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Joao Fragoso e Manolo Florentino O arcaismo como projeto Mercado atlintico, sociedade agréria elite mercantil em uma eco mis rdia = ee moc , = # edigiorevinacampliads = is? =: i a 909 193 CoPYMGHT 9 Jot Fapsoe Ml Foxrian, 20 ZAOOOYS3A IY om QUS:cADPOR he cma tees ce Deaepiaec oxrogeince ‘Bon one oft Le Sous Lee 158k 5 REINIOD2EL.K00 2 SET ORNS a ee ection, Manco, 188. "Qurna cno rfc mec dan scedade P6850 te dn ec am tna semaine tdi {Wo oe fneioy 1590 140 Manolo Foren © oo 1, _Feeo Re de nes Cota 102% ‘Agtoices Ban 8520005343 1st ~Mina—Peod clea 100: asl = Dino = Hii 3. Ba ‘Seniniae 1 Tia cop - 98105, 10480 BU 9m soon Tons oso sera. Psi 9 mp, manne 8 ‘Tanne de pes eine ne Se garogee eyo pein Sracegl po exrea. Dict det eo adgudoe pe Eoifons CvIZAGAO MRASILEIRA rte DISTRISUIDORA RECORD DE SERVIGOS TE IMPRENSA 5. [es Aang 7, ao trae sd onto, Rh, ro, 2921300 {eo a) 386300 EDIDOS PELO REEMBOLSO TOSTAL, (Cate oa 23082, ode fret RJ = 20928970 Ingen ro Bea ar para Renato Rocha Pitzer, in memoriam Sumério rirlockmstessacio 9 rerloeamasemeegio 11 ewrnwos Introdugio. 15 ‘ovina Interpretagées 23 SomREOSMODEIESOCUEATHOS AECONOMACOIONL 25 ennuscaotumanovantononcen 41 eutwom A integragio do Rio de Janeiro ao sistema atlinico portugues 61 munca pkclosxny 63 -AdsiasgAODEUMALSTILTURA CLONAL TARDANCNOC 848 aroouglo 56 poncwusho 96 AMRECONDGAO AHR AAUTONONNA. 5 XS CSS DOS FORE OA CONOMACOLONAL 117 ASWUTURAOROHRIADAMAODEONA 118 AsWUTUMASKOFERA DE AUMENTOS 148 AcsEmuzaGio quENsetscorK 159 ‘caviuow Elite mercantile l6gica de reprodugio em uma economia, colonial tardia 167 Arsebencs oo COMAL ERAT. 169 ANATUREAESTURURAL DO MOHOPOUOEDAESFECUGAO 189 ANATUEZAESHUTUMALOACADIAADANTAAETORADNYOAETO 203 cartwoy (Oarcatsmo como projeto 221 opumomomeoasscnanoto 223 ‘lea ansecRAMCD AFUE MERCAIT AFOREHAODAANSTOCRAGA NOS ‘worcos 227 UMisocRDABE HSTOMCAMATESOUDAKACOMABICLAAO. 235 potwoees 239 ‘Bae livro me parece exemplar em dois sentidos principais. “Tratas, om primeico lngar, de uma obra em colaboragioy que efetua a confluéncia de duas importantes teses de dou- toramento, defendidas na Universidade Federal Fluminense. _Além do fato dbvio de que das cabesas bem sintonizadas pen sam melhor do que uma, deve ser ressaltado que aquelas teses resultaram de longos processos de pesquisa coordenados entre voltados em parte para as mesmas massas documentais, interrogadas para finaidades diferentes mas complementares. Assim, a toca de idéias entre os autores vern de longe, tendo ja rendido outros frutos antes na forma de artigos © comunics- ‘¢6¢s, Ota, o trabalho em equipe é pouco freqlente entre n6s, 0 individualsmo predomina nas hostes da academia. Textos como ‘este demonstram que isso é una pena! Oxalé a leitura de resul- ‘aos tio inteessantes de um esforgo conjunto encoraje o de- senvolvimento de projetos similares. Tendo, no passado, produzido sete livros em colaboragio com historiador Héctor Péret Brignoli, no tenko, quanto a mim, qualquer dGvidaacee- ‘ca de quio proficuoe intelectualmente satisfatério pode ser 0 trabalho em equipe. Quantas vezes a discussio de um ponto crucial, de divergéncise on convergéneia, do caminho 2 seguir ornou-se to excitante e envolvente que s6 20 ver 0 sol raiar€ a esposa de Héctor, Yolanda, trazer-nos primeiro café do novo dia percebiamos ter passado a noite em claro, falando, debs tendo, plancjando! Este lirro parece-me, sinda, exemplar por conseguir uma ara conjugacio dialética do todo e das partes, por ser um cenfoque do regional que tanto ilumina 0 quadro de conjunto ‘quanto ¢ por ele iaminado. Este estudo do Rio de Janciro en- te 1790 ¢ 