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BIBLIOTECA FFLCH ? 6 JUN. smog We 1898 18 JUN, 1999 15 JUN, 1999 José William Vesentini Professor Assistente Do da FFLCH da epsrtamento de Geografla de de Séo Paulo DEDALUS - Acervo - FFLCH-GE Aces A CAPITAL DA GEOPOLITICA =! [SBD - GEOGRa; 1A J use TOMRO: 00796 ea Ii FFLCH~uge we Assim, com a crescente integracdo das “regides” num mer- cado nacional "6, 0 Sudeste, especialmente o Estado de Sio Pau. Jo", passa a ser a regidéo da inddstria; 0 Sul perde sua posigio relativa no setor industrial, mas passa a se “especializar” no setor agricola, visando inclusive a suprir 0 Sudeste; 0 Centro-Oeste passa a ser mais ocupado produtivamente, aumentando sua parti cipacdo na renda agricola e de servigos (que conheceu um aumento de 1,7% do total nacional em 1955 para 3,0% desse total em 1968, atribufveis em grande parte a interiorizacdo da Capital Fe- deral); 0 Norte, apesar da rodovia Belém-—Brasilia, s6 comega a set mais fortemente integrado na economia nacional a partir de 1970. Nas palavras de dois autores, temos O processo de redivisio, partindo da indistria do Sudeste, & amplo e atinge todas as regites. Transfere e repassa tarefas agropecde Tias para outras regides, tais como o Nordeste © 0 Sul, cria uma otra regio, como o Centro-Oeste, destr6i numa prime ou retuz o crescimento da indtstria no Sul e no Nordeste © Norte mantém-se relativamente imune aos seus efeitos, em virtude da inexisténcia de uma infra-estrutura de transporte que viabilize & integragio (esse isolamento comega a ser rompido ‘com a Belém—Brasilia), O crescimento industrial do Sudeste ria ¢ amplia a fronteira agricola, reprodus as margens, formas de acumulagio no inteiramente capitalisticas, das quais iransfere excedente que vai reforgar a capacidade de acumulagéo no préprio Sudeste, 7" © periodo em que se deu a construgio da nova Capital do Brasil, a segunda metade da década de 1950, representou, nesse processo de integragio econdmica do territério nacio vo para sua consecugio. Foi um perio deixou de predominar, nessa articulagio das diversas 3” no mercado nacional comandado pelo Sudeste, a parcial dos alicerces econémicos do Nordeste ¢ do Sul (certas indstries © atividades agricolas), passando entéo a predo- minar a expanséo de outras atividades nessas regies, com vistas & divisio espacial do trabalho a nivel nacional. O Sul, nessa década de 1950, conheceu uma enorme expansio agricola, arti- culando-se, como “celeiro nacional”, a economia do Sudeste. © Nordeste também conheceu, especialmente de 1955 a 1960, uma expansio agricola; mas, nesse perfodo, a ‘nica principal ‘dessa regio foi a “necessidade de planejamento”, de correcdo do seu atraso frente ao Sudeste, O Centro-Oeste, como regio, passa a ser eriado nesse momento, ¢ a construgio de Brasilia, juntamente com as rodovias que ligam essa cidade até os grandes. centros urbanos do Pais, desempenhou um papel importante nesse processo, 123 De um lado, tratava-se de “cortigir os desequiltbrios regionais” através da intervengao do Estado, e, de outro lado, tratava-se de “conquistar os espacos vazios", de ocupar produtivamente e povoar © territério sob 0 dominio desse Estado, visto genericamente como “Brasil”, Em ambos os casos, todavia, tratava-se — a0 nivel do discurso ideol6gico — de integrar o pais, da “integragao nacional’ Ademais, nesse momento assistia-se a uma crescente penetragio do capital monopolista na economia industrial do Sudeste, junta. mente com o alargamento. das fungées do Estado, que se torna lanificador”."# Nesse sentido, Brasilia representou uma nova Capital para um Estado Federal que se reestruturava, fortalecia-se frente aos oderes estaduais e municipais e voltava-se cada vez mais para a Feprodugdo do capital na escala nacional. 