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Apresentacao - Consumos midiaticos, consumidores em debate sumario Clotilde Perez e Eneus Trindade ‘© que pessoas comuns fazem & comunicagao de marca? Uma andlise de ‘campanhas publicitdrias francesas Lorreine Beatrice Petters Soft Power e a construco simbélica da realidade: a influéncia da midia no comportamento da sociedade ~ 0 caso da reforma da previdéncia no Brasil Aryovaldo de Castro Azevedo Junior Em nome do direito de ser crianca: 0 papel vanguardista do marco legal da primeira infancia no combate a pressao consut comunica¢ao mercadolégica Paulo Nassar e Ana Claudia Pompeu Torezan Andreucci Religi@o 2.0: interagées processuais e sist@micas no blog do bispo Edir Macedo Carlos Sanchotene A performance do comediante Whindersson Nunes: a imagem piiblica ‘consumida como celebridade ordinaria Fabiola Carolina de Souza, Fernanda de Faria Medeiros Paulo Henrique Basilio Santana Basta e Basta: do ethos dos produtores a projecio dos sujeitos consumidores de editoriais em dois momentos distintos da politica brasileira (1964 e 2016) Tania Hoff e Guy Pinto de Almeida Junior racismo brasileiro ou... quando 0 protagonista nao é branco: a narrativa publicitaria em “Nesse dia dos pais, dé O Boticario’ Pablo Moreno Fernandes Viana e Dalila Maria Musa Belmiro A apropriacao do social pela publicidade: Sko! Reposter e suas ideologias de consumo Ana Paula Bragaglia Diversidade, género e consumo: estudos contemporaneos Witton Garcia O panorama dos estudos de recepcao e consumo midiatico no Brasil: contribuicées do estado da arte em Meios e Audiéncias III Guilherme Libarai http //dx.dol.org/10.1606/issn 1984-5057 VIIp1-2 CONSUMOS MIDIATICOS, CONSUMIDORES EM DEBATE O volume 11, mimero 1, da Signos do Consumo taz como eixo articulador entre os artigos aprovados a discusséo dos consumos midiéticos e @ concepgao de consumidores aportadas por contextos comunicacionais. Esse conjunto de textos registra 0 fendmeno contemporadneo que permite compreender a comunicagao a partir de seus consumos como marcas, produtos e servigos midiaticos ou nao, mas trazendo no comum/comunicacional a perspectiva que encerra em sitoda a finalidade da comunicacgo, a transformacao dos sujeitos ou sua cooptagao nos processos de apropriagao, recepgao € consumos. O primeiro artigo, intitulado “O que pessoas comuns fazem a comunicagao de marea? Uma anélise de campanhas publicitérias francesas”, de Lorreine Beatrice Petters, da Universidade Sorbonne Nouvelle ~ Paris 3, traz a hipdtese de que a representacao de pessoas comuns na publicidade propicia maior identificagdo discursiva com os contetidos de tais mensagens, por parte dos consumidores, ao se verem representados na légica do imagindrio das marcas. A autora, para esse propésito, analisou 140 mensagens francesas a luz das teorias discursivas. O texto seguinte, “Soft Power e a construgao simbolica da realidade: a influencia da midia no comportamento da sociedade - 0 caso da reforma da previdencia no Brasil”, de Aryovaldo de Castro Azevedo Junior, da Universidade Federal do Parana (UFPR), discute o tipo de influéncia e jogos de poder entre atores/agentes mididticos na formagao da opiniao publica sobre as campanhas governamentais a favor da Reforma da Previdencia Social no contexto brasileiro. “Em nome do direito de ser crianga: 0 papel vanguardista do marco legel da primeira infancia no combate a pressdo consumista e a comunicagdo mercadol6gica” € 0 artigo de Paulo Nassar, da Universidade de Sao Paulo (USP), e Ana Claudia Pompeu Torezan Andreucci, da Universidade Presbiteriana Mackenzie. 0 texto aborda, oportunamente, a importancia do marco legal da Lei n° 13.257/2016, que preserva a primeira infancia da mira das estratégias capitelistas da comunicagio mercadolégica, trazendo a cena dos artigos em discussio 0 direito a preservagéo do consumidor infantil no periodo de zero a seis anos de idade, Ja discussdo do consumo midiatico digital no universo religioso se faz representar no artigo “Religi@o 2.0: interacdes processuais e sistémicas no blog do bispo Edir Macedo”, de Carlos Sanchotene, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). 0 texto aponta para as logicas comunicacionais dos usos e consumos midiaticos de figis a Igreja Universal do Reino de Deus, comandada pelo bispo Edir Macedo, em seu blog, discutindo a midiatizacao da fé na mediacao tecnolégica. O quinto artigo, “A performance do comediante Whindersson Nunes: a imagem publica consumida como celebridade ordinaria”, de Fabiola Carolina de Souza e Fernanda Faria Medeiros, ambas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e Paulo Henrique Basilio Santana, da Pontificia Universidade Catélica de Minas Gerais (PUC-Minas), aborda as implicagées do youtuber estudado na perspectiva dos conceitas de celebridade ordinaria e performance, apontando para légicas do seu sucesso no consumo midiatico no Brasil A discussao sobre o ethos do leitor de editoriais de jornais como consumidor de contetidos politicos via imprensa escrita esta disponivel apresentacao 2019jan fun, EDI-2 1 (Cuome Perez e Eneus TRADADE 2 SIGNS DO CONSUMO no texto, intitulado “Basta e Basta: do ethos dos produtores & projegao dos sujeitos consumidores de editoriais em dois momentos distintos da politica brasileira (1964 e 2016)”, de autoria de Tania Hoff e Guy Pinto de Almeida Junior, ambos da Escola Superior de Propaganda e Marketing de Sao Paulo (ESPM-SP). Os autores realizam uma anélise do discurso que apresenta aspectos semelhantes e especificos dos dois contextos historicos e jornalisticos selecionados para a comparagao, mostrando como a impressa busca cooptar seus leitores a partir do imaginario ideolégico que assume em seus editoriais. O texto “Racismo brasileiro ou... quando o protagonista nao é branco: a narrativa publicitaria em ‘Nesse dia dos Pais, dé O Boticério”, de Pablo Moreno Fernandes Viana e Dalila Maria Musa Belmiro, ambos da PUC- Minas, é um ensaio que pde em discusséo 0 negro representado na publicidade, especificamente a partir das repercussdes sobre a campanha do Dia dos Pais (2018) da marca O Boticério, considerando a nogo de familia autocentrada que, na reflexdo dos autores, faz emergir a légica racista estrutural, presente na sociedade brasileira. O oitavo artigo, intitulado “A apropriag&o do social pela publicidade: Skol Reposter e suas ideologias de consumo”, de Ana Paula Bragaglia, da Universidade Federal Fluminense (UEF) , aborda a responsabilidade social da marca Skol, diante da questéo da representacdo do género feminino, como uma questao emocional da marea, constitutiva a sua ideologia de consumo em construgdo para com publico. © ultimo texto desta edigdo faz uma reflexo ensaistica sobre 0 audiovisual (videoclipe) “Corpo fechado”, de Johnny Hooker, langado em 2018, para pensar o cruzamento das questdes de negociagdo de outras masculinidades diante do hegemdnico e suas possibilidades no contexto contemporaneo do consumo midistico como consumo politico, que pode favorecer a assimilagdo da diversidade de genero. Assim, “Diversidade, género e consumo: estudos contemporaneos”, de Wilton Garcia, da Universidade de Sorocaba (Uniso), encerra este niimero da Signos do Consumo trazendo a questdo do produto audiovisual e seu consumo para além da mercadoria, e como agao politica de outras negociagées na vida social sobre a diversidade de género. Por fim, apresenta-se a resenha intitulada “O panorama dos estudos de recepgao e consumo midiatico no Brasil: contribuicdes do estado da arte em Meios e Audiéncias II”, realizada por Guilherme Libardi, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que nos oferece uma leitura sobre a terceira publicagio referente as relagdes entre meios e audiéncias, a partir do trabalho coordenado pelas professoras Nilda Jacks, Elisa Pedras, Monica Pieniz e Valquiria John na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e na UFPR. Diante do conjunto de textos aqui reportados, deixamos como comentarios finais os nossos agradecimentos aos pareceristas deste nuimero, cuja contribuigao oferece qualidade aos processos editorias da Signos do Consumo, ¢ desejamos a todos uma étima leitural Clotilde Perez e Eneus Trindade Editores http //ax.do\org/10.1606 issn 1924-5057 viIps-12 O QUE PESSOAS COMUNS FAZEM A COMUNICACAO DE MARCA? UMA ANALISE DE CAMPANHAS PUBLICITARIAS FRANCESAS What do ordinary people do for brand communication? An analysis of French advertising campaigns éQué hacen las personas comunes para la comunicacién de marca? Un analisis de campafias publicitarias francesas Lorreine Beatrice Petters Univorsidade Sorbonne-Nouvolle, Pais, Franca, DDoutora cen Ciéncias da Comunicacéo e pesqussader-rrembya do Centre de Pesquisa Abordagens Pragmaticas om Ficsota ds Linguagom eda Comunicacao (APPLASCO-CIM), da Universidade Sorbonne-Nourele Roalza atualmonto un pés-doutorado na Universidade de Rouen (Franca) @sous Principals tomas de poscuisasdo a comunicacio das orgaizactes ea crclacdo do iscursos miciaticcs E-maiclorreinepotters@gmaiicom RESUMO 0 emprogo de passoas camuns na comunicacao publicitaria de marca se difere do fato de utilizar atores, celebridades ou especialistas © exig2 uma mise en scene singular. NOs levantamos a hipdtese de que.o emprego de pessoas comuns permite 30s ~anunciantes construir uma ficeao publicitaria proxima ao cotidiano dos consumidores efetivos @ potenciais, estabelacendo uma promessa de autenticidada, Para verificar tal hipétese, foram realizadas uma revisto teérica e uma andlise de contetido de um corpus composto por 145 mensagens publicitarias audiovisuats veiculadas na Franca entre 2010 e 2017. PALAVRAS-CHAVE Pessoas comuns, Comunicaco publicitaria de marca, Promessa de autenticidade ABSTRACT The employment of ordinary people in brand advertising differs from using actors, celebrities or experts, and requires a singular mise en scéne. We hypothesized that the use of ordinary people allows advertisers to construct an advertising fiction close to the daily ife of consumers and potential consumers, establishing a promise of authenticity, To verify this hypothesis, a theoretical review and a content analysis of a corpus composed of 145 audiovisual advertisings messages published in France between 2010 and 2017 were carried out KEYWORDS Ordinary people, Brand advertising, Promise of authenticity RESUMEN El empleo de personas comiunes en la comunicacién publicitaria de marca se diferoncia del hecho de utilizar actores, colabridadias o expertos, y exige una mise en scéne singular. Planteamos la hipdtesis de que el empleo de personas comunes permite a los anunciantes construir una ficcién publicitaria cerca de la vida cotidiana de los consumidores efectivos y potenciales, estableciendo una promesa de autenticidad Para verificar tal hipdtesis, se realizaron una revisién tedrica y un andlisis de contenido de un corpus compuesto por 145 mensajes publicitarios audiovisuales divulgadas en Francia entre 2010 y 2017 PALABRAS CLAVE Personas comunes, Comunicacién publicitaria de marca, Promesa de autenticidad, ‘Como citar este artis PETTERS, LB. 0 que pessoas comuns fazem a comunicacso de marca? Uma andlise de campanhas ppubletarss ancasas. Sighos do Consumo, Sao Pauiow Tn p12, jan fu, 201 do consumo artigo ‘Submetido: 50 se. 2012 ‘Aprovader 20 2 2082 2019 jan fun; NC3-12 3 Loaene Bearaice Peres 4SIGNOS DO CONSUMO. INTRODUCAO, Desde o comeco dos anos 2000, a comunicagao publicitaria assiste a uma diversificagao de formatos e de espacos ocupados pelos anunciantes, levando a uma mercantilizacao sem precedentes da esfera publica e a “uma hyper-afichagem das marcas como produtoras de contetidos midiaticos e culturais* (BERTHELOT-GUIET, 2013, p. 94, tradugao nossa). Por consequéncia, as marcas ampliam seus territérios semiéticos, ocupando espagos nao dedicados exclusivamente a mensagens comerciais ou ainda incrementando suas préticas discursivas, pois compartilham valores, retinem individuos em torno de comunidades e tomam partido em questdes sociais. As marcas sao aqui consideradas como entidades simbélicas que representam organizacbes, produtos e servigos ao mesmo tempo em que mediam representagdes do mundo social Neste artigo, nds analisaremos um fendmeno especifico: 0 emprego de pessoas comuns na comunicaggo publicitéria de marea, emprego que € expresso e declarado, o que se difere do fato de utilizar atores, celebridades ou especialistas. Mesmo que esse fendmeno nao seja novo’, Jevantamos a hipétese de que ele permite aos anunciantes