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€ j@ncias & Cognigao 2021; Vol 26(2) 360-369 © Ciéncias & Cognicao ISSN 1806-5821 E52 submetido em 13/02/20 | Aceito em: 13/06/21 | Publicado online em 31/12/21 Revisao da literatura sobre Transtorno Opositivo Desafiador e Transtorno de Conduta: causas/prote¢ao, estratégia escolar e relagdo com a criminalidade Literature review about Oppositional Defiant Disorder and Conduct Disorder: causes / protection, teaching school and relationship with crime Dhaniella Cristhina de Brito Oliveira, Danielle Rodrigues Monteiro da Costa” Programa de Pés-Graduaco em Ensino de Ciéncias e Matematica, Universidade Federal do Sul e Sudeste do Para, Maraba, Pard, Brasil Resumo De acordo com variados estudos cientificos, nas idades escolares os estudantes podem apresentar diferentes distirbios comportamentals. Assim, este artigo ‘tem como objetivo apresentar uma revisio da literatura sobre o Transtorno Opositivo Desafiador (TOD) e o Transtorno de Conduta (TC) de modo a favorecer 0 diagnéstico e intervengées escolares. Para isso, realizou-se busca por descritores no Portal da Capes e no Google Académico em que foram selecionados trabalhos mais recentes escritos em portugués e inglés que continham no titulo dos manuscritos os termos da busca e os contetidos destes foram divididos em categorias, tais como, fatores de causa/protecd estratégias de trabalho com alunos acometidos de TOD e TC e a relacdo que os distirbios podem apresentar com o cometimento de atos infracionais. Verificou-se que os autores abordam que ambos os distirbios podem desenvolver-se pela influéncia do ambiente social das criancas e adolescentes, € que 0 professor pode exercer influéncia sobre 0 comportamento e rendimento escolar destes estudantes. O presente estudo contribui, portanto para a compreensao dos disturbios a partir da exposi¢aio do debate de diversos autores 0 que pode auxiliar professores, alunos e pais no trabalho com pessoas acometidas de TOD e TC. Palavras-chave: transtorno de conduta; transtorno opositivo desafiador; revisdo. Abstract According to several scientific studies, at school age, students may have different behavioral disorders. Thus, this article aims to present a literature review on Oppositional Defiant Disorder (ODD) and Conduct Disorder (CT) to favour diagnosis and school interventions. A search for descriptors in Capes “DR. M. da Cost: -mail: danymont@uepa.br br — ORCID http://orcid.org/0000-0002-8593-371X; D.C.0. ~ORCID http://oreid.org/0000-0002-8051-3584 360 Cigncias & Cognicao 2021; Vol 26(2) 360-369, © Ciéncias & Cognicao ISSN 1806-5821 E52 submetido em 13/02/20 | Aceito em: 13/06/21 | Publicado online em 31/12/21 Portal and Google Scholar was carried out, in which more recent works written in Portuguese and English that contained the search terms in the title of the manuscripts and their contents were divided into categories, such as causative/protective factors; work strategies with students suffering from ODD and CT, and the relationship that the disorders can present with infractions. We found that the authors state that both disorders can develop under the influence of the children’s and adolescents' social environment and that the teacher can Influence their behavior and academic performance. Therefore, the present study contributes to the understanding of disorders from the discussion of several authors’ debates, which can help teachers, students, and parents work with people with ODD and CT. Keywords: conduct disorder; oppositional defiant disorder; revision. Introducao Varios so 0s fatores que impedem que o trabalho pedagégico em sala de aula ocorra de maneira mais proveitosa. Entre esses fatores estd 0 mau comportamento estudantil que toma do professor tempo de aula, atencdo dos demais alunos de classe, entre outras consequéncias. Quando este comportamento dos estudantes se torna preocupante? Considerando a faixa etaria dos alunos entre os anos iniciais e finais de escolarizacao, tém-se idades em que podem ser apresentados diferentes distUrbios comportamentais, dentre os quais 0s de conduta, Os distirbios de conduta sdo um conjunto de problemas e comportamentos repetidos