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RESUMO
A palavra “xamã”, quer dizer sacerdote, curador, místico, médico. Depende de
cada cultura. Mas no Brasil quando falamos xamanismo reduzimos o significado
da palavra aos rituais dos povos chamados de “indígenas” (originários da terra).
Nesse sentido, podemos dizer que xamã é uma palavra com sentido
aproximativo do real – pelo menos conforme pensamos no imaginário coletivo.
Mas, esse termo não parece ser capaz de descrever ou traduzir tudo aquilo a
que ele se refere. E parece muito menos conseguir representar o simbólico
daquilo a que o termo se refere. Pois a realidade das culturas de cura no mundo,
sobretudo no Brasil são amplas demais para reduzirmos em breve conceito como
a este fenômeno tão imensurável. Mais do que a dificuldade semântica e
intercultural a ser abarcada por essa terminologia disseminada globalmente, há
um outro fator de ordem epistemológica e política, fundantes desses conflitos
cognitivos, e obliterados pelo senso comum e até mesmo científico, a relação de
poder e de dominação subjacente às culturas.
Palavras-chave: xamanismo; interculturalidade, decolonialidade e poder.
INTRODUÇÃO
No Brasil, conforme os dados da Fundação Nacional do Índio (Funai) temos mais
de 305 etnias diferentes de povos originários dessas terras onde hoje se delimita
o território brasileiro. Temos 274 línguas faladas atualmente. Sem contar os
povos tradicionais de matriz africana (quilombolas e remanescentes de
quilombos), que conforme a Coordenação Nacional de Articulação das
Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) no total deve chegar a quase
5 mil comunidades no Brasil afora, mas a Fundação Cultural Palmares mapeou
ainda somente 3.524. Todos esses segmentos de povos tradicionais,
contabilizando outros povos, tais como: de terreiro, quebradeiras de coco,
ribeirinhos, ciganos e tantos outros catalogados pelo Centro Nacional de
Desenvolvimento Sustentado das Populações Tradicionais (CNPT), têm os seus
INTERCULTURALIDADE E COLONIALIDADE
Catherine Walsh (2009) ao discutir sobre interculturalidade no contexto da
América Latina organiza a abordagem em alguns conceitos básicos para
diferenciar os efeitos da relação em que o discurso demarca os espaços de
poder de um sistema de dominação entre as culturas. Por isso a autora
apresenta três perspectivas conceituais: relacional, funcional e crítica. A
Relacional camufla os conflitos entre as distintas culturas. O fato de existirem,
até mesmo num dado espaço, culturas distintas como a indígena, a negra e a
europeia, não significa que tudo está consolidado e apaziguado como pressupõe
o mito da democracia racial. Walsh apresenta o conceito Relacional como um
postulado no qual simplesmente o conflito e o sistema de dominação parecem
entre os distintos grupos. A segunda perspectiva citada por Walsh é a Funcional,
na qual reconhece as diversidades, e por isso trabalha com o ideal de inclusão
das minorias na estrutura social privilegiada. Conforme Walsh, essa segunda
perspectiva nos dá a impressão de efetivação de justiça social porque corrige as
assimetrias e desigualdades, mas não tem o sistema de regras questionado, por
isso, esse modelo é o predileto do neoliberalismo e do viés da globalização. E a
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terceira perspectiva apresentada pela pesquisadora é a Crítica. Walsh diz que a
Crítica permite diferenciar a questão das diversidades culturais da estrutura
colonial, cujo critério de poder é a raça. Assim, ela diz que essa perspectiva
permite compreender como esse critério hierarquiza as raças, colocando em
local de destaque e privilégio a raça branca. Por isso, a interculturalidade dentro
dessa terceira perspectiva ainda não existe de fato, mas é a algo que pode vir a
existir. Ainda sobre essa temática há outros autores que tratam dessa
hegemônica relação de poder, a saber, Aníbal Quijano (2005), Boaventura de
Sousa Santos (2006) e Achille Mbembe (2005), Garcia Filice (2017) e outros.
CONCLUSÃO
É dessa feita que discutir o xamanismo apenas numa perspectiva semântica da
diversidade cultural tem bastante relevância, pois produz tolerância, diálogos,
cooperações, no entanto, não serão resolvidos os conflitos interculturais se não
questionarmos antes as estruturas mantenedoras dessas assimetrias, no caso a
chamada “colonialidade do poder” (Quijano, 2005). É dentro dessa lógica
sistemática obliterada, mas atuante que os dogmas operam, que com suas
justificativas racionalizantes produzem não somente desconhecimento acerca
das demais culturas, mas também medo, preconceito e as vezes até mesmo ódio
às culturas subjugadas. Sendo assim, funda também nesse preconceito religioso
o racismo religioso, pois as religiões, saberes, práticas e hábitos de povos
subalternizados estão relacionados à sua raça, à sua etnia, ao seu povo. Dentro
desse contexto, aquilo que consideramos certo ou errado, em geral, não é nada
mais do que preconceito de classe. Que por sua vez divide não somente
opiniões, mas pessoas da família humana.
REFERÊNCIAS
FILICE, Renísia Cristina Garcia. Tecendo redes antirracistas: África(s), Brasil e Portugal. 2017. I
Congresso Internacional em Direitos Humanos e Cidadania. Mesa IV Gênero e Raça e as Lutas
Decoloniais dos Direitos Humanos e seus Desafios no Brasil e na América Latina. 2017.
Índios no Brasil: quem são? Disponível em: http://www.funai.gov.br/index.php/indios-no-
brasil/quem-sao>. Acesso em 01 de julho de 2018, às 22hs.