construir uma fiegdo publicitéria mais préxima do cotidiano dos consumidores efetivos potenciais, estabelecendo uma promessa de autenticidade. Essa promessa nada mais € que um efeito de sentido visando fornecer condigdes para que 0s interlocutores (publico que tenha tomado conhecimento das mensagens) possam aderir e acreditar nas experiéneias e percepgdes compartilhadas por pessoas comuns em contexto publicitario: 0 “efeito de autenticidade” esta mais ligado ao fato de “se acreditar no que € verdadeiro” do que ao fato de “ser verdadeiro”. Ele surge na subjetividade da relagio do sujeito com o mundo, quando 0 sujeito cria uma adesdo com o que pode ser julgado verdadeiro, com o que € compartilhavel com outros sujeitos que se assemelham a ele e com © que se inscreve em suas normas de reconhecimento do mundo. (CHARAUDEAU, 2008, p. 37, traduc&o nossa) Baseando-se num quadro teérico composto especialmente por twabalhos em sociologia das midias e em ciéncias da linguagem, nés realizamos uma anélise de contetido de um corpus formado por 144 videos (divulgados em diferentes meios, como televisdo, internet e cinema) oriundos de 27 campanhas publicitarias figuradas por pessoas comuns e veiculadas na Franga entre 2010 e 2017*. No momento de selecionar as campanhas publicitarias que fariam parte do corpus, 1. Poresemplo, as campanhas da marca General Motors do comeco dos anos 1980 contavam, a “LJ histeria de pessoas que dirigiam os caminhoes da marca, por exemplo o padre, ‘ farmacéutico ou ainda o médico da zona rural que, gracas ao seu GM fie chegava “& heeira do leito de uma crianca desfalecide’ apenas a tempo ‘de trazéla de volta a vida” (KLEIN, 2001, p. 34) 2. Asmarcas cujas campanhas comptem o corpus sto: Always (higiene), Biocoop (alimentacko, AdistribuigSo) Blédina (alimentac&o infantil), BNP Paribas (servicos, banco),Cilit Bang Gimpeza), Crédit Agricole (servigos, baneo), Danone (slimentacSo), Dove (higiene), Fleury ‘Michon (alimentago), Kinder (alimentaco), Knorr (alimentaco), Monabang (servicos, bbanco), Nescafé (bebidas), Nutella (alimentaco), Pages Jaunes (servigos, lista telefbnica) Sarenza (moda, calcados), Signal (higiene, cosméticos), Société Générale (servicns, banco), Sosh (servigos, telefonia), SupertT —_(slimentacao, distribuicSo), Tige (puericultura), (© QUE PeSSOAS COMUNS FAZEM A COMUNICACAD DE MARCA? UMA ANALISE DE CAMEANIAS PUBLICITARIAS FRANCESAS observamos essencialmente uma caracteristica: 0 fato dos participantes serem apresentados como pessoas comuns (“de vrais gens", em francés) nos préprios videos ou ainda no “paratexto” das campanhas (websites, comunicados de imprensa etc.). £ assim manifesto 0 objetivo dos anunciantes de apresentarem os individuos participando das campanhas ‘como pessoas comuns. As campanhas compondo o corpus nao se associam a uma categoria de marca especifica (alimenticia, cosméticos, servigos etc.) oa um suposto ptblico-alvo almejado. Para realizar a anélise de contetido dos videos publicitérios selecionados foram observadios especialmente os seguintes aspectos: 0s procedimentos de seleg&o das pessoas comuns participando as campanhas quando esses sao apresentados (casting, sorteio etc.); as caractertsticas das pessoas comuns evidenciadas nos videos publicitérios selecionados para anélises assim como a utilizagao discursiva das vivencias de pessoas comuns. Essas vivéncias podem ser anteriores ou “provocadas” no contexto da campanha, quando propde uma experiéncia inédita aos participantes (Visitas, viagens, encontro com pessoas nao esperadas etc.). Nosso artigo ¢ organizado em dois tempos. Primeiramente, apresentaremos as caracteristicas do emprego de pessoas comuns em campanhas de comunicacdo publicitaria de marca, identificadas com a andlise de contetido; traremos assim exemplos do corpus para ilustrar as constatacdes realizadas. Em seguida, questionaremos a maneira com a qual esse emprego estimula um processo performativo (AUSTIN, 1990) de acreditacdo, encorajando a adesio dos interlocutores as mensagens publicitarias, bem como aproximando de maneira simbdlica a marca do cotidiano dos consumidores. Isso porque adotamos uma abordagem pragmatica da comunicag&o, que se concentra menos no emissor ou no receptor do discurso para se concentrar sobretudo na relagao enunciativa que une os diferentes interlocutores e na coprodugao de sentidos em uma situagéo comunicacional (WATZLAWICK; HELMICK- BEAVIN; JACKSON, 1992). PESSOAS COMUNS NA PUBLICIDADE: UMA MISE EN SCENE SINGULAR Desde o final do século XIX, quando a comunicacao publicitaria comega a adotar estratégias persuasivas que nao se limitam ao simples reclame apresentando um estabelecimento comercial ou um artigo a venda, 0 uso da primeira pessoa do singular se torna um dos modelos enunciativos “mais empregados pelos anunciantes” (ADAM; BONHOMME, 2012). De fato, ouso do “eu” permite, em contexto publicitario, representar a figura de um consumidor ideal e sua suposta fala, coma ajuda de uma ilustracao, de uma fotografia ou ainda, no caso de mensagens audiovisuais, da encenagao de um ator ou de uma atriz. O consumidor ideal é, nesses casos, aquele ou aquela que incarna as caracteristicas sociodemograficas ou, ainda, que representa o modo de vida do publico-alvo definido pelo anunciante Quando anunciantes mostram pessoas comuns em suas campanhas, ha uma intencao explicita de diferenciar essas pessoas de atores que representam consumidores-tipo ou ainda de celebridades e de Vichy (cosmnéticos). Uma parte do corpus de anélise ¢ oriunda de nossa pesquisa de doutorado, realizada entre 2012 e 2016. 2019 jan fun; WOYS2 & Loaene Bearaice Peres SIGNOS DO CONSUMO. especialistas. Dessa forma, 0 uso de pessoas comuns na comunicagao publicitéria modifica o processo enunciativo polifénico das mensagens veiculadas. Segundo a teoria da enunciagao proposta por Oswald Ducrot (1985), 0 anunciante e sua equipe (agéncias e profissionais de comunicacao que trabalham na elaboracao da campanha) sao 0 sujeito falante do discurso publicitario, produtores efetivos dos enunciados @ dos signos que compoem as mensagens comerciais. SA locutores a marca, locutora simbélica, ¢ os personagens presentes nos amincios, pois correspondem a “seres discursivos” que podem empregar a primeira pessoa do singular e que tomam a responsabilidade dos atos de linguagem presentes na mensagem. O sujeito falante 6, para Ducrot, como um autor, enquanto o locutor representa 0 narrador nas historias literérias. O desafio enunciativo dos amincios figurados por pessoas comuns é 0 de fazer acreditar que essas pessoas no sAo meras locutoras de um discurso jd produzido, mas que elas so “sujeitos falantes”. Ou seja, o desafio € criar um contexto discursivo em que as pessoas comuns sejam identificadas como produtoras dos enunciados que pronunciam, baseando-se em suas proprias experiéncias e se expressando de maneira pessoal e sincera. De fato, em nossa andlise, nds constatamos que as campanhas publicitérias que empregam pessoas comuns possuem certas caracteristicas discursivas que visam estimular os interlocutores a atribuir a essas pessoas comuns 0 papel de sujeitos falantes. Essas caracteristicas so chamadas de “operadores factuais" (DULONG, 1997), ou seja, trata-se de elementos capazes, ao mesmo tempo, de ligar o que é dito pelo individuo a uma determinada realidade e de estabelecer pontes com o(@) mundo(s) do(s) interlocutor(es). Qualquer narrativa, publicitaria ou nao, “I... $6 € inteligivel se o mundo descrito estabelecer pelo menos algumas passarelas com 0 mundo do leitor [interlocutor!” (DULONG, 1997, p. 94, traducaio nossa). A “factualizacéo” consiste em contar uma experiéncia pessoal da maneira mais plausivel, mais proxima possivel do que realmente aconteceu ou do que poderia ter acontecido: isso s6 pode ser definido pelos interlocutores da mensagem publicitaria, que aderem ou nao ao relato produzido. ‘Nas campanhas analisadas, néo apenas 0 nome do individuo (frequentemente sem o sobrenome) € citado, sugerindo uma relagio estreita entre ele ¢ os interlocutores, mas também séo apresentadas certas informagies biogréficas, como a idade, a cidade em que mora, a profissdo que exerce, entre outros. Esse ¢ o caso da campanha da marca de alimentagao infantil Blédina, na qual maes e pais sfio apresentados nos videos por seus nomes acompanhados dos nomes e das idades de seus filhos; ou ainda da campanha da marca Danone, na qual fazendeiros fornecedores de leite sao apresentados pelos seus nomes, mas também por caracteristicas relativas ao seu dominio agricola (tamanho, regiao etc.). Divulgar tais informagoes permite acionar um procedimento de categorizagao social’, ou seja, acentuar as diferencas e as semelhancas entre o individuo comum presente na publicidade e o consumidor-tipo do produto ou da marca anunciada. Esse procedimento de categorizagao social estimula os interlocutores a assimilé-lo a grupos socialmente conhecidos, autentificando seu papel num contexto comercial (“6 preciso” ser mae para poder testemunhar sobre a alimentacao de 3. Nogtio escudada em psicologia social, especialmente a pattir dos rabalhas de Henri Tafel (4919-1982), a categorizacdo social compreende o conjunto de atividades cognitivas que ypermitem considerar os individuos como elementos que compSem uma categoria. (© QUE PeSSOAS COMUNS FAZEM A COMUNICACAD DE MARCA? UMA ANALISE DE CAMEANIAS PUBLICITARIAS FRANCESAS criangas, ou ainda ser um fazendeiro para falar sobre a produgao de leite). O procedimento de categorizacao social estimula igualmente os interlocutores a perceberem de maneira mais ou menos consciente semelhangas entre vivéncias proprias e as declaradas pelos individuos presentes nos antincios. Alem disso, no caso das mensagens audiovisuais analisadas, as falas, de pessoas comuns 40 marcadas por signos de espontaneidade, como hesitagdes, enunciados aparentemente improvisados e expressoes de linguagem familiar ou girias. De fato, as falas marcadas por espontaneidade posstuem uma sintaxe peculiar, diferente da linguagem escrita: é ideia nascente que regula a sequéncia dos enunciados, as vezes com rupturas, pausas ou cortes: “o locutor esta sempre atualizando 0 pensamento, procurando pelo mais adequado, substituindo uma primeira afirmacao por outra melhor formulada” (CAELEN-HAUMONT, BEL, 2000, p. 256, tradugao nossa). A justaposigao de formas sintaticas mais ou menos interrompidas ou incompletas, as vezes acompanhadas de signos faticos, confere um caréter dinémico as falas espontdneas. Na campanha da marca de cosméticos Vichy, cuja proposta ¢ apresentar o depoimento de pessoas comuns que sofrem de doencas dermatolégicas, as hesitagdes sao remaredveis: “Old, meu nome ¢ Jade, eu tenho 19 anos e sofro de vitiligo que é... é uma falta de melanina nas células da pele e... o que faz com que a gente, a gente ndo tem mais cores em certas zonas da pele e nao pode bronzear essas zonas I...) A gente se diz que talvez, talvez a gente néo € bonita ou agradavel a olhar [...] Isso me encorajou a... a procurar solugdes pra camuflar wm pouco, um pouco mais essa despigmentacéo” (twadugio e grifos nossos). Francois Brune afirma que a hesitagdo na formulacio de uma declaragio ¢ um sinal indiscutivel da plausibilidade da experiencia que énarrada pelo locutor: Cuidado com a frase intelectual demais, licida demais ou literdria demais: 0 que os outros querem de mim nao sao ideias, mas 0 compartilhamento de reagdes e sentimentos baseados na vivéncia, no qual eles reconheceréo mais facilmente uma auséncia de estrutura préxima a deles. (BRUNE, 1993, p. 46, traducdo nossa) Em outras palavras, falas hesitantes, tom informal, girias e expresses familiares so sinais que representam a falta de preparo propria a relatos pessoais, 0 que sugere que os participantes da campanha nao estdo encenando nem aprenderam de cor suas falas: suas historias observagdes podem ser consideradas auténticas apesar do contexto publicitario. Os signos de espontaneidade so operadores factuais, na medida em que a auséncia de hesitagdo ¢ constantemente associada a profissionais da comunicacao, como jornalistas ou atores, e nao a individuos ordinarios, nao acostumados com a camera e com as técnicas de comunicacao midiatica Acentuando as falas espontaneas de pessoas comuns, as produgoes, audiovisuais das campanhas publicitarias analisadas usam com frequéncia o reaction cut, “um tipo de montagem que consiste em tornar visivel o efeito que um evento, uma atitude ou uma situagao produzem quem testemunha esse evento, atitude ou situacao” JOST, 