1840 desembocou no esclareci ‘mos gerais de reprodugio da economia ¢ da sociedade da Coldnia e das déeadasiniiais do Império em sua totalidades mas, por sua vez, foi formulada no bojo de wma visio bem dererminada acerea da etrutra social intcira — suashierarquias, sua ideologia, seu funcionamento. Sendo extremamente orginal ebem baseada empiricamente, a verso que oferecem os autores desse meio século de nose bhistria deverd despertar debates ¢ controvérsias de geande in teres ilidade.Sinto-me orgalhoso por ter sido 0 orientador de uma, eter paricipado da banca das dus ees que origins ram este texto, estando portanto vinculado as ratzes ‘as deste esforgo de sintese tio oportuno. 0 dos mecanis- iter, janeiro de 1993, CIRO FLAMARION CARDOSO Preficio & presente edi ‘Aos poucos, sucedem-se as edigdes de O arcaiomo como projeto, resultado da cimplice reflexio de Joio Fragovo e Manolo Florentino. Menos citado do que as publicagses individaais de cada um — Homens de grossa aventura, de Joio, e Em castas negras, de Manolo —, 0 Arcafomo traz, no minimo, dois desa- fiadores ahusosreéricos. Primcto, contrariando a teoria dos i- clos da matrz historiogrifics, que asocia pelo avesso nossos periodos de maior atvidade econémica a fase descendente do clo da economia internacional, sustentam Manolo e Joio,evi- dincias A mio, que © dinamisma da economia interna do pals se excitava no mesmo compasio da volipia acumulativa do {ebril uaiverso colonial em expansio. Estamos falando do sé- culo que vai de meados dos oitocentos a meados do XIX ¢ do slide enraizamento do sistema excravsta de produsio da vida material do que se estrururava como sociedade brasileira. O ar- _gumento ¢ a documentacio pertinente 0 leitor encontraré a0 longo do volume, advertido de que a cerimoniosa contestagio due spresentam Aquele elegants, complexo e poderoso mode- To, essencial ¢ exaustivamente arquitetado por Celso Furtado, representa na verdade completa subversio do ordenamento da histéria econsmico-social brasileira. Todo o acervo de informa- ‘fo jf acumulada, do trafico negreiro ao sistema judiciério, adguire novo estatuto documenta, a sevigo, agora, de mode. lo especular contraditério da historiografia consageada, Pare: 0 esorético, mas © ponto central é simples: aquile que se supe tena sido a genese da sociedade brasileira contemporinea esté seriamente equivocado, loge, aquilo que se supe seja omelhor entendimento da propria socedade brasileira contemporines aparece seriamente comprometido. Isto nfo pode fica assim, evidentemente, eno devido tempo outrasinvestigagies empfricas trario reforgo ou desafios hipstesestedrcase robusta dis evi= déncias do Arcatsmo. E, nesse pass, esclarego que estou proce: dendo a cirtrgica simplificagio do argumento de Joio ¢ Manolo. Todo ele considerado e digerido e, com certeza,seré ‘em breve impossivel produit historiogralia sem acertar conta, de um modo ou de out, com ele. ‘Anda mais explosivo & 0 segundo ponto que quero desta- car. A certaalura da histéria, de acordo com Joio e Mandlo, agueles a quem se designava homens de grossa aventura — inclasificve!estamento econémico e socal ue detinha a maior « mais significativa parcela de nossa eapacidade de poupansa, investimento e crediticia — optam por investi na continuidade de um modo de produgio (ternitoral-eseravistae aristocra- tizante) que, ao que parece, seria 0 nico a garantir a reprodu- ‘gio de uma estrutura em que s mumificariam as barreiras sociais. Atengio, nlo se trarava de assegurar epenas a pereai- dade da posigho relativa que ocupavam, mas da criagio de rmecanismos tio poderosos como destina ao exflio econémico «social todos os