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V. 5, n.

1 - Fevereiro de 2018

A Guerra Civil na Síria: atores,


interesses e desdobramentos
João Victor Scomparim Soares1

Introdução ideais da Primavera Árabe (movi- em todo país que foram acompanha-
mentos reformistas pró-democracia dos por uma repressão violenta por
O conflito que acontece hoje na Síria no Oriente Médio) foram fortemen- parte do Estado. Assim, a resposta
é complexo, envolvendo muitos gru- te reprimidos pelo governo. Tais ma- também violenta daqueles que se
pos, alguns extremistas, como Estado nifestações foram se intensificando, manifestavam resultou na formação
Islâmico e a Frente al-Nusra, grupos e atingiram os grandes centros urba- de diversos grupos. Alguns eram se-
rebeldes contra o governo, as forças nos do país. Em março de 2011, jo- culares com ideais liberais e demo-
armadas sírias, e instituições, como vens foram presos e torturados após cráticos, outros com profundas raízes
o Partido dos Trabalhadores Curdos terem sido detidos por pichar um islâmicas conservadoras e extremis-
(PKK), sem contar as coalizões ex- muro com mensagens que veicula- tas, alguns com ideais etnocêntricos
ternas que atuam ativa e diretamente vam slogans revolucionários. O fato e separatistas, como os curdos, que
na guerra civil. desencadeou uma série de protestos apesar de combaterem igualmente

O conflito remonta 40 anos, quan-


do em 1970 aconteceu a tomada da
presidência por Hafez al-Assad, pai VOA

do atual presidente sírio Bashar al


-Assad, que abriu as portas para que
muitos alauítas (crença pré-mao-
metana, que representa 12% da po-
pulação síria) assumissem postos-
chave no governo. Desde então a
questão do credo e do poder execu-
tivo se explicitou.2 Essa atuação não
se alterou em 2000 quando Bashar
substituiu seu pai.

O ambiente para o conflito atual


começou a se formar em Daraa,
uma pequena cidade no sul do país,
onde manifestações, motivadas pelos
Combatente com bandeira do Estado Islâmico.

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OCI • Série Conflitos Internacionais

