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Coleção TECLIN - Tecnologias, Culturas e Linguagens

O objetivo primordial da coleção TECLIN - Tecnologias, Culturas e


Linguagens é incentivar, desenvolver e contribuir com o estudo e a
pesquisa sobre tecnologias, culturas e linguagens no âmbito das Artes,
da Comunicação e da Educação, a partir de uma visão indisciplinar e
mestiça, para compreender o uso das tecnologias e das linguagens na
construção de sentidos nas mais diversas manifestações artísticas, além
de interpretar as possíveis articulações das tecnologias e das linguagens
com a educação e com os processos de ensino e aprendizagem de
línguas – em seus mais diversos contextos.

Conselho editorial

Prof. Dr. Fábio Marques de Souza (UEPB)


Profa. Dra. María Isabel Pozzo (IRICE-Conicet-UNR, Argentina)
Profa. Dra. Marta Lúcia Cabrera Kfouri-Kaneoya (UNESP)

Comitê científico da obra

Prof. Dr. Aluizio Lendl Bezerra (UECE)


Profa. Dra. Cristiane Navarrete Tolomei (UFMA)
Profa. Dra. Eliete Correia dos Santos (UEPB)
Prof. Dr. Ivo Di Camargo Junior (SME-Ribeirão Preto-SP)
Prof. Dr. Maged Talaat Mohamed Ahmed Elgebaly (Aswan University)
Profa. Dra. Maria Manuela Pinto (Universidade do Porto)
Profa. Dra. Mona Mohamad Hawi (USP)
Prof. Dr. Nefatalin Gonçalves Neto (UFRPE)
Profa. Dra. Rosa Ana Martín Vegas (USAL, Espanha)

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Fábio Marques de Souza
Lígia Beatriz Carvalho de Almeida
Moabe Breno Ferreira Costa
(Organizadores)

LINGUAGEM, CIBERCULTURA
E EDUCOMUNICAÇÃO:
GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DO CONHECIMENTO
POR MEIO DE AMBIENTES DIGITAIS

TECLIN/UEPB/CNPq

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Copyright © dos autores
Todos os direitos garantidos. Qualquer parte desta obra pode ser
reproduzida ou transmitida ou arquivada, desde que levados em
conta os direitos dos autores.

Fábio Marques de Souza; Lígia Beatriz Carvalho de Almeida; Moabe


Breno Ferreira Costa (Organizadores).

Linguagem, cibercultura e educomunicação: gestão da


informação e do conhecimento por meio de ambientes digitais. São
Paulo: Mentes Abertas, 2019, 164 p.

ISBN 978-65-80266-17-3

1. Tecnologias. 2. Culturas. 3. Linguagens. 4. Educomunicação.


5.Cibercultura. I. Título.
CDD 370

Capa:
Elite Estúdio Criativo.

Revisão:
Jean de Medeiros Azevedo.

www.mentesabertas.com.br
2019

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO 7
Os organizadores

PREFÁCIO 9
Claudemir Viana

EDUCAÇÃO PARA A MÍDIA COMO 11


ESTRATÉGIA DE APRENDIZAGEM ATIVA
EM AMBIENTE DIGITAL
Mariana Pícaro Cerigatto

DESAFÍOS EN EL DISEÑO DE UN SEMINARIO 31


VIRTUAL DE ESCRITURA DE TESIS DE
POSGRADO
María Isabel Pozzo

A CONTRIBUIÇÃO DA GESTÃO 49
EDUCOMUNICATIVA DO CONHECIMENTO
PARA A CONSOLIDAÇÃO DE CIDADES
EDUCADORAS
Lígia Beatriz Carvalho de Almeida
Iasmin Araújo Bandeira Mendes
Claviano Nascimento de Sousa

CIBERCULTURA E EDUCOMUNICAÇÃO: 71
UMA PROPOSTA PARA A GESTÃO DE
COMUNICAÇÃO DO PRIMEIRO SETOR
Moabe Breno Ferreira Costa

5
O DESENVOLVIMENTO DE UM APLICATIVO 97
MÓVEL NO CONTEXTO DO TELETANDEM
Aldemi Severino da Silva
Aliny Vieira Carneiro
Fábio Marques de Souza