rebentos posteriores do aglomerado de pobres, escravos e mestios constitutivos da nio-lite brasileira. Quer dizer, no fururo, a aboiso do estatuto juriico da escravidio, consagragio constitucional da igualdade politica de todas a6 cetias, em acréseimo a universlizagio dos direitos de cidada- nia, alm de relativo progresso na escala da renda,seriam insu ficientes para romper o himen da pretendida pureza ¢ intocabilidade do quisto superior da comunidade. A socieda- de, eventualmente, viria aenriquecer, sempre, contudo, mediante 1 reprodugio ampliada do mesmo. O projeto antigo, moderna «e contemporineo foi e & 0 de congelar uma sociedade arcsice, de inabalivel extatificagio de valores e simbolos de status, in- dependentemente de alteragSes marginais no perfil de distribui- io de renda, © arcafsmo da sociedade brasileira nio existe por caso, mas por destgnc. ‘A tese & radical. Mais do que politicas tendo por objetivo impede modifiagSes socsisrelovantes,estarégia defensiva, a lite bresileira gera,delberada e continuamente, propostas de curso de ago enjo resultado liquide consist, em certo sentido, em desistoriczar a sociedade, precisamente na medida em que, come lé dzia © outro, mais as coisas parecem mudar, mais se parccem asi proprss. Eis, portanto, 0 ponto: tudo que existe, existe por desgnio, em metaférico tempo transistrico. Controverso — Adam Ferguson seria muito mais enfitico ‘no comentirio — mas nio impossivel. Manolo e Joio transmi= tem a mensagem de que, saprema entre todas, paita uma fenomenologia da matéra social, chave de idenificagio das d= versas mascara, abem dizer disfarces, ue ludem a percepcao do estado ainda bruto, is vezes brutal, da muatéia social origi nisia, Cumpre, evidentement, desvendar 2s sucessivas media 486s que so longo do tempo propiciaram a passagem de ama formacio & mesma, iasinvando outa, diversa. E cumpre, so bretudo, demonstrat que a hip6eese dialética da translormagio dda quantidade em qualidade prescreveu, perempts Estimo que no esteja no longinguo horizente dos poss! ‘eis, mas parece-me de todo modo certo que, para provi, ser necessirio comer o pudim. No caso, fazer uma histrie diferen- te. O Arcafsio 6 us desses peculiar livras a exigir algo mais do que aficil ret6rica relativista para entreter-se com ele, Du vido, ironicamente, se me entendem, duvido que passe em Danco. Para que no restem dividas sobre 6 compromisso deste prefaciador: sou totalmente solidirio com a audaica, mérito, possveis equivocos, pretensio e évidas do Arcatimo, saudan- do-0 como 0 mais visionirio projeto de interpretagio nacional ds tlhimas décadae. Rio de Janeiro, ontubro de 2000 ‘WANDERLEY GUILHERME DOS SANTOS cavirutot Introdugio “Se existe algum aspecto sobre o qual ha consenso entre os ana- listas da economia brasileira, € 0 de que nela prepondera uma das dstribuigges de renda mais desiguais do mundo ocidental, senio a mais desigual." Tal é a constatacio que serve deeixo 3 anilise de Mauricio Costa Romo numa coletinea sobre a eco- nnomia brasileira das Gltimas décadas. Seus dads sfo contun- dentes: entre 1960 ¢ 1988, a porcentagem de individuosabaixo Ao partir desseslineamentos, era inevitive, também a Farta- do, insistr na transferéncia de sobretabalho para a Metrépele como o fundamento da ecouomia colonial. A tal conclusto se chegou por meio da anise de dados acerca da empresa agucarcira Furtado estimava ser esta sufcientemente rentive para autof- nnanciar a duplicago de sa capacidede prodtivaacada dis nos, ‘que, contudo, x6 por vezes ocorreu, Di a indagagio: {-) mas sea plena capacidade de atofinanciamento da in- istia mio era uslizada, que destino tomavam os recursos f- snanceirossobrantes!