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EDMUNDO ULSON”
CURSO DE HISTÓRIA
Araras-SP
2010
CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON”
CURSO DE HISTÓRIA
Monografia apresentada à
Banca examinadora do Curso de
História do UNAR – Centro
Universitário de Araras Dr.
Edmundo Ulson como
exigência parcial para
conclusão do curso.
Araras-SP
2010
BANCA EXAMINADORA
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Este trabalho pretende mostrar de uma forma mais direta as questões dos
ideais buscados pelo movimento “punk” na década de 80, o seu início na Europa
e como chegou até o Brasil, esclarecer a situação da política brasileira e
relacionar esse movimento de rebeldia com as lutas sociais das grandes capitais,
identificar o surgimento do rock nacional como característica fundamental da
abertura cultural da década, mostrar de que forma é vista a imagem do punk
através dos estudos de historiadores que vivenciaram a época.
SUMÁRIO
A sociedade sempre foi uma questão que gerou debates entre sociólogos,
historiadores e estudiosos de outras áreas. Em meio às relações sociais, surgem
manifestações, sejam elas, de origem cultural, política ou religiosa. O objetivo
dessas manifestações culturais é expressar idéias, às vezes de
descontentamento e oposição contra algo que os reprima.
O inicio das influências culturais que vamos estudar neste trabalho, tem início na
Inglaterra em meados da década de 1970. A música inglesa conhecia um novo
expoente do rock, o conjunto Sex Pistols inovou ao expressar em suas canções a
insatisfação com a Corte Inglesa. Todos os elementos se tornavam um ponto de
expressão para agredir o governo e a sociedade, o visual rasgado e desleixado, o
cabelo estilo moicano e o rock estilo rápido e agressivo. Assim como na
Inglaterra, as questões sócio-culturais no Brasil estavam em evidência. O
movimento punk chegava ao país no fim da década de 70, mas ficou restrito aos
subúrbios das grandes cidades. Foi no início da década de 80 que o movimento
aproveitou a popularidade do rock nacional, e pegou carona para conseguir seu
espaço perante os ouvintes brasileiros.
A história está ganhando cada vez mais destaque próximo às outras áreas
de conhecimento que estudam especificamente o homem, procurando desvendar
toda a importância do seu papel em meio à história social. Na história o seu
processo nunca é contínuo ou linear, ele não obedece a um desenvolvimento
―reto‖, ele entrará em desvio, avanços, recuos, inversões, etc. É necessário
entender que é o homem o autor das mudanças históricas que acontecem,
segundo Vavy Pacheco Borges:
São os homens constituídos em sociedade que, embora nem
sempre conscientemente, atuaram e atuam para que as coisas
se passem de uma ou outra maneira, para que tomem um rumo
ou outro (1987, p.50)
Portanto, o histórico do Rock nos mostra que seu poder de propagar ideologias
sociais dentro de suas letras e outros elementos é marca registrada no âmbito da
história cultural recente. Cabe-nos aqui, dar um retrato a respeito dessa
dimensão.
Capitulo 2 A política nacional em transição: 1980-1990
O universo político nos leva a percorrer caminhos que nos fazem analisar
toda sua relação com os tempos atuais. A década de 80 no Brasil viveu um dos
maiores momentos em que o povo despertava e necessitava de voz ativa naquele
período. A democracia se fazia presente na vontade popular e observando estes
últimos anos políticos no Brasil e em todo o mundo, somos obrigados a colocar
novas percepções sobre os problemas culturais e sociais. É fato que, para a
permissão de uma abertura democrática a tomada de decisão política envolve
vários parâmetros a serem observados e Marilena Chauí alerta:
Uma nova visão passou a ser analisada perante o Estado, que como de
costume era visto gigante, ameaçador, passou a não ser detentor de toda força e
autoridade. E sobre essa discussão, a revolução deixou de ser a única saída para
as injustiças sociais, nesse movimento de redescoberta outras possibilidades
emergiram dos anos 80 passaram a dar ênfase aos problemas próximos. A
construção de uma sociedade mais justa, a liberdade e melhores condições de
vida passaram a ser vistos como ideais a serem conquistados no cotidiano,
principalmente nas transformações de comportamentos individuais.