2007, p. 101, tradugao nossa). Tratando-se de um processo tipico usado por reality shows na televisao, o reaction cut acentua a externalizacao da emogao do individuo depois de uma determinada situacao vivida, Essa situagao pode ser associada a uma experiéncia passada na vida do individuo (como 0 2OI9jan/un; W)S12 7 Loaene Bearaice Peres SIGNOS DO CONSUMO. exemplo de Jade falando de sua vida com vitiligo, na campanha da marca Vichy) ou ainda associada ao préprio dispositivo publicitério (quando a marca organiza visitas, viagens ou ainda outras experiéneias inéditas aos participantes da campanha). Assim, o reaction cut permite estabelecer uma narragao intercalada, como ela é definida por Gerard Genette (1972), em que a narrativa é composta por etapas, misturando tempos pasado e presente. Enquanto as legendas dos videos publicitarios e a voz off de um narrador contam o que as pessoas comuns vivem como experiéncia (a literariedade do audiovisual funcionando como uma prova, mostrando 0 que acontece), as pessoas comuns exprimem suas reacdes no presente. As falas desses individuos ordinarios sao valorizadas como uma fonte priméria, como a expresséo de uma experiéncia ainda nao mediada, editada ou manipulada. Por exemplo, no caso da campanha da marca de alimentos Fleury Michon, individuos comuns sao levados ao Alasca para conhecer o processo de pesca dos peixes que so utilizados em suas receitas. Os videos da campanha mostram esses consumidores no barco discutindo com os pescadores e, em seguida, eles dao seus depoimentos face a camera, como esse de uma das participantes: “Vou poder dizer pra todo mundo que nao é fake, a matéria-prima é top e, se hd uma marca para escolher, essa marca ¢ Fleury Michon” (tradugao e grifos nossos). Ademais, as campanhas analisadas ganham frequentemente making- ofs ou videos que apresentam os bastidores das gravacdes, permitindo apresentar os procedimentos de casting dos participantes, reforgando seu cardter ordindrio ¢ mostrando uma suposta auséncia de roteiro. O making-of € definido como um produto audiovisual, cujo objetivo principal € descrever e comentar o processo de criagao de uma obra cinematogréfica, televisiva ou publicitaria. Trés tipos principais de imagens so utilizados na criagdo de um making-of: wechos da obra original, imagens da produgdo dessa obra original (filmagem, pés- produgéo, entre outros), bem como entrevistas com individuos que participaram da criagéo da obra. Ao fazé-lo, as marcas nao encorajam os interlocutores a questionarem a construgio do dispositive publicitario ou os assuntos que séo tratados; elas tentam dispersar qualquer desconfianga. A semidtica da desconfianga, segundo Yves Jeanneret, ligada em principio a todos os tipos de comunicagéio midiatica, seria “[..] uma relagéio com as mensagens fortemente marcada pela mediagéo da ideia de que essas mensagens foram retrabalhadas, elaboradas a partir de intengdes nem sempre explicitas [...]” JEANNERET, 2008, p. 176, tradugao nossa), dai a necessidade de autenticar as mensagens no sentido de torné- las crediveis, fiaveis. De fato, as marcas parecem impor aos interlocutores um distanciamento da Darstellung publicitaria, decriptando sua propria imagem e rompendo com a “quarta parede”, ao mesmo tempo em que constroem uma representacao dos bastidores de suas campanhas e se mostram como entidades crediveis. A sensagao de proximidade provocada pela exposigao dos hastidores de campanha torna-se a ilusao de uma visao total, dissimulando o fato que os anunciantes s6 mostram o que eles realmente querem que seja visto. ANONIMATO E ACREDITACAO Os operadores factuais identificados neste estudo ~ os usados na apresentagaio de pessoas comuns e ligados a categorias sociais, os associados as falas de pessoas comuns (hesitacGes, enunciados nao- estruturados, utilizacao de girias...) ou ainda os préprios ao dispositive (© QUE PeSSOAS COMUNS FAZEM A COMUNICACAD DE MARCA? UMA ANALISE DE CAMEANIAS PUBLICITARIAS FRANCESAS publicitério (making of, reaction cut) - permitem a validacao das enunciagdes produzidas por pessoas comuns em contexto publicitério ¢ estimulam um proceso performativo (AUSTIN, 1990) de acreditagao. A acreditagao refere-se, por um lado, & relagao que as pessoas comuns rém com as experiéncias relatadas na comunicagao publicitaria, experiéncias estas, sempre apresentadas como pessoais e tinicas; por outro lado, a relacao entre as pessoas comuns e seus interlocutores, reforcando a capacidade dessas pessoas comuns serem reconhecidas como representantes fidveis dos consumidores potenciais e efetivos da marea anunciada, O proceso de acreditacao é reforgado pelo anonimato, caracteristica intrinseca aos individuos ordindrios participando as campanhas publicitérias. Mesmo quando os nomes das pessoas comuns presentes em um antincio publicitério sao citados, elas continuam sendo andnimas: “[..] vamos considerar 0 anonimato como um modo de ser da fala, caracterizado menos pelo desaparecimento ou pela auséncia de um nome, mais por uma oposicéo ancorada no nome de um autor” JOST, 2001, p. 132, tradugdo nossa). Em outras palavras, os nomes das pessoas comuns, mesmo quando apresentados ou mencionados, no so memoréveis, ndo tem valor de citagéo como os de uma celebridade, de um especialista ou de um personagem politico reconhecido, Isso acontece porque as falas de pessoas comuns, quando midiatizadas, pertencem a uma logica evanescente, a“I...] uma fala cotidiana e indiferente, fala que vai e vem, que flutua e passa, uma fala imediatamente consumivel” (FOUCAULT, 1994, wadugdo nossa). Em termos foucaldianos, é uma fala sem “fungio de autor” O anonimato ¢ ainda, segundo Dominique Mehl, uma representacao discursiva apropriada a uma sociedade em perda de grandes autoridades em busca de novos parametros; autonomia dos individuos levando a perda de legitimidade das instancias hierarquicas (Estado, Igreja, escola); ¢ concordancia das individuelidades subsistindo na arbitrariedade das subjetividades: “A sociedade hoje se vé tanto através de experiéncias como através de apologias, ela se pensa tanto através de exemplos personalizados quanto através de abordagens abstratas e globalizantes” (MEHL, 1994, p. 110, tradugio nossa). De acordo com 0 filésofo Gilles Lipovetskky (1983), nossa época é assim marcada por um desinvestimento da esfera publica, por uma perda de sentido em relagio as grandes instituigdes coletivas, sociais e politicas e por uma cultura com mais tolerancia, mas também com mais narcisismo. Trata-se de uma época em que, gragas @ comunicacao midiatica e ao consumo, triunfam 0 bemestar e a auto-realizacao, o gosto pelas novidades, a promogao dos prazeres da vida, elementos que contribuem para fazer do individualismo hedonista um dos principais valores das sociedades contemporaneas. A “era do vazio” se manifesta também na intimidade dos individuos que, tendo mais possibilidades de encontros, se sentem mais sozinhos, pois, quanto mais os lagos humanos se tornam livres, mais a possibilidade de experimentar um relacionamento intenso rara. 0 contexto atual poderia entdo ser resumido da seguinte forma: “Estamos vendo a expansao do individualismo acontecer; diversificando as possibilidades de escolha, liquefazendo marcos, minando os significados tinicos e os valores mais, elevados da modernidade, [o vazio ideolégico] organiza uma cultura personalizada e sob medida” (LIPOVETSKY, 1983, p. 14, tracugao nossa). Nesse contexto, Guillaume Soulez (2001) identifica um paradoxo: as falas de pessoas comuns, quando presentes na comunicacao publicitaria, so certamente anénimas ¢ singulares, mas também devem interessar 2019 jan fun, MCY'S-12 9 Loaene Bearaice Peres 10 SIGNS DO CONSUMO por sua capacidade de se abrir a uma certa universalidade, tocando emocionalmente os interlocutores. Em outras palavras, a fala de cada pessoa comum permanece individual, subjetiva, mas s6 se torna miditica quando tem vocagao a mencionar uma situagao ou um problema geral, ou ainda a provocar percepgdes ou sentimentos que podem ser compartilhados: Ao ouvir essas falas singulares, 0 espectador pode dizer “ele também” ou “eu também”, Assim, 0 anonimato representa uma das fontes que leva & universalidade. Fle evita a identificacao estrita a uma personelidade e sugere que se trata de uma individualidade intercambiavel. (MEHL, 2001, p. 127, taducao nossa) Frangois Jost (2003) acredita que o anonimato, enquanto recurso discursivo, incentiva um “deslizamento simbélico”, coneretizado na passagem do “eu” presente nas falas dos individuos ordinérios para 0 “a gente” interpretado pelos interlocutores das mensagens publicitérias. O autor se baseia na teoria de Kate Hamburger (1986), que se interessa pelos géneros literérios e explica que a narrativa em primeira pessoa tem um status particular, menos fiet{cio que quando outros pronomes sto empregados, pois convoca inevitavelmente “um sujeito de enunciagao determinado, individual e historico”. Analisando enunciados em primeira pessoa, Hamburger opée a enunciacdo histérica a enunciacdo tedrica. Se observarmos essa distingéo a partir da afirmagiio “eu escrevo”, pronunciada por um professor dando aula, 0 sujeito da afirmagao pode se referir a uma situactio efetiva, quando o “eu”, no caso, faz referencia ao proprio professor que esta escrevendo no quadro. Nesse caso, estamos diante de um sujeito de enunciacao dito “historico”. No entanto, se 0 professor usa essa frase como um exemplo para explicar uma regra gramatical, 0 sujeito da enunciagéio é denominado “teérico”. Em uma ocorréncia do ewhistérico, a individualidade do sujeito da enunciagéo ¢ fundamentalmente levada em conta. No caso do eu- te6rico, no entanto, a individualidade da pessoa que realiza a enunciagio nao é questionada, pois € imediatamente generalizada: “O leitor fou 0 ouvinte] esta interessado apenas no contetido, sem colocé-lo em relagéo com a individualidade do autor” (HAMBURGER, 1986, p. 64, tradugéo nossa). Em resumo, o ewhistorico € nomeado, enquanto 0 eu-tedrico € abstrato, andnimo. O “deslizamento simbélico” do ewhistérico ao eu- te6rico, do “eu” ao “a gente”, é o que explicaria, enquanto procedimento discursivo, 0 fato que os interlocutores possam se identificar com as falas e comportamentos das pessoas comuns na publicidade Embora essas intervencdes verbais sejam apresentadas como experiéncias singulares, como testemunhos histéricos; embora elas possam, a partir de certo ponto de vista, ser intercambiaveis, seu objetivo é menos de nos apresentar as sutilezas de uma personalidade e mais de nos mostrar uma situacdo geral capaz de provocar uma emocao [..J. JOST, 2003, p. 69, traducao nossa) Quando um individuo comum fala sobre um assunto especifico ou sobre uma experiéncia pessoal no ambito de uma mensagem publicitaria, impoe-se uma questao de valor: esse discurso pertence quase sempre a um registro emocional. Assim, o que importa nao ¢ a informagao fornecida pelo individuo comum, muitas vezes redundante quando comparada (© QUE PeSSOAS COMUNS FAZEM A COMUNICACAD DE MARCA? UMA ANALISE DE CAMEANIAS PUBLICITARIAS FRANCESAS aquela que pode ser obtida em outros documentos publicitarios ou nao. 0 que importa sao suas manifestagoes subjetivas, pois elas permitem aos interlocutores do amincio experimentar, por procuracao, as experiéncias relatadas pelo individuo ordinério vé-lo como um semelhante. 