serem os pequenos comidos como se fossem po, ou seja, um alimentos que se come quotidiana © indiscretamente — ‘o pio € comer de todos os dias, que sempre e continuadamente se come”; * _ serem os pequenos comidos em qualquer modo - “no s6 de dia, send também, de noite, as claras es escuras, como também fazem os homens. Vieira tenta, entio, convencer os peixes a no se comerem uns aos outros, referindo-se 20 diltivio e & arca de Noé. Na arca, 0s animais da terra e do ar, que costumavam comer-se uns aos outros, ndo 0 ‘era por uma questo de sobrevivéncia e todos viveram em paz. Por isso, os peixes devem seguir © seu exemplo, evidenciando atitudes de temperanca e benevoléncia, Os peixes so, ainda, acusados de outros defeitos: a ignorancia e @ cegueira, que os fazserem pescados e perderem a vida, sendo “Enganados por um retalho de pano” tal como os homens. capitulo acaba com mais uma referéncia a Santo Antonio como exemplo a seguir. Santo Antonio preferiu a sobriedade & ostentagdo, recusando galas e vaidades e, por isso, atingiu a santidade. Foi com esta postura simples e humilde que conseguiu converter muitos homens desviados da Fé. Capitulo V Depois de apresentada a critica generalizada, Vieira enuncia, neste capitulo, os principais defeitos e vicios de alguns peixes, em particular. Apr espécie a ser criticada ¢ 0 grupo dos roncadores. Estes peixes, apesar de pequenos ¢ aparentemente vulnerdveis, emitem um som forte, ao contrario do que acontece com outras peixes de maior envergadura. interroga-se sobre tal contrassenso, embora, segundo o pregador, a resposta seja Obvio: 0s roncadores simbolizam aqueles que se autopromovem, exibindo a sua vaidade e poder, sendo, por isso, arrogantes, Vieira exemplifica a triste sorte dos roncadores, referindo 0 exemplo de Pedro, o discipulo de Cristo A este apéstolo, apesar de ter afirmado que defenderia até 8 morte 0 seu Senhor, bastou-the uma simples afronta de uma mulher, apés a priséo de Cristo, para negar que conhecia o seu Mestre. Ora, se tal aconteceu a S. Pedro, muito menos razes teréo os homens para exibirem a sua arrogancia. Vieira recorre, ainda, a outros exemplos biblicos (Davi e Golias, Caifés e Pilatos) para reiterar que os arrogantes e os soberbos pensem que so Deus, mas acabam por ser diminufdos ehumilhados, porque “quem se toma com Deus, sempre fica debaixo”. No entanto, o simbolo da verdadeira sabedoria, Santo Anténio, nunca “blasonou” disso, ou seja, nunca se vangloriou das suas capacidades, confinando-se a sua condicao de servo de Deus —“E porque tanto calou, por isso deu tamanho brado”. Outra das espécies piscicolas s0 0s pegadores. Estes peixes pequenos agarram-se ao dorso dos peixes maiores, que nao conseguem livrar-se deles, vivendo como parasitas as custas dos seus hospedeiros. Ana Rita Azevedo 4 Portugués- 112 ano Padre Antonio Vieira, Sermdo de Santo Anténio Partindo deste exemplo, o pregador tece uma violenta critica a0 aparelho colonial portugués, referindo que estes animais aprenderam a ser parasitas com os portugueses, porque nao ha nenhum vice-rel ou governador que parta para as conquistas sem ir rodeado de larga comitiva. Os mals inteligentes tentam construir a sua vida autonomamente, mas os mais preguicosos acabam como os pregadores que, quando 0 tubaro, que Ihes serviu de hospedeiro, é pescado, morrem com ele, porque a ele estdo pegados. Vieira refere, entao, um exemplo biblico que ilustra a triste sorte dos pegadores: a familia de Herodes, que perseguiu a Sagrade Familia, e que se afundou com o sue patriarca. Mas os pegadores nao sao apenas exemplo das més praticas, pois “Deus também tem os seus pegadores”, aqueles que espalham