4. © projeto de dominagéo do empresariado industrial Esse engendramento do espaco geogritico brasileiro, com a corelata divisdo territorial do trabalho a nivel nacional, foi tam~ bém — © em sua esséncia —o resultado de uma ceria relagto de dominacio: trata-se de um projeto politico do empresariado industrial, colocado de forma intensa em 1928, tendo se tornado vencedor nesse momento, e que conheceu um redirecionamento na segunda metade da década de 1950, De fato, em 1927-28 havia em Sio Paulo um acitramento n process de luta de classes, com varias propostas de “revolugéo sendo colocadas na ordem do dia, por varios agentes — 0 BOC (Bloco Operério © Camponés), 0 PD (Partido Democratico) © os “tenentes”.7 Os vencedores' desse proceso de lutas, no exer. cicio da dominacio, buscaram apagar as memérias vencidas ¢ reescrever a histéria, dando um significado univoco para o termo “revolugdo" — que ele nao possufa no momento de indetermi- nagio, de outras historias possiveis — e criando, nessa luta, a dia de “Revolugio de 193: Nesse contexto, como A periodizagio produz o lugar da histéria e, como ele, 0 da origem legitimada do poder vigente. “Revolugio de 30” € um Aispositivo ideolégico para ocultar a uta de classes durante ¢ apés esse momento histérico, gragas 20 discurso, a pritica ¢ & meméria do vencedor, elevados & condigio de meméria histrice Esta generaliza © passado para toda a sociedade brasileira, for. 124 necendo a representagéo de uma “revolugio” una e dnica 1928 emerge como um momento histérico perdido porque cle uma outra histéria se anunciava como possivel de 28, escreve o autor [De Decca], a burgues luma estratégia que 2 faz passar da’ “guerra de posigio" no inte- rior do mundo fat jerra de movimento” em direcéo & posse do aparelho de Para conjunto de crengas, sociedade e, a0 mesmo temp alizar no apenas seu adver- sirio de classe, mas ain es internas. Para o segundo problema, encontra a soluedo na criago do Ciesp, para o primeizo, 4 articulagio entre um discurso de industializagfo e um outro, do progresso nacion: Nesses termos, a criagio do Ciesp em 1928 — e da Fiesp em dustrial enraizada em Sio Paulo. ro empresariado — assim como os demais setores da classe dominante (especialmente os fazen- deiros © os grandes comerciantes), mas sob a lideranga dos in- dustriais — frente ao espectro de uma revolugdo social conduzida ot outras classes — 0 operariado e o campesi isso num momento em que havia efetivamente um processo revolucionsrio fem curso — sob a forma de conquistas democréticas — e varias propostas alternatives de reordenacéo societéria, Por outro lado, fratavase de promover uma formulando 0 tema da i tica da burguesia industrial, com vistas a promover uma igo de toda'a sociedade no sentido da “construgio da vir-a-ser que dependeria do “pro- por sua vez seria uma la burguesia indus de toda a organizagio da ia — tanto dos scus sindicatos como de seu par ++}. Em outras palavras, 0 tema da le @ ponta a questio demoerética posta pelo classe oper em 1928 [...], A mudanca na direpdo dos acontecimentos néo s6 levou & liquidagio progressiva do BOC, ns Destarte, a implementacdo desse projeto de dominagio do empresariado industrial acarretou uma reformulago no Estado. © Estado liberal das primeiras décadas do século tornou-se num Estado que intervém na economia, regulamenta a relago traba- Ihista, protege a s pelo territrio nacional.®® Esse processo de reordenamento iciado em 1928, prossegue com 0 governo Getilio Vargas, al apés 1937. ‘A criagéo de uma ej lagdo trabalhista é significativa a esse uma profunda ruptura com o libera~ , Indistria e Comércio, criado de Conciliagdo ¢ Julgamento, surgidas em 32, a regulamentacgo do trabalho das mulheres ¢ maenores, também realizada em 32, a lei das férias, de 34, a cartel profissional para Consolidacao das ram diversos mome Ihista corporativi atos (que eram criagdes esponténeas dos atrelando-os ao Estado, Nesta citaglo expressa-se (Gria daquele projeto de dominacio: is trabalhistas fazem parte de um conjunto as destinadas a instaurar um novo modo de acumulagio. populacio em geral, © especialmente a populagio is cidades, necessitava ser transformada em “exército a legislagao trabalhista igualava reduzindo — antes que incrementando — 0 prego da forga de trabalho, Essa operagdo de igualar pela base reconvertia inclusive trabalhedores especializados situagdo de nfo-qualificados, e impedia — 20 — a formagio precoce de um da concorrincin perfela, € provevel que ele ssubisse para algumas categorias operirias especializadas; a regu- lamentagio das eis do trabalho operou a