0 valor de empregar pessoas comuns no émbito de um discurso estratégico como a comunicagao publicitéria reside no fato de que suas afirmagdes podem ser subjetivas e singulares, mas devem permitir que os interlocutores se apropriem das percepcdes e sentimentos compartilhados assim como que se identifiquem com as situagdes descritas. CONCLUSAO: 0 QUE PESSOAS COMUNS FAZEM A COMUNICACAO DE MARCA? Sea ficgao publicitéria ¢ acusada de afastar os consumidores de suas preocupagdes cotidianas levando-os a sonhar com o que néo podem possuir, a presenca de pessoas comuns e seus relatos podem ser vistos como um antidoto para esta ficedo considerada como alienante ou impessoal. Desta forma, o emprego de “pessoas reais” na comunicacao de marca é baseado em uma promessa dupla de autenticidade. Por um lado, por trés da afirmacio repetida de filmar sem atores, existe a ideia, ja presente no cinema neorrealista italiano’, de que ha mais autenticidade no anonimato e no improviso do que na atuagio de atores profissionais. Por outro lado, a promessa de autenticidade ¢ feita nao apenas pelo individuo comum que parece “oferecer” seu ponto de vida e compartilhar suas experiéncias nos anuincios, mas também por sua capacidade de representar os problemas e as expectativas dos consumidores visados pelos esforcos comunicacionais. Gragas a presenca de pessoas comuns em suas campanhas, as marcas estabelecem uma “representagio construida e ficticia, mas com um coeficiente de vivéncias e emogées” (MEHL, 2001, p. 128, tradugéo nossa), a qual é mais préxima dos consumidores e, portanto, melhor aceita por eles; aparentemente mais fiavel porque é supostamente livre de interesses puramente comerciais. As marcas se aproximam do cotidiano dos consumidores ¢ compensam “[..] o fendmeno da dissolugao dos lagos sociais, proporcionando relagées que nutrem (simbolicamente ao menos) ‘eu vazio’ que predispée 0 abandono da tradigio e da comunidade numa sociedade moderna marcada pela dissolugao e pela transformacao dos vinculos sociais” (HEILBRUNN, 2003, p. 135, tradugdo nossa). As marcas exercem assim um poder unificador entre os consumidores, que direcionam suas preferéncias ¢ influencia seus modos de viver, mas também representa comportamentos e valores propagados pelos proprios consumidores, incentivando a criagao de comunidades em torno de interesses compartilhados e de praticas de consumo. REFERENCIAS ADAM, J. M; BONHOMME, M, LArgumentation publicitare: rhétorique de Iéloge publici- ‘aire et de [a persuasion. Paris: Armand Colin, 2012. 4. O neorrealismo no cinema, especialmente no cinem@ italiano, se constitui no perfodo 1péesegunda guerra mundial. Ele espreita a realidade das ruas, mostra individuos nos filmes desempenhando o papel que Ihes cabe na vida cotidiana e confirma o interesse pelo mundo “como ele é*, sem arnamentos ou efeitos especiais, 2019 jan fun; WDS12 0 Loaene Bearaice Peres 12SIGNOS DO CONSUMO AUSTIN, L. J. Quando alzer é fazer. Porto Alegre: Artes médicas, 1990, BERTHELOT-GUIET, K. 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Pragmatica da camunicago urna ‘na, S30 Paulo: Cultrix, 1992 http //ax.do\.org/10.11606/\ss SOFT POWER E A CONSTRUCAO SIMBOLICA DA REALIDADE: A INFLUENCIA DA MIDIA NO COMPORTAMENTO DA SOCIEDADE - 0 CASO DA REFORMA DA PREVIDENCIA NO BRASIL Soft power and the symbolic construction of reality: the media influence in society’s behavior - the case of social security reform in Brazil Soft power y la construccién simbdlica de la realidad: la influencia de los medios de comunicaci6n en el comportamiento de la sociedad - el caso de la reforma de la seguridad social en Brasil 1984-5057 Ilpts-25 Aryovaldo de Castro Azevedo Junior Universidade Federal do Parané, Curitiba, Brasil Pos-doutor em Ciéncias da Comunicacdo pola Universidade de S80 Paulo. Doutor em Muitimeios polo Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas. Mestre em Ciencias da CComunicacao pela Escola de Comunicacées ¢ Artes da Universidade de Sao Paulo © bacharol om Publcidade e Propaganda pola Escola de Comunicacdos © Arts da Universidade de 50 Paulo. Integra os arupos do pesauise Estudos em Comunicacdo, Consumo e Sociedade (ECCDS/UFPR) « Comunicacao Elotral (CEL/UEPR). Membro da Associacio Brasilora de Pesquisadores om Publicidad (ABP2), Red Latinoamericana de Investiaadores on Publicidad (Rolain) e Associacdo Internacional de Investioadores em Branding (Observatério de Marcas) Professor Associado do Departamento de Comunicacdo @ do Programa de Pos-Graduacao em Comunicacao da Universidade Federal do Parana E-maitprotarvazevedo@uolcombr RESUMO A sociedace contemporanea tem consolidado © capitalismo enquanto sistema ‘economico hegemonico, principalmente pela influéncia dos conglomerados de midia @ entretenimento para a construcao simbélica da realidade, somados a0 poder de corporagdes que induzem a definicao de diretrizes pilblicas por parte dos Estados- hacionas. Este artigo, através de andlise documental e estudo de caso, propoe tecer algumas relaces entre os atoras que infiuenciam as estruturas de poder e exemnpificar com estudo de caso da campanha pela reforma da previdéncia social realizada pelo governo federal brasileiro e, assim, demonstrar a influéncia da linguagem persuasiva na comunicacao pilblica. PALAVRAS-CHAVE Propaganda, Comunicacao integrada, Politica, Oligopdlios, Poder. ABSTRACT Contemporary sociaty has consolidated capitalism as a hegemonic economic system, mainly by the influence of media and entertainment conglomerates for the ‘symbolic construction of reality, added to the power of corporations that induce the definition of public directives by the national states. This article, through documentary analysis and case study, proposes to weave some relations between the actors that influence the structures of power and to exemplify with case study of the campaign for Como citar este artigo: AZEVEDO JUNIOR. A.C. Soft power ea construcao simbdlica da realidad: nuencia da midis no ‘compottamanto da socedade ~ caso da reforma da providencia no Basi, Signos do Consumo, S30 Paulo, T.n1.p. 1-25 jan/iun, 2019 do consumo artigo ‘Submetido: lout. 2018 ‘Aprovade: 20 out 2010, 2019 jan fun, IKDIS-25. 1S AsyovA.00 DE CASTRO AZEVEDO JUNOR 14SIGNOS DO CONSUMO the reform of the social security system conducted by the Brazilian federal government and thus demonstrate the influence of persuasive language on public communication. KEYWORDS Propaganda, Integrated communication, Politics, Oligopolies, Power. RESUMEN La sociedad contemporanes ha consolidado el capitalismo como sistema econdmico hegeménico, principalmente por la influencia de los conglomerados de los, ‘medios de comunicacion y entretenimiento para la construccién simbolica dela realidad, sumados al poder de corporaciones que inducen la definicion de directrices publicas poor parte de los Estados nacionales. Este articulo, a través de analisis docuental y estudio de caso, pronone tejer algunas relaciones entre los actores que influencian las, estructuras de poder y ejemplificar con estudio de caso de la campafa por la reforma de la seguridad social realizada por el gobierno federal brasileno y asi demostrar la influencia del lenguaje persuasiva en la comunicacién pilblica, PALABRAS CLAVE Propaganda, Comunicacién integrada, Polltica, Oligopolios, Poder. INTRODUCAO No mundo globalizado, integrado principalmente em decorréncia do entrelacamento das economias nacionais em arranjos comerciais internacionais, 0 poder das corporagdes tem se destacado como um dos principais influenciadores na definigao de politicas publicas, o que interfere na vida de paises e pessoas em escala global. Sua inter relacao com os Estados-nagdo tem forjado diretrizes planetarias de modo a valorizar a integragdo dos mercados produtores e consumidores. Para o desenvolvimento deste artigo, num contexto marcado pela celeridade das relagdes sociais decorrentes da evolugio tecnoldgica e pela conectividade global, tornou-se premente o desenvolvimento de pesquisas documentais para contextualizar os saberes derivados de autores como Adorno, Baudrillard, Ortiz, Souza, Warnier ¢ Werthein de conceitos relacionados @ antropologia, sociologia e comunicaséo; cotejados por Bresser-Pereira, Castells, Harari, Kotabe e Helsen, bem como Kotler e Nye, com estudos relacionados economia, marketing, politica ¢ tecnologia; bases referenciais para a compreensio da dinamica da propaganda contemporanea analisada, via estudo de caso, no contexto da reforma da previdéncia, a fim de apontar a relagéo entre interesses corporativos, diretrizes politicas e a tentativa de influenciar © comportamento social com a utilizagao de comunicagao integrada via multiplataformas midiaticas. © mundo ainda ¢ politicamente fragmentado, mas os Estados esto perdendo sua autonomia rapidamente, sendo incapazes de executar politicas econémicas e sociais de modo independente ou de conduzir questées internas como julgar conveniente, pois estéo cada vez mais abertos a influéncia dos mercados, a interferéncia de organismos multilaterais e empresas globais e a supervisao do publico global e do sistema juridico internacional (HARARI, 2015, p. 3635-3637). Para David Rathkopf, diretor da revista Foreign Policy, o gigantismo das corporagées e 0 seu enorme poder politico subvertem as regras da democracia: As duas mil principais empresas do mundo sao maiores & controlam mais recursos que os menores paises do mundo e seus 1. hups:/fpgroup foreignpolicy.com/ SOFT POWER E A CONSTRUCAQ SIMBOLICA DA REALIDADE governos nacionais. Em vez de um sistema internacional de Estados que se comunicam com outros Estados, temos hoje um sistema de Estados interagindo com atores privados que controlam recursos significativos e podem orientar e moldar os resultados da forma que hes convémn, atrasando a regulacao dos mercados financeiros glolvais e pressionando por mais abernura de mercados, mesmo «ue isso cause problemas. (ROTHKOPF, 2012) Kotabe e Helsen (2000, p. 72) indicavam esta tendéncia a concentragao corporativa, a qual esta em consonancia com o levantamento da revista Forbes, no qual as duas mil maiores empresas do mundo em 2015 foram responséveis por um faturamento total de US 39 trilhdes , somaram lucros de US 3 trilhes e ativos valendo US 162 trilhdes. Destas, 379 companhias estao nos Estados Unidos e 232 na China (SALOMAO, 2016). No ranking da mesma revista, sobre as maiores companhias globais de 2017, o grupo ICBC, instituigao financeira chinesa, lider do ranking, tem um valor de mercado estimado em US 311 bilhOes, com faturamento de U$ 165 bilhées, lucro de U$ 43 hilhées e ativos na casa dos U$ 4,2 trilhdes (FORBES MAGAZINE, 2017). A guisa de comparacao, o PIB aproximado dos EUA em 2016 foi de 18 trilhaes de délares, o da China 11 trilhoes e 0 do Brasil 1,8 wilhdes (IMF, 2016). Quadro 1. Maiores empresas globais 2017 Posi¢ao | Corporacao setor Pais 1 ficec Financeito China’ 2___| china Construction Bank Financeiro China’ 3 [Berkshire Hathaway Financeiro EUA 4 [PMorgan Chase Financeiro EUA 5__ | Wels Fargo Financeiro EUA 6 | Aaricuttural Bank of China Financeiro China’ 7 |Bankor America Financeiro EUA 8 [Bank of China Financeiro China’ 9 [Apple Tecnologia EUA 10 [Toyota Motor Automotive [Japao Fonte: Forbes Magazine Ranking (2017). A proeminéncia das instituigdes bancérias dentre as maiores corporagées do planeta em termos de faturamento indica a predominancia do capital financeiro no funcionamento do sistema capitalista na contemporaneidade. Entretanto, so marcas que néo reputam de um conhecimento amplo por parte da sociedade, pois, pela esséncia de seu proprio negécio, nem sempre focam seus negécios no consumidor final. Quanto a concentragao simbélica (brand awareness ou conhecimento de marca) refletida na lembranga das principais marcas globais, de acordo com a consultoria Interbrand, o destaque vai para, além da dominancia dos Estados Unidos, a presenca crescente de empresas de tecnologia, reforgando 0 conceito de Castells (1999) da mudanga paradigmatica da economia, que migra da valorizagao de energia para a valorizacao de conhecimento e tecnologia. 2019 jan /jun; WDI3-25. 15 AsyovA.00 DE CASTRO AZEVEDO JUNOR 16 SIGNOS DO CONSUMO Quadro 2. Melhores marcas globais 2017, Posi¢ao_| Corporacao Setor Pais 1 [Apple Tecnologia EUA 2 [cooale Tecnologia EUA 3 | Microson Tecnologia EUA 4 |cocacoia Alimenticio| EUA 5 [Amazon Tecnologia EUA € _|Samsuna Tecnologia Cordia do Sul 7 [Toyota ‘Automotivo Japé0 & | Facebook Tecnologia EUA 2 [Mercedes-Benz Automotive Alemanha oe Tecnologia EUA Fonte: Best Global Brands (2017). Aanélise dos rankings apresentados anteriormente indica uma forte presenga simbélica de marcas estabelecidas nos Estados Unidos, 0 que reforga a associagao entre marca e nagao e sua influéncia na percepgao e escolha de produtos e servigos pelos consumidores (KOTABE; HELSEN, 2000), bern como a predominancia dos mereados financeiro e de tecnologia na construgao de novos direcionamentos no proceso de globalizagao, com conceitos e valores difundidas por meio do conjumto midiatico que carrega as informagées ¢ o entretenimento em diferentes plataformas, utilizadas pela publicidade e propaganda, nas suas mais diversas roupagens, com o intuito de estimular o consumo (BAUDRILLARD, 2008). TECNOCRACIA, INFORMACAO E PODER A base do poder nao é econémica, militar ou religiosa. Sua hase é informacional e quem controla a informacdo tende a controlar o poder. Tal equacdo é fundamental na sociedade contemporanea, caracterizada por transformagdes técnicas, organizacionais e administrativas que tém como hase os insumos baratos de informacao decorrentes dos avancos tecnolégicos na informatica e nas telecomunicagdes (WERTHEIN, 2000). Para Castells (1999 O que caracteriza a anual revolucao tecnol6gica nao é a centralidade de conhecimentos e informacao, mas a aplicacao desses conhecimentos € dessa informagio para a geracdo de conhecimentos e de dispositivos de processamento/comunicaco de informagao, em um ciclo de realimentacao cumulativo entre a inovacao e seu uso. [.] 