™ "FURTADO, Gel, forma ecoutmica do ral. Sho Considerando que os recursos no eram aplicados no agi- car nem em outras rgiSes, Furtado sugere que (0) taver sia que parte sutszancal dos capitis splicados na produgio agucaeia pertencesse aos comercintes? Bis aqui claramente explicitada a subordinasio da produ- ‘io ao capital mercantil que, a0 se apropriar da maior parte do sobretrabalho, detcrminariao ritmo da acum. ‘Cabeinterroga sobre anaturezadesc capital mercanti, uma vex que o autor afirma nio existr na Colénia uma classe de ‘comerciantes de importincia, sendo os grandes empresitios agricalas 0 Gnico grupo de expressio, Sua resposa & precisa (Go) uma parte da renda, que ances atibuiamos& classe de ‘roprietiios de engentos e de canavias, seria 0 que Imodernamente se chama renda de nio residents e perma necia fora da Colénia. Explicar-se-ia, assim, a intima coordenasio existent ente ax eapas de produgio e comer- alizagio® ‘Mas Celso Furtado ndo se limita a seguir Caio Prado, Na bbasca por desvendar as flutuagées da economia colonial, ele se dcbruca sobre o comportamento dos diferentes segmentos que ‘a constiiriam, escaba por elaborar uma das melhores passa> gens de sua obra. Apéndice de sistemas maiores, a economia estar desprovida de ritmos préprios, com suas flutuages de- ‘terminadas pelas do mercado internacional. A expansio (fase [A), neste caso, seria condicionada pela alta dos pregos externos, Mees teat 924 ‘© aqueda desteslevaria&retragio (Fase B). Ressalte-se, porém, ‘que a fase B nio ensejria qualquer madanga de estrurua, vis- to que, por entio, es excravos das engenhos se veriam desloca- ddos para atividades de subsistencia nio diretamente ligadas & exportagio. Furtado conclu que as atvidades voltadas para o mercado, internacional, altamente especalizadas, cstaiam caractrizadas ‘or grande cocficiente de exportaglo. Por isso seu crescimento necessariamente implicaria o crescimento de setores coloniais ligados a0 abastecimento. Eis ai a brecha atvavés da qual ze de- senvolveria o mercado interno colonial — ou sea, ae produsées rmereants para abustecimeato, Por cert, este mercado conhe- ‘ceria limites precisos, impostos pela prépriasituagio colonial = por exemplo, os baixosfretes martimos, que faciltariam as ‘importagSes, ea determinacio mesropolitaa de impedi acon ‘corréacia de produtos colonais.” Ligado, pois, exportagto,o abastecimento interno nao es- ‘aria assentado majoritariamente na escrwvidio (veja-se 0 caso) ‘da pecuitia), e grande parte da produsio deste setor se desti- naria i anto-subsisttncia, Daf sua relativa autonomia em face das fummagGes do mereado externo, a qual, porém, deve ser bem centendida: apenas em épocas de alta dos pregos externos tais ‘segmentos aumentariam seus indices de mercantzagéo, Du- ‘ante as conjunturasdesfavorsveis, polo contrdtio, eles se red Ziriam, pois a propria agroesportagio recuaria a niveis de antoconsumo. Assim, 0 grau de mercantiizagéo da produgio de alimentos — e, portanto, a prépria extensio do mercado interno — dependeria dos pregosinternacionais, Nos momen= tos de crise, a produgéo colonial poderia até aumentar, mas o "em pp 36, faria de forma nio mercantilizada, isto 6, enquanto pura pro- ‘dugio de subsistenca’ “Trts décadas depois de Caio Prado haver erigido o comér- cio exterior a condigio de eixo maior da histéria colonial, Fernando Novas eforcava semelhante ida. Fo farinintegran- do de maneira mais sistemitica © Antigo Sistema Colonial ‘Mercantilsta 8 acumulagéo primitiva de captais: (0 que nos parece peculiar, historicaments especfcn, dis ormagbes colonia do Antigo Regime, € que ata menrager decor dos movimentor de acumulagio do capital merea- ‘ima foemasto do eaptalismo.