o governo não apresentam uma coe- todo o território do país, contudo em remos protegendo-a. A comuni-
rência entre si.3 sua maioria os grupos carregam o ob- dade internacional, com Rússia
jetivo comum de remover o governo e Estados Unidos na liderança,
bombardeia os muçulmanos do
Estava, assim, formado o cenário o presidente Assad do poder. Um dos
levante (Síria) com o pretexto de
para a guerra civil. principais grupos é o Exército Livre
nos golpear, que respondemos à
da Síria, formado por civis e milita- Al-Qaeda. Por isso, decidimos
A violência se intensificou mais e res desertores, que além de lutar por interromper nossas relações com
mais, até o ponto de que o confli- uma transição pacífica e democrática a Al-Qaeda e rebatizar a Nusra”.
to hoje é mais do que uma dispu- Todavia o grupo mantem seus
do poder, também são atores funda-
ta entre grupos pró e anti-Assad. objetivos de aplicar a religião de
mentais na luta contra o Estado Is-
Adquiriu contornos sectários, Alá, estabelecer a sharia (lei islâ-
jogando a maioria sunita contra lâmico, mantendo diversas regiões
mica) e levar a justiça aos povos,
o ramo xiita alauíta de Assad. E libertas.7 Há ainda o Conselho do
unificando as facções de mujah-
o avanço do EI deu uma nova di- Comando Revolucionário, uma enti- idins para libertar o levante”. O
mensão à guerra.4 dade que tenta unificar as facções e grupo passou a se denominar Fa-
acabar com as divergências de mais tah al Sham Front.11
A oposição exigia a renúncia do pre- de 70 grupos rebeldes sírios.8 Esti-
sidente, que por sua vez ma-se haver cerca de 100 mil com- Os curdos são a maior etnia sem ter-
batentes rebeldes, alguns com forte ritório próprio, por isso, é natural
se recusou a renunciar, mas fez tendência extremista e com vínculos que uma das reivindicações do gru-
concessões para tentar aplacar os com a Al-Qaeda. Os grupos modera- po seja a constituição do Curdistão
manifestantes. Ele encerrou o es-
dos têm o apoio principalmente dos que ultrapassa diversas fronteiras o
tado de emergência, que durava 48
Estados Unidos da América (EUA).9 que implicaria na perda de territó-
anos, fez uma nova Constituição e
realizou eleições multipartidárias. rio por parte de outros países. A rei-
Mas as medidas não convenceram A Jabhat Fateh al-Sham, também vindicação por autonomia enfrenta
a oposição, que continuou comba- conhecida como Frente al-Nusra, é grande oposição da Turquia, país
tendo e exigindo sua queda.5 uma organização jihadista salafista que possui a maior concentração de
opositora às forças do governo sírio, curdos do mundo.12 Na Síria, a área
Os diversos grupos tendo como objetivo estabelecer um curda é conhecida como Rojava, si-
do conflito sírio estado islâmico no país.10 Segundo o tua-se no norte do país, na frontei-
vídeo de apresentação do grupo, a ra com a Turquia, e abriga mais de
O conflito sírio é caracterizado por Frente al-Nusra se constitui de com- 300 mil curdos-sírios que se dividem
ser descentralizado e com muitas batentes sírios, que voltaram de di- em mais de 30 facções. A região está
frentes e grupos envolvidos, no qual versos front de jihad para restaurar sob o controle do Partido da União
não se aplicaria a definição clássica os mandamentos de Deus na Terra Democrática (Partiya Yekîtiya De-
de guerra. Há ainda quem o chame o e vingar a honra violada e o sangue mokrat – PYD em curdo) desde
de “nova Guerra Fria” ou “mini guer- derramado dos sírios. Desde sua apa- 2012, e se opõe ao presidente Bashar
ra mundial”.6 Nesta guerra atuam di- rição em 2012, a al-Nusra executou al-Assad. O braço armado do partido
versos grupos, os quais especificare- diversos ataques contra alvos estra- são as milícias Unidades de Proteção
mos a seguir. tégicos do governo, incluindo a to- Popular (Yekîneyên Parastina Gel -
mada de pontos-chaves, como uma YPG, em curdo), considerada a força
As forças do Governo Sírio são, ba- base aérea no norte do país. O grupo síria mais efetiva na luta contra o Es-
sicamente, as forças armadas que se é considerado terrorista pelos Estado tado Islâmico. Além disso, o PYD é
mantiveram leais ao atual regime do Unidos. Desde 2013, a organização filiado ao Partido dos Trabalhadores
presidente alauíta Bashar al-Assad. foi filiada à Al Qaeda, que a consi- Curdos da Turquia. O Estado Islâmi-
Tem apoio dos governos russo e ira- derava sua única representante na co também se opõe aos curdos, que
niano e do partido libanês Hezbollah. Síria. No entanto em setembro de por sua vez têm o apoio dos Estado
2016, seu líder, Al Golani, anunciou Unidos e também da Rússia.13
Com relação aos grupos rebeldes, a separação entre Al Qaeda e a Al
não há um grupo rebelde unificado Nusra, em suas palavras: As elites tribais também são impor-
com liderança e comando único de- tantes atores no jogo geopolítico,
finido. Os rebeldes são diluídos por Preservaremos a jihad e continua- todavia seus objetivos são mais lo-

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calizados, e se contrapõem entre si,