agressivos, violentos, antissociais, ou desafiadores, capazes de violar regras, deveres e normas sociais. Nesta categoria esto o Transtorno Opositivo Desafiador (TOD) e o Transtorno de Conduta (TC). © TOD caracteriza-se por um padrdo de comportamentos hostis, desafiadores e desobedientes, iniciados normalmente entre seis e oito anos, raramente apés o inicio da adolescéncia. Assim, as pessoas acometidas deste transtorno nao se sujeitam a regras, por no se conformarem com as exigéncias de outros, e tendem a enfrentar e questionar os, adultos ou figuras de autoridade que tentam colocar regras e estabelecer limites para com eles. Quantitativamente, o transtorno atinge uma média de 6% das criangas e adolescentes, ¢ é similar em ambos os géneros, porém, apresenta-se com maior persisténcia em criancas do género masculino e suas caracteristicas variam de acordo coma idade da crianca ea gravidade do transtorno (Bernardo, Silva & Santos, 2017; Silva, 2017; Araujo & Araujo, 2017; Vilhena & Paula, 2017). Quando nao tratado 0 TOD pode evoluir para 0 TC, que, caracterizado como um transtorno mais grave, apresenta padrdes persistentes de conduta dissocial, agressiva ou desafiante. Criangas e adolescentes com TC expressam comportamentos vingativos, rancorosos, explosives, com perda répida de temperamento, reagindo de maneira agressiva as pessoas e animais, destruindo propriedade e apresentando um padrao de roubo ou de falsidade (American Psychiatric Association, 2014), Ambos os transtornos se desenvolvem em individuos com idade inferior a 18 anos, momento que corresponde as idades escolares em que criangas e adolescentes brasileiros esto cursando o ensino basico (fundamental e médio), passando em média quatro horas didrias no ambiente escolar. 361 Cigncias & Cognicao 2021; Vol 26(2) 360-369, © Ciéncias & Cognicao ISSN 1806-5821 E52 submetido em 13/02/20 | Aceito em: 13/06/21 | Publicado online em 31/12/21 A presente revisio tem por objetivo apresentar uma reviséo da literatura sobre o Transtorno Opositivo Desafiador (TOD) e 0 Transtorno de Conduta (TC) de modo a favorecer 0 diagnéstico e intervengdes escolares. 1. Fundamentacao Ambos 0s transtornos esto descritos no Manual Diagnéstico e Estatistico de Transtornos Mentais (American Psychiatric Association, 2014). Documento mundial que aborda critérios para o diagnéstico do transtorno a partir da verificagao da existéncia de um padrdo de comportamento em individuos com idade inferior a 18 anos. Para que o diagnéstico seja positivo, o individuo deve nos ultimos 12 meses apresentar pelo menos quatro ou mais comportamentos dos 15 critérios diagnésticos presentes no manual, associado de no minimo um comportamento antisocial (furtos, brigas com uso de armas etc.) nos Ultimos seis meses. De acordo com Ezpeleta, Navarro, Osa, Penelo e Domenech (2019), no periodo da pré- escola a probabilidade de aparicdo de disturbios de conduta é alta, apresentando diminuic30 no inicio da infancia (6 e 7 anos) e outro aumento na aproximagao da puberdade (8 e 9). Vale destacar que este é 0 periodo em que a crianca esta adquirindo habilidades importantes de autorregulacao e fungo executiva, aprendendo a lidar com as suas frustracdes pessoais e emocGes provenientes da vida em sociedade. Na convivéncia social, Dias (2012) informa que pessoas com distirbios de conduta podem ter suas relagées comprometidas pela impulsividade, alteraco na regulacdo do afeto, e prejuizos nas fungdes executivas e na atencao dos seus portadores, além de apresentarem riscos de desenvolver outros problemas, incluindo transtornos de ansiedade e depressao No ambiente escolar, Rodrigues, Sousa e Carmo (2010) relatam, em um estudo de caso, que no ensino fundamental o aluno tende a desafiar professores e demais funciondrios que tentam Ihe impor limites, persistem na violacdo de normas sociais, rotineiramente brigam com os colegas, nao realizam tarefas extraclasse, culpam aos outros por seu comportamento hostil e apresentam baixo rendimento escolar trazendo limitacdes académicas € sociais as criangas ou aos adolescentes. Quanto 20 baixo rendimento escolar que estes alunos podem apresentar, diferentes autores abordam que esses transtornos