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3 OPAPEL DO ESTAGIO NOS CURSOS DEFORMACAO DE PROFESSORES: farina Arantes Fazenda* Pensar 0 papel do estigio nos cursos de formagao de professores tem sido para mim uma tarefa complicada, pois sempre acabo me defrontando com questées altamente contradit6rias e paralelas, que impede até uma certa linearidade na ordenagdo do pensamento. Por uiro lado, acredito que seria um ato de profunda omissio de minha parte deixar de registrar, nem que fosse caoticamente, algumas das Principais inquietagdes que envolveram meu “pensar estgio” nos oito ‘anos consecutivos em que trabalhei no curso de Pedagogia da PUC-SP, ¢, em particular, neste momento, em que fui convidada pela Cenp (Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagégicas de Sio Paulo) para assessorar 0 Cefam (Centro Especi do Magistério) nas questdes Entretanto devo confessar que muitas das indagacdes que permeavam meu trabalho de professora de Pritica de Ensino ¢ > rofessora titular da Pontificia Universidade Catlica de Sto Pano (PUC-SP) eda Unik | prion de ansino 0 stgio superisioaco 47 os no curso de Pedagogia vém sendo ampliadas que tenho me dedicado a orientagao de sses de doutorado no curso de pés-graduagio em Supervisio e Curriculo da PUC-SP. Somente a distincia fisica e temporal da graduago e dos cursos de formacao de professores de 2* grau permitiu-me constatar a necessidade da em nos voltarmos mais para esses cursos, percepeio decorrente de contato constante com o pessoal egresso desses cursos. ‘Trabalhando hé trés anos com alunos da pOs-graduacdo, percebo as principais dificuldades por eles encontradas quanto & organizagio do Embora relatem, na maior parte das vezes, simples c6pia de trechos das enciclopédias. ‘O aluno que foi “copista” ou preenchedor de questionérios, fechado na escola de I? grau, passa & escola de 2° grau sem ter nem mesmo 0s rudimentos basicos para resumir. Resumir acaba significando tornar pequeno e, tudo se passa como se a grande problemética da compreensio de um texto se reduzisse a questdes de tamanho (diminuir ou ampliar)2 Ele resume mal, porqué no aprendeu como resumir, e responde laconicamente a0s questionstios do livro didatico, porque foi condicionado pensar numa tinica direco, Além disso, esse aluno pode passar oito na escola basica, sem conhecer a biblioteca da escola, sem conhecer pensar que nao o de seus professores, sem conhecer um outro undo que no o que Ihe & mostrado e s6 conhecer das suas habilidades 48 apis Edtora esse sentido, essas questdes, que podem parecer & primeira vista de ordem puramente estrutural, parecem-me essenciais para encaminhar as reflexdes de quem procura pensar a formacio do educador. condigdes de projetar seu pr6prio trabalho, de avaliar seu desempenho e de contribuir para a construgo do conhecimento de seus alunos, A partir dessas reflexdes sobre 0s efeitos possiveis de uma escola de 1° grau, reporto-me as minhas aulas de Prética de Ensino e Estégio no curso de Pedagogia,¢ as questdes aqui colocadas assumem uma dimensa0 as aulas de Prética de Estégio no 3° ano de Jo de que durante os d 10s haviam estad 1a escola de I? grau, num tinico sentido, o de cumprir tarefas: resumo de ci de livros, trabalhos em, grupo, semindrios improvisados. Leituras realizadas visando a um resumo, sem que -m por que resumir. A todo momento, percebia-se a ras repetidas, textos indicados de lementar de apoio. iar 0 3° ano, esse aluno € retirado da hibemnaglo tedrica e convidado a realizar uma leitura da vida, do c la de aula do 1° grau, enfim, uma leitura da pritica. Mas como é possfvel realizar uma ca adequada? E as aulas de 1a nova forma de hibemagdo ~ cconformes a um roteiro previamente treinados a ver numa elaborado, placidame entrardo em contato com o trabalho docente, Em ingressam num terceiro perfodo de hibe aposentadoria. O professor entra no m ‘confuso com uma realidade que desconhece, despreparado teoricamente para enfrenti-la, malpago, mal-orientado, ¢ niio incentivado, acaba por ‘estagnar-se, hiberna-se em seu trabalho e af permanece até o final. ‘A pron do ensine © 0 estigio superisonado 49 [Neste ponto de minhas divagagSes, éoportuno voltarmos ao objetivo deste texto: pensar 0 papel do Estigio nos cursos de formagio de professores. Dadas todas as inquietagdes aqui expostas e outras mais ‘surgindo, minha resposta € ainda uma diivida: E pos sem pensar num projeto coletivo maior pi formacio do educador? Melhor explicando: pensar o Estigio desvinculado de um pensar a Diddtica, a Pratica de Ensino, a Filosofia, a Sociologia e as outras disciplinas que compdem os cursos de formagaio do educador & admitir ou que o Estégio seja “o salvador do ou que ele seja t30 pouco importante que pode ter tratamento diferen resumir o saber sem para que ou do aluno de pés-gi precisava construir uma monografia sem ter claro aonde pret Foi com essa mesma perplexidade que me lembro de terenfrentado © desafio de assumir, pela primeira vez, as fungdes de professora de Prética de Ensino e orientadora de Estégios no curso de Pedagogia. Felizmente percebi a tempo que ‘meu, que os alunos também a partilhavam, Declarei, entio, mirtha posi¢a0, sobre a questio Estagio lancei a proposi¢ao de construirmos juntos uma forma propria de “pensar e fazer estégio”. jei com o que aprendera a fazer em meus anos de contato com igaro fendmeno situado naquela sala de aula. A pergunta a da investigacio, foi: Quem eram aqueles frequentavam aquele curso naquele ano (1979)? Que fai pretendiam realizar? Era uma classe de 50 alunos muito “ret ji havia “dispensado” dois professores de Estigio antes de mim. Permiti a eles uma catarse inicial, em que os motivos foram, um a um, sendo cenunciados; pareceu-me que as razdes da rebeldia eram menos de ordem ‘do... Era, pois, a classe ha (no poderia realizar o trabalho que iria propor se a turma fosse muito acomodada!). Iniciei com eles um processo de autoconhecimento, uma pesquisa do “si-mesmo”, nfo 86 para que pudessem melhor compreender 0 outro, mas, sobretudo, para que gradativamente fossem construindo sua 50 Papin Eaiora identidade de educador.’ Para tanto, utilizei as técnicas de resgate de meméria e hist6ria de vida, analisando as contradigées, os desejos, os sucessos e as omissdes de cada um. A forma de construgio dessa hist6ria de vida foi revelando gradativamente aspectos até entio nao revelados, guardados na meméria, as vezes, desde a dessa historia, acompanhei a descrigao dela em t €, quanto mais investigava, melhor o fendmen revelava. No final do processo, pudemos confrontar nossas vida, suas confluéncias, suas individualidades e entdo teorizar sobre elas, com 0s elementos que a teoria anteriormente vista no curso de Pedagogia permitia. Mas a teoria era pobre; entio havia a necessidade de pesquisar “arremedos” dessa teoria. S6 assim os alunos puderam perceber o real papel de uma teoria ~ aquela suficientemente necesséria para ser instigadora ou esclarecedora. Como o leitor péde acompanhar, a marca impressa no inicio de ‘minhas aulas foi a mesma revelada em outras intervengées de minha pela pesquisa. Comegar, portanto, a inves uma pesquisa, sobre quem a ha eficiente de tratar essas disciplinas denominadas Pi Estagio Supervisionado. Cada vez tornava-se mais que a tarefa de ambas as disciplinas era comum no proposta do curso de Pedagogia, por mim considerada pri ilise da pritica educat Caminhando na descrigdo dessa experiéncia vivida por mim nas iinas Pratica e Estégio — curso de Pedagogia ~ encontramos, apos esse momento inicial da “pesquisa do cu”, um segundo momento igualmente importante: a pesquisa do nés. De certa forma, 0 objetivo € ‘0 mesmo do inicio, apenas desdobrando-se: a construgio da identidade 3. Enire es estudiosos da questio da construglo da identidade encontramos Antonio Ciampa, Carlos Byington e outros. A piitica de ensino @ 0 exiigio supenicionado 61 do educador, que necessariamente passa pela construgio da identidade pessoal e gradativamente se vai encaminhando para a busca da iden coletiva, Decidimos iniciar a pe de Pedagogia, ja passou por ito anos de escola basica e no minimo mais 1ués de 2° grau; tentamos rever com ele as priticas bem-sucedidas de seus ex-professores e no que elas resultavam. Esse processo de pensar a pratica foi adquirindo diferente colorido em todos esses anos, ie, em 1987, realizei, com meus alunos do 4° ano de a sobre a l6gica que presidi lho dos professores bem-sucedidos do ‘curso de Pedagogia da PUC-SP, nas di s Prtica de Ensino, Didatica, Historia da EducagZo, Sociologia da Educag sofia da Educagao elementos de sucesso nessas priticas, de forma que, quando anal € adaptados, pudessem dar subsfdios para a