0 que pensamos e como pensamos é expresso em bens e servigos, producao material e intelectual. (p. 69) A pertinéncia do raciocinio do autor pode ser representada pelo crescimento exponencial das empresas de tecnologia, com sete das dez marcas globais provenientes da area de tecnologia (Quadro 2). Todas essas corporagdes tém investido pesadamente em big data inteligéncia artificial como forma de melhorar a compreensdo sobre comportamento de consumo e, consequentementte, otimizar a oferta de produtos e servigos a seus consumidores (FERNANDEZ, 2017). SOFT POWER E A CONSTRUCAQ SIMBOLICA DA REALIDADE Como exposto acima, enquanto 0 poder econémico concentra- se nas instituigbes financeiras, 0 poder simbélico (brand awareness) est centralizado nas corporagdes do ramo de tecnologia. Entretanto, cabe destacar que a construgao de marcas esté fortemente vineulada & comunicacao promocional, difundida por grupos de midia e entretenimento responséveis pela propagacao de informagao e lazer em ambito planetario, Embora o poder corporativo seja proeminente na estrutura mundial contemporanea, é notéria a concentragéo geoeconémica e geopolitica, refletidas de modo ainda mais nitido quando se considera a oligopolizacao mididtica planetéria. De acordo com o relat6rio da Zenith Optimedia, Top 30 Global Media Owners 2017, ranking que lista as maiores corporagies de midia do mundo: Quadro 3. Maiores grupos globais de miaia 2017. Posigao Corporagao Pais 1 Alphabet Google) EUA 2 Facebook EUA 3 Comeast EUA 4 Baidu China’ 5 Walt Disney Company | EUA 6 ist Century Fox EUA 7 CBS Corporation EUA 8 iHeartMedia inc EUA 9 Facebook EUA 10 Bertelsmann Aleranha Fonte: Zenith Media Ranking (2017). Das dez maiores corporagies de midia, informagio e entretenimento, cito esto baseadas nos EVA, 0 que explicita, de modo incontestavel, a proeminéncia do dominio norte-americano na produgio simbélica ¢ potencial agendamento de pautas de interesse para a reificagdo de valores de manutengéio sistémica dos contetidos de informagio e entretenimento (WARNIER, 2003, p. 79). Este poder de influenciar e persuadir por meio da cultura, das instituigdes e das agdes no ambito internacional é definido como soft power e, segundo Nye (2002), “o pais que consegue legitimar seu poder aos olhos dos demais encontra menor resisténcia para obter ‘o que deseja. Contando ele com uma cultura e uma ideologia atraentes, 05 outros se mostram mais dispostos a acompanhé-lo” (p. 39) INDUSTRIA CULTURAL GLOBAL O sistema capitalista, hegeménico neste século XXI, se encontra cada vex mais excludente, concentrando a renda numa elite global, enquanto a maior parcela da populacao mundial vive as suas margens, relegada a subsisténcia. Um estudo de 2015 da organizagao nao governamental britanica Oxfam constatou que a riqueza acumulada pelo 1% (aproximadamente 70 milhées de pessoas) mais abastado da populacao mundial agora equivale, pela primeira vez, a riqueza dos 99% (cinco bilhdes novecentos ¢ trinta milhGes de pessoas) restantes (REUBEN, 2016) Ou, numa exposigao ainda mais dramatica, as 67 pessoas mais ricas do 2019 jan /jun; WOIS-25 17 AsyovA.00 DE CASTRO AZEVEDO JUNOR 18 SIGNOS DO CONSUMO. mundo tém USS 1,72 ilhao. Tanto dinheiro quanto os 3,5 bilhoes mais, pobres - metade de toda a humanidade! (PANDOLFI, 2017). Evitar convuls6es sociais num cenario tao assimétrico 6 é possivel graces, principalmente, ao uso da industria cultural, com énfase nos meios de comunicagao e entretenimento, que estabelecem padrdes internacionais de comportamento e consumo que suportam esta estrururacao global focada na confianca de funcionamento do sistema capitalista e que, a partir da Segunda Guerra Mundial, tem difundido valores liberais, principalmente na economia, numa rede de relacionamentos originéria no Institute of Economic Affairs (IEA), fundado em 1955, em Londres, e que hoje tem no Atlas Network sua face mais conhecida. Financiado por parte significativa do PIB planetério através de diversas fundagGes ¢ institutos, o Atlas propaga um mundo livre, préspero e pacffico, onde o estado de direito, a propriedade privada e os mercados livres so a base de desenvolvimento planetério’. Esse pensamento liberal é refletido nas diretrizes macroecondmicas do Consenso de Washington (BRESSER-PEREIRA, 1990), com a defesa de livre mercado e a redugdo da ingeréncia do Estado na economia, num receitudrio propagado pelo Fundo Monetério Internacional e pelo Banco Mundial, ambos sob controle das prineipais economias mundiais, nominadas como G7° (Alemanha, Canada, Estados Unidos, Franca, Itélia, Japao e Reino Unido) e que defendem diretrizes como disciplina fiscal; rredugtio dos gastos publicos; reforma tributaria; juros de mercado; cambio de mereado; abertura comercial; eliminagdio de restrigdes ao investimento estrangeiro direto; privatizagio de empresas estatais; desregulamentagéo de leis econdmicas e trabalhistas e direito a propriedade intelectual A globalizagao economica foi forjada nestes preceitos que justificam e sustentam seu pleno funcionamento. E, para sua manutengdo € continuidade, é relevante a confianga no sistema, cuja construgéo perpassa a propagacéo ideologica perpetrada pelo conjunto midiatico e de entretenimento, Assim, ao sistema da indiistria cultural cabe a apologia aos processos econdmicos dominantes, atuando no ambito da propagagio cultural para a difuséo de valores pertinentes a sua sustentagao. A maior parte dos produtos culturais, como filmes, programas de televisdo, miisica, livros, revistas e jornais, além da posse de sistemas de transmissdo por cabo ou satélite, esta restrita a grandes empresas de comunicacao, as quais “oligopolizam” o sistema midiatico e limitam a multiplicidade de fontes de informagio, o que seria fundamental para uma composicio adequada da produgao democratica da informagio, que é solapada com tal concentragao. Um exemplo desta concentragao é os Estados Unidos, onde seis grandes corporagGes de midia e entretenimento possuem 90% de participacao no mercado: Comcast, The Walt Disney Company, 21st Century Fox, TimeWarner, Viacom e CBS (MEDIA, 2016, p. 46). ‘SIMULACROS, MEDIA E CORPORACOES O capitalismo organizado se expande da esfera de produgao de bens materiais para a produgao industrial de hens simbélicos, constituindo aguilo que Adorno havia chamado de industria cultural: diversas formas 2. Disponivel em: hutp:/bity/2MHPLyn. Acesso em: 20 set. 2018, 3. Dispontvel em: https|[bitly/2eMSizd. Acesso em: 20 set. 2018, SOFT POWER E A CONSTRUCAQ SIMBOLICA DA REALIDADE de manutengao ou adequagao de comportamentos sociais aos interesses dos oligopolios ou a representagao ideolégica de sustentagao dos oligopslios através da comunicacao de massa. (ADORNO apud COHN, 1986) Quem controla a produgao das ideias dominantes comtrola o mundo. Por conta disso também, as ideias dominantes sao sempre produto das elites dominantes. £ necessario, para quem domina e quer continuar dominando, se apropriar da produgao de ideias para interpretar e justificar tudo o que acontece no mundo de acordo com seus interesses (SOUZA, 2018). Ainduistria cultural é a aplicagao da logica capitalista da maximizacao do lucro a esfera dos bens simbolicos. Ou seja, além de ser a forma dominante de produzir mercadorias materiais, 0 capitalismo também passa a ser a forma dominante da produgéo de mercadorias simbélicas, como a informagéo eo conhecimento (SOUZA, 2018). E, no contexto contemporaneo, essa produgao e seu posterior consumo suplantam as barreiras tradicionais, dos Fstaclos-nagao e agem em escala planetéria (ORTIZ, 1994). A midia se estabeleceu e se consolidou como uma das bases do funcionamento das democracias e coube a imprensa a atuacao para zelar pelo bom funcionamento das instituigdes, denunciando a luta pelo poder politico e suas relagdes perigosas com os atores que suportam a conducao da politica de Estado, Enwetanto, a imprensa tem uma notéria relacdo com grupos econdmicos e financeiros que, com a globalizagéo, atuam em escala planetaria e definem os objetivos e estwatégias de conducio da civilizagéo sob o beneplécito da midia corporativa que reverbera seus preceitos. Muito dessa influéncia corporativa ocorre pelo uso de poder econdmico, com pressao sobre jornais feita com destinacao (ou n&o) de verbas publicitarias e com lobby, com financiamentos de campanhas ou agdes empresariais em areas de interesse politica, seja por conta de desenvolvimento econdmico em “currais cleitorais”, seja pela difusto de apelos que se coadunam a emendas parlamentares ou projetos de lei. Esse tipo de relac&o amplia a percepgio de que a imprensa e a politica andam a reboque de interesses outros que nao os da sociedade. UM ESTUDO DE CASO: REFORMA DA PREVIDENCIA NO BRASIL Em 2016, as empresas publicas investiram R$ 1,07 bilhdo em propaganda. E a administracéo direta (Planalto e ministérios) investiu outros R$ 432 milhées. Assim, o investimento publico federal em comunicagao publicitaria atingiu RS 1,439 bilhao, sem incluir os gastos com publicidade legal, patrocinios e os custos de produgao (NETZEL; BARBIERI, 2017). De acordo com pesquisa do Kantar Ibope Media sobre o ranking dos maiores anunciantes e agéncias do Brasil em 2016 (BLUE BUS, 2017), 0 lider é a empresa do ramo farmacéutico Genorama, com investimentos de R$ 1,3 bilhao. Cruzando-se os dados destas referéncias, identifica-se o governo federal como o maior anunciante brasileiro quando considerado ‘© conjunto de verbas publicitarias sob sua administracao. A Secretaria de Comunicagao Social da Presidéncia da Reptiblica (Secom:) 6 responsavel por coordenar a verba e a negociacao da publicidade vinculada ao governo federal. A verba de comunicagao publicitéria de RS 1,439 bilhao (2016) foi investida na seguinte proporsao (Figura 1): 4. hurp:(wivw.secom gov be) 2019 jan fun; IMDI-25. 19 AsyovA.00 DE CASTRO AZEVEDO JUNOR 20 SIGNOS DO CONSUMO ORIGEM - Maiores contas da administracao direta e estatais Outros cba Correios . Ministério da Saude B% Petrobras e—~ ‘secam Bonco do Brasit. Figura 1. Verba do governo federal 2016. Fonte: LEVIN & LEMOS (2017) Como forma de se tornar uma marca-nagéo mais atraente ao capital internacional e assim prospectar investimentos, tornowse premente ao governo federal do Brasil a subordinacao as normas do Consenso de Washington e, dentre destas, a reduco do déficit fiscal através, com destaque, da reforma previdenciéria. Assim, o governo federal investiu na campanha pela reforma da Previdéncia com o intuito de angariar apoio popular para influenciar 0s deputados federais e senadores quando esta for debatida no Congresso Nacional. Desde 2016, de acordo com dados disponibilizados pela Secom, o governo federal gastou RS 103,6 milhoes com agencias de propaganda para formular campanhas sobre essa tematica (CARNEIRO, 2018). Antincios foram veiculados em TV*, radio, jornal, revista e internet, inclusive em plataformas como Google, YouTube’, Twitter e Facebook. Nos meios oficiais de comunicacao do governo, como em perfis no Facebook, websites do Planalto e de ministérios, foram propagadas mensagens favoraveis a reforma, Também foram contatados influenciadores digitais (INFLUENCIADORES, 2018), ser a devida formalizagao, para desenvolver contetides favoraveis 4 reforma previdencidria, o que remeteu ao caso anterior em que o governo federal contratou youtubers (PORTINARI; SALDANA, 2017) para defender a reforma do ensino médio sem a identificagio necessiria em aces publicitarias deste tipo, o que gerou um questionamento sobre a conduta ética da administragéo no sentido de influenciar a opinido publica. Tal falta de transparéncia é reforgada com a interrupgio dos servigos do Instituto de Acompanhamento da Publicidade (LAP) em 2017. 0 érgo compilava todos os gastos com propaganda na esfera publica federal. Era custeado com o direcionamento de 1% do investimento em publicidade por parte das agéncias que atendiam as contas publicas (RODRIGUES, 2017), ‘Menos transparéncia tende a dificultar 0 acompanhamento dos investimentos governamentais em comunicacao promocional e segue na contramao do que o marketing contemporaneo propée: difusdo de informagées claras e fidedignas para a sociedade, como forma de reforcar a marca por meio de processos ¢ investimentos que podem ser acompanhados por todos (accountability), mostrando a lisura e idoneidade da marca corporativa, que ganha respeitabilidade e credibilidade junto aos consumidores. (KOTLER, 2010). 