Mahmoud Bali/VOA
visto que as lideranças se dividem
entre xiitas e sunitas. Enquanto os
xiitas se preocupam em conter as
ameaças dos extremistas sunitas,
as tribos sunitas tem como objeti-
vo manter seu controle territorial.
Além disso, eles têm apoios inter-
nacionais diametralmente opostos.
Os xiitas são apoiados pelo Irã, e os
sunitas pela Arábia Saudita.
Parte destruida da cidade de Raqqa.
A atuação do Estado Islâmico no
cenário da guerra civil síria ganhou
projeção em 2014, quando o grupo se
aproveitou do caos e tomou controle nham o comum objetivo de destruir Rússia. No entanto, outros países in-
de grandes áreas na Síria e no Iraque, o Estado Islâmico. Em outubro de fluenciam na guerra e se dividem en-
proclamando a criação de um cali- 2017, Raqqa, a capital do califado, foi tre os blocos de apoio e oposição ao
fado. O principal objetivo do grupo retomada dos militantes, bem como governo de Assad, como a Turquia,
era expandir o califado, para assim a cidade de Mosul, o maior reduto Arábia Saudita, França, Reino Unido,
manter a sua capacidade de operar dos extremistas no Iraque, deixando Irã, Qatar e outros Estados árabes.
no território sírio. No ápice do avan- sob o controle do grupo apenas vi-
ço territorial, o grupo chegou a con- larejos à margem do Rio Eufrates.15 A oposição ao governo sírio se re-
trolar um área que englobava cerca Tais conquistas representaram o fi- sume aos países de maioria sunita,
de 10 milhões de pessoas. A cidade nal derradeiro da luta contra o gru- como Arábia Saudita, que faz parte
de Raqqa foi escolhida como sede do po, apesar dele ainda manter certa da coalização contra o Estado Islâ-
autoproclamado califado.14 As coali- capacidade de operação.16 mico liderada pelos Estados Unidos.
zões internacionais, lideradas princi- O governo saudita já deixou claro
palmente por Rússia e Estados Uni- Sistema internacional que é de extrema importância reti-
dos, com o apoio de diversos países e influências rar Bashar al-Assad do poder. Dessa
como Turquia, Egito, Emirados Ára- forma, a Arábia Saudita, é um dos
bes Unidos, França, Espanha, dentre Alguns consideram o conflito sírio maiores fornecedores para os rebel-
outros iniciaram diversas operações como uma nova Guerra Fria, exata- des, inclusive para grupos mais radi-
contra o grupo. Apesar de apoiarem mente pelas influências e interesses cais, diferente da postura dos EUA.17
lados diferentes na guerra civil, ti- contrários dos Estados Unidos e da
Por outro lado, há países como o
Irã, de maioria xiita, que se alinham
à Rússia no apoio do governo sírio.
VOA

Para os iranianos, a manutenção de


Assad é chave para frear a influên-
cia de seu rival na região, os saudi-
tas. Nesse sentido, o Irã se colocou
contra os insurgentes sunitas que se
opõe ao governo de Assad.18