NET-ATIVISMO E AS NOVAS NARRATIVAS 111


NO CONTEXTO DA COMUNICAÇÃO EM
REDE
Marina Magalhães

LYRIC VIDEO - A CONSONÂNCIA SONORA E 143


VISUAL
William Takenobu Akamine

SOBRE OS AUTORES 162

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APRESENTAÇÃO

Esta obra reúne um conjunto trabalhos que abordam


a gestão da informação e do conhecimento por meio de
ambientes digitais, considerando as demandas da
contemporaneidade. Assim, apresentam-se
problematizações na relação entre linguagem, cultura,
tecnologia, informação, cidadania e educação.
Em cada texto, há reflexões a respeito da apropriação
das tecnologias digitais na gestão da informação e do
conhecimento no contexto das organizações
contemporâneas e das comunidades locais. Nesse sentido,
as discussões consideram processos comunicacionais que
ocorrem a partir de plataformas digitais, levando em conta
aspectos políticos, econômicos, sociais e tecnológicos que
fomentam convergências culturais, produções
transmídias e participações significativas de
interlocutores envolvidos nos processos.
Os autores estabelecem relações entre técnicas de
produção e modos de recepção, destacando as diversas
linguagens e formas interativas que constituem a
comunicação na ambiência digital e como elas refletem as
condições atuais do comportamento do ser humano. A
discussão proposta por Mariana Pícaro Cerigatto, por
exemplo, envolve as metodologias de aprendizagem
desenvolvidas com a incorporação das TDIC no cotidiano
escolar.
Em seguida, María Isabel Pozzo contextualiza a
realização de seminários virtuais no processo produtivo
na pós-graduação. Na sequência, Lígia Beatriz Carvalho
de Almeida, Iasmin Araújo Bandeira Mendes e Claviano
Nascimento de Sousa trazem um debate sobre Cidades

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Educadoras, contextualizando a ideia a partir de oficinas
educomunicativas. Os autores descrevem como a
educomunicação é um processo de produção de
conhecimento compatível com a atual cultura digital.
Nessa mesma direção, Moabe Breno Ferreira Costa discute
a gestão da comunicação no primeiro setor a partir de
perspectivas da educomunicação e da cultura da
convergência e participação significativa.
Já a narrativa construída por Aldemi Severino da
Silva, Aliny Vieira Carneiro e Fábio Marques de Souza
descreve o planejamento, concepção, desenvolvimento,
implantação, testagem e aprimoramento de um aplicativo
para dispositivos móveis junto ao processo de ensino-
aprendizagem colaborativo e intercultural de línguas. Por
sua vez, processos colaborativos e interculturais são
também temáticas do construto de Marina Magalhães. A
pesquisadora discute a ideia de net-ativismo, destacando
movimentos sociais como 15-M (Indignados), da Espanha
e as Jornadas de Junho de 2013, no Brasil.
Por fim, na perspectiva mercadológica, William
Takenobu Akamine discute o conceito de Lyric Vídeo para
difusão da indústria fonográfica, considerando, entretanto
a produção de sentidos a partir da exibição simultânea de
música, clipe e letra em uma única plataforma de mídia.

Boa leitura!

Fábio Marques de Souza


Lígia Beatriz Carvalho de Almeida
Moabe Breno Ferreira Costa
(Organizadores)

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PREFÁCIO

Estamos numa sociedade da informação, do


conhecimento. Essa ideia já é tão divulgada que não nos
damos conta sobre as inúmeras dimensões que isso tem e
como nos atinge diretamente em nosso cotidiano. As
transformações provocadas pelo avanço nas últimas
décadas das tecnologias de informação e comunicação em
nossas ações são enormes, e não são apenas
comportamentais. São também novas formas de ser, de
pensar e atuar individual e coletivamente.
Este fenômeno vem sendo objeto de muitos estudos,
pesquisas e produção de conhecimento há muito tempo, e
em diversas áreas do saber. Aliado a isso, nossas formas
de usar as novas tecnologias para satisfazer nossas
necessidades, antigas e novas, também são parte desse
saber que, no entanto, requer lapidação para que
superemos o uso meramente pragmático e imediatista das
novas tecnologias.
Nesta obra, o leitor é convidado a aprofundar suas
reflexões sobre a presença das novas tecnologias de
informação e comunicação em nosso cotidiano, com a
preocupação de potencializar a aprendizagem dos
usuários para a educação midiática, crítica, criativa e
cidadã. A partir da perspectiva da interface entre
comunicação e educação, os trabalhos aqui apresentados
trazem oportunidades de conhecer novas experiências
neste sentido.
A consciência sobre a importância de se promover
processos educativos para uma atuação fortalecida no
contexto cibercultural remete-nos a novas perspectivas
quanto aos processos de ensino e aprendizagem, como

9
com os processos de comunicação e participação ativa na
contemporaneidade. Portanto, é de extrema importância a
sistematização de conhecimentos a respeito, qualificados
pela práxis e pela reflexão crítica.
Nas experiências aqui apresentadas, a presença da
mídia e das tecnologias de informação e comunicação são
constantes, seja com a preocupação de entender melhor
sobre os processos educativos em contextos mediados por
elas, seja com a preocupação de se apropriar das mesmas
como exercício do direito de atuar numa cidadania plena,
ampliando para novas práticas de mobilização social e
defesa dos direitos humanos.
Com a leitura, será possível conhecer diferentes
abordagens sobre a questão da educação midiática,
destacando-se a perspectiva do paradigma latino-
americano da educomunicação, que apresenta proposta
de novos modelos de práticas comunicativas visando a
promoção de ecossistemas comunicativos mais abertos,
democráticos e múltiplos. Em convergência a isso, a
mídia-educação também está presente como perspectiva
de abordagem científica sobre processos e fenômenos
culturais contemporâneos.
Os organizadores e autores desta obra oferecem,
assim, contribuições de grande valia para o debate social e
científico a propósito dos novos contextos culturais e
sociais em que estamos imersos, visando potencializar o
uso crítico, participativo e criativo das novas tecnologias
de informação e comunicação.
Boa leitura!
Prof. Dr. Claudemir Edson Viana, Coordenador e
professor da Licenciatura em Educomunicação na ECA – USP.
Julho de 2019.