5. Dispontvel em http: /bit ly 2Baiilw e htrp|bity/2BacakQ. Acesso em: 15 set. 2018. 6. Dispontvel em hreps:/bitly/2sC78rj. Acesso em: 15 set. 2018, SOFT POWER E A CONSTRUCAQ SIMBOLICA DA REALIDADE Agdes de relagdes piiblicas e assessoria de imprensa também foram. realizadas na campanha pela reforma previdenciéria. O presidente Michel Temer (MDB) protagonizou em programas televisivos, como Silvio Santos’, Ratinho! e Amaury Jr.*, em entrevistas variadas a imprensa, como para a radio Bandeirantes®, fez diversos discursos em cerimonias no Palacio do Planalto” e mesmo no Forum Econémico Mundial, em Davos, sempre reiterando a importancia da mudanca constitucional que possibilitasse adequar as propostas reformistas defendidas pela sua gestao. Estratégia coerente de comunicacéo integrada para diminuir a rejeigéo popular a proposta governamental. E importante destacar a assimetria na cesséo de espaco editorial para o presidente defender propostas governamentais. Mesmo que tais agdes de comunicago governamental pudessem ser enquadradas como publicidade institucional, conforme normativa da Secom, desde que fossem destacadas como acdes publieditoriais - 0 que nao ocorreu ~ nGo fica claro o interesse dessas empresas de midia quanto a cessfio de espaco com alto valor de mercado sem a contrapartida formal de inversao publicitaria (LUPION, 2017). Para uma difusdo verdadeiramente diversificada da informacdo seria fundamental também expor a posicao daqueles contrérios as reformas governistas nesses veiculos de comunicac&o, dando oportunidade ao conjunto da sociedade em construir uma percepedo ampla e abrangente dos temas difundidos até entao de modo unilateral e, consequentemente, tendencioso, com eminente falta de espirito democratico quanto a difusao da informagio em concessdes publicas. Indiferente as criticas, e mesmo as agdes na Justia, o governo federal no se furtou em manter a campanha com os motes “contra privilégios, a favor de todos” e “sem reforma, o Brasil quebra”, enfatizando dados parciais para tentar convencer a populagéo, num evidente esforco para fazer valer seu ponto de vista, como destacou, em dezembro de 2017, a procuradora-geral da Republica, Raquel Dodge, quando entrou com uma ago no Supremo Tribunal Federal (STE) pedindo a suspensiio da veiculagio da propaganda do governo Temer em favor da reforma, questionando o uso de verba suplementar de RS 99 milhées aprovada pelo Congresso em “campanha estratégica de convencimento pablico e que nao explicita de maneira clara e transparente a totalidade dos dados pertinentes ao tema” (CARNEIRO, 2018). Tecnicamente, a campanha de comunicacéo é eficiente ¢ contemporanea, pois multiplataforma, transmidia e digital, com integracdo de agdes de publicidade, de relagées pablicas e de assessoria de imprensa. Eticamente, é uma campanha questionavel por possuir viés persuasivo, o que ndo se coaduna a comunicacao oficial, que deveria ser eminentemente informativa e formalmente identificada como agao de comunicagio governamental. 7. Disponivel em http:bitly2MRmh2P. Acosso em: 15 st. 2018, 8. Disponivel em http: bitlyf26biXih, Acesso ern: 15 set. 2008, 9. _Disponivel em httpbitlyBeplet. Acesso em: 15 set. 2018. 410. Disponivel ema http: ityRYDrex. Acesso em: 15 set. 2018. 11, Disponivel em hpi y/2R 412, isponivel em http|bity/2REMEpU. Acesso em: 15 set. 2018 22. Acesso em: 15 set, 2018, 2019 jan /jun.;WYI3-25. 2 AsyovA.00 DE CASTRO AZEVEDO JUNOR 22 SIGNOS DO CONSUMO Quadro 4. Relacao de anuincios favoravets 8 reforma da Previdéncia, Espaco nobre (sabrecapa®) de 18s revistas ‘sernanais de informacao com a chamada que associa a impassiblidade de aposentadoria de uma crianca, no futuro, c3s0 no seja aprovada a reforma, no presente. Além do espaco diferenciado, a veiculacao integrada e simultanea nas trés ‘semanais com maiores tiragens apontam a intencao de potencializar oalcance da divulgacso. ‘Serie de programetes veiculados na televisao & disponivels no canal Governo do Brasil, Yo qual tambem redirecionava para 0 canal especifico da reforma da Previdencia, ambos no YouTube Mensagens explicitando o ponto de vista governamental sobre a necessidade de realizar a reforma previdenciaria, ;Banner® pela reforma da Previdencia para plataformas digitals apontando o funcionalismo ppablico como responsavel por parte significativa do deficit pubico. Anuncio para Twitter® na conta do Planalto, apontando © funcionalismo publico come responssivel por parte significativa do défieit pablico, Anuncio para plataformas digitais” destacando priviléqios do funcionalismo pilblico como parte significativa do défcit pablico, Perfil oficial do Ministério das Cidades no Facebook™, ‘Antincio” custeado pelo partido do presidente da Reptiplica - PMDB, condicionando a manutancso de politicas publicas com orande aceitaeso social 8 realizacéo da reforma da previdéncia, Aniincio® custeado por entidade patron favorével areforma, Fonte: levantamento realizado pelo autor. 2 4 15 16 0 18 19, 20 Disponivel em ips:{itly/2MgkapS. Acesso em: 15 set. 2018. Dispontvel em htps:{fhtly/2MalsyQ. Acesso em: 15 set. 2018. Dispontvel em htpsfhitly/OTPCL9. Acesso em: 15 set. 2018, Disponivel em https:{fhitly/2C12rGB, Acesso em: 15 set. 2018, Dispontvel em httpsfhitly/2VUTele. Acesso em: 15 set. 2018. Dispontvel em hitps:/iglo.bo/2HbNZ9K. 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Somados a cobertura jornalistica, que nos vefculos wadicionais ganhou viés favorével a proposta governmental, chega-se a ‘uma ideosfera midistica francamente favorével a realizacao das reformas. CONSIDERACOES FINAIS O discurso promocional, com o intuito de estabelecer percepedes positivas acerca de marcas ou ideias dos anunciantes, sejam corporagdes, organizacdes ou governos, anscende o uso tradicional da publicidade, eminentemente comercial, e foca intensivamente na propaganda, cujo discurso tem viés mais ideolégico e superestrutural, presente em contetidos variados que interferem na percepcao social da realidade. O uso de publicidade e propaganda como ferramenta de influéncia social por parte de movimentos organizados (Brexid; campanha politica onald Trump) ou comunicagéo governamental (reforma da Previdencia) demonstra a ampla gama de influencia da comunicagao promocional, que intermedeia 0 discurso entre publicidade e propaganda conforme os objetivos comunicacionais, possibilitando uma abordagem holistica ¢ integrada entre diferentes plataformas midiaticas. A tecnologia potencializa a difusio de contetides direcionados a diferentes segmentos da sociedade de modo a amplificar a anuéncia as propostas defendidas pela publicidade e propaganda, a fim de tornar 0s discursos maleaveis a diferentes audiéncias, reiterando valores que permeiam os setores da sociedade ¢ os levam a confluir a aceitacéo das mensagens promocionais de seus patrocinadores No estudo de caso apresentado sobre a reforma da Previdencia, mesclam-se 0s interesses ideoldgicos e econdmicos com a desregulamentagio de leis previdenciarias e trabalhistas que tendem a reduzir o deficit publico pelo aumento do tempo de contribuicao por parte dos trabalhadores e pelo corte de direitos sob 0 pretexto de desburocratizagao fiscal para empresas de modo a se adequar ao ideario do Consenso de Washington e potencializar a atragao de investimentos internacionais ao pais, na esperanga de que isto resulte em desenvolvimento para a nacao. O estudo também indica que nao importa o segmento da sociedade, nao importa o ramo de atividade e nao importa a relacao factual com a verdade. Cada vez mais, o que importa é difundir o discurso adequado as diferentes audiéncias para cativé-las e tornélas receptivas as proposicées expostas por anunciantes, cada vez mais capacitados com o uso de algoritmos que caracterizam segmentos sociais e tornam o uso de big data e inteligéncia artificial os tiltimos fronts da persuasao humana. E nitida a teia de relagdes entre predilegdes corporativas, governamentais e midiaticas quanto a sua sinergia para forjar uma percepcao publica da realidade consonante a seus valores e interesses, 2019 jan jun; WOIS-25. 23 AsyovA.00 DE CASTRO AZEVEDO JUNOR 24 SIGNOS DO CONSUMO de modo a potencializar o retorno de investimentos em termos de capital financeiro (empresas anunciantes e veiculos de communicagao) ou politicos (governos); perpetuando, assim, o poder restrito a uma oligarquia global que representa uma infima parcela da sociedade, mas que a conduz de modo a eternizar o starus quo em detrimento dos interesses majoritarios e, ainda assim, conta com a sofrega anuéncia destes que, embora excluidos, dao o suporte necessario a manutencao do sistema gracas a incorporagao dos valores simbolicos difundidos, dentre outras formas listadas neste artigo, pela publicidade e propaganda. REFERENCIAS ADORNO, T. W. A industria cultural. In: COHN, G. (Org); FERNANDES, F (Coord). 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Acesso em: 5 out. 2017, 2019 jan fun; WC)1S-25. 25 http //dx.do\.org/10.11606 issn 1924-5057 Ip26-33 EM NOME DO DIREITO DE SER CRIANGA: SIGNOS O PAPEL VANGUARDISTA DO MARCO | MA LEGAL DA PRIMEIRA INFANCIA NO COMBATE A PRESSAO CONSUMISTA E do consumo A COMUNICACAO MERCADOLOGICA artigo In the name of the right to be a child: the avant-guard role of the legal framework for early childhood in combating consumer pressure and marketing communication En nombre del derecho de ser nifio: el papel vanguardista del marco legal de la primera infancia en el combate a la presion consumista y la comunicacion mercadolégica Paulo Nassar Universidade de Séo Paulo, Séo Paulo, Brasil. Profossor titular da Escola de Comunicacoose Artes da Universidade de Sao Paulo (ECAVUSP), CCoordenador do Grupo de Estudos do Novas Narrativas (GENN-ECA/USP).Dirotor Presidente da Associacdo Brasiora de Comunicacdo Empresarial (Aber) E-maipaulonassar@usp.be Ana Claudia Pompeu Torezan Andreucci Universidade de So Paulo, Séo Paulo, Brasil os-douteranda pela ECAVUSP sob 2 superviszo do pr Paulo Nassar. Professora das Fac de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM) ¢ Universidade So Judas Tadeu (USI, Participante do GENN e coordenadora do grupo de pesauisa CiaDirMack Ditetas da Crianca do vor E-maitanatorezangandrouc Adolescente no Séc RESUMO Este trabalho tem por objetivo analisar 0 papel vanguardista da Lei ne 18.257/2016, denominada de Marco Legal da Primeira Infancia e que disciplina mecanismos de regulacao da exposicae precoce 4 comunicacao mercadologica rosso consumista as criancas de zero a sels anos de idade PALAVRAS-CHAVE Vulnerabilidade, Pressdo consumista, Marco legal da primeira infancia, Vanguardismo legisiativo, ABSTRACT This study aims to analyze the avant-garde role of Law 13,257/2016 called the Legal Framework for Early Childhood, which regulates mechanisms of early exposure tomarketing communication and consumer prassure for children from 0 to years old, KEYWORDS Vulnerability, Consumer pressure, Legal framework for early childhood. Legislative vanguardism, ‘Como citar este arti NASSAR P; ANDREUCCI, A C.P.T. Em nome do cteito de ser crianca: 0 panel vanquardista do Marco Lega da primeira inféncia no combate pressao consumista ea comunicarao mercadolégica, Si do Consuino,Sa0 Paulo, Tf. 26-35 jan jun. 2019 ‘Submetido: 50 se. 2012 0 ‘Aprovader 20 2 2082 2019 jan/iun.; WM)26-33 26 Eb NOME Do DREITO DE SER CRANGA: 0 PAPEL VANGUARDSTA DO MARCO LEGAL DA PROAERA INFANCIA NO COMBATE A PRESSED CONGIMISTAF A COMUMCACAO MERCADOLOGICA RESUMEN El presente trabajo tiene por objetivo analizar el papel vanguardista de la Ley 18.257/2016 denominada de Marco Legal de la Primera Infancia, y que disciplina mecanismos de regulacién de la exposicién precoz a la comiunicacidn mercadolégica yy presién consumista a los nifios de a 6 anos de edad PALABRAS CLAVE Vulnerabilidad, Presion consumista, Marco legal de la primera infancia, Vanguardismo legislativo, ERA UMA VEZ UM MARCO LEGAL PARA A RECONSTRUCAO DE UMA INFANCIA LIVRE DE CONSUMISMO NO BRASIL Vocé deve saber que nao hé nada mais elevado, mais forte, mais saudavel e bom para a vida no futuro que uma boa lembranca, especialmente uma boa lembranca da infancia, do lar. As pessoas falam muito em educagdo, mas wna boa e sagrada lembranca, preservada da infancia, talvec seja a methor educagdo. Se