a palavra divina: David pegou-se a Deus e Santo Anténio a Cristo ambos foram bem-sucedidos Vieira centra, a seguir, a sua aten¢do nos voadores. Estes animais, crisdos por Deus para serem peixes, ‘como tém umas barbatanas maiores do que a generalidade dos peixes, queriam imitar as aves. Esta ambico de os voadores se quererem transformar naquilo que verdadeiramente no so, s6 hes traz sofrimento porque estao sujeitos aos perigos do mare aos perigos do ar ~ no mar morrem enganados pelo isco € no ar morrem porque as veles, as cordas € os lagos dos barcos se transformam em redes, apanhando-os. Vieira refere ainda Santo Anténio como exemplo de alguém que sempre se desmarcou da ambico, Porque reconhecia que as asas que fazem subir também fazem descer, 0 que pode precipitar a destruigéo. Assim, Santo Anténio preferiu remeter-se & sua humildade: “Nao estendeu as asas para subir, encolheu-as para descer”. Altima criatura marinha a ser criticada é 0 polvo. Este peixe, na verdade, parece um monge e uma estrela; simula brandura e mansidao, contudo, debaixo desta aparéncia &, segundo S. Basilio e Santo ‘Ambrésio, “o maior traidor do mar”. Com a sua capacidade de dissimulagSo, 0 polvo engana os outros peixes com malicia e mentira, cagando-os mais facilmente. A tradicéo é de tal forma repugnante que Vieira afirma que o polvo € pior que Judas, o paradigma do traidor no Evangelho, porque 0 apostolo planeoua entrega de Cristo as escuras mas executou a trai¢ao as dlaras, enquanto o polvo, escurecendo a gua com a sua tinta, rouba a luz & sua presa para a apanhar. As palavras finais do pregador so violentas: “Vé, Peixe aleivose e vil, qual é a tua maldade, pois Judas em tua comparacao ja 6 menos traidor! capitulo acaba com uma critica feroz aos portugueses. Partindo do exempio de Santo Anténio~“o mais puro exemplar da candura, da sinceridade, € da verdade, onde nunca houve dolo, fingimento ou engano” -, Vieira refere a deterioracio dos valores nacionais, uma vez que, no passado, as s exemplares de Santo Anténio eram extensivas a todo 0 povo portugués, no sendo, por isso, atributos dos santos ~ “bastava antigamente ser portugués, nao era necessério ser santo”. caracteri Ana Rita Azevedo 5 Portugués- 112 ano Padre Antonio Vieira, Sermdo de Santo Anténio PERORACAO — Capitulo VI No primeiro paragrafo deste capitulo, Vieira refere o facto de os peixes nunca serem animais escolhidos para os sacrificios rituais, porque, como nao vivem fora da 4gua, chegariam mortosao altar. 0 orador afirma que, tal como os peixes, hd muitos homens que chegam ao altar “mortos”, ou seja, em pecado mortal. No segundo pardgrafo, o orador refere a sorte que os peixes tém, pois embora irracionais, no ofendem a Deus nem com as palavras, nem com a meméria, nem com o entendimento, nem com a vontade; apenas desempenham a missdo para que Deus 0s criou, enquanto ele foi criado para servir Deus, missdo que néo realiza na sua plenitude, pois ndo consegue converter os homens. 0 Gitimo pardgrafo constitui uma exortagao aos peixes para que louvem a Deus, porque Fle os fer numerosos, belos € diversos, porque Ihes deu a dgua para nela viverem e se multiplicarem e porque escolheu os pescadores (os apdstolos) para com Ele privarem, 0 sermao termina de modo provocatério, pois como a pregagao foi destinada aos peixes e estes, pela sua condicao, nfo so capazes “de Gléria nem de Graca”, 0 sermao também "no acaba (..) em Graga € Gloria’, ou seja, no atinge o seu objetivo. O pregador remete ento para Deus a béncdo final — “assim como no principio vos deu a sua bén¢3o, vo-la dé também agora”. Ana Rita Azevedo 6

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