* Norais retomava Caio Prado lancando mao de nog6es como “transferéacia de excedentes" "elagber centrolperiferia™, con trais para a constituicio de seu quacro explicativo.* “Mas oconceito de Antigo Sistema Colonial representa 0 ins- ‘tramento analiico maior. Em Caio Prado tal nogio aparece fn- ‘dada naquilo que se convencionou chamar de Pacto Colonial — ‘a exclusividade comercial entre as colénias e suas respectivas ‘metrdpoles. O Pacto seria aexpressio maior do capitalismo co- ‘mercial, pois reservatia aos mereadores metropolitanosoprivlé- io das transages colonia.” Novas é, a esterespeito,enfitico: iden pp fos PIER, Paolo 5 abaliarav,comomiseaciedade, Ho de Jano, Pa Tes 1984 7.77 -NCARDOSO, Cie FS. "Ar eonepe str do ‘itn coco mn ‘al eo “sng item ceo x recaps oso com 'exragio ‘drecedene™ in LAPA Jo Jo org) Modor de produ era (baa Resp, ous, 1980, 9127 PRADO fk, itr, pp. i161 O regime do comércio colonial — isto 6, 0 exclusive me- ‘wopoitano no comércio colonial — constiuiv-se a0 longo sds steulos XVI, XVIle XVIIL, no mecanismo através do qual se processva a apropragi por parte dos mercadores das retrépoles, dos hscrosexcedentergerados nas economias > loriait: asim, pois, o sistema colonial em funcionamento ‘configurava uma pesa da acunulagio primitiva de capitals nos quadzos do desenvolvimento do captalismo mereantil cesropeu* Por certo Novais nio desconhece o cariter peculiar das rmetrdpoles ibéricas. Nestas no se veificavam os resultados fintis de uma acumulagio prévia de capitals — isto 6, a indas- ‘malizagdo capitalista. Embora nfo se detenha na anilise do fe- nnémeno (0 que, segundo ele, “extravasaria nosso objetivo"), Novais, como antes o izers Caio Prado, percebe em Portugal ‘um capitalismo mercantl, porém marcado pela hipertrofia do Estado — um “capitalismo monérquico". A isto acrescenta a conjuntura internacional qu, a pacts de meados do sécalo XVII, © tornou desfavorivel 4 Metrépole, Tal fendmeno ensejaria a dependéncia porniguesa para com a Inglaterra e aquilo que © autor chama de “transferéacia das vantagens” do exclusivo ‘colonial. Dessespressupostos emergem ostrapos bisicos da economia colonial, comegando pela excravidio, Da mesma forma que em Caio Prado e Furtado, para Novais a hegemonia da plantation resultaria num mercado interno reduridissimo, dado que 0s es- «ravos produziriam grande parte de sua subsisténcia na prpria a tunidade exportadora. A economia colonial estaria, pois, dividida em dois setores bisicos: a plantation, razio de ser da colonizagio capitalist; e o setor, subordinado ¢ dependente, * Na verdade, com a crise do ouro e dos iamantes, Minas reordenou-se para o suprimento da cidade do Rio de Janeiro, cujo crescinento demogréfco foi notvel a parti de 1760, Estruturoa-se aa sil das Gerais um verdadeiro comple- xo agropecuirio, sua comarca mai importante (Rio das Mor tes) couhecen um aumento populacioal estupendo — de 82.781 hhabitantes em 1776 para 213.617 em 1821, ou ej, de 1 para 2/5 da populagio da capitania como um todo. Entre estes dois Jc SCLIART, Set Bny Latin America, Nova J Ceiersty Pe 1985, p 394 SIMONSEN, ero C ‘wend de eal, 15001800, Sie Pl Compaahia tora ‘Neco 1978 p29 ¢ FURTADO, op. p12. loko raaseso € MAKoLo F anos, a populagio mincita cresceu 6196, enquanto naquela ‘comarca tl indice alcangou 1589. Tais dados indicam tanto o deslocamento demiografico de antigas dreas de mineragéo para o Sul quanto © incremento dis importagSes de exeravs.