A atuação da Turquia no conflito é


delicada, complexa e algumas vezes
controversa, porque além de fazer
fronteira com a Síria, a questão cur-
da influencia decisivamente em seus
interesses. Como país de maioria su-
Tropas Curdas após capturar a cidade de Raqqa. nita, a Turquia apoiou grupos rebel-
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des contra o governo de Assad desde do da Organização. No mesmo ano, seu projeto de retomar o legado per-
o começo do conflito. O país acolheu a Turquia declarou rompimento do dido após o colapso da União Sovié-
ainda vários opositores de Assad. diálogo com a Síria. Em março de tica. Os objetivos externos estariam
Além disso, o governo turco lançou 2012, um enviado especial da ONU ligados a:
ataques aéreos contra militantes foi até Damasco para discutir manei-
curdos no norte do Iraque, perto da ras de acabar com a violência, sem • opor-se à tentativa ocidental de
fronteira com a Síria, que tinham, resultado. A hostilidade se mante- desestabilizar o Oriente Médio por
inicialmente como alvo o EI, que ve, e em diversos momentos foram meio da exportação de revoluções
também é inimigo dos curdos.19 Des- evidenciados picos de violência com que se dizem democráticas;
de 2016 os turcos já consideravam massacre de civis, como em agosto
necessário desencadear operações de 2013 quando um ataque quími- • aproveitar que o Oriente Médio
terrestres na Síria, principalmente na co nos arredores de Damasco deixou vive em um momento de transição,
área de fronteira entre os dois países, centenas de mortos.21 pela mudança de postura da políti-
com o objetivo de infiltrar as linhas ca estadunidense na região. A pos-
das milícias curdas e criar uma “zona O episódio do ataque químico qua- tura norte-americana de equilibrar
tampão” na fronteira. Arábia Saudita se deu origem a uma intervenção a tensão entre Irã e Arábia Saudita,
e Emirados Árabes Unidos também estrangeira no país. Entretanto, o muitas vezes optando por não tomar
apoiam esse tipo de operação. Pela presidente russo, Vladimir Putin, atitudes, deixa alguns líderes árabes
falta de apoio ocidental a ideia ficou propôs o controle internacional das descontentes com a aliança com os
em stand by até o início de 2018, armas químicas e o governo sírio as- EUA. Portanto, com essa lacuna a
quando a Turquia iniciou a Opera- sinou plenamente o tratado global Rússia busca demonstrar força para
ção Ramo de Oliveira, com exército contra armas químicas e se compro- se posicionar como uma potência ca-
realizando uma incursão terrestre no meteu a entregar seu arsenal para paz de interferir na região;
norte da Síria, atacando milícias cur- destruição.22
das apoiadas pelos EUA.20 • outro objetivo seria contornar o
Diversos interesses dos principais isolamento internacional da Rús-
Vale a pena lembrar, que todos os atores internacionais influenciam sia devido à crise na Ucrânia. Putin
países apresentados aqui se opõem diretamente o conflito interno sírio, vem tentando reduzir as tensões na
de algum modo ao Estado Islâmico principalmente dos Estados Unidos região, ao mesmo tempo que busca
e praticamente todos eles operaram e da Rússia. Por um lado, Putin não um acordo diplomático e militar
contra os extremistas. A coalizão li- esconde que o objetivo principal de com os EUA para combater ao Esta-
derada pelos EUA apoia os rebeldes seu país no conflito é estabilizar as do Islâmico.25
e os curdos tanto na luta contra o autoridades legítimas, historicamen-
governo, como contra o EI. A Rússia te aliadas de Moscou, ou seja, go- Além disso, a Rússia deixa claro que
apoia as forças leais a Assad e grupos verno de Assad.23 Enquanto isso, os o interesse principal na Síria não é
que lutam contra o Estado Islâmico. Estados Unidos de Trump sinalizam perpetuar poder de Assad, mas sim
que retirar Assad do poder não seria garantir a unidade do Estado sírio.26
Intervenção e Interesse uma prioridade, como era no gover- Dessa forma, “a atuação russa na cri-
Internacional no Obama. Apesar de ataques reta- se da Síria em se contrapor a medidas
liatórios à posições militares sírias multilaterais contra esse país, refle-
O conflito sírio é alimentado inter- pelo uso de armas químicas, Trump tem não apenas interesses materiais
nacionalmente. Desde o seu início encerrou o programa da Agência de estratégicos, mas sua relação históri-
diversas medidas foram tomadas por Inteligência Americana (CIA) de ca com o Ocidente”.27
países estrangeiros. Os EUA impu- apoio a grupos armados que ocorria
seram diversas sanções ao governo desde 2013, o que representa uma Os principais interesses dos EUA
sírio. A União Europeia baniu a im- perda significativa para a oposição.24 estariam relacionadas com o confli-
portação do petróleo e também em- Esta postura pode favorecer as nego- to Israel-Palestina e com questões
bargou venda de armas para o país. ciações políticas. econômicas. Estrategicamente a Sí-
A Liga Árabe, ainda em 2011, pediu ria apresenta um importante papel
o fim imediato da violência na Síria e Em relação à Rússia, a investida na nessa questão pois não é aliada de
alguns meses depois o país foi bani- Síria fortalece internamente Putin e Israel, mas sim do Irã, que utiliza o