reconversio a um inador comum de todas as catego ‘com 0 que, antes de © que se viu apés a |] que um tremendo ferizando uma nova 126 Portanto, 0 (novo) Estado que se reestruturava a partir do final da década de 1920, que intervia mais fortemente na economia © nas relagdes de trabalho, que se tornava cada vez mais unitério no sentido de concentrar poderes no Governo Federal, enfraque- gendo os estaduais © municipsis, ndo foi obra do acaso ou de “necessidades internas de transformago” (do Estado), mas sim resultado de um processo de luta de classes onde um projeto de dominagdo da burguesia industrial tornou-se vitorioso. ® E esse Estado reordenado pela préxis dessa burguesia enraizada em Sio Paulo envolve-se ativamente na construcio do espago nacional ¢ na divisio territorial do trabalho a nivel nacional, desfazendo as barreiras alfandegérias existentes entre os Estados (os impostos estaduais sobre as importacdes provenientes de outros Estados) e anulando a capacidade que cada Estado possuia de legislar sobre © comércio exterior. # Nesse mesmo sentido podem ser entendidas as medidas pai cas destinadas a restringir a vinda de imigrantes: era um Estado que disciplinava a forca de trabalho para o capital — daf a legistagdo trabalhista —, fazendo-o @ nivel nacional e no mais das necessidades de mAo-de-obra de uma “eco- (como fora o caso da imigracdo para a lavoura cafeeira); ea nivel nacional havia grandes contingentes popula- em disponibilidade — seja devido a0 declinio de atividades agricolas (acticar, algodio), seja pela faléncia e/ou estagnagio de empresas industriais dessa “regiéo” provocadas pela concorréncia das mercadotias de Séo Paulo — que deviam ser colocados & disposigio, como exército de reserva, para 0 parque industrial do Sudeste brasileiro. Na década de 1950, em especial no periodo do governo JK, © projeto politico da burguesia industrial coloca-se novamente na ordem do dia, devido tanto ao novo patamar atingido pelo processo de industrializacio — ¢ dai a énfase agora nas industria de bens de produgao ¢ de bens de consumo durdveis — como 20 recrudescimento das lutas sociais. J4 em 1945, quando havia isiveis sinais que apontavam para a iminéncia ‘do término do Estado Novo, o empresariado industrial revelava preocupacses com 0 movimento operério.®® E a “fase democrética” de 1946-64, apesar de, como jé vimos, marcada por um certo autoritarismo arraigado no Estado € ma Sociedade como um todo, permitiu a coexisténcia de uma abertura politica dirigida “pelo alto” com movimentos populares que visavam a ampliar o espago da democracia. Todavia, houve has organizagdes que falavam em nome da classe operdria, nessa segunda metade da década de 1950, a forte presenga de uma 127 Stica onde o inimigo principal seria o imperialismo, aliado do latifindio, sendo a industrializago nacional encarada’ como pro sressista © desejével a qualquer custo.* Isso estabeleceu pontos de contato eruciais entre 0 idedtio do operariado e o projeto burgués, subordinando-se 0 primeiro ao segundo." Ao longo dos anos JK a burguesia industrial agin decidida ¢ intensamente no sentido de implementar um arranque industrial gue dissimulasse os conflitos sociais a partir da identificagao entre industrializagdo e “bem coletivo da Nao”. A Fiesp assume um papel de lideranca nessa aco, procurando acordar 0 empresariado frente ao seu ideério, persuadindo as eventuais fragées da classe que estivessem em desacordo e atuando no interior do aparelho de Estado, com vistas a bloqueat ou aprovar determinados projetos de lei em ‘tramitagéo.* ‘Como ponto de partida da representacéo da realidade cons- fuida pela burguesia industrial, aparece a existéncia de uma “pobreza nacional” no Brasil, ou seja, uma pobreza (ou subde- senvolvimento) da coletividade vista como um todo harménico, ¢ nido de classes ov segmentos da sociedade; a panacéia para os cor ional” — quais sejam: 0 analfabe- tismo, a subnutricao, @ baixa produtividade do sistema econmico fem geral ¢ as disparidades regionais — seria o desenvolvimento como aparece no editorial do Boletim Informative n? 316, de 24/10/55, da Fie ica de fortalecimento econémico, tem responder &s esperangas do povo bre- sileiro © deve portanto merecer todo o apoio as suas legitimas reivindicagdes. Impossivel dissociarem-se os interesses da industria ¢ do Brasil, sob pena de sacrificarse ignominiosamente a Nagio 4 interesses particularistas © egofstas que devem necessariamente situar-se em plano inferior. °° Todavia, esse arranque industrial desejado deveria apoiar-se num esforgo’— levado a cabo pelo Estado — no sentido da implantagao das indistrias de base.! Nesses termos, o slogan ‘Energia ¢ transporte", da campanha eleitoral de JK, foi bem visto pelos industriais; e 0 Plano de Metas recebeu deles o mais entu. sigstico apoio, como se observa no editorial do Boletim Informative n2 332, de 13/02/56: Encontrou a melhor repercussfo em Sdo Paulo o plano de governo do Sr. Juscelino Kubitschek, nos termos em que foi anunciade fem nota oficial sobre a reunifo ministerial do primeiro dia deste més, Néo temos nenhuma restrigio a fazer a esse plano, que cor. us responde plenamente 20s principios expostos pelo candidato em ‘sua campanha eleitoral, e 56 esperamos que o governo da Repti- blica, com o apoio da opinio piblica, possa levé-lo a bom termo, do to Togo quanto possivel ao plano das ara o bem do nosto a0 encontro do que tem sido tentemente proclamado e defen- ido pelas classes produtoras, 0 que se pode verificar pelo seu onfronto com as conclusdes’e recomendagées de conferéncias como a de Araxé ¢ reunides como a de Porto Alegre. "7 Partindo do pressuposto de que o capital é o fator fundamental Para a industrializagéo © que ele 6 ainda escasso no Brasil, 0 empresariado industrial defende os investimentos estrangeiros ‘no pais, em especial nos setores em que as empresas nacionais sio frégeis. Apregoando uma poltica de incentives & vinda de capitais estrangeiros, desde que em igualdade de condigées com os nacio- nais®®, a Fiesp condena o “nacionalismo exacerbado” daqueles que encaram isso como imperilismo e propéem a nacionalizagao das empresas estrangeiras: ‘Vou aproveitar a oportunidade para fazer declaragSes um pouco pesadas, Nao sei se 0s companheiros esto acompanhando esse movimento, que vem recrudescendo de uns tempos a por atos de elementos comunistas, no sentido de na: cerbado. Isto jé vem de hé muito tempo. E faz pout publicado um manifesto, que est4 em poder do nosso tesoureito, ‘no qual se ptega abertamente a teoria marxista. Esse manifesto concita, ainda, todos os operdtios a lutarem pela encampacdo de todas as grandes empresas, como a Light, e companhias que explo. tam 0 comércio de gasolina. [apés enfatizar que jd se referin a isso, num discurso pronunciado nessa Casa, numa solenidade ‘que contou com a presenga de varias altas autoridades militares, 0 autor prossegue] Nesse discurso, combatiames diretamente 0 ne- lismo exacerbado, e defendfamos 0 nacionalismo puro, aquele que, realmente, se preocupa com 0 futuro da Nagio e nfo cris cembaragos 20 ‘capital estrangeiro que aqui vem também servir ‘aos altos interesses da nossa Patria 0 © Nordeste, como “regido-problema”, é também objeto de preocupacdo da Fiesp. Em nome da “harmonia nacional presariado paulista propde a industrializagdo dessa regigo como solugo para sua pobreza. Em sua percepgo, 0 Nordeste 6 visto como um reservatério — recursos nat o-de-obra, mercado de consumo — a ser aproveitado pela indistria de Sao Paulo em sua expansio,1 Reafirma-se continuamente a expansio industrial, 0 cresci- mento econémico, Tudo o mais deve subordinar-se a esse escopo 19 fundamental. A preocupacio com as condigées de trabalho, com melhorias nos salérios reais ou com a participago dos trabalha- dores nos lucros das empresas 6 vista como “demagogia” ou “‘populismo", Como afirmou o presidente da Fiesp em novembro de 1955, num discurso pronunciado em Porto Alegre durante a Segunda Reuniao Plenéria da Industria, o importante € a acumu- lagio e nfo a igfo: somos ainda uma nagio pobre, com uma renda per capita 7 vezes & da Inglaterra e de 15 vezes 4 dos Estados Uni- dos. Nossa preocupacio dominante, se queremos superar a fase de trangulamento econémico a que chegamos, deve ser a de criat ica a de distribuir, de uma forma empirica ¢ con- lementar bom senso, aquilo que s6 existe em escala ica a