™" ‘Como néo poderiadeiear de ser, a politica continuariain- terferindo na economia, o mercado continvava imperfeito © as liangas entre familias luminenses se sucediam. Porém, ema 1746, fem carta ao rei, os homens de negécios da cidade do Rio de Janeiro voltariam a solicitar a partiipasio nos cargos da Re- puiblica, denunciando a pobreza a que teria chegado parte da “pobreza da terra”: ‘0s eleitas para o Senado [coo peécequisito era pertencer 3 fidalgialalém de morarem distance da Cidade (.) so tho pobees, que chegam a vende, para comprar vestide de core, ‘0 nico negenko que hes seve de plantar osustento de suas famine. Apssar do possvel exegero, em 1745 0 Sena reconheceria que osnegacantes da cidade eram os seus moradores mais “abona- dos’. Aparentemente, em finais do Setecentososnegosantesganka- ama disput. Por isso 6que, das pessonscorsideradas pelo Senado ‘como apts para nele servi, cerca de 4090 eram mercadores. TMARWEL, Kneth A dea da devas Rode Jno, Pt Tera, 1977, gp. 300301 ‘er HIEALHO, Ferands, essen dos colon in: Acide ¢0 Inpiis BindeJonoo we dmdmieacloil prt, ios XVI € DVI. So Pano, Popa Ge Poa em Hi da USE, 197 (Corde domorade ni), fe says fra eae de eso, p36! 607, hab COVEN, Marin F “Rad Se peer na Ae ot ‘Ross. © Cave da Cra do Rio de jaz em as do tala XVI € Inti do XX, in © unio no mud poms Funchal Cento de Eos de Hata do Aino, 1958, p 853 Desse mod, 20 lado de uma wobrese de tera, descendente dos conquistadores quinhentistas, consoida po! os comerciantes de grosso tato. Caberia perguntar quem seviam estes novos personagens. Para comecar, seu poder eco- ‘némico foi paradoxalmente afirmado pelo relatério do mar- ués do Lavradio (1778), 0 qual, 20 analisar a estrutura comercial do Rio de Janeiro, afirmava que os agentes mercan- tis cariocas nio poderiam merecer a designacio de comercian- tes, posto serem meros representantes de easas comerciais ‘metropolitanas. Nas piginas seguintes, entretanto, © préprio vice-rei constatava que a Coroa devia a esses comerciantes a ‘quantia de 5 milhées de cruzados — cifra atronémica, dado representar cerca de 1/5 do valor de todas a8 exportagiecolo- niais no ano de 1796, ¢aproximadamente metade das da Bahia ‘na mesma épocal ‘Ontras pistas indicam que, ao longo da segunda metade do XVIII, estes comerciantes constitafam a elite flaminense, Caso nos fixemos nos principais coatratadores do perfodo, ppereeberemos entre lesa presenca de José Bezerra Seixas, ne- ociante do Rio que arrematou cinco diferentes contratos en- tre 1751 © 1759: dizima da slfindega do Rio de Janeiro (1751-53); direitos dos escraves que safam da Bahia, Rio de Janeiro e demais portos do Sul (1755-59) direitos de 38500 ‘por escravo na entrada da alfindega da Bahia (1751-53); ditei- tos de 1$000 por escravo da fortaleza de Ajudlé (Costa da ‘Mina) que entrava ne alfandega da Bahia (1757-59); e subsi- dio da aguardente que se gastava no Rio de Janeiro (1751-53). [Em razio da simultaneidade de tais impostos e dos valores rncles mobilizsdos, ratava.se de sim comerciante de grosso sem novo gre: Contudo, tratava-se do Gnico arrematante fluminense com esse perfil” Dos contratantes presentes nos *Mapas CChronolégicos dos Contratos", cram mais freqlentes os por- tugueseslstados como membros da elite mercanti isboeta da Epoca pombalina.