A abertura política dos anos 80 era uma incógnita, restavam saber quais
seriam os rumos dessa abertura, já que em nossa cultura a democracia é uma
palavra de sentido fluído. Os movimentos sociais pressionaram o governo com
greves, organizações de bairro, sendo de fundamental importância para a
abertura de conquistas democráticas. Isso claramente exigia mudanças nos
canais efetivos da participação das classes trabalhadoras. Com isso, as medidas
para conter as manifestações eram tomadas, como por exemplo, o Decreto
no.2045, em 1983, que alterava a política salarial, e em 1984, quando foi votada a
emenda Dante de Oliveira que propunha as eleições diretas para a presidência do
Brasil.
Grupos musicais como The Clash e Sex Pistols inovavam ao atacar mais
diretamente as suas insatisfações com o governo e a sociedade em suas
composições. Rockeiros como Raul Seixas e Rita Lee tentavam modificar a cena,
mas ainda era muito pouco e as pessoas precisavam de algo novo para fazê-las
esquecer um pouco de tudo aquilo que as deixavam tensas.
E foi em meio a isso tudo que apareceu o rock brasileiro dos anos 80, que
ficou conhecido como ―Rock Brasil‖. Foi em São Paulo que surgiu a primeira casa
noturna que abriu espaço para a nova geração do Rock, a Paulicéia Desvairada,
em 1982. Criada por Nelson Motta e Julio Barroso (da banda Gang 90), foi o
primeiro lugar a tocar punk e new wave no bairro dos jardins, pois até então, as
festas punks só eram realizadas na periferia. Quando essa casa fechou o mesmo
Julio abriu outro espaço, chamado agora de Hong Kong e grande bandas como
Barão Vermelho e Titãs se apresentaram por lá inicialmente. Aliás, mais adiante
falaremos sobre alguns grupos musicais de maior expressão dessa cena. No Rio
de Janeiro, existia o Circo Voador, que foi onde começou a despontar as bandas
do rock carioca como Paralamas do Sucesso, Kid Abelha, Barão Vermelho, Gang
90. E o lugar serviria ainda de palco para muitas bandas emergentes de outros
estados. Não se pode deixar de falar da febre das danceterias em São Paulo,
sempre com bandas ao vivo. Mais tarde ainda outro lugar marcaria o cenário
underground da cidade, o Madame Satã, onde era o ponto de encontro de todos
os que procuravam um espaço alternativo (VINIL, 2008).
Todos esses lugares garantiriam a divulgação do novo rock brasileiro que
estava surgindo. Mas esse rock brasileiro ainda não estava tão preocupado ou
influenciado por questões sociopolíticas, não se caracterizava como música de
protesto. Até mesmo porque, a censura fez com que a música de protesto fosse
substituída por uma música comercial, sem engajamento político, mas essa
mesma censura irá provocar o pensamento contracultural. E esse termo
―contracultura‖ surge na década de 60 pela imprensa norte-americana para
denominar os conjuntos de manifestações culturais que estavam repercutindo em
todo o mundo. E nesse quadro de manifestações, a música é mais do que
simplesmente uma ferramenta cultural e Carlos Alberto Messeder Pereira nos diz:
O rock nacional teve sua preparação nos anos de 81 a 82, para viver uma
fase de ascensão entre 1983 a 1987, e depois sofrer uma pequena baixa, mas
mesmo assim mantendo-se como a grande força da musica nacional. As
gravadoras se alertavam às manifestações vindas do eixo Rio-São Paulo.
Começando pelo rock carioca, temos várias bandas que influenciadas pela new
wave e o rock internacional, surgiram deixando marcas expressivas no mercado
fonográfico e muitas delas permanecendo até os dias de hoje. Lembrando que
neste capítulo estamos destinando a compreensão das bandas que tiveram maior
expressão da mídia brasileira de época, para depois compreendermos as bandas
undergrounds, denominadas punks (VINIL, 2008).