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território sírio para enviar armas ao As negociações foram reiniciadas em te Assad, enquanto a Síria se recusa a
Hezbollah no Líbano e ao Hamas na diversos momentos e passaram por negociar enquanto o futuro político
Palestina.28 várias reuniões e etapas, visto que a do presidente Bashar al-Assad for
violência e o problema no forneci- pauta de discussão.35
Além disso, ainda haveria a questão mento ajuda humanitária no terreno
do gás natural e uma suposta propos- continuavam. Atualmente, as nego- Considerações Finais
ta feita pelo Qatar ao governo sírio, e ciações se encontram em uma nova
apoiada pelos Estados Unidos, de um rodada de diálogos, mas não foi pos- Segundo o Centro Sírio de Pesquisa
gasoduto que passaria pela Síria para sível alcançar os objetivos principais Política mais de 470 mil pessoas mor-
chegar na Europa. Assad, a pedido de redigir uma nova Constituição, reram nos primeiros 5 anos de con-
de Moscou, teria rejeitado a propos- estabelecer uma transição política e flito, além de mais de 1,9 milhão de
ta para proteger os interesses russos, marcar eleições.33 feridos. Ou seja, número de afetados
que são os maiores fornecedores de diretamente pela guerra representa
gás para os europeus.29 Segundo a UNOG, 11% da população do país. Ainda, 70
mil pessoas teriam perecido por não
Alguns grupos rebeldes apoiados Conforme exigido pela Resolução ter acesso à água, comida ou cuida-
pelos Estados Unidos, foram orien- do Conselho de Segurança 2254 dos médicos, como veiculado na re-
(2015), as negociações se con-
tados a focar suas ações contra o portagem realizada pelo jornal inglês
centram na governança, um cro-
Estado Islâmico. Todavia, para os The Guardian.36
nograma e processo para redigir
grupos rebeldes que se encontram uma nova constituição e a reali-
na zona de combate, o objetivo zação de eleições como base para Até 20 de julho de 2016, segundo o
principal continuou sendo derrubar um processo de propriedade da Alto Comissariado das Nações Unidas
o governo sírio.30 Síria, liderado pela Síria, para aca- para Refugiados (ACNUR), 4.819.494
bar com o conflito. As discussões pessoas foram forçadas a buscar refú-
Negociações de Paz incluem estratégias de combate ao gio desde o começo do conflito.37
terrorismo.34

O processo de paz na Síria começou Na guerra civil estão presentes di-


em 2012, quando o então Secretário- Um dos principais entraves às nego- versos atores, inclusive internacio-
Geral da ONU, Kofi Annan, lançou o ciações são os interesses contrários nais, que influenciam diretamente
Plano de Paz dos Seis Pontos.31 To- do países presentes. Os Estados Uni- o conflito e as negociações de paz.
davia, as negociações propriamente dos e a União Europeia, por exem- De maneira geral, o conflito na Síria
ditas se iniciaram efetivamente em plo, exigem a deposição do presiden- teve forte influência dos movimen-
2014 em Genebra, em um encontro
entre representantes do governo e
da oposição, apoiado e mediado pela
U.S. Department of State
ONU. Segundo o Escritório das Na-
ções Unidas em Genebra (UNOG,
sigla em inglês), as negociações não
foram efetivas e acabaram suspensas.
Quando foram retomadas no iní-
cio de 2016, duraram apenas quatro
dias, e foram novamente suspensas
após a ONU ter enviado um agente
especial para a Síria. O ápice das ne-
gociações aconteceu a partir de um
acordo bilateral entre Estado Uni-
dos e Rússia, ao estabelecerem um
cessar-fogo, em meados de 2017.
Contudo, violações a essa trégua se
tornaram comuns, o que dificulta as
conversas em Genebra.32 Enviado Especial da ONU para a Síria com o Secretário de Estado norte-americano e o
Ministro de Relações Exteriores da Rússia em Genebra.
5
OCI • Série Conflitos Internacionais
Scott Bobb/VOA

Cidade de Aleppo após bombardeios.