administragdo. A smo”, como prética irracional © anseios da Naco, porque ligada a interesses A segunda € tida como geréncia ra- , como planejamento, como pritica des- ico competente, € no por um politico do a inieresses partidétios, corrupgio e preocupagées demagégicas. Nesse sentido, para o bom governo portante um distanciamento frente as “presses de grupos”, ", para se administrar de forma racional, como se depreende deste editorial do Boletim Informativo de 15/10/58: , profundamente ia administrative de pér um paradeiro Anunciou-se [...] que o Presidente da R¢ impressionado com 0 descalabro e a defici ‘numerosas autarquias econémicas, esté dispost 2 esses desacertos. Em outras palavras, sentiu a necessidade de afastar a politicagem desses Srpios, entregando-hes a diregio a homens pi sejam em penhor de eficiéncia e de mora- lidade adi Ao invés de érgios atuando ao sabor de cconvenitncias partidérias, teremos organismos integrados numa preocupacio elevada de pdr ord Como se vé, so me Ges de 3 de outubro, pareciamos condenados 40 regime de populismo mais desenfreado. S6 poderiam aspirar a0 comando dos postos administrativos e integrar os érgios in- ccumbidos da feitura das leis os candidatos que explorassem alimentassem a mais desbragada demagogia eleitorel 130 A ideologia nacional-desenvolvimentista expressa pelo discurso de IK reproduz admiravelmente certos temas e preocupagdes divul- gados pelo idedrio do empresariado industrial. A temética do discurso de JK se concentra em torno do desenvolvimento; visando a superar o subdesenvolvimento, a pobreza nacional, ele dire- ciona seu governo no sentido da expansao econémica, tida como singnimo de industtializagdo.1°* J4 em sua primeira Mensagem ao sso Nacional, no inicio de 1956, quando define globalmente "a de seu governo “diante da crise que a nagio atravessa”, JK pensa numa ampliagio do processo de industrializacio (agora estimulando as indiistrias de base ¢ de bens de consumo durdveis) 10 © meio de o pais alcancar sua “independéncia econdmica”, isto 6, a superagao do subdesenvolvimento: Acentua-se predomin a fase de transigéo de nossa economia, do ente agropecudrio, para o estigio da, indust zagho intensiva, quando jé se impde evoluir da pratica, exclusiva, das simples indlstrias de transformagao, pat se entio) ampliar, estimular e fundar as i necessita para sua completa e verdadeira ibertagdo econémica: @ indGstria siderirgica, a metalirgica, a produgéo de cimento, a fabricagio de tes, a mecinica Pesada © a quimica de base, entre outras, 10 Essa prosperidade, ou desenvolvimento, a ser alcan Pais, contudo, deveria estar vinculada a ordem, ou se sresso dentro da ordem para garantir 2 ordem". O central da ideologia desenvolvimen (es; a soberania, a ser pl sada, dependeria da prosperidade (isto é, da industrializagao na ional) dentro da ordem, ou 5 smo ¢ do combate & subversio,205 A prosperidade, entio, ¢ encarada também como profilaxia ara os conflitos sociais e a subversio: Estou certo {...] de que somente através do desenvolvimento eco- ico conseguiremos abrandar a insatisfagio que estimula a lasses, criar eondigées de uma vida digna para todos os nar preconceitos que perturbam nossas relagées ovos ¢ atingir a seguranga nacional em seu mais © Plano de Metas foi elaborado contando com uma partici- Pacdo estrangeira na ordem de 1/3 dos investimentos globais. 18 Atrair recursos externos, tanto sob a forma de empréstimos como de investimentos diretos, foi uma preocupaco constante do governo JK, Numa Mensagem ao Congress Nacional, de 1957, JK afirmou B condigdo de desenvolvimento que se clevem 0 nivel de pou- Panga interna'e a absorgio ds poupanga externa — representada is estrangeiros — para que s investimentos produtivos, 177 Numa perspectiva de que “‘o verdadeiro nacionalista 6 aquele que rocura apressar o desenvolvimento econdmico, sem o qual a Nagiio continuaré fraca e pobre”, JK concilia 0 nacionalismo com © Tecurso aos capitais externos. ‘Assim, o nacionalismo inteligente nfo se confunde com xenofobia ou nacionalismo em: suas palavras, “o nacionalismo que se preza, 0 nacion: favor e nfo contra a nagdo, precisa cret que ninguém & forte para desviar o Brasil de