psiquidtricos nao apresentam ligacdo direta com dificuldade de aprendizagem. No entanto, o transtorno pode potencializar prejuizos na atencdo dos seus portadores no processamento de linguagem € na aquisicao de novas informagées, o que pode causar repeténcia e evasao escolar. Além disso, o transtorno pode incidir no trabalho do professor com os demais alunos individual e coletivamente, uma vez que pode promover agressdes verbais e fisicas aluno-aluno e aluno-professor, sendo necessério o desenvolvimento escolar de estratégias de apoio a estes estudantes, tais como intervengées que reforcem a pro- atividade e 0 comportamento pré-social de maneira a reduzir comportamentos disruptivos (Vilhena & Paula, 2017; Tyler, White, Thompson & Blair, 2019). Nas escolas, no entanto, Silva (2017) ressalta que nao hd suporte adequado para identificar ou mesmo desenvolver estratégias para o trabalho com alunos que sofrem dos transtornos ja citados. Isto tem contribuido para que, cada vez mais, sejam acentuadas rotulagdes indevidas aos alunos que possuem transtornos definindo-os como hiperativos, sem limites etc., além de favorecer momentos de agressio aluno-professor e aluno-aluno. Atitudes estas que comprometem a missio educativa das instituicdes escolares. 362 ISSN 1806-5821 Submetido em 13/02/20 | Aceito em: 13/06/21 | Publicado online em 31/12/21 € Cigncias & Cognicao 2021; Vol 26(2) 360-369, © Ciéncias & Cognicao 2, Método 2.1. Indexadores © material para revisio foi selecionado a partir de consultas feitas ao Portal de periddico CAPES e no Google Académico, realizadas durante os meses de abril e maio de 2019 em que foram utilizados os seguintes descritores para a pesquisa: transtorno de conduta na escola; transtorno opositivo desafiador na escola, acrescidos de suas traducdes nao literais, para a lingua inglesa. 2.2. Critétios de inclusao e exclusio 05 critérios de incluso foram: conter os descritores da busca no titulo do trabalho; trabalhos escritos em lingua inglesa publicados no primeiro trimestre de 2019; trabalhos em lingua portuguesa de estudantes de pds-graduacao ou publicados em revistas cientificas; trabalhos com publico cumpridor de medida socioeducativa; trabalhos praticos em escolas e disponibilidade da publicac3o em formato integral. Por sua vez, foram considerados para critério de exclusdo trabalhos de revisdo sistematica e/ou estudos teéricos, Para a amostragem final, foram considerados relevantes trabalhos que ao debaterem 05 transtornos de comportamento mencionavam o ambiente escolar e socioeducativo. Os estudos selecionados para a amostragem final foram lidos na integra e suas informacées organizadas em categorias como: causas/protecdo, estratégias de trabalho com alunos acometidos de distirbios de conduta e relaco com atos infracionais. 3. Desenvolvimento Na busca de trabalhos cientificos que tratassem do tema, observou-se que os distarbios de conduta, quando comparados a demais transtornos so pouco pesquisados. Referente aos transtornos discutidos neste trabalho observou-se na busca nos portais, que ha um maior numero de estudos sobre o Transtorno de Conduta do que referente ao Transtorno Opositivo Desafiador. A amostragem final foi composta por 16 estudos, os quais apresentam seus contetidos divididos em diferentes categorias, que passam a ser expostas abaixo. 3.1. Causas/protecao Todos os trabalhos revisados neste artigo abordavam que nao ha esclarecimento quanto etiologia desses transtornos comportamentais. Descrevem, no entanto, que observagées referentes a idade de apresentacao dos transtornos fazem com que diferentes, autores atribuam suas causas a fatores ambientais, sugerindo que, a familia como primeiro niicleo de aprendizagem de comportamento das pessoas seria responsavel pela modelagem de comportamentos e que devido as fortes influéncias das atitudes dos genitores, as criangas, poderiam interiorizar as experiéncias vivenciadas e formar sua personalidade (Dias, Oliveira- Monteiro & Aanar-Farias, 2014; Adams, 2010). Sob esta mesma visio, Teixeira (2014) esclarece que alguns fatores familiares influenciam, incluindo: 363 Cigncias & Cognicao 2021; Vol 26(2) 360-369, © Ciéncias & Cognicao ISSN 