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EDUCAÇÃO PARA A MÍDIA COMO ESTRATÉGIA
DE APRENDIZAGEM ATIVA EM AMBIENTE
DIGITAL

Mariana Pícaro Cerigatto

As aprendizagens ativas representam, hoje, as novas


concepções pedagógicas do século XXI 1 . Contrapondo
abordagens que colocavam o aluno em posição passiva no
processo de ensino e aprendizagem, sendo que o professor
era o centro, e a escola focava o “ensinar”, o ideário da
Escola Nova veio para ultrapassar limitações
apresentadas pelo ensino tradicional. O aluno passa a ser
o centro do processo e valoriza-se seu protagonismo
durante a aprendizagem.
As metodologias ativas, quando bem aplicadas,
podem garantir processos de aprendizagem mais
significativos, que vão ao encontro de princípios sobre o
que significa ser alfabetizado nos dias de hoje. Para a
UNESCO 2 (ROBINSON, 2005), a alfabetização
contemporânea deve se desenvolver em contextos em
mutação, e envolve uma atitude “contínua de
aprendizagem ao permitir que os indivíduos alcancem
seus objetivos, desenvolvam conhecimento e potencial

1 Percebe-se que as concepções das metodologias ativas coincidem com as


habilidades previstas para o século XXI, pontuadas por Jenkins et al. (2006) na
publicação “Confronting the Challenges of Participatory Culture: Media
Education for the 21st Century”, disponível em inglês no link
https://www.macfound.org/media/article_pdfs/JENKINS_WHITE_PAPER.PD
F.
2 Trecho do documento “Aspects of literacy assessment: topics and issues from

the UNESCO Expert Meeting”. Disponível em: http://unesdoc.unesco.org/


images/0014/001401/140125eo.pdf

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para participar ativamente na comunidade e na sociedade
como um todo”. De acordo com Mc Garry (1991), o
momento é de se repensar na alfabetização como
“multialfabetização”, o valor dela de acordo com novos
desafios; propor uma alfabetização que esteja de acordo
com o momento histórico e ansiedades contemporâneas.
Para o autor, a alfabetização não é só necessária para o
desenvolvimento individual, mas também coletivo.
Considerando a alfabetização midiática, ou educação
para a mídia, educomunicação ou então media literacy,
uma premissa importante para o desenvolvimento de
sociedades capazes de ler novos textos trazidos pelas
novas mídias, se engajar junto a essas mídias com vistas à
autoexpressão e cidadania, se faz importante o trabalho
com as linguagens midiáticas em sala de aula. A educação
para a mídia é ainda necessária para a plena inclusão
digital de sujeitos ativos, que saibam ler e gerar conteúdo
de forma crítica e reflexiva no cenário digital e de cultura
participativa3.
Além de fazer a relação entre mídia e educação, se faz
importante discorrer sobre as metodologias possíveis que
viabilizam o trabalho com a educação para a mídia.
No cenário em que as tecnologias digitais são
protagonistas, o objetivo deste texto é apresentar técnicas
para o efetivo trabalho com a mídia e educação, fazendo

3 “Cultura participativa” é uma expressão usada pelo teórico Henry Jenkins


(2009) para fazer referência à maneira como a sociedade contemporânea adere e
interage com a internet, dentro de uma nova relação com os meios de
comunicação, que modifica os papéis de produtores e consumidores de
informação, em um contexto em que a produção de conhecimento e a
disseminação de informações e ideias tornou-se uma realidade recorrente.

12
referência a recursos do ambiente online que podem
facilitar o trabalho com a educação, considerando a
concepção contemporânea de metodologia ativa de
aprendizagem.

1 Abordagens didáticas contemporâneas

As experiências com metodologias ativas em sala de


aula – que perpassam desde a educação básica até o ensino
superior – se caracterizam pela “inter-relação entre
educação, cultura, sociedade, política e escola, sendo
desenvolvida[s] por meio de métodos ativos e criativos,
centrados na atividade do aluno com a intenção de
propiciar a aprendizagem” (ALMEIDA, 2017, p. 12). E, por
mais que haja relação entre metodologias ativas com as
tecnologias digitais, essa concepção surge muito antes do
advento das tecnologias digitais de informação e
comunicação (TDICs).
A ideia de aluno na condição de protagonista tem
raízes em uma concepção pedagógica do movimento
denominado Escola Nova, que representou uma marcante
alteração em abordagens que colocavam o aluno em
posição passiva no processo de ensino e aprendizagem.
O movimento Escola Nova teve como principais
pensadores William James, John Dewey e Édouard
Claparède. Essa concepção está ligada ao paradigma
educacional construtivista, que tem como um de seus
principais autores Jean Piaget (1970), que criou a teoria
chamada de Epistemologia Genética ou Teoria
Psicogenética, cuja explicação considera que, desde o seu
nascimento, o indivíduo constrói o conhecimento. Assim,