tos reformistas que objetivavam a nos do país, como a capital Damas- ao conflito os diversos sujeitos inter-
democracia no Oriente Médio. As co e a cidade de Aleppo. O governo nacionais se envolveram por conta
manifestações se iniciaram ao sul do respondeu com truculência, chegan- de seus próprios interesses políticos
país e logo foram reprimidas violen- do empregar unidades blindadas do e estratégicos, aumentando as diver-
tamente pelo governo, movido pelo Exército para combater os civis e gências e, por consequência, elevan-
receio que o movimento crescesse cortar água e eletricidade. Com isso a do os níveis de violência e a intensi-
no país como havia acontecido em violência aumentou, inclusive com a dade da luta, implicando em efeitos
outros Estados árabes. Entretanto, a adesão militar. Os vários grupos que colaterais, principalmente humani-
repressão teve efeito contrário. As surgiram abrangeram desde secula- tários, cada vez mais catastróficos e
manifestações se intensificaram e res liberais e democráticos até extre- alarmantes.38 Nesse quadro, o confli-
atingiram os maiores centros urba- mistas. Adicionando complexidade to completou 7 anos.

A derrota e desestabilização quase


completa do Estado Islâmico é um
VOA

passo para se alcançar o fim das hos-


tilidades e da violência na Síria. To-
davia, ainda há muitos aspectos que
precisam ser resolvidos para que se
consiga atingir a paz no país. O pro-
blema dos refugiados, o uso de armas
químicas por parte do governo, a in-
tervenção internacional polarizada
por Estados Unidos e Rússia, o fu-
turo de Assad, são alguns exemplos.
A troca ou não no comando político
do país ainda não está definida, bas-
ta observar as batalhas que ocorrem
na região de Ghouta, planícies que
Combatente do Exército Livre da Síria em Aleppo. contornam a cidade de Damasco, e
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que servem como maior reduto para

Karl-Ludwig Poggemann/CC
os insurgentes atualmente. Os emba-
tes mais violentos nessa região vêm
acontecendo desde 25 de fevereiro de
2018, quando o governo iniciou uma
investida, e já deixaram mais de 700
civis mortos, deslocaram mais 400 mil
pessoas, e devastaram 76% das resi-
dências. Os rebeldes que lá estão, além
de combaterem as forças sírias, tam-
bém lutam entre si pelo comando de
região, agravando a situação e dificul-
tando o acesso de ajuda humanitária.39

Com isso, percebe-se que o conflito


não será resolvido em curto prazo. E
mesmo que se chegue a um acordo de
paz, as ações de construção da paz de-
mandarão muitos anos para que, de-
pendendo de como sejam conduzidas,
consigam levar a paz positiva ao país. Controle Territorial na Síria (Dezembro de 2016).

1
Discente do Curso de Relações Internacionais da Universidade Estadual Paulista 9
ENTENDA quem luta contra quem na Síria. BBC, 2015. Disponível em: <http://
“Júlio de Mesquita Filho” (UNESP) - Campus de Marília, membro do Grupo de www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/11/151120_siria_entenda_tg>. Acesso
Estudos e Pesquisa em Conflitos Internacionais. em: 30 jan. 2016.