1806-5821 E52 submetido em 13/02/20 | Aceito em: 13/06/21 | Publicado online em 31/12/21 Complicagées pré e perinatais (...], psicopatologia e comportamento criminoso na familia...) desenvolvimento materno e paterno deficiente [...], supervisio deficiente[...], perturbacdes das qualidades das relacdes familiares |... discérdia conjugal [...], tamanho da familia [...] € desvantagem socioeconémica (Teixeira, 2014, p. 50). Kivumbi et al. (2019) e Saunders et al. (2019) sugerem que a pobreza extrema, a violéncia, a presenga de doencas sexualmente transmissiveis (presentes nos genitores) e a mortalidade parental podem ser fatores associados aos transtornos de conduta, estando relacionados a natureza ambiental, biolégica, ou a um conjunto amplo de fatores que interagem entre si, desencadeando o desenvolvimento de transtornos comportamentais. Assim, denota-se influéncia da relaco afetiva com os pais, a maneira de punico empregada a estes, falta de carinho parental, sentimento de inseguranca, hostilidade, agressividade em relacdes sociais e familiares, humilhacBes, abuso fisico e psicolégico, e exposi¢ao a desenhos de violéncia e jogos como estimulos 20 comportamento agressive, podendo provocar alteracdes nos tracos calosos dos portadores de transtornos. Referente a isto, Tyler et al. (2019) afirmam que no cérebro de um jovem com problema de conduta, verifica-se diminuigdo da atividade na via amigdala-insula, levando a elevada frieza emocional e pouco remorso ou culpa pela angistia gerada a outros individuos 0 que pode reforgar suas atitudes antissociais pela diminuicao da reatividade autondmica ao medo e tristeza (Souroulla, Panteli, Robinson & Panayiotou, 2019) As atitudes demonstradas por pessoas com distiirbio — caracterizadas por Severa et al. (2019) como falta de remorso ou culpa, insensibilidade, falta de empatia, falta de preocupacdo com o desempenho e afeto superficial ou deficiente — faz com que, segundo Silva (2017), as pessoas com 0 transtorno sejam muito prejudicadas por rejeicBes que séo geradas em torno deles. Isso gera nos portadores grande sofrimento por sua ndo aceitagzio uma vez que estes no se consideram raivosos, opositores ou desafiantes, ndo compreendendo suas atitudes como antissociais. Quanto a forma de tratamento, ambos os transtornos, até 0 encerramento desta pesquisa, ndo apresentavam cura, podendo apenas ser seus sintomas amenizados pelo uso de neurolépticos e com psicoterapias que vao de treinamento de solugées de problemas, desenvolvimento de habilidades sociais e orientagao de pais e professores. Os programas de tratamento para aspectos cognitivos e familiares associados aos distirbios, segundo Dias (2012) devem ser realizados enquanto o portador ainda é crianca,, uma vez que, com o passar dos anos, hé diminuico nas habilidades adaptativas do sujeito. Essa diminuicao ocorre devido a didtese-estresse que, de acordo com estudos de Tyler et al. (2019), faz com que quanto maior for a exposi¢ao de um individuo a situacdes de estresse, mais elevado serdo seus tracos calosos-ndo-emocionais, fazendo com que estes sejamm menos sensiveis a causar prejuizos fisicos, materiais ou mentais a outras pessoas, reagindo de forma excessiva a estressores moderados pelo resto de sua vida. Felizmente, vulnerabilidade genética ndo significa imutabilidade, podendo ser tomadas medidas preventivas e estratégias de tratamento que se baseiam em contrapor influéncias ‘negativas' por ‘positivas mais fortes’ através de diferentes aces conjuntas com a familia, a comunidade, a escola e com o préprio menor (Rodrigues, 2009; Osa, Penelo, Navarro, Trepat & Ezpeleta, 2019). 