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formaliza-se uma “concepção construtivista da formação
da inteligência”, a partir das ideias de Piaget.
John Dewey propunha, no escolanovismo, o
“aprender fazendo” que remete a uma postura mais ativa
em experiências educacionais. Dewey (1959) defendeu a
educação significativa dentro de um processo que
reconstrói e reorganiza a experiência do educando.
Integrante a este processo, princípios de iniciativa,
originalidade e cooperação passaram a ser mais
valorizados. No Brasil, os princípios do escolanovismo
fazem referência ao educador Paulo Freire (1996), que
desenvolveu diretrizes norteadoras para uma educação
problematizadora, dialógica, participativa e
conscientizadora.
Atualmente, as abordagens mais atuais valorizam que
os conteúdos escolares possam ser estabelecidos
considerando o que os alunos já sabem, suas experiências
e vivências. Os conteúdos devem partir de situações-
problema, devem trazer mais o cotidiano para a sala de
aula. A aprendizagem ocorre por meio da motivação e
estimulação de problemas para busca de soluções e
respostas aos fenômenos.
Tais abordagens diferem consideravelmente sobre
àquelas que enfatizavam os conteúdos como
conhecimentos acumulados, que tinham que ser
repassados como verdades absolutas, em que o método de
exposição verbal era predominante.
Hoje, em várias situações notamos que as abordagens
tradicionais ainda persistem, o trabalho em colaboração e
cooperação, o desenvolvimento da autonomia dos alunos,
o trabalho a partir de situações-problemas, não é tão fácil
de ser aplicado. As abordagens de aprendizagem ativas

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exigem uma pedagogia dinâmica, em que processo de
ensino e aprendizagem é algo extremamente complexo e
não-linear.
De acordo com Moran (2017), observa-se que há uma
certa predominância de metodologias que ainda seguem
um caráter dedutivo: em um primeiro momento, há a
transmissão do conhecimento do professor, sendo que
depois o aluno deve usar esse conhecimento em situações
mais específicas. A dedução é um processo que se
organiza partindo do conhecimento geral para o
particular, ou seja, parte de um saber considerado
universal, para depois chegar a afirmações e conclusões
mais individuais.
Conforme afirma o autor, este tipo de aprendizagem
por meio da transmissão não está descartado e ainda tem
sua importância. No entanto, a aprendizagem por
questionamento e experimentação pode levar o aprendiz
a uma compreensão mais ampla e profunda. Assim, é
notável a combinação entre metodologias ativas em
contextos híbridos, que unam as vantagens das
metodologias indutivas (que partiriam de conhecimentos
mais particulares e individuais, para depois interagir com
conclusões gerais) e das metodologias dedutivas. Dessa
maneira, “os modelos híbridos procuram equilibrar a
experimentação com a dedução, invertendo a ordem
tradicional: experimentamos, entendemos a teoria e
voltamos para a realidade (indução-dedução, com apoio
docente)” (MORAN, 2017, p. 27-28).
Depois desse exemplo, fica clara a fundamental
importância da combinação entre a aprendizagem ativa e
a aprendizagem híbrida. A aprendizagem ativa preza pelo
papel protagonista do aluno; e a aprendizagem híbrida,

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por sua vez, supõe a flexibilidade, a mistura e
compartilhamento de espaços e tempos, assim como
atividades, materiais, técnicas e tecnologias que compõem
esse processo ativo.
Assim, não significa que o professor precise romper
completamente com suas práticas mais tradicionais, mas
deve combiná-las com novos métodos, que valorizem
aprendizagens por experimentação, em que o aluno cria e
é autor de conteúdos. A combinação entre diferentes
tecnologias (novas e velhas) é também uma forma de
aprendizagem híbrida.
A sala de aula tradicional deve virar um espaço
privilegiado de cocriação, de busca de soluções
empreendedoras, que possibilite estudantes e professores
aprenderem a partir de desafios, jogos, experiências,
situações-problemas, com recursos variados e mais
acessíveis, que podem ser desde tecnologias básicas até as
avançadas (MORAN, 2017). As estratégias devem focar o
estímulo à criatividade, a assumir riscos, tomar decisões
em conjunto, aprender com os colegas, etc.
A seguir, vamos pontuar algumas das principais
estratégias para as aprendizagens ativas (VALENTE,
2017):
A Aprendizagem baseada em projetos (project-based
learning – PBL): A chamada “pedagogia de projetos” já
existe muito antes da vedetização das tecnologias digitais,
uma estratégia de ensino que foca o desenvolvimento de
tarefas, atividades, missões e desafios com a finalidade de
produzir um projeto ou um produto final. É uma
metodologia ativa porque geralmente é desenvolvida de
maneira colaborativa e cooperativa, ao integrar diferentes
conhecimentos dos indivíduos que, juntos, vão atuar para

