Você está na página 1de 4
cronologia Cae LY O imperativo categorico sua amiga Maria, que ao. Cristina vem ter consigo a Maria. Se lhe disser a Sabe que a Cristina quer matar a acabou de deixar sentada ao bale e pergunta-lhe se sabe onde esta verdade, a Cristina encontrara a Maria e maté-la-4. Se mentir e lhe disser que viu a Maria sair ha cinco minutos, a Cristina seguira outra pista, e isso permitira que a Maria se escape. O que deve fazer? Contar a verdade, ou contar uma mentira? a parecer uma tolice. As consequéncias de dizer a aro que deveria menti ~ poderd até pensar que ma muito boa causa. Mas segundo para alguns, 0 maior filésofo Perguntar tal coisa chez verdade sto nefastas. Ech seria uma mentira bondosa, por Immanuel Kant — um dos mais influentes ¢, dos dltimos 300 anos — nd é essa.a resposta certa, Para Kant, nao mentir é tim prinefpio fundamental da moralidade, ou eimperativo categorico»: algo i fuser, incondicionalmente e independentemente das redvel insisténcia no dever, a par da nogao do fandamenta, é a pedra de toque da ética que somos forgados consequéncias. Essa impl imperativo categérico que kantiana. Os imperativos hipotético e categé6rico Para explicar o que é ‘a por nos dizer o que ele néio 6, um imperativo categ6rico, Kant comes: comparando-o com um imperativo hipotético. Suponhamos que eu the digo 0 que deve fazer proferindo uma ordem (um imperativo): «Pare de fumar!» Implicitamente, ha uma série de condigdes que cu poderia anexar a este rae lo wae nfo quiser dar cabo da sua satide», por exemplo, ou «se no ‘Avregra de ouro ile 73 As conseyvéncias nao importam A ética de Kant, 0 paradigmatico sistema dever moral é efectivamente o de dizer a i deontoldgico da moralidade, baseado no verdade em todas as ocasiées, mesmo a dever, teve uma enorme influéncia nos uma assassina. Com a sua inabalavel | posteriores tedricos da ética, que primazia do dever pelo dever, desenvolveram avidamente as ideias dele, independentemente de quaisquer | ou reagiram energicamente a elas. Foi consequéncias, previstas ou imprevistas, I apresentado a Kant o cere do caso de Kant traca um caminho que se opde o mais Cristina e Maria, ¢ ele ateve-se possivel ao dos sistemas consequencialistas imperturbavelmente as suas armas da moralidade. categéricas, insistindo em que o nosso quiser desperdicar 0 seu dinheiro». Evidentemente que, se vocé nfo se preocupar com a sua satide nem com o seu dinheiro, tal ordem nao tem peso algum e voce nao tem de a acatar. Com um imperativo categérico, pelo contrario, nfo hé condigdes em anexo, implicitas ou explicitas. «Nao minta!» e «Nao mate pessoas!» so injungSes que nao constituem hipéteses acerca de algum objectivo ou desejo que vocé possa ter ou no e tém de ser acatadas por uma questo de dever, de forma absoluta e incondicional. Contrariamente a um imperativo hipotético, um imperativo categérico deste tipo constitui uma lei moral. Do ponto de vista de Kant, por detras de cada acgao ha uma regra, ou maxima, de conduta que a fundamenta. No entanto, tais maximas podem ter a forma de imperativos categéricos sem se qualificarem como leis morais, caso nao consigam passar um teste, que em si mesmo é uma forma suprema e culminante do imperativo categérico: Age somente de acordo com uma maxima que pudesses ao mesmo tempo querer tornar lei universal. ‘A guilhotina de Hume O imperative categorico 74 Por outras palavras, uma ac¢do s6 é moralmente permissivel se concordar ccom uma regra que possamos aplicar universalmente e consistentemente a nds mesmos e aos outros (trata-se, na verdade, de uma variante da regra de outo; ver pagina 76). Por exemplo, poderiamos propor como maxima que € permissfvel mentir. Mas mentir € poss{vel somente quando exista (algum nivel de) verdade — se toda a gente mentisse o tempo todo, ninguém acteditaria em ninguém ~ e por esse motivo seria contraproducente e, em certo sentido irracional, pretender que