3.2, Estratégias de trabalho com alunos acometidos de disttirbios A divulgacao nas escolas e em momentos de formacdo continuada para professores e gestores sobre 0s possiveis transtornos que podem ser gerados nas idades escolares, de 364 Cigncias & Cognicao 2021; Vol 26(2) 360-369, © Ciéncias & Cognicao ISSN 1806-5821 E52 submetido em 13/02/20 | Aceito em: 13/06/21 | Publicado online em 31/12/21 acordo com Rodrigues et al (2010) e Silva (2017) so de extrema importdncia para que a escola crie estratégias de trabalho com os alunos e para que seja superado equivocos de avaliac3o que categorizam alunos com distirbios de conduta como pessoas com dificuldade de aprendizagem. Isto impede a realizacao de intervengées necessarias ao trabalho com estas criangas e adolescentes. Referente as estratégias para o trabalho docente com os estudantes, apresentados neste trabalho, ressalta-se que no se tem uma receita infalivel de como lidar com alunos acometidos de distirbios de comportamento; a primeira tética seria buscar ajuda de um profissional qualificado, como a exemplo psicdlogos e psicopedagogos. Esses profissionais, conhecendo 0 caso, podem tracar planos de trabalho juntamente com o professor para um atendimento personalizado do aluno que sofre desse e de outros distirbios. Trabalhos como © de Aratijo e Araijo (2017) demonstram grandes beneficios deste método, pois como citado anteriormente, o transtorno é dimensional em sua gravidade, e o atendimento personalizado permite um trabalho mais centrado no comportamento antisocial apresentado pelo estudante. Em continuidade, Rodrigues et al (2010) entendem ser de extrema importéncia estabelecer rede de relacdes escola-familia-profissionais especializados. Essas redes sdo cooperativas; assim, a escola responsabiliza-se pelos ensinamentos necessarios que the cabe, como: realizagao de intervencées cognitivas, treinamento em habilidades sociais, orientacdo vocacional e reforgo escolar, além de permitir a intervengio de profissionais especializados na melhoria das didaticas de ensino do aluno com transtorno. Evita-se, assim: praticas educativas coercitivas, abuso fisico e psicoldgico; negligéncia, disciplina relaxada, puni¢o inconsistente e monitoria negativa. A familia fica incumbida do papel de fortalecimento de boas relagdes familiares. Nesta estratégia, no entanto, segundo Bernardo et al (2017), ¢ necessario que cada um compreenda e faca o seu papel, uma vez que esforcos unilaterais sobrecarregam e podem ndo surtir os efeitos esperados. Diferentes autores entendem que no ambiente escolar, a relacdo professor-aluno ndo deve ser marcada por rotulagées. € importante que o docente conhega 0 aluno e a familia dele e procure sempre apresentar uma postura pedagégica adequada, uma vez que as criancas e adolescentes tendem a imitar modelos que, para eles, so significativos. Quanto as atividades pedagégicas, Carmo (2010) comenta que o professor pode elaborar: provas com poucas questées, sendo estas claras e diretas; provas orais; direcionar menor quantidade de ligdes para serem feitas em domicilio; exercitar o contetido mediante repeticdes de exercicio: permitir o uso de gravador, tabela periddica e calculadora para determinados momentos da aula, incentivar 0 uso de estratégias de memorizagdo e recuperacdo de informacées, entre outros Fora isto, em sala de aula é importante que o professor dialogue com o aluno com 0 transtorno, perguntando a ele, por exemplo: sobre sua relaco com a familia, quais tarefas desenvolvem em casa, 0 que gosta de estudar/fazer na escola, porque nao gosta de fazer outras atividades e assim por diante, de forma a identificar qual estratégia pedagdgica sera mais bem recepcionada por esse aluno e, também, as formas de aproximaco entre aluno e professor mais vidveis, promovendo a autoestima dos estudantes e estimulando a confianca © a satisfago no convivio em sala de aula. A relacdo harmoniosa professor-aluno é fundamental para que criangas com transtornos percam a concep¢do de que adultos apenas agem de forma severa e punitiva e disponham-se a estabelecer conversas honestas e objetivas sobre seu comportamento, sem partirem para agressées (Silva, 2017; Araijo & Aratijo, 2017) 365 Cigncias & Cognicao 2021; Vol 26(2) 360-369, © Ciéncias & Cognicao ISSN 1806-5821 E52 submetido em 13/02/20 | Aceito em: 13/06/21 | Publicado online em 31/12/21 Além da relacao aluno-professor, o convivio com os demais estudantes da classe deve ser o mais sadio possivel. Araijo e Araijo (2017) em seu trabalho com estudantes acometidos de transtornos recorre a explicagio da doenca aos demais alunos da sala de aula de maneira a demonstrar a importdncia da melhoria de suas relacées, oportunizando, a partir do conhecimento do transtorno, um melhor