O disco seguinte seria Selvagem? (1986), está na lista dos melhores discos
da banda e tem ―pitadas‖ de MPB com as faixas ―Alagados‖ e ―A novidade‖, esta
escrita em parceria com Gilberto Gil. Em 1987, tiveram a oportunidade de tocar
em lugares internacionais, e a banda passou a ser famosa na América latina. O
tecladista João Fera entrou para o grupo e partir daí acrescentou ―metais‖ para os
arranjos. A banda faz parte do cenário rock até os dias atuais. Outras bandas
cariocas também ajudaram a construir BRock, Gang 90 e as Absurdettes foi uma
banda influenciada pela new wave do B-52 ‗s e do Blondie. A banda liderada por
Julio Barroso estreou no festival MPB Shell, da rede Globo, em 1981, com a
música ―Perdidos na selva‖, mais tarde regravada pelo Barão Vermelho. A banda
teve música tocada na abertura de novela, mas a carreira da banda foi
bruscamente interrompida pela morte de Julio Barroso, em 1984. Em 1986, foi a
vez de aparecer o Biquíni Cavadão com o LP Cidades em Torrente, que continha
seus grandes hits de década, ―Timidez‖, ―No mundo da lua‖, e ―Tédio‖.
Eles seriam os responsáveis por ser uma banda de alto conceito na mídia,
mas que ao amadurecerem as idéias, apresentariam em seus álbuns um pouco
de contracultura citada agora a pouco no início do capítulo. Começaram no ano
de 1982 com o nome de Titãs do Iê Iê, uma sátira new wave da Jovem Guarda e
a banda contava com um belo time de compositores. No início eram nove
integrantes, depois se reduziram a oito, mudando também o nome para Titãs,
somente. O primeiro disco, Titãs (1984), emplacou somente ―Sonífera ilha‖, o
segundo LP Televisão (1985), com a produção de Lulu Santos, alcançou maiores
sucessos com ―Televisão‖, ―Insensível‖ e ―Massacre‖. No ano de 1986, Cabeça
Dinossauro, veio provar a competência da banda ao falar de assuntos que se
relacionavam a política e sociedade, o disco era carregado de influência punk
diferenciando-se dos anteriores, e talvez por isso seja um dos discos mais
aclamados do grupo durante toda a carreira. No ano seguinte, lançaram mais um
clássico:‖ Jesus não tem dentes no país dos banguelas,” seguiu a mesma linha do
anterior, e nessa época fizeram uma grande performance no festival Hollywood
Rock. Em 1988, lançam um álbum ao vivo, e em 1989 Õ blésq blom se
consagraria como um dos álbuns mais elaborados da banda. As músicas são de
arranjos riquíssimos e efeitos eletrônicos que combinam com a atmosfera do
disco e com ele, alcançam um prêmio da MTV americana de melhor vídeo de rock
da América Latina, com a música ―Flores‖ (VINIL, 2008).
Vale a pena citar também a banda liderada por Roger Moreira, o Ultraje a
Rigor, que era fiel ao estilo rock and roll dos anos 50. Um dos sucessos da banda
―Inútil‖, que continha uma letra politizada, porém, bem-humorada, chegou a ser
citada por políticos como Ulisses Guimarães na época das Diretas Já. O Ultraje
colecionou vários hits pela década de 80 ―Nós vamos invadir sua praia‖, ―Sexo‖,
―Marilou‖, ―Ciúmes‖ e ―Independente Futebol Clube‖. Fora desse eixo Rio-São
Paulo, teremos bandas importantes também para a construção do cenário do rock
nacional. Brasília foi um grande celeiro de bandas que representaram muito bem
sua região para o resto do país. Há ainda uma discussão interessante sobre
quem teria o papel de ter gerado os primeiros grupos punks, mas é uma conversa
a ser discutida mais a frente.