mentir se tomnasse uma lei universal. Do mesmo modo, roubar pressupée um contexto de propriedade, mas 0 conceito de propriedade ruiria por inteiro se todos roubassem; romper as promessas feitas pressupSe uma instituigdo geralmente aceite com as promessas — manté-las; e assim por diante. O requisito da universalidade elimina pois certos tipos de conduta por motivos légicos, mas parecem existir muitos outros que poderfamos O fFilbsofo meditative Hé muito que Kant é jocosamente retratado como 0 fildsofo absoluto e arquetipico, entrincheirado na sua torre de marfim embrenhado em profundas meditagdes acerca da obscura metafisica teuténica. Essa imagem 6 realgada pelo facto de Kant ter passado toda a sua vida em Kénigsberg, sem, ao que parece, alguma vez ter posto pé fora da sua cidade natal. Os tons sombrios dessa imagem séo acentuados pela patente austeridade da sua filosofia e pela dificuldade de entender a linguagem em que esta é apresentada. De facto, Kant desvia-se por vezes do seu caminho para oferecer munigdes a quem 0 ataca; um dos casos mais notdveis é 0 das suas elucubragées acerca do amor sexual, as quais (como indicou 0 filésofo Simon Blackburn) mais se assemelham a descrigéo de uma violagao colectiva: Tomado em si mesmo, é uma degradagao da natureza humana; pois logo que @ pessoa se torna um objecto de apetite para uma ‘outra, todos os motivos do relacionamento moral deixam de funcionar, jé que enquanto objecto de apetite para um outro a pessoa se transforma numa coisa ¢ pode ser tratada e usada como tal por qualquer um. Seja como for, embora exista algum motivo para tal caricatura, 0 veredicto final deverd ser 0 de que Kant 6 um dos pensadores mais originais e influentes na historia da filosofia; alguém cuja marca enorme e indelével se pode encontrar tanto na ética moderna, como na epistemologia ena metafisica. vi) universalizar, embora nao gostassemos de os considerar morais. @Duas coisas «Cuiclar sempre dos seus prsprios interesses», «Romper oven o espirito bromessas sempre que possivel sem prejudicara insttuisio ds 9mm admirag&o e romessa» ~ néio parece haver nada de inconsistente ou de P E : = espanto sempre inracional em se pretender que tais proposigdes se tornassem i crescentes, leis universais. Como afasta entéio Kant esse perigo? , 7 to mais Autonomia e raz4o pura As exigéncias do imperativo entemente categ6rico impéem uma estrutura racional A ética kantiana, @ Persistentemente mas a tarefa passa entilo a ser a de passar do esquema logico ao Teflectimos nelas: contetido moral efectivo — para explicar como pode a «razio OS G6uS estrelados pura», sem suporte empirico, informar e dirigir a vontadede no alto e a lei moral um agente moral. A resposta esté no valor inerente ao proprio em. nés.9 agenciamento moral - 0 valor baseado no «tinico principio supremo da moraldade>,a iberdade eu sutonomiade una MAlMtanwel Kant, 1788 vontade que obedece as leis que impde a si mesma. A suprema importincia atribuida aos agentes auténomos ¢ livres reflecte-se na segunda grande formulacao do imperativo categérico: Age de modo que trates sempre a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de um outro, nunca unicamente como um meio, ‘mas sempre ao mesmo tempo como um fim. Logo que se reconhega o inestimavel valor do nosso proprio agenciamento moral, é necessério estender esse respeito ao agenciamento de outros. Tratar os outros simplesmente como meios, de forma a promover os nossos proprios interesses, artufna ou destréi o agenciamento deles, pelo que as maximas que sejam egofstas ou danosas para outros contrariam esta formulagao do imperativo categérico e niio se qualificam como leis morais. No fundo, reconhece-se aqui a existéncia de direitos bisicos que cabem as pessoas em virtude da sua humanidade, e que nao podem ser suplantados: | uma faceta profundamente humana e esclarecida da ética kantiana. | a ideia resumida

Você também pode gostar