relacionamento intraclasse. No entanto, esta forma de abordagem pode também causar a prética de bullying com o estudante acometido de transtorno, criando assim maiores empecilhos ao tratamento do aluno. Os autores citam, ainda, que a turma e o aluno com transtorno podem discutir propostas metodoldgicas para auxiliar os professores no aperfeigoamento e/ou criagéo das didéticas de ensino, demonstrando ao estudante com TC ou TOD que as tarefas e regras da escola ndo Ihe estdo sendo impostas, mas também escolhidas por ele, dando-Ihe a sensacao de esté realizando as tarefas por vontade prépria. Aods o estabelecimento das regras de convivio em turma, & importante dialogar continuamente com os estudantes abordando o que foi estabelecido de forma cooperativa, elogiando ou relembrando aos alunos as atitudes que foram acordadas. Os elogios podem agir como recompensas pelo cumprimento das medidas de convivéncia estabelecidas. Isto ajuda, ainda, a reincorporar outra estratégia, a motivacdo, pois a capacidade de empatia entre professor-aluno e aluno-aluno pode fazer com que sejam sustentados relacionamentos de alta qualidade, diminuindo conflitos e melhorando o desempenho académico dos estudantes (Tyler et al. 2019). Um método no qual autores apresentam divergéncia de pensamento refere-se a0 trabalho em grupo e ao uso de jogos didaticos em sala de aula. Enquanto, a exemplo, Araijo @ Arailjo (2017) sugerem que esta metodologia de ensino nao é apropriada devido os alunos, com transtorno no se sentirem & vontade pelas regras do jogo e também no trabalho em grupo, Rodrigues et al (2010) aconselham os professores a levarem para sala de aula jogos educativos que estimulem os alunos a se comportarem melhor. Sendo assim, cabe a verificagao do comportamento do aluno ou, como Rodrigues et al 2010 nomeiam o “remapear do comportamento”, comparando resultados de suas observagdes com o de outros profissionais da educacao, analisando o comportamento dos alunos perante 0 jogo € a0 trabalhar em grupo. Isto permite verificar 0 que incomoda o aluno nesses dois momentos, as atitudes que ele apresenta quando nao se sente a vontade, e quais recompensas recebem por esse comportamento. Assim, 0 professor pode tracar maneiras de direcionar a atividade de forma que 0 estudante com transtorno possa realizé-la. Caso os resultados néo sejam Positivos, nao surtindo os efeitos desejaveis, o professor pode direcionar 0 aluno para o trabalho em dupla com uma crianca mais tranquila, que sirva de modelo. Ao invés do uso de jogos o professor, pode realizar oficinas de desenvolvimento de brinquedos, maquetes, desenhos, entre outras tarefas acordadas. Além disso, pode apresentar filmes ndo agressivos, que sinalizam maneiras adequadas de resolver conflitos, de forma a propiciar 0 contato com atitudes que possam ser interiorizadas pelo aluno e que ele possa querer imitar. 3.3. Relaco com atos infracionais ‘Ao longo dos anos, diferentes pesquisas vém sendo realizadas em diversos paises para identificar a relacdo que os transtornos comportamentais podem ter com 0 cometimento de atos infracionais. Em antecipacdo, Pacheco e Hutz (2009) j4 apontavam que atitudes antissociais ocorridas na infancia poderiam ser protétipos do que pode acontecer no futuro. Estudos mais recentes sugerem que, se no houver tratamento adequado, por dimensdes supostamente performativas do TOD, pode-se supor que a crianca com o transtorno sera um 366 Cigncias & Cognicao 2021; Vol 26(2) 360-369, © Ciéncias & Cognicao ISSN 1806-5821 E52 submetido em 13/02/20 | Aceito em: 13/06/21 | Publicado online em 31/12/21 adulto em conflito com a ei. Isso nao significa que todas as pessoas com disturbios de conduta se tornardo delinquentes, mas as condigdes ambientais destes ea falta de tratamento podem desencadear atitudes antissociais consideradas graves. Em relagao a pesquisas desenvolvidas nesta drea, Perez (2017), em seu estudo sobre a prevaléncia de transtornos psiquidtricos em jovens infratores, afirma que o Transtorno de Conduta tende ao envolvimento em atividades perigosas e até mesmo ilegais. J4 Andrade, ‘Assumpcio Jr., Teixeira & Fonseca (2011) demonstram que, entre meninos e meninas sob condigées