Em 1976, a mídia não quer saber de publicar outra coisa que não seja
sobre os punks, mas nesse inicio o movimento ainda era mais uma revolução de
estilo do que política. Mas aos poucos vai entrando em um campo que vai ferir as
esferas do poder, começando a dar inicio a sua ideologia: o anarquismo. Em
todas as suas manifestações, o punk vai priorizando suas características, vai se
modelando, começam a ser a favor da exteriorização de um sentimento mais forte
contra todo o erro humano e suas falhas, toda a opressão, injustiças, mentiras,
torturas que afetam as pessoas desprivilegiadas como eles. Os festivais punks
começam a ser realizados com mais freqüência na Inglaterra, causando a
popularidade do estilo musical, e o mais importante efeito alcançado,
ultrapassando as barreiras do reino unido e chegando ao resto do mundo. Claro
que a popularização no exterior seria mais lenta e mais ―estereotipada‖ do
verdadeiro sentido do que estava acontecendo. Acompanhando toda essa
evolução do punk, é possível fazer um pequeno comparativo com o movimento
hippie dos anos 60. Aquele período ficou marcado pelo nascimento da
contracultura e Carlos Alberto Messeder explica:
Desta forma o homem novo que a contracultura tentava construir
pressupunha efetivamente um novo modo de conceber e de se
relacionar com o mundo a sua volta, nas mais diferentes áreas do
seu cotidiano, exigindo portanto o surgimento de uma nova
consciência ou de uma nova sensibilidade (1983, p.86)
Não vejo uma diferença muito grande entre os dois períodos, claro que a
ideologia, os métodos e maneiras de se expressarem se diversificavam, mas a
busca pelo espaço e notoriedade dentro da sociedade existia em ambos os
movimentos, permitido também lembrar que na essência mais profunda, os dois
movimentos geram uma crítica anárquica em oposição à ordem dominante.
Seguindo adiante, o Sex Pistols mais do que nunca já espalhava pela Inglaterra
toda sua fúria e contestação contra o governo da rainha, e os problemas vividos
por eles na sociedade proletária. Após fazerem várias apresentações, eles
conseguem o visto americano para que se apresentem nos EUA. Isso causaria
um tumulto no país, que ansiosamente esperava pelo conjunto mais temido do
momento. Por onde passam, os Pistols deixam um rastro de destruição, no
sentido às vezes material, mas principalmente uma destruição ideológica das
platéias que os assistem. Nesse mesmo período, eles encerram as atividades da
banda, por conflitos internos principalmente, e em 1979, Sid Vicious que entrara
por ultimo na banda e que também viraria um ícone para os punks, morreria de
overdose, deixando o punk órfão naquele momento.
Dalí em diante, o punk viveria uma fase que sofreria para sobreviver como
uma vertente do rock, mas entre 1979 e 1981, várias bandas se formariam no
cenário mundial, pois o trabalho dos Sex Pistols renderia frutos. A partir de 1981,
o punk se despontaria, mesmo que de forma pequena em alguns países, países
socialistas como Iugoslávia, Polônia, Tcheco-Eslováquia teriam representantes
do movimento, Itália, Alemanha, Noruega, Holanda, ninguém escaparia dos ideais
anárquicos. Era como se fosse um levante punk pela segunda vez, e agora a
preocupação era com a guerra das Malvinas, já que até hoje a Europa parece ser
traumatizada com as Guerras Mundiais. Bom, depois de termos vistos este início
do punk, de como se desencadeou tudo isso lá fora, é chegada a hora de saber
como recebemos isto no Brasil e como ele se estabeleceu como um dos
principais movimentos sociais de década de 80.