um homem carrega consigo muitas destas lembrancas durante sua vida, ele estard seguro até o fim de seus dias, ¢ quando se tem apenas boas lembrancas no coragéo, isto pode, as vezes, ser 0 meio de nos salvar. (Dostoiévski, 2009, p. 85) Vanguarda. Inovacao. Pioneirismo. Estes wés vocabulos dao o tom exato para adjetivar a novel legislagdo brasileira que recebeu o nome de Marco Legal da Primeira Infancia, Lei n° 13.257/2016. Referida lei assumiu ‘compromisso da prioridade absoluta na articulagio de politicas publicas para os seus destinatdrios, criangas de zero a seis anos de idade, os quais ‘ousamos chamar de “sujeitos de direito em grau superlativo” tamanha a sua importéncia no novo contexto brasileiro. Primeira norma dessa categoria na América Latina, 0 Marco Legal da Primeira Infancia alterou o tratamento destinado a crianga nos primeiros seis anos de vida e, especialmente, frisou o reconhecimento dessa crianga como “cidada”, buscando a articulago entre os entes federativos ¢ a participagio solidaria entre Estado, familia e sociedade, bem como propugnando que o fundamento constitucional da cidadania vai além da configuragio do sujeito como portador de capacidade eleitoral, mas como aquele que influi nas decisées politicas. A novel legislagéo sublinha os 72 meses iniciais de vida, ou seja, de zero a seis anos, como um momento nao apenas de extrema relevancia para o desenvolvimento infantil, mas também como um marco inicial para o desenvolvimento pleno do ser humano. A partir de um conjunto de ages voltadas a promocao do desenvolvimento infantil, desde a concepgao, até os seis anos de idade, 0 ‘Marco Legal da Primeira Infancia se estabelece incluindo todas as esferas da Federagdo com a participagao da sociedade, e prevé a criagao de politicas, planos, programas e servigos que visam garantir o desenvolvimento integral de mais de 20 milhoes de brasileiros nessa faixa etaria Pesquisas cientificas contemporaneas revelam que os investimentos em politicas piblicas para a primeira infancia sao os mais eficazes que trazem mais retorno, pois apresentam intimeros resultados para 0 presente e para a formacao futura da crianca e da sociedade. Nos primeiros anos de vida, o desenvolvimento fisico, psicolégico e emocional da crianga ganha contornos para transformagées em grandes dimensdes. Cabe destacar que a trajetdria do Marco Legal do Primeira Infancia tem inicio no ano de 2011 coma criagao da Frente Parlamentar da Primeira Infancia, integrada por mais de 200 parlamentares e que depois se agremion a Rede Nacional Primeira Infancia (RNPD, articulagao nacional 2019 jan fun. 1O).26-33. 27 Pawo NASSAR £ ANA CLAUDIA Powe ToREZAN ANDREUCCL 28 SIGNOS DO CONSUMO de organizagoes da sociedade civil, do governo, do setor privado, de outras redes e de organizagdes multilaterais que atuam, direta ou indiretamente, pela promogao e garantia dos direitos da primeira infancia. Salienta-se que 23 parlamentares da Frente participaram de um curso de lideranga executiva em primeira infancia, em Harvard. Em dezembro de 2013 foi apresentado 0 Projeto de Lei (PL) da Primeira Infancia, Lei n° 6,998/2013, e em fevereiro foi criada a Comissao Especial da Primeira Infancia com o objetivo de analisar o projeto. Deve ser ressaltado que 0 projeto recebeu intimeras sugestdes oriundas de participagao social, bem como de especialistas nos temas em debates pelo Brasil afora. O Estatuto da Primeira Infancia destaca o caréter vital de se atribuir a devida atengao aos primeiros seis anos de vida da crianga, reforgando medidas para consolidar 0 conceito aqui explanado, que conceitua a crianga no papel de cidadao, apto a influenciar os rumos do pats, desenvolvimento histérico que agora recebe novos detalhamentos pela sociedade e pela cultura juridica. A preocupacao mais pujante se refere nao somente a disponibilizar os alicerces fundamentais para a criacao de um ser humano cidadao, consciente de seu papel social e do seu direito de demandar o Estado naquilo que for oponivel, como também da possibilidade marcante de oferecer a crianga o direito mais inerente acla, que ¢ 0 direito de ter uma infancia saudavel, desenvolvendo seu aprendizado, sim, mas vivenciando essa época, brineando e convivendo harmonicamente com a familia e com a sociedade, uma simbiose importante para sua formagio mais apropriada. © que deve ser ressaltado € que o estatuto eleva a crianga a categoria de cidada, coadunando com os instrumentos internacionais de protecdo a crianga ¢ com o nosso texto constitucional, ressaltando a sua caracteristica de sujeito de direito, o que significa taté-la como um individuo atuante na esfera publica e sujeita a protegdo do Estado, no presente caso, prioritéria. Reconhecer a crianga como prioridade € um passo importante, especialmente para a consolidacéio do modelo responsavel para fazer com que sejam cumpridos de forma efetiva os objetivos e fundamentos da Republica Federativa propostos no texto constitucional vigente. A cidadania se imp6e mediante o reconhecimento des direitos fundamentais, da erradicagao da pobreza, da redugo das desigualdades e que deve ter inicio, literalmente, no bergo. (ANDREUCCI; JUNQUEIRA, 2018). A cidadania e 0 protagonismo da crianga sao as novas narrativas expostas no Marco Legal da Primeira Infancia e, para tanto, a novel legislagdo declara como formas de violéncia as pressdes consumistas e a comunicacao mercadolégica, merecendo toda uma engrenagem articulada de medidas juridicas, bem como a criagao de politicas publicas a fim de evita-las. RESPEITO, EU SOU CRIANCA! PRESSOES CONSUMISTAS COMO FORMA DE VIOLENCIA AO PUBLICO INFANTIL Entre as grandes conquistas trazidas pelo Marco Legal da Primeira Infancia, nosso olhar reflexivo esta voltado A analise do direito A nao exposigdo precoce de natureza mercadolégica, considerada aqui na novel legislagao como uma espécie de violencia. Art. 5® Constituem areas prioritérias para as politicas ptiblicas para a primeira infancia a satide, a alimentacao e a nutricao, a educacao Eb NOME Do DREITO DE SER CRANGA: 0 PAPEL VANGUARDSTA DO MARCO LEGAL DA PROAERA INFANCIA NO COMBATE A PRESSED CONGIMISTAF A COMUMCACAO MERCADOLOGICA infantil, a convivéncia familiar e comunitéria, a assisténcia social & familia da erianga, a cultura, o brincar e o lazer, 0 espaco ¢ o meio ambiente, bem como a protecéo contra toda forma de violencia e de presséo consumista, a prevencao de acidentes e a adocao de medidas que evitem a exposi¢ao precoce & comunicacao mercadolégica (BRASIL, 2016) O termo “sociedade de consumo” foi utilizado pela primeira vez por Jean Baudrillard (1993), que enfocava a sociedade contemporanea como alvo e vitima de uma nova meta de vida, a meta do consumo, Seria uma sociedade voltada tinica e exclusivamente para a aquisicéo e o descarte de bens como foco gestor da atuagao dos individuos. Atrelado a isto, para que as vendas se tornassem céleres, combinou-se o ingrediente do fomento de “pseudonecessidades” nas pessoas, traduzindo como a imputacao do “ter” sobre o “ser”, ou seja, estar inclufdo nessa sociedade. “Pertencer” pressupde ser um bor consumidor que compra com rapidez e descarta com a mesma velocidade. A sociedade de consumo € umas das faces do capitalismo, incentivador da produgao seriada, em larga escala e de produtos programados para pouco durar, fendmeno que se denomina obsolescéncia programada. Correlata a toda esta estrutura esté condicionada a notabilidade do cidadao a aquisicao e descarte de produtos. Cumpre dizer que a posse de objetos ultrapassados € vista como sindnimo de estupidez pelos demais membros da sociedade. Nao basta apenas consumir e ter, preciso consumir cada vez mais em um diminuto espectro de tempo. Durabilidade, perenidade sdo conceitos que nao mais se coadunam com a sociedade de consumo, rarefeita e que se liquidifica com extrema facilidade (BAUMAN, 2008, p. 78). Zygmunt Bauman considera o consumo desenfreado como uma forma de consciéncia coletiva e nicleo da vivencia coletiva humana, os quais siio 0s responsaveis por recepcionar também os novos sujeitos de direito, bebés ainda, quando ingressam neste mundo existencial e declara que “tio logo aprendem a ler, ou talvez bem antes, a ‘dependéncia das compras’ se estabelece nas criangas. [..] Numa sociedade de consumidores, todo mundo precisa ser, deve ser e tem que ser um consumidor por vocagao” (bidem, p. 73).Na chamada sociedade pos: moderna, consumismo, felicidade e angiistia se confundem e se consomem na medida em que aceleridade na aquisigéo, a felicidade instantéinea e a angiistia sequencial sio elementos correlatos para a manutencao do sistema: © consumismo se torna uma economia do engano, em que a felicidade esta associada a um volume e intensidade de desejos sempre crescentes, gerando assim, uma constante insatisfacao. Se por um lado 6 evidente que as mercadorias na sociedade de consumidores sao planejadas para pouco durar, gerando — se a necessidade de novos produtos serem constantemente adquiridos, por outro também. as relacdes sociais adentram nessa légica de efemeridade e de durabilidade instantanea. (GALIAZZI; LEITE, 2013, p. 204) Resta enfatizar que a publicidade dirigida a crianga colabora na formagao de conceitos e em protagonismos voltados ao consumo, englobando a crenca de uma sociedade alicercada no “ter” ena exclusao daqueles que nao possuem bens materiais destacados como objetos de desejo. Tal exclusao é responsavel pela exposicao a violéncia enquanto da infancia como alvo de consumo ¢ nao como uma crianga cidada 2019 jan /jun.; 1KD:26-38 29 Pawo NASSAR £ ANA CLAUDIA Powe ToREZAN ANDREUCCL 30 SIGNOS DO CONSUMO em fase de desenvolvimento (OLMOS, 2018, p. 34). No mesmo sentido, dé-se a construgao dos primeiros elementos da subjetividade infantil, a qual estaré adstrita aos estimulos do mundo material atuando como manipuladores dos significantes sociais. A assimilagao consumista se da de forma répida e a aquisigao dos bens materiais passa a ser nao apenas um objeto em si mesmo, mas sim a sua representatividade social pautada no bindmio inclusao/exclusao e assim “a boneca Z nao é apenas um brinquedo, mas assume um lugar de signo, é desejada por todas as criangas; té-la significa ter status, ser admirada, respeitada e invejada por outros” (PEREIRA et al., 2005, p. 106). Presses consumistas também se fazem constantes na aparigao frenética de intimeros portais dirigidos ao publico infantil e alojados na internet, por meio das atividades lidicas, coloridas, games e jogos, as memdrias das criancas ainda em fase de desenvolvimento vao gravando e associando marcas, personagens e produtos como estimulos positivos (KARAGEORGIADIS; TOLEDO, 2014, p. 73).Divertimento, excitacéo e experiéncias de aprendizado sao falas recorrentes de criancas para usar a midia de forma abundante e sem reservas, exercendo sobre elas experiéncias de aprendizado para a inclusdo e acompanhamento dos acontecimentos (FEILITZEN; BUCHT, 2002, p. 79). Diante desta efervescéncia de possibilidades, a crenga na midia como educadora ganha espaco ¢ a nogao de manipulagéo no discurso passa longe dos holofotes. As contribuigdes no campo da formacao cognitiva desenvolvidas por Piaget séo alicerces notaveis para a compreensdo do desenvolvimento infantil na chamada primeirfssima infancia; consumir pode ser um ato politico e refletido, mas pode também tazer graves consequencias para a consolidagao da personalidade infantil, na medida em que as pressdes mercadologicas podem ser consideradas como formas de violénci cabendo citar: A precocidade das interacées entre a crianca e seu ambiente sociocultural ¢ evidenciada na assimilagdo da cultura do consumo, pela infaincia, desse contexto, em que ela se vé bastante exposta aos estimulos das propagandas e ao bombardeio feito pelo mercado atrav das midias. Essa faixa etaria marca a insergao da crianga no mundo do consumismo devido ao seu egocentrismo, ao surgimento da linguagem € as primeiras relagées sociais, de forma que tais particularidades atuam em harmonia com as estratégias das empresas para atingir 0 ptiblico infantil. (MOURA; VIANA; LOYOLA, 2013, p. 475) A exposigdio excessiva aos apelos de consumo, o ter como base para uma existéncia “feliz” se traduz como senha para ingresso e pertencimento ao mundo pés-moderno, responsavel por rotular e etiquetar sociamente as pessoas. Para o atingimento desta meta cultural “ter” igual a “ser”, anteriormente vinculada apenas aos adultos, todas as formas para se chegar la séo permitidas, e até mesmo as que causem danos para sie para outrem. Ha