de medida socioeducativas no Rio de Janeiro: um quantitativo de 77% tinha TC e 50% tinham TOD; havia uma maior prevaléncia de transtornos psiquidtricos na populacdo feminina de infratores adolescentes, quando comparada com a masculina. Em relagdo a0 ambiente familiar dos adolescentes infratores: 70% tinham sido expostos a alguma droga ainda na vida intrauterina; 82% deles tinham caso de alcoolismo na familia; 48% casos de drogas ilicitas; aqueles que eram filhos de maes alcodlatras fizeram uso mais cedo de alcool. Caracteristicas do ambiente familiar semelhantes foram encontradas ao pesquisar fatores familiares que podem influenciar o aparecimento do TOD e do TC. Este Ultimo dado apresentado é de suma importdncia, uma vez que 0 comportamento infrator pode ser determinado por dimensées sociais, culturais, individuais e familiares, demonstrando que o ambiente de interacio da crianga pode ter graves influéncias no seu desenvolvimento comportamental, evidenciando, ainda, que muitas atitudes delinquentes podem estar ligadas a problemas de conduta por uma relacdo histérica entre transtorno mental e delinquéncia a partir, entre outras coisas, das experiéncias infantis de negligéncia e precariedade em termos de cuidados afetivos (Dias et al, 2014; Pacheco & Hutz, 2009; Perez, 2017). Sabendo da associacao da delinquéncia e criminalidade com os problemas de conduta, Vilhena e Paula (2017) ressaltam que detectar os transtornos disruptivos na primeira infancia 6 de suma importéncia para prevenir que seus possuidores desenvolvam, quando adulto, Transtorno de Personalidade Antisocial e casos irreversiveis de esquizofrenia e psicoses. No entanto, embora varias pesquisas abordem esta relacdo, ainda é timida em varios paises, inclusive no Brasil, a elaboragdo de programas de tratamento e/ou intervencdes adequadas para evitar que este problema se expanda. 4. Consideragées finais Observa-se mediante as literaturas apresentadas que os disttirbios de conduta afetam go somente seus portadores, mas também uma gama de pessoas que, direta ou indiretamente, esto associadas a estes individuos. O que é preocupante é que estes transtornos quando no tratados apresentam possibilidade de evoluir a quadros bem assustadores de comportamento delinquente, entre os quais para Transtornos de Personalidade Antissocial, ocasionando atos criminosos graves. Frente a isto, todas as literaturas concordam que os disttirbios de conduta devem ser considerados como problema de satide publica e ressaltam a necessidade da elaboraco de politicas de salide publica para a identificacao e acompanhamento de pessoas com distlirbios de maneira a resguardar a integridade destas pessoas, daqueles que direto ou indiretamente convivem com estes € daquelas que eles podem vir a gerar. Isto porque os transtornos comportamentais podem desencadear um ciclo de atividades antissociais, prejudicando a sociedade como um todo pelo 367 Ciéncias & Cognigao 2021; Vol 26(2) 360-369 © Ciéncias & Cognicao ISSN 1806-5821 E52 submetido em 13/02/20 | Aceito em: 13/06/21 | Publicado online em 31/12/21 aumento da violéncia e ainda pelos custos social/econémico gerados pela delinquéncia e pela criminalidade. Desta forma, chamamos a atengéo para a elaboragao de politicas piblicas de prevencio e tratamento ptiblico e de qualidade para pessoas com transtornos comportamentais e seus familiares, como forma de desenvolvimento da seguranca social uma vez que, somente com essas medidas seré possivel prevenir o aumento das taxas de violéncia tanto nas escolas, onde os professores so os principais prejudicados, quanto na comunidade. Referéncias ‘Adams, A. (2010) Entre a loucura e o desvio: adolescentes em conflito com a lei acometidos de transtorno psicético e de conduta no cumprimento de medida socioeducativa de internacao. Dissertagdo (Mestrado em ciéncias criminais) - Faculdade de Direito, PUC- RS, Porto Alegre, RS. Andrade, R. C.; Assumpcdo junior, F.; Teixeira, |. A. & Fonseca, V. A. S. (2011) Prevaléncia de transtornos psiquidtricos em jovens infratores na cidade do Rio de Janeiro (RJ, Brasil): estudo de género e relacdo com a gravidade do delito. 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