sew caminho” Em sintese, a ideologia nacional-desenvolvimentista de JK representou uma formulagdo voltada para o arranque industrial do pafs, para a acelera¢o da acumulacéo com énfase na “manu- tengo ‘da ordem”, ow do sistema capi Por esse motivo, o> posse numa fhindo a necesidade : an para cena imagem ea fiqueea, com sun nfae ates Go tado bodice [1 Ne Verdes, dle desea & erst uma sspragSo nova digida para o aumento. da rosperdade. Ou methon, 9 que pretende é generlizar esta aspi Faofo como uma necesvdade. Pata tanto se 2pOia antes de tao, a imagem de tm futuro promistor que o Pais deverd encontat Se ess eee 132 assim, medidas de caréter autoritério quando o desenvolvimente ‘ou a Seguranga o exigitem. 208 nessas circunsténcias, deixar de concluir que o \jeto de industria. Tizacdo. temente, de dominagio) do empresariado industrial ‘sediado principalmente "© que isso significou um redirecionamento da tomado vitorioso em 1928. A supervalorizagio da at lustrial como pana- céia para os “males da nacio”, a énfase na acumulacao de riquezas €m detrimento de sua distribuigfo, o crescimento da atuacio do Estado como planejador e garantidor da indispensével 20 crescimento industrial, além ministrativa terse encontrada por esse go 1a” ou dos “desequilibrios regionais” — o planc- través da criagio da Sudene —, percebe-se essa com a racionalidade do empresariado industrial. A possi- “unidade nacional” através do cres- ro-Sul e 0 Nordeste foi um dos argu- ficar a maior intervenco do Governo abandonar toda jonalidade admi Essa ago coordenadora do planejamento pablico, que cria- ia — via su sdos no Nordeste, foi claramente pensada para a aceleragdo da acumulagio, e nunca Para melhorar os padrées salariais dos trabalhadores: Comparando o nivel dos pregos dos alimentos no Recife © em Sio Paulo, chega-se conclusio que o custo de vida para o ope- ratio € 25% mais alto na capital pernambucana do que no meoe trial do Pals. E esta diferenca tende a acentuar-se. conseqiiéncia, cada reajustamento do salério minimo € pre. judicial 20 Nordeste. E o salério minimo do Recife é atualmente, Spenss 25% inferior ao de Sko Paulo. Se prossegurmos ness: 133 © © nacional-desenvolvimentismo momento éureo do Iseb 8), criado em julho de io de abril de 196: © periodo em que esse in io da Educaco ¢ Cultura, recebew © promoveu o maior niimero de Cursos, conferéncias, semindrios de estudos, pesquisas etc., dos Durante 0 governo JK ocorr (Instituto Superior de Est do Congresso Nacional e dos Minis- ideres sindicais, parlamentares estaduais, No periode de 1956-60, portanto, © presidente J. Kubitschek dinamiza esse érgio com a’fi de assessorar 0 seu governo na promogdo do desenvolvimento nacional, definindo a tarefa do Iseb como sendo a de “formar uma Apesar de vincular-se 20 Estado ¢ de propor uma lizagio da sociedade através do planejamento”, com vistas a subd através da expansio da #, 0 Jseb, em suas obras impressas, expri- por meio de uma retérica marxista e’chegou luéncia em organizacées tidas como de es- lo uma interversio na concepeHo marxista de ideolo- isebianos argumentaram que nas formagdes sociais sub- desenvolvidas (ou “‘semicoloniais”) haveria a necessidade dé forjar partir da frase de hd movimento revolucionério sem teo bisier afirmou que “ndo haverd desenvolvimento sem a formulagio prévia de uma ideologia do desenvolvimento nacioné , a classe média e representado pelos s classes, além do leologia nacional-desenvolvi- mentista do Iseb considerava as “‘outras contradi se enquadram nessa oposi¢ao, como secundé © procedimento fado seria uma 134 com vistas & superacdo do subdeseavol ento ou estégio semi- colon: ficaria a supresséo do “domfnio estrangeiro € a construgdo de uma verdadeira nagio.i2 V/trabalho, assim, ficaria postergado para 0 mo- lagio de capital com a intens trabalho, que caracterizou os pode-se endossar sem ressalvas a afi teria cumprid independéncia na imar 0 progresso econdmico, conven cendo o trabalhador a fazer de sua existéncia trabalho © 6 tra- balho, fazendo-o crer que sua sueigdo fosse liberdade, inteprando-o 20 capitalism Essa supervalorizagtio da Nagdo ¢ do planejamento es untamente com a idenificagio entre indust de uma