2
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BENOTMAN, Noman; BLAKE, Roisin. Jabhat al-Nusra Jabhat al-Nusra li-
Publifolha, 2008. ahl al-Sham min Mujahedi al-Sham fi Sahat al-Jihad. A Strategic Briefing. 2014.
Disponível em <https://web.archive.org/web/20140722191931/http://www.
3
PEREIRA, Tito Lívio Barcellos. Os Guardiães da Pátria: O Exército Árabe da quilliamfoundation.org/wp/wp-content/uploads/publications/free/jabhat-al-
Síria e sua relação com o Povo e o Estado. Revista de Geopolítica, Natal, v. 5, n. 1, nusra-a-strategic-briefing.pdf>. Acesso em: 05 fev. 2018.
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sirios-da-frente-al-nusra-deixam-al-qaeda>. Acesso em: 21 fev. 2018.
4
ENTENDA a ‘mini guerra mundial’ que ocorre na Síria. BBC. 2016. Disponível
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5
ENTENDA a guerra civil da Síria. G1. 2013. Disponível em: <http://g1.globo. Extensao/observatoriodeconflitosinternacionais/a-questao-curda.pdf>. Acesso
com/revolta-arabe/noticia/2013/08/entenda-guerra-civil-da-siria.html>. Acesso em: 22 fev. 2018.
em: 30 jul. 2016
13
ENTENDA..., 2015, op. cit.
6
OITO..., 2015, op. cit.
14
RETOMADA de Raqqa representa o fim do Estado Islâmico. BBC, 2017.
7
LIGA Internacional dos Trabalhadores. Anotações sobre o Exército Livre da Disponível em <http://www.bbc.com/portuguese/internacional-41664071>.
Síria. 2016. Disponível em: <https://litci.org/pt/mundo/oriente-medio-mundo/ Acesso em: 05 fev. 2018.
siria/anotacoes-sobre-o-exercito-livre-da-siria/> Acesso em: 05 fev. 2018.
15
Idem.
8
OPOSIÇÃO armada síria forma Conselho do Comando Revolucionário.
Sputnik, 2014. Disponível em <https://br.sputniknews.com/portuguese.ruvr. 16
RUIC, Gabriela. Estado Islâmico é derrotado em Raqqa, a sua “capital”. Exame,
ru/news/2014_12_02/Oposi-o-armada-s-ria-forma-Conselho-do-Comando- 2017. Disponível em: <https://exame.abril.com.br/mundo/estado-islamico-e-
Revolucion-rio-4979/>. Acesso em: 05 fev. 2018. derrotado-em-raqqa-a-sua-capital/>. Acesso em: 05 fev. 2018.

7
OCI • Série Conflitos Internacionais

17
ENTENDA..., 2015, op. cit. 32
SANCHA, Natalia. Entra em vigor o cessa-fogo na Síria acordado por EUA e
Rússia. El País. 2017. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/brasil/2017/07/09/
18
Idem. internacional/1499592837_117468.html>. Acesso em: 05 fev. 2018.

19
OITO..., 2015, op. cit. 33
GOVERNO sírio e oposição retomam negociações de paz em Genebra. G1,
2017. Disponível em: <https://g1.globo.com/mundo/noticia/governo-sirio-e-
20
EXÉRCITO turco inicia ofensiva terrestre na região síria de Afrin. oposicao-retomam-negociacoes-de-paz-em-genebra.ghtml>. Acesso em: 05 fev.
Folha de S. Paulo, 2018. Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/ 2018.
mundo/2018/01/1952174-exercito-turco-inicia-ofensiva-terrestre-na-regiao- 34
UNITED Nations Office at Geneva, op. cit., tradução nossa.
siria-de-afrin.shtml>. Acesso em: 21 fev. 2018. SIZA, Rita. Turquia reúne apoios
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SÍRIA: retomam negociações de paz. RFI, 2017. Disponível em: <http://pt.rfi.fr/
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36
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25
LIMA, 2015, op. cit.

26
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27
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E409A03F0D7CFB4AC1257F480045876E?OpenDocument>. Acesso em: 30 jan.
2016.

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Observatório de Conflitos Internacionais da
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O conflito armado em Darfur - Sudão V. 3, n. 5
Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita
Filho (UNESP) - Campus de Marília – SP A Somália e o Al Shabaab V. 3, n. 6
A questão curda V. 4, n. 1
Editor: Prof. Dr. Sérgio L. C. Aguilar O atual conflito no Sudão do Sul V. 4, n. 2
Layout: Paula Schwambach Moizes O conflito na Costa do Marfim e as missões de paz da ONU V. 4, n. 3
ISSN: 2359-5809 Afeganistão: a continuidade do grande jogo V. 4, n. 4
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Disponível em: www.marilia.unesp.br/#oci Guerras civis na Libéria e as operações de paz da ONU V. 4, n. 6

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