16
atingir o projeto final. Favorável para trabalhar com
competências como o trabalho em equipe, protagonismo e
pensamento crítico.
A aprendizagem por meio de jogos (game-based
learning – GBL): A aprendizagem baseada em jogos e
brincadeiras também sempre foi uma metodologia ativa, e
que ganha mais evidência ainda com as tecnologias
digitais e o ambiente online. Imersões em ambientes 3D
reforçam o engajamento do indivíduo, que se sente
totalmente dentro daquela situação.
Por meio do jogos, pode-se desenvolver habilidades
socioemocionais, cognitivas e fazer relações, de maneira
lúdica, entre o ambiente do jogo e o que está se
aprendendo. Os alunos são motivados a atingir
determinados objetivos, sozinhos ou em equipes.
O método do caso ou discussão e solução de casos
(teaching case): Partindo de casos reais de organizações ou
situações mais específicas, essa abordagem desenvolve
especialmente a autonomia, a cooperação e a tomada de
decisões. Os alunos devem elaborar soluções e planos de
ação para os problemas centrais de cada caso e situação
particular.
Apesar de serem estratégias bem atuais e
importantes, nos atuais moldes de sala de aula nem
sempre é viável a aplicação dessas abordagens. Conforme
analisa Valente (2017), pode haver dificuldades de
adequar essas estratégias aos conteúdos curriculares
previstos. Além disso, a falta de infraestrutura, muitos
alunos em sala de aula, falta de apoio da gestão escolar,
etc., também são fatores que podem interferir nesta
estratégia.

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Nesta perspectiva, atividades de educomunicação
têm se mostrado muito favoráveis para o trabalho dentro
dessas abordagens, considerando também os recursos e
ferramentas digitais e online, como veremos em uma
proposta mais adiante.

2 A educação para a mídia: referências para o trabalho


pedagógico

Por que trabalhar com os meios de comunicação e as


novas mídias em sala de aula? Atualmente a media literacy
- ou então educomunicação, também conhecida por
alfabetização midiática, competência midiática, educação
para a mídia ou mídia-educação - tem sido compreendida,
segundo Rivoltella (2002), como uma área de saber e de
intervenção; e ainda “como práxis educativa com um
campo metodológico e de intervenção didática; e como
instância de reflexão teórica sobre esta práxis (com
objetivos, metodologias e avaliação) em contexto escolar e
extraescolar” (FANTIN, 2014, p. 49).
A educação para mídia pode ser considerada uma
área de alfabetização emergente, considerando que, no
cenário da digitalização, passamos a conviver mais
diariamente com a cultura midiática. As mídias nos
trazem questões sobre o cotidiano, atuam como fontes de
informação que influenciam a tomada de decisões, são
canais para atividades diárias e de exercícios de cidadania,
e fazem circularem visões de mundo um tanto restritas,
querendo se passar por universais.
Desta maneira, podemos pensar que refletir o papel
dos meios de comunicação em sociedade vai ao encontro
de novas habilidades proclamadas para o século XXI. Se a

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mídia ocupa papel central na vida dos cidadãos, como
fonte de informação e lazer, se faz necessário desenvolver
habilidades para pensar os meios de comunicação de
maneira mais crítica, sabendo identificar as manipulações,
a tomada de partido, os elementos da linguagem midiática
que criam e recortam realidades, etc. Portanto, como
pensar a mídia criticamente, usá-la como meio de
autoexpressão é também uma demanda emergente.
As novas metodologias de ensino e aprendizagem
prezam por abordagens colaborativas, que colocam os
alunos para trabalhar em equipe e buscar soluções para a
resolução de problemas. A inovação, a criatividade e o
pensamento crítico são peças-chaves neste processo.
Neste sentido, e considerando que hoje as abordagens
pedagógicas valorizam o conhecimento do aluno, que
deve ser confrontado com o conhecimento sistematizado,
é importante que se tenha em mente que parte das
tomadas de decisões e soluções de situações-problemas
vão partir de informações e dados que os alunos obtêm
com as mídias – desde comportamentos que aprendem
nos filmes e novelas, até as fontes de notícia que mais
acessam. Assim, consideramos que a habilidade crítica a
ser desenvolvida em mídia e educação ultrapassa o caráter
instrumental de uso das mídias apenas como ferramenta
de reprodução de conteúdo.
As habilidades de produção e transmídia também são
relevantes, visto que hoje as novas mídias ocupam posição
central para a apresentação de novas ideias. Por isso, não
basta saber acessá-las, mas tirar proveito para melhor
expressar o que se pretende.
Vale ressaltar que educomunicação é uma área
interdisciplinar, que se entrelaça a várias disciplinas e