4.2 – O Punk e seu contexto no Brasil: uma analise sucinta
O punk viria com toda a força para poder se manifestar de forma contrária
a tudo que estava sendo aceito pela sociedade, e o melhor, o movimento não
poderia ser ignorado por muito tempo. De certa forma, o movimento ganharia um
espaço dentro das referências culturais do país. Teixeira Coelho esclarece:
―Cultura é o que move o indivíduo, o grupo, para longe da indiferença, da
indistinção, é uma construção que só pode proceder pela diferenciação‖ (2001,
p.21).
Mas eles sabiam que o futuro era incerto se não fizessem nada, ―o punk
surgiu numa época de crise e desemprego, e com tal força, que logo se espalhou
pelo mundo. E que cada um, há sua realidade, adotou o protesto punk,
externação de um sentimento de descontentamento que já existia atravessado na
garganta de uma certa ala jovem das classes menos privilegiadas do mundo‖
(Bivar, 2001). O jovem queria liberdade, voz de expressão na sociedade que
caminhava cega e surda para o fim do mundo. Em abril de 1982, o primeiro disco
organizado pelo movimento punk foi Grito Suburbano, que continha canções de
três bandas punks, Olho Seco, Inocentes e Cólera. Como a abertura no comércio
fonográfico era totalmente fechada a essas bandas, começou um circulo de
gravadoras e uma mobilização entre as bandas, criando-se um circuito
underground punk. Mas antes dessa compilação, a banda Restos de Nada, já
abria caminho para o punk encontrar seu destino em território nacional. Composta
por Clemente, Ariel, Carlos Charles e Douglas, os Restos de Nada iniciava suas
atividades no inicio de 1978, mas iria gravar o primeiro LP só em 1987, intitulado
Restos de Nada, com o intuito de registrar as canções pioneiras do grupo da
década de 70. Neste LP encontra-se uma canção que já retratava a situação do
jovem punk em meio à sociedade vivendo em crise, sob uma óptica claramente
revoltada:
O que para muitos parecia ser só uma moda permaneceria até hoje como
um estilo de vida e uma vertente do rock fiel a seus princípios. Na mesma década
de 80, ainda surgiria uma banda que ganharia um lugar de destaque no cenário
punk brasileiro, por retratar o dia-a-dia do proletário suburbano, daqueles que são
oprimidos pelos ditos donos do poder. Os Garotos Podres, como sugere o nome,
era uma banda que se preocupava desde o início em ―ofender‖ a sociedade com
o lado sujo dos punks, em dizer o que pensava de forma direta e agressiva, e
muitas vezes debochada também. Iniciaram suas atividades no ano de 1982, no
ABC paulista e fizeram parte das famosas compilações punks, e no ano de 1985
gravaram o primeiro LP Mais podres do que nunca, alcançando a incrível
vendagem de 50 mil cópias. Para uma banda punk alcançar esses números era
um grande fato inédito, e isso acabou ocasionando alguns fatores que não eram
comuns à época, como essas músicas tocarem em rádios FM. Esse fato rendeu
shows à banda no Brasil inteiro, e ajudou na aceitação de outras bandas
undergrounds. Em 1988, eles lançaram o LP Pior que antes, álbum que trouxe
várias músicas chamativas para a mídia e alguns artistas de diferentes estilos.