obra isebiana: Tendo-se formado um capitalismo bras nal terd de ser uma pega na pc © nosso. capi proceso de industrializagio e seus beneficiétios nfo sio apenas (03 donos dos bens de produgo, mas o povo brasileiro em geral Mais uma vez descjamos referir-nos a Clausewitz. Como tet © general, os seus trabalhos ganharam 0 teor concreto que se Ihe reconhece, prineipalmente porque soube compreender qué i ‘orgas Armadas da Nagao alema s6 pod teresses do capitalismo nacional de sua pf do ponto de vista da revolugi seguranga nacional nfo é a de um ou abstrato, mas a de um pals que Por conseguinte, se 6 i » & seguranga nacio- de defesa desse aj jou sua revolugio burguesa. ivel que a seguranga nacion: Integrando-se na politica geral de defesa do nosso processo Je industrializagio, incumbese & se- guranga nacional participar do combate aos fatores intemos © fexternos que © ameacem. 14 1s Dessa forma, nada mais natural que a defesa da interiorizagio da Capital Federal, expressa em alguns autores isebiano: argumenios que muito devem a0 E que este, no Bras radigdo ¢ uma racional gue se encontram com o pensamento isebiano, que nelas se afunda. ‘No mais important de Brasilia, pode-se perceber a identificacdo entre o Brasil e 0 territ6rio, entre 0 Pafs € 0 contorno que figura nos mapas Se contemplarmos 0 mapa do Brasil, € realmente chocante 0 conde se concentram quase toda a popu- f, que se desdobra fem infindiveis extensies desertas, nos chapadées, alagadicos ¢ ‘pAntanos da regido central e na impenetravel floresta equatorial do Mato Grosso ¢ da regio amazénica E chocante, diziamos, © contraste entre o litoral e o Interior, que ainda permanece vazio f deserto, Mais do que uma simples impressio, os nimeros nos revelam 0 tremendo desequillbrio entre a periferia e © centro do Pais, 228 E a nova Capital vista como uma sintese do “novo Brasil” que surgiria com desenvolvimento industrial e a “construgio da Naglo”, como se segue no mesmo texto: Todas as grandes culturas © ci tram, por assim dizer, seu arres izagBes que conhecemos encon- seu coroamento na construgio Concentragao de espitito e de ‘comando, ponto de convergén- ia modeladora e pedagégica, as grandes capitais sem- pre foram o arremste ¢ a sintese das suas culturas pporque tal localizagio corresponde a uma fase de nossa evolugéo histérica que se tornou imperioso ultrapassar {...]. Desembara- {gado das injungSes municipais, da inéreia da méquina burocré- tica secularmente esclerosada, goes de emprego, da pressio dos grupos econémicos e da imprensa a servigo desses, ‘grupos, longe da demagogia e da agitagdo local, o Poder Central 136 encontraré, na Capital interiorizada, condigSes materiais que the permitiréo’ funcionar efetivamente como Poder C Fando a perspectiva ju matutina em que as bremos pri Brasilia, a flor do des ermos os contemporineos da epopéia de , a Capital do futuro e da esperanga. 26 adr, peli voltadas para 0 desenvol (e imperia- demagézica © “popu sci aos centros mundiais do capi- al © corrupta, Brasilia seria 0 exemplo meridiano da “nova civilizagio” que se gestava, do Estado funcional e planificador, voltado apenas para os “verdadeiros an seios da Nagdo” e isento de polit Em suma, Brasf jo como desejavel ¢ quas consolidada pel gem e corrupcio. da espera © “populismo’ © promovendo o planejamento, os planos concebidos sor do conhecimento cientific 10 do planejamento cientifico — tanto a nivel de sintese do Plano de Metas ¢ do nacional-desenvolvimentismo quanto pelo “‘caréter revolucionério” de seu plano urbanistico © da arquitetura de seus edificios —, e sendo o planejamento, feito nos moldes técnicos ¢ cientificos adequado: Por definigio (afinal, a ‘verdadeira cién isto 6 condizente com o “sentido da histéria”), é fécil de compreender por que qualquer critica a esse ato era tida como “obscura © “reacionéria”, Quer fossem os recla- mos de trabalhadores das obras de edificacio da cidade, quer fossem dentincias parlamentares sobre favorecimentos ¢ out regularidades na construgao de Brasilia, ou ainda quaisquer ecocmasaii eeimnnennmngimisititaanNASRNedanaanas ges & transferéncia da Capi todas as das", a0s ensamento geopolitico © ” seguida por dete ia da revolucio