uma massificacao dos sentimentos negativos entre eles, desejos infinitos de consumir, inveja, ira, tristeza, anguistia, e até mesmo a ocorréncia de deslizes crimindgenas. Hé a disseminacao da cultura do conflito nas relagées sociais, entre eles, na escola, na familia e na comunidade A outra face do consumo ¢ a exclusao, que gera a violéncia por nao pertencer e por buscar meios de pertencer, com a consequente discriminagao e hierarquizagaio de grupos sociais (CAMURRA, 2010) exercendo ainda maior influéncia e manipulagao em criangas da primeira Eb NOME Do DREITO DE SER CRANGA: 0 PAPEL VANGUARDSTA DO MARCO LEGAL DA PROAERA INFANCIA NO COMBATE A PRESSED CONGIMISTAF A COMUMCACAO MERCADOLOGICA infancia que nao possuem as reais dimensdes da nogao de pertencimento e cidadania politica, pasando a desejar o ter como forma de serem enxergadas pela sociedade. Ha uma inversao absoluta na nogéo de cidadania, posto que temas correlatos ao consumismo, tais como aquisicao e exclusées, vao sendo apresentados da pior maneira possivel ao puiblico infantil, “coloridos” pelo desejo e pela retorica da sedugao, ratificando o mercado produtor de necessidades e desejos incessantes. No momento em que a sociedade elege como valor determinadas situagdes, por exemplo a ascensao social, 0 lucro, o enriquecimento a qualquer prego, sem propiciar uma correspondente oportunidade de se alcangar esses objetivos, cria-se um estado de anomia no qual o cidadao néo consegue, por vias legais, atender aquilo que os outros esperam dele. 0 espago para a convivéncia ea politizagao necessario ao processo reflexivo dos individuos de uma sociedade foi substituido nos dias atuais pelos passeios aos grandes centros de compras e deve ser urgentemente ressignificado, afirmando a necessidade de se orientar as criangas para que possam desenvolver suas capacidades criticas e nao acreditem piamente em tudo o que veem como verdades absolutas, visto que a proibi¢do ao acesso a este meio de comunicagao néo consegue evitar esta influencia (DETTENBORN, 2002, p. 37). Mas ¢ possivel fazer diferente e o proprio Marco Legal da Primeira Infancia em sua articulagao dogmatica oferece uma rede conjugada de esforcos para a alteracdo deste estado de coisas, ao centrar como temas nucleares o direito a brincar e o papel da comunicagéo para o desenvolvimento infantil. O direito a brincar, previsto no art. 17 (BRASIL, 2016), pode ser vislumbrado como um direito humano indeclinavel, na medida em que objetiva o desenvolvimento das subjetividades infantis. Do mesmo modo, quis o legislador que a Unio, 03 estados, 0 Distrito Federal e os municipios fossem responsaveis pela criagio de espagos lidicos que propiciassem o hem-estar, o exercicio da criatividade em locais publicos e privados em ambientes livres e seguros nas comunidades. Estabelece de maneira vanguardista algo que pode parecer paradoxal, o retorno as origens, a construgéo de narrativas significadas do brincar como lazer, alteridade, vivéncia comunitéria e a construg&o de uma infancia livre de consumismo. Finalmente, a comunicacéo imbuida de sua principal missio de informar para a ética e aproximagéo ganha dimensées diferenciadas no Marco Legal da Primeira Infancia, pois Ihe cabe o papel precipuo de transmitir contetidos relatives aqueles que nominames no inicio do presente artigo de “sujeitos de direito em grau superlativo”, Erigida a categoria de direito humano fundamental, o papel da comunicagao na novel legislacao é singular e plural, tinico e dotado de intimeras possibilidades para trazer informagSes consistentes e formativas para a sociedade brasileira, em especial no universo do consumo. Assim, a comunicagao ética se impoe sobre a comunicacao pressionadora e mercadolégica CONSIDERACGES FINAIS: PONTILHANDO O CAMINHO PARA A APROVACAO DO MARCO REGULATORIO DA PROPAGANDA INFANTIL Prestes a completar a maioridade no ano de 2019. Este é o status do PL n° 5.921/2001, de autoria do deputado federal Luiz Carlos Hauly, em discussao na Camara hé dezessete anos com vistas a implementar © Marco Regulatorio da Propaganda Infantil no Brasil. Ha um forte 2019 jan jun. WOY:26-33 3 Pawo NASSAR £ ANA CLAUDIA Powe ToREZAN ANDREUCCL 32 SIGNOS DO CONSUMO lobby econdmico para a sua nao aprovacao, eis 4 raz40 dos anos que se acumulam no Parlamento para a sua nao aprovacao. Argumentos tais como liberdade econémica e censura sao recorrentemente wtilizados por aqueles avessos & regulamentagao. Por outro lado, associagdes, sociedade civil organizada, Ministério Publico e institutos - com destaque para o Instituto Alana - tém tido ganhos representativos no tema. Entre eles, a Resolugao n? 163/2004 do Conselho Nacional dos Direitos da Crianga e do Adolescente (Conanda), dispondo sobre a abusividade do direcionamento de publicidade e de comunicacao mercadolégica a crianga e ao adolescente. Resta dizer que, desde a edigéo da resolugao no ano de 2004, o conceito de comunicagao mercadolégica - agora também disciplinado pelo Marco Legal da Primeira Infancia - ja se fazia presente e pode ser compreendido como: Art 1°: § 1° Por ‘comunicacdo mercadolégica’ entende-se toda e qualquer atividade de comunicacdo comercial, inclusive publicidade, para a divulgacdo de produtos, servigos, marcas ¢ empresas independentemente do suporte, da midia ou do meio utilizado. § 2° A comunicagéo mercadolégica abrange, dentre outras ferramentas, amincios impressos, comerciais televisivos, spots de radio, banners e paginas na internet, embalagens, promogées, merchandising, ages por meio de shows e apresentagdes e disposigéio dos produtos nos pontos de vendas. (BRASIL, 2014) Ainda, o tema vem sendo fortemente judicializado no Brasil, com destaque para a paradigmatica decisdo do Superior Tribunal de Justica, coibindo a venda casada, a utilizagdo de mascotes e o uso de técnicas persuasivas nas propagandas destinadas as criangas ¢ adolescentes em caso envolvendo a Empresa Alimenticia Bauducco (NASSAR; ANDREUCCL, 2016). A partir de tal moldura urge destacar a necessidade imperiosa do debate e da conscientizagio da sociedade para o tema, que nao se restringe ao ambito da familia, mas traz em seu delineamento a solidariedade na atuagao sobre a problematica. Finalmente, resta dizer que o consumo deve ser visto como um ato politico e de solidariedade, e pressupée ser ensinado em seu carater iransdisciplinar. Nao é apenas problema da familia, mas sim dos atores sociais conjugados nos termos do art. 227 da Carta Magna de 1988 (BRASIL, 1988), e o querer do constituinte se fez em forma de principio da cooperacao, impondo a familia, sociedade e Estado os deveres em relacao ao publico infantojuvenil. A solidariedade € um dos corolarios da sociedade brasileira, tendo por vocacao constitucional a construgdo de uma sociedade livre, justa, desenvolvida, com a promagao do bem de todos ¢ apartamento das desigualdades regionais. A solidariedade para o estado democratico de direito brasileiro deve ser concebida como sinénimo de desenvolvimento, justica social, bem-estar e paz. O vocabulo solidariedade nos remete & concepgao de ligacao entre pessoas, responsabilidade mtitua, congregacao de interesses individuais para o desenvolvimento comum, vinculagao de individuos em prol de um bem maior, communhao de responsabilidades, e que se estabelece de maneira cabal no Estatuto da Primeira Infancia Por arremate, resta clara a vocacao vanguardiista do Marco Legey@) Primeira Infancia Brasileiro ~ reforca-se 0 seu ineditismo na A. Eb NOME Do DREITO DE SER CRANGA: 0 PAPEL VANGUARDSTA DO MARCO LEGAL DA PROAERA INFANCIA NO COMBATE A PRESSED CONGIMISTAF & COMUNRCAO MERCADOLOGICA, Latina - na busca dogmética pela reconstrugao de conceitos que ‘operam como biissolas para a compreenséo do ser crianga em todo 0 seu desenvolvimento. Tal estatuto dignifica a categoria infancia como ambiéncia privilegiada do comeso da vida, desenvolvimento ¢ inicio da humanidade. REFERENCIAS ‘ANDREUCCI, A.C. P.T; JUNQUEIRA, M. A Criancas vsives edieito 8 voz como diteto humana fundamental: contributos juridico-socials do marco legal da primeira intancia para o desanho de poltcas piblicas partcipativas no Brasil. Cadernos de Dereito Actual, Santiago de Compostela. 7p. 29-308, 2018, BAUDRILLARD, J. O sistema alos objetos. Sa0 Paulo: Perspectiva, 1995. BAUMAN, Z. Vida para consumo: a transformagéi de pessoas em mercadoria. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008. BRASIL. [Constituicso (1988)]. Constitur-do da Republica Federativa do Brasil Brasil ‘Senado Federal, 1988, BRASIL. Conselhio Nacional dos Direitos da Crianca @ do Adolescente. Resolucao n* 163, de 15 de marco de 2014. Dispée sobre a abusividade do direcionamento de publicidad e de ccomuinicacao mercadol6gica & crianca e 30 adolescante. Diario Ofcia! aa Uniso, Brasilia, DF, 4 abr. 2014. Disponivel em: http://bity/2VYSurt. Acesso em: 17 jan. 2019. BRASIL. Lei n* 15.257, de 8 de marco de 2016, Disp6e sobre as politicas pUblicas para a primeira infancia e altera a Lei n® 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Crianca ¢ do Adolescente), 0 Decreto-Lei n® 3.699, de 3 de outubro de 1941 (Céigo de Processo Penal), 2 Consolidacdo das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei n® $452, de I? de aio de 1943, a Lei nf 11770, de 9 de setemibro de 2008, ea Lein* 12.662, de 5 de junho de 2012. Diério Oficial da Uniao, Brasilia, DF, 9 mar. 2016. Disponivel em: htto./bitiy/2G0r2Jo. ‘Acesso em: 16 jan. 2018. CAMURRA, L. Osujeito contempordneo ¢ a mealacao docente na cultura da mila. 95 f 2010. Dissertago (Mestrado em Educago) - Universidade Estadual de Maring3, Maringa, 2010. DETTENBORN. S. A. A influéncia da micia no comportamento das criancas. Rarbarsi Santa Cruz do Sul, n. 16, p. 33-38, jan /jun. 2002. DOSTOIEVSKI,F. Os irmaos Karamazov. 2. ed. $20 Paulo: Editora 34, 2009, FEILITZEN, C. V; BUCHT, C. Pergpectivas sobre a crianca e 2 miaia. 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E-mailcarios_sanchotene@yahoo.combr RESUMO Busca-se analisar 05 processos de interacao entre igroja fidis a partir do blog do bispo Edir Macedo, lider da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), Por meio das possibilidades interacionais da chamada web 2, permite-se a0s fidis internautas coparticigarem dessa plataforma digital, oferecendo a eles a oportunidade de manifestarem suas religiosidades em carater multimidia, A partir da teoria geral dos sistemas e das contribuicdes de Niklas Luhmann, examina-se o funcionamento das interacdes de abertura e fechamento operacional que se d3o no biog. Entre os resultados, compreendemos a existéncia de novas formas de relacbes entre religiao efidts PALAVRAS-CHAVE Midiatizacao da religiao, Interacao, Sistema. ABSTRACT Examines the processes of interaction between church and religious believers from the blog of Bishop Edir Macedo, leader of the Universal Church of the Kingdom of God (UCKG). Through the interactional possibilities of the so-called ‘web 20, it allows religious internet users to participate this digital platform, offering them the opportunity to express their religiosity in multimedia character. From the ‘general systems theory and the contributions of Niklas Luhmann, the functioning of the interactions of opening and closing operating that occur in the blog are analyzed. ‘Among the results, we understand the existence of new forms of relations between roligion and believers, KEYWORDS Mediatization of Religion, Interaction, System. RESUMEN Se busca analizar los procesos de interaccion entre iglesia y fieles a partir del blog de! obispo Edir Macedo, lider de la Iglesia Universal del Reino de Dios (IURD). Por medio de las posibilidades interactivas dela liamada web 20, se permite alos fieles internautas coparticipar de esa plataforma digital, ofreciéndoles la oportunidad de Imanifestar sus religiasidades en caracter multimedia. A partir de la teoria general de los, sistemas y delas contribuciones de Niklas Lunmann, s@ examina ol funcionamiento de las interacciones de apertura y cierre aperativo que se dan en el blog. Entra los resultados, ‘comprendemos la existencia de nuevas formas de relaciones entre religion y fieles. PALABRAS CLAVE Midiatizacion do la religion, Interaccion, Sistema, ‘Como citar este artis SANCHOTENE, C. Relig @o 20: interapsas processuatsesistémicas no blog do bspo Edi Macedo, Signos do Consumo, S30 Paul, v 1, 34-46, jan jun 2018, do consumo artigo ‘Submetido: 5 sao. 2018 ‘Aprovader 202 2032 2019 jan fun. NC)34-45 34

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