Entre as canções presentes neste disco, uma chama mais atenção para
compor esta pesquisa, a chamada ―Subúrbio operário‖, que aborda questões da
realidade paulistana da época. Uma curiosidade do punk, é que o estilo não tem
afinidade nenhuma com outro movimento, as músicas de protesto de outros
estilos não encontram parceria com as dos punks. Exatamente por isso, o
movimento ganha uma singularidade significativa perante os outros artistas, a
MPB considerada música de burguês feita para os pobres, romantizam a pobreza
e a miséria, tornando uma fonte de lucro. ―Os punks querem temas regionais, de
realidade nua e crua, querem deixar o papo ―piegas‖ de lado e serem mais direto
no sistema, e tudo isso é dito com sinceridade, naturalmente, sem qualquer pose
ou afetação.‖ (Bivar, p.102) E na canção dos Garotos Podres é possível sentir a
revolta e a consciência de que nada estava do jeito que era para ser:
Sem deixar dúvidas, a música destaca a violência com que foram tratados
os operários, e ainda aponta os interesses das classes mais favorecidas com as
leis impostas pelo governo. Mas deixa claro que, mesmo com todas as
repressões, haverá de alguém sempre buscar por justiça e direitos que sejam
essencialmente a favor dos excluídos sociais: os punks, que estariam sempre a
incomodar os detentores do poder. Para não sermos injustos com outras regiões
do Brasil, a banda Plebe Rude também causa impactos representativos com as
canções punks na capital Brasília. A banda chega a ser detida em um show no
estado de Minas Gerais por interpretar uma música que incomodaria o governo,
junto com o grupo Legião Urbana. Em um LP chamado O concreto já rachou
(1985), a banda interpreta uma música chamada ―Até quando esperar‖, que traz
indagações sobre os direitos sociais:
Sei
Não é nossa culpa
Nascemos já com uma bênção
Mas isso não é desculpa
Pela má distribuição
Com tanta riqueza por aí, onde é que está
Cadê sua fração
Com tanta riqueza por aí, onde é que está
Cadê sua fração
Até quando esperar
A plebe ajoelhar
Até quando esperar
A plebe ajoelhar
Esperando a ajuda do divino Deus
Plantando e colhendo
Morrendo são esquecidos
Ilustres nunca foram detidos
Congresso gera o desequilíbrio
Nota-se na letra, que a banda coloca a culpa de todo ―desequilíbrio‖ social
no congresso, ou seja, nos políticos, nos gestores das leis. Quando ele canta
―torturas já foram aplicadas‖, relembra o período da ditadura, menciona os atos
obscuros que o governo praticava. Através da letra, é possível perceber uma
alusão a impunidade gerada pelo sistema para com aqueles que causam todo
esse desarranjo e privilegiam de uma posição social mais alta, ―ilustres nunca
foram detidos‖. O punk quer saber o porquê às leis não se aplicam de uma forma
igualitária. Então, é fato que a música punk só existe por ser um meio de
expressão para os excluídos, ao contrário não existiria. O foco é totalmente
voltado para as criticas ao capitalismo e Cezar Augusto Melão nos diz:
O movimento punk, que teve origem na década de 70 e teve uma ascensão maior
na década de 80 no Brasil, se tornou um assunto muitas vezes alvo de
observações estereotipadas por parte dos meios de comunicações. Depois
dessas pesquisas, com a ajuda de historiadores que vivenciaram a época,
pudemos traçar um perfil do movimento relacionado com a situação política
brasileira, é claro que antes, no período ditatorial, tínhamos manifestações
culturais voltadas contra o sistema. Mas o punk criou de forma mais direta, a
linguagem rebelde, deixou claro que estavam ali pra incomodar o sistema e
agredirem de forma visual, sonora e ideológica.
COELHO, Teixeira. O que é ação cultural. São Paulo: Ed. Brasiliense, 2001.
DAPIEVE, Arthur. BRock: o rock brasileiro dos anos 80. São Paulo: Ed Editora
34, 1995.
NADA, Restos de. Restos de nada: Gravadora Devil Discos. São Paulo 1987. 1
Long Play (LP). Faixa 1
INOCENTES, Os. Inocentes: Gravadora Warner. São Paulo 1989. 1 Long Play
(LP). Faixa 10.
PODRES, Garotos. Pior que antes: Gravadora Continental. São Paulo 1988. 1
Long Play (LP). Faixa 5.
PODRES, Garotos. Canções para ninar: Gravadora Radical Records. São Paulo
1993. 1 Disc Compact (CD). Faixa 9.
RUDE, Plebe. O concreto já rachou: Gravadora EMI. São Paulo 1985. 1 Long
Play (LP). Faixa 1
CÓLERA. Tente mudar o amanhã: Gravadora Ataque Frontal. São Paulo 1984. 1
Long Play (LP). Faixa 5, lado B.