™ Entre estes destacavam-se nomes coma Joao Fernandes de Oliveira que, entre 1751 ¢ 1759, arrema- taria ao menos quatro impostos, alguns com a exvergadura dos “diamantes de Serro Frio, por captagio de seiscentos ne- gros"; ou ainda Estevio Martins Torres, negociante de qua- ‘0 impostos que envolviam otrfico de escravos com a Costa ‘da Mina e os dizimos do Rio de Janeiro, entre outros empre- cendimentos. Poucos, porém, tinham a envergadura de José Ferreira da Veiga. Salvo engano, em mais de trints anos de atividades, Veiga arremstara, em diferentes pontos dos dois Iados do Atlantica Sul, cerca de 13 contratos, envolvendo-se fem atividades que iam das “passegens do rio Paratba” aos “direitos de eseravos e marfim de Angola”. Tomando por base ‘o valor total de impostosultramarines do ano de 1753," ele «seus séciog teria sido responséveis por 983:7058000, ou scjay 45% daguele total. ‘Assim como Veiga, nesta €poca existiam outros mercadores tings transatldaticos. Tratsva-se, contudo, de mera aparéncia, pois, A exceco dos contrato, esses neg tam controlar 0 coméecio alteamarino do Brasil e da fndia. Da ‘mesma forma, eles no dominayam a circulasio de produtos ultamarinos entre Portugal e a Europ, que permanccia em mo "Rul sry rm eu ao, emacs soe por © ta sonra li don Si sion rrr tee 0 de “Ghyur de CaldrBrtss)— cop. pain, "SPEDREIRA. Or bomen er Ape de negociantes de outras partes do Velho Continente.® Fis aqui uma das importantes diferengas entre a comunidad mercantil lisboeta ea do Rio de Janeiro: apesar de nao arrematarem tan- tos contratos retis como os lsboetas, 0s comerciantes do Rio de Janeiro controlavam a base de parte substantiva dos neg6cios que eram tributados pelos contratos ultramarinos, [AAFIAMAGAO DE UMA ESTRUTURA COLONIAL TARDIA, (€1700-¢:1680) (0 tse do temo tard & de longs teadigo historiogrifiea. Com se busea-secaracterizar a etapa final do determinado period e, simultaneamente, 0 inicio de um nove, falta de melhor defini {o, por “trdio" eu “tarda” compreensde-se um period de tran gd ou, mais raramente, de mudangas aceleradas, Pata o Brasil, 18 coisas nio slo muito diferentes, embora com muangis. Em um texto hoje clissico, Dauril Alden uilizaanogo “co: lonial tardio" para dae conta das ilkimas décadas da economia « sociedade eolonias sb o efetivo donsinio portugues — 0 pe iodo 1750-1808." A etapa tara se iniciaria com o boom do “Sab oe Yr FEDREIRA, Os homens. oP 164167. Spo sae Bator, ptr ds rane omora dos Hones dees ‘tip nonopliavi ocd us fa, nem eer oan Emo teapumapt.o menno sub ss “x snes.) vendanem Lites sarigos morass do tango, xonam a experagio do rt ation dowinvn spore enze Fria fatape gp 116519) ‘ALDEN, Dear 1 colon adlin BETEIELL- Lop) Hise ‘ve dst expres par mares na dexda da pees pargaes fo Basl mbm pode ser encontrado con oon aaoren coma SCHWARTZ Slee Pots sth Grove of Pensa i at Clo sid Bee: RUSSELL WOOD, AR. From Colo to Natomas ols HopkssUnveniy Fre, 1975, pp. 153154 ‘ure (seu ponte mais lt), seria seguida pelo declinio da pro- ‘dugio aurifera e, depois, pelo retorno, em grande estilo, da for- ‘ma tradicional da rigueza colonial — a agricultura de ‘exportag, Este renascimento ou ressurgimento agrcola, como preferem autores como Stuart Schwartz seria marcado nio apenas pela recuperagio da produc de produtos como 0 ag car eo tabaco, mas também pelo erescimento de novas culcuras| de exportacio (como © algodio eo anil). Além disso tis mo- vimentosseriam acompanhados por mudancas politics e sociais, ‘como as reformss pombalinas. © téemino do perfode ocorre a partir da chegada da Corte portuguesa e, pois pelo fim do ‘pacto colonial ea emergéncis de um novo estatuto politico para ‘0 Brasil sinda nos quadros do Império Tustano.* Emapregamor a nogio de tam modo algo diferente. Nosso ponto de partida & a experiéncia econémica social do Rio de Janeiro e do SulSudeste brasleitos entre finals do Serecentos © as primeizas décadas do século seguinte — 0 que obviamente iio quer dizer que a nosio no passa ser aplicada a outras re sides da América portuguesa. Mas por “colonial tarda” enten-

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