bra- agies consideradas de ‘al no planalto como modernizacao da politica, Os “grupos de ‘culares”, as “injungSes politico-parti- im, eram encarados como irracionalidade, como prética a ser substituida pelo governo distanciado das aglo- meragoes, das “presses sociais”, e norteado pelos planos a serem rigidamente implementados. O Pals, o “Brasil”, era interpretado como dade” genérica, sem contradig6es antagénicas ine- rentes reas retrOgradas” representariam interesses cionais", estando portanto exclufdas do “verdadeiro Bra: sua expresso mais profunda ow encontrar-se-ia no ter- rit6rio. E esse imenso territério — a “melhor heranga doada pelos nnossos antepassados”, com sua integridade sendo vista até como “unidade nacion ara consolidarmos nossas fronteiras e ocuparmos nossa heartland (como no discurso geopolitico), seja para expandirmos o lismo nacional”, transformando a natureza pi natureza, em mercadoria (como nos demais di esses argumentos que justiicaram Federal nos parece por demsis evi- fesmo tendo sido engendrados num perfodo em que, bem ou mal, houve a vigéncia de determinadas liberdades democraticas, eles de fato apontam para a emergéncia de um Estado autori- trio, fortemente centralizado e distante dos reclamos populares, para um Estado planejador, que concentre recursos em escala igantesca, que acelere a industrializacfo, que corrija os “dese- i que direcione a fixagio “correta” da popu- io etc., e tudo isso a partir de uma racionalidade strativa, Brastlia como nova Capital Federal bolizou, nesses argumentos, o fim da politica e da histéria Tuta de’ classes, com a inauguracio do pl da histéria como operacionalizacdo de planos ra no seio do Estado. gerados 138 Dessa forma, a construgio de Brasflia ajusta-se admiravel- mente & tendéncia — existente desde o final da década de 1920 — de concentragio de poderes no Governo Federal, em detri- mento dos Estados e municipios, e também ao autoritarismo esta- tal que apareceu sem disfarces no Estado Novo e no regime pés-64 , mesmo com nuangas ¢ em menor grau, na “fase " de 1946 a 1964. E ajusta-se ainda as grandes rea lizagdes do governo JK: 0 Plano de Metas, o arranque industrial com a superexploragéo da forca de trabalho, © recurso aos vestimentos estrangeiros, a énfase na acumulacio em detrimento da ibuigdo, a preocupacdo com a seguranga acima do bem-estar \g80 da Sudene e a valorizagdo da eficigncia adminis- trativa no ato de governar, Isso posto, s6 poderiam causar estranheza as afirmativas de um autor — e isso jé em 1978 — segundo as quais: ‘As demais metas pertenciam, em seu programa de governo — Por isso elaboradas por tecnocratas intimamente ligados a jalismo —, aos seus compromissos, lagos, dependéncias ps 20 contrério, era a sua (de JK} iss0, 0 andamento daquelas reservou para si daquela que em sua nome [...] 0 governo assado ¢'Brs io colocara como a que fi “Juscelino Kubitschek estava, A fragilidade desses argumentos 6 tamanha que se torna dispen- sével comenté-los; eles foram apresentados apenas para mostrar © grau de comprometimento de uma certa ideologia nacion —e convém recordar que o autor dessa obra f © que ela foi escrita para “destacar as grandezas” do arquit que projetou grande parte dos 2: ia — com a nova capital, mesmo quando em de 18 aspectos do governo JK. Bem mais perspicazes e adequadas sfo as frases de uma autora que analisou 0 periodo sob 0 prisma do pensamento ise- biano © processo de mudanga social a que esteve vinculado 0 Iseb se ‘cumpriu com desenvolvimento econémico realizado durante um periodo de “liberdades democt no interior do qual se gestou, contudo, a figura de um Est firmado sobre a centra- iGo das decisdes © no planejamento econémico, no crescimento it tecnocrata, na acentuagio do ‘Uma vex aparelhedo um Estado forte © comprometido com o status quo onde estavam garantidas 139 jetdades burguesas — 0 parafso dos direitos do homem —, ficou muito fe & bastante adequada ym as garantias d da “teoria do bolo” dispensar seus incémodos nome da “revolugio burgues tl do isolamento dos governantes, da “seguranca nacional” entendida como seguranga do Estado forte e autoritério.

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