construcio de planos de curso para ¢ssas disciplinas. Nao houve muito problema na escolha dos inham ainda presentes na meméria a imagem e 0 8 que mais marcaram 0 curso, 10s ento para um levantamento comum de questoes imos inicialmente aos professores-sujeitos da pesquisa. Nossa intengio era perceber a de seu trabalho. A aplicagéio do ‘questionirio foi precedida de um estudo criterioso sobre formulagao de questiongrio, no qual o tamanho e a intencionalidade das questées precisam. estar perfeitamente adequados ao objeto primordial da pesquisa. Obedecidos aos critérios para aplicagao (inclusive com um questionério- ialmente formulado e posteriormente revisto), os questiondrios foram encaminhados. Em sua devolugio, uma outra frustrago: respostas, as, pouco representativas da sala de aula habitada pelos alunos-pesquisadores. Decidimos parti, entdo, para uma entrevista 52 Papi Ecitors aberta, gravada ¢ transcrita, em que dados nio revelados da histéria da vida desses professores ter acess aos dads qe bse sujeitos re rigueza de detalhes e envolvimento que ficou até proceder Tinhamos entdo trés elementos para anélise: sim, a tragar o perfil daquele professor de Didatica, or exemplo, 0 que 0 tomava bem-sucedido. De repente, descobrimos, relacionavam com os cursos que frequentava, com a forma que buscava - as té mareadas cera a da Juta por um conhecer mais e mel diregdes. Sucesso € condigao passam mesmo veio. Os resultados dessa pesquisa sucedidos no curso de Pedagogia possibilitaram-nos a construcio de planos de curso para as disciplinas da Habilitagao Espectfica do Magistério (HEM), no final do 1® semestre de 1987. Entretanto esse trabalho de {niciagao A pesquisa aqui relatado requer muita disponibilidade de tempo, € essa tarefa $6 foi possfvel por se tratar de um grupo pequeno ~ 20 alunos. O germe da pesquisa plantado no 1®semestre de 1987 permaneceu € floresceu no decorer do 2* semestre. Construido o plano de curso, desde a justificagio até a escolha dos procedimentos, 0 enfoque ‘metodolégico, os pressupastos tedricos c bibliografia, houve a necessidade de confronti-lo com outros planos de curso utilizados pelos professores da rede paiblica de 2° grau (HEM), Partimos, ento, para uma nova pesquisa, nos do curso de Pedagogia foram treinados para observar as salas de aula e realizar um. registro da pritica dos professores de Didtica do HEM. Os dados eram [A préica do ensino © 0 estigio supervisionado 5% registrados cursivamente e entregues semanalmente a mim para avaliag a forma de registro (eu procurava nessa avaliagdo clarificar aspect igdo © salientar os que se apresentavam bem itamos que uma descrigHo bentfeita de um fendmeno bem-sucedida; nesse sentido, esti idado com a verificagdo desses registros. coletados todos os dados desses dados, utilizando 0 inal do primero més, le curto perfodo, Procedems referencial te6rico selecionado Decorrido quase um ano da pesquisa ~ a Giltima etapa precisava ser transposta: a elaboracio do pesquisa, Por opeiio do grupo, decidiu-se que um relat . pois tanto os dados arrolados quanto as an: realizadas careciam de tratamento cientifico mais adequado. Optou-se 1 transformar as conclusées da pesqui tentando public4- forma de descrever as questdes da formagio do educador de 2° grau. ‘Analisando atualmente essa pr la no curso de Pedagogia durante um ano ~ 1987 — verifico que foi possivel porque no ano anterior ~ 1986 — dez desses vinte alunos haviam trabalhado comigo num de pesquisa sobre a Pré-Escola, que culminou na produgio Té pronto, Seu Lobo? Didéticalpratica na Pré-Escola.* Pensar 0 Estigio como pesquisa, volto a afirmar, de nada valeria \déssemos pensi-lo numa dimensio maior: a de um projeto ivo de formacao do educador. “4. Arespeito dessa consrugio col «a didética, pp. 63-14. consulta, de véros autores, Um desafto para 54 Papius Eats Passados dois anos dessa experiéncia, fui convidada pela Cenp fico de Formagdo e Estigio. Por 10 valor de um projeto col 0s a0 nosso traball desde o de ordem pi . penso que é dever da ‘ processo vivido na Universidade, mas |i iniciado a outros que possam cot Bibliografia FAZENDA, L.C.A. (org.). Metodologia da pesquisa e 1. Sao Paulo, Cortez, 1989. VN.A.A. Um desafio para a diddtica. Sa0 Paulo, Loyola, 1988, [A prea do encino @ 0 estigo supervsionado 56

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