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áreas do saber, sendo que podemos ver referências para o
trabalho com as mídias, tecnologias e suas linguagens na
Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que é
documento norteador para o Ensino Básico. É dada como
competência central a habilidade de utilizar diferentes
linguagens, desde a verbal, assim como a visual e digital;
é posto ainda a competência ligada à compreensão da
utilização de tecnologias digitais de informação e
comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e
ética nas diversas práticas sociais para resolver problemas
e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e
coletiva. Saber ainda identificar fatos, dados e informações
confiáveis é também pontuado.
O trabalho com a educomunicação contempla essas
competências sendo uma área que se preocupa em
desenvolver formas de ensinar e aprender aspectos
relevantes da inserção dos meios de comunicação na
sociedade. Assim, a “literacia em mídia” é o resultado
esperado dessas ações pedagógicas, que envolvem,
necessariamente, a compreensão crítica e a participação
ativa (SIQUEIRA, 2014).
A cultura, a crítica, a criação e a cidadania são os “4C”
da mídia educação, conforme desenvolve Fantin (2014).
Atividades de mídia-educação estão relacionadas com a
cultura, pelo fato de ampliarem e diversificarem os
repertórios culturais; devem considerar habilidades de
leitura crítica (análise, reflexão e avaliação de conteúdos);
mídia-educação também envolve a criação, a criatividade,
a expressão, a comunicação e a construção de
conhecimentos. Por último, temos a associação à
cidadania, já que atividades desta natureza permitem o

20
exercício da cidadania ao se apropriarem criticamente da
mídia.
A educação para a mídia é fundamental para garantir
as necessidades de um novo letramento, e está de acordo
com os anseios das multiliteracias. A educação para a
mídia é algo fundamental nos processos de socialização das
novas gerações, pois a media literacy é uma concepção de
educação ao longo da vida, é imprescindível para o
exercício da cidadania e para a produção, reprodução e
transmissão da cultura (BÉVORT; BELLONI, 2009).

3 As metodologias ativas na educomunicação: uma


proposta

Para o trabalho com a educação para a mídia,


podemos nos nortear por conceitos-chave mais comuns: as
linguagens midiáticas (a maneira como os códigos verbais
e não-verbais e suas convenções de uso dão forma ao teor
das mensagens), a produção (aqui entra a análise do
contexto social e político de exploração e controle das
corporações de mídia – como todo este contexto influencia
na difusão de mensagens), a audiência (como as
características do público influenciam na elaboração de
produtos de mídia e como também o mesmo público é
influenciado) e a representação (conceito que examina a
representação, o recorte de mundo feito sobre um assunto,
a construção de um ponto de vista sobre um assunto)
(BUCKINGHAM, 2003).
Desta forma, podemos estudar a mídia entendendo
como ler suas linguagens que formam a mensagem, a
influência do contexto de produção, da audiência,
chegando à representação, podendo entender criticamente

21
os valores associados, os valores que estão em disputa e a
quais atores sociais, eventos políticos e culturais e como
tais valores estão relacionados à mensagem midiática. Ao
fazer uma análise crítica das mensagens da mídia, nos
afastamos emocionalmente do texto e aprendemos a vê-lo
por dentro e por fora, para depois sustentar uma opinião
informada sobre a mensagem (HALL; WHANNEL, 1964;
BUCKINGHAM, 2003; LUSTED, 1991).
Dessa maneira, conseguimos também engajar
indivíduos mais críticos dentro da cultura midiática, que
sabem como melhor tirar proveito para também produzir
suas próprias mensagens.
Considerando esses eixos de atuação (linguagens
midiáticas, a produção, a audiência e representação),
podemos elencar determinados métodos para ensinar
mídia que procuram passar por etapas de análise, estudo
de caso, entre outros. Buckingham (2003) descreve seis
técnicas pedagógicas mais comuns na área: análise textual,
estudo do contexto, análise de conteúdo, estudo de caso,
tradução (de um livro para um filme, por exemplo) e
simulação-produção.
A seguir, vamos detalhar as técnicas:
Análise Textual: Técnica que consiste em fazer do
familiar, estranho, a fim de encorajar a formação de um
ponto de vista a partir de uma reflexão. Por exemplo:
selecionar uma mensagem midiática, descrever os
elementos que a compõem e estudar as conotações e
associações das intertextualidades.
Análise Contextual: Complementa a análise textual –
estuda a linguagem mais a fundo, a fim de identificar
padrões e valores. Nessa técnica, podemos caracterizar a
audiência idealizada por uma mídia, analisar os recursos

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técnicos e estéticos empregados, recursos para criar apelos
e manter a audiência.
Estudo de Caso: Pode envolver um caso da cultura
midiática para estudo e discussão. Em equipe, os alunos
devem se envolver no processo de produção: como se
define o público-alvo, como se constrói a mensagem, onde
se insere o marketing e publicidade e que respostas gera
na audiência. Por exemplo: identificar quem é o público de
um filme, quais são as expectativas em relação a este filme,
onde ele é anunciado e quais são os argumentos das
pessoas que criticam filmes desse tipo.
Tradução: São as mudanças que ocorrem quando um
conteúdo é tratado em mídias diferentes e em gêneros
diferentes, para audiências diferentes.
Simulação: Trabalho que visa simular situações da
cultura midiática, colocando os alunos para simular o
funcionamento de um jornal, uma agência de marketing,
etc. Identificar personagens, traços físicos,
comportamentais, valores, atitudes. Construir o
personagem oposto a esse e simular os acontecimentos.
Produção: Criar situações-problema da cultura
midiática para serem resolvidas pelos estudantes em
equipes. Os estudantes terão que definir o público-alvo;
orçamento; captação de recursos; atribuição de tarefas;
criar critérios de avaliação, etc.
Considerando estes seis procedimentos, podemos
observar que as técnicas em mídia-educação baseadas em
Buckingham (2003) contemplam princípios muito comuns
presentes em aprendizagens ativas: várias técnicas visam
desenvolver projetos e produtos, o que vai ao encontro do
propósito da “pedagogia de projetos”, do trabalho
colaborativo e em equipe, como a técnica 6 (produção). A

23
aprendizagem por meio de jogos está relacionada na
técnica 5, de simulação, que oportuniza, de forma lúdica,
os estudantes a simularem situações da cultura midiática,
assumindo personagens. A técnica 6 também pode ser
considerada um “game”, a partir de uma situação-
problema em que os alunos precisam cumprir missões e
desafios para alcançar determinados objetivos e
premiações.
O método do caso ou discussão e solução de casos
(teaching case), se relaciona mais especificadamente com
a técnica 3, que se delineia por casos reais da cultura
midiática.
Considerando esses métodos, a seguir apresento uma
proposta para o trabalho com as linguagens midiáticas e
plataformas digitais, dentro da concepção ativa de
aprendizagem e ambiente híbrido de tecnologias, usando
ferramentas que favorecem uma série de habilidades
propícias para o século XXI:

Quadro 1 – Trabalhando com a cultura midiática em sala de aula com o


público jovem.
Atividade de análise textual e contextual
Descrição: Escolher um videoclipe bastante popular
entre adolescentes. Fazer a leitura crítica dos elementos da
mensagem midiática – descrever a linguagem e estudar as
associações feitas. Identificar como cada elemento da
linguagem (letra da música, efeitos, planos e enquadramentos
das cenas, etc.), ou seja, os recursos estéticos e técnicos são
empregados como apelos para cativar o público-alvo.
Para este trabalho, vamos usar a plataforma da web
YouTube, que nos dá acesso a centenas de videoclipes de
maneira gratuita, e permite pausar o vídeo de acordo com as

24
cenas que queremos ver, possibilitando melhorar a qualidade
de imagem do vídeo.
Habilidades desenvolvidas: habilidades ligadas à
reflexão individual, concentração, senso analítico, senso
crítico.
Atividade de estudo de caso e simulação
Descrição: Depois de se familiarizar com a linguagem da
mídia, o professor pode propor aos alunos para que se
dividam em uma equipe e escolham para estudar um caso da
cultura midiática. Eles podem estudar como é a produção de
um videoclipe que já existe, desde sua concepção até o
lançamento na grande indústria midiática e a recepção do
público. Os estudantes podem simular o que estudaram e
colheram de informação, simulando as diversas etapas do
processo produtivo até a receptividade da audiência. Nisso,
eles precisam assumir papéis e personagens, tarefas, traçar
estratégias e simular cenas específicas e reações diferentes.
Nesta atividade os estudantes precisam se engajar em
personagens para atingir objetivos e premiações, e pode ser
apresentado na forma de um teatro em sala de aula. O
professor deve indicar desafios a serem resolvidos em cada
caso.
Aqui, os estudantes podem usar diversas tecnologias e
plataformas para gerir a atividade: acessar a internet por meio
de aparelhos celulares e computadores para busca de
informações sobre o caso específico; podem usar câmeras
digitais filmadoras para gravarem as encenações e
simulações.
Ao assistir as encenações, o professor pode perguntar
aos alunos como se sentiram assumindo determinados
papéis, questionar a atitude e comportamento dos
personagens.
Habilidades desenvolvidas: colaboração, cooperação,
habilidades socioemocionais, tomadas de decisões.
Tradução

25
Descrição: O professor pode pedir aos alunos para
exercitar a capacidade de leitura e produção transmídia ao
pedir para que os alunos transformem a narrativa da música
em outros gêneros textuais, e utilizem mídias diferentes para
isso. Ou seja, pode-se pensar nas mudanças que ocorrem
quando um conteúdo é tratado em mídias diferentes e em
gêneros diferentes, para audiências diferentes.
Aqui o papel das tecnologias digitais se destaca, com o
uso de diferentes linguagens e canais. Pode-se pedir para os
alunos contarem a narrativa da música por meio de animação
e quadrinhos, por exemplo, através de plataformas como o
Powtoon 4 (programa de edição simples de vídeos que usa
animação) e o recurso online Pixton 5 , que permite gerar
quadrinhos online. Pode-se pedir ao aluno para transformar
a narrativa em um infográfico usando a ferramenta
Piktochart6 ou um mesmo um curta-metragem, com gêneros
diferentes, para públicos diferentes.
Habilidades desenvolvidas: multimodalidade,
navegação, leitura e produção transmídia, criatividade.
Produção
Descrição: Criar situações-problema da cultura midiática
para serem resolvidas pelos estudantes em equipes. Eles
podem produzir um novo videoclipe, compondo uma nova
narrativa, com uma nova linguagem. Dentro disso, os
estudantes terão que: roteirização, definir o público-alvo;

4 Powtoon é uma ferramenta gratuita e online disponível em um site que permite a


criação de vídeos animados. É um recurso acessível e fácil de usar, sem ter que fazer
download, pode facilmente ser inserido em contexto escolar. Disponível em:
https://www.powtoon.com/.
5 O Pixton é uma plataforma online, gratuita e também fácil de usar que possibilita a

criação de quadrinhos online. Disponível em: https://www.pixton.com/br/.


6 O Piktochart, com versão gratuita, é um aplicativo voltado para a criação de

infográficos que possibilita aos usuários sem experiência em design criar facilmente
infográficos e visuais usando modelos temáticos. Disponível em:
https://piktochart.com.

26
orçamento; captação de recursos; atribuição de tarefas, etc.
Pode-se recorrer à aprendizagem por meio de jogos, em que
os estudantes são colocados em situações específicas que têm
tempo para conclusão de determinadas etapas, e premiações.
A pedagogia de projetos também é contemplada aqui.
O uso das tecnologias está intrinsecamente ligado a esta
atividade. É importante definir o papel que cada tecnologia
terá aqui – na filmagem do videoclipe, na edição do mesmo,
na captação de imagens, etc. O Whatsapp (aplicativo de
comunicação instantânea muito utilizado em aparelhos
celulares) pode ser usado entre os integrantes para fins de
comunicação enquanto cada um se envolve com uma etapa
do trabalho. É importante que o professor avalie, aqui, como
cada aluno contribuiu e cooperou para o resultado final.
Habilidades desenvolvidas: Criatividade, colaboração,
cooperação, tomada de decisões, pró-atividade.
Fonte: Autora.

Essa proposta alia as aprendizagens ativas a


atividades de educomunicação, que consideram os eixos
antes colocados: linguagens midiáticas, produção,
audiência e representação. Passando por todo esse
processo é que os alunos podem se sentir sujeitos da
indústria midiática e refletir suas funções que assumem
em sociedade, ao estudar o funcionamento, a produção de
dentro para fora, ao se colocar no lugar de quem produz
mídia, e também da audiência.
Todo esse processo recorre a diversas plataformas,
programas e tecnologias digitais, que auxiliam o trabalho
colaborativo, com a multimodalidade e habilidades
transmídia.
A intenção é que se possa adaptar o exemplo dessa
proposta a várias linguagens e produções midiáticas, para

27
diversos públicos. O intuito é mostrar que a
educomunicação é uma área propícia para se trabalhar
com metodologias ativas, a colaboração, a cooperação, a
criatividade, sendo que coloca os alunos como autores de
todo o processo.
As plataformas digitais ajudam tanto a gerir o
trabalho como são meios para a criação de produtos
novos.

4 Considerações finais

O objetivo do texto foi discorrer sobre a importância


de adotar novas concepções de aprendizagem, baseadas
no protagonismo do aluno. Essas abordagens se
desenvolvem ligadas ao movimento da Escola Nova, que
valoriza mais o ato de “aprender” do que o de “ensinar”.
Hoje, é importante que qualquer trabalho pedagógico
busque desenvolver habilidades de criatividade,
cooperação, colaboração, pró-atividade, que são
requeridas para a contemporaneidade. As tecnologias
digitais desse cenário podem ajudar a reforçar o
desenvolvimento dessas habilidades em um panorama de
educação híbrido.
A educação para a mídia é uma área propícia para o
trabalho com o protagonismo, sendo também uma área de
alfabetização emergente, dada a centralidade das mídias e
seus conteúdos na vida de milhares de pessoas.
Sugere-se, ainda, que o trabalho com a mídia como
objeto de estudo esteja bem fundamentado em autores e
referenciais de relevância para a área, como os autores e
seus fundamentos expostos aqui.

28
REFERÊNCIAS

ALMEIDA, M. E. B. Apresentação. In: BACICH, L.; MORAN, J. (Org.).


Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma abordagem
téorico-prática. Porto Alegre: Penso Editora, 2017. p. 7-11.
BÉVORT, E.; BELLONI, M. L. Mídia-Educação: conceitos, história e
perspectivas. Educação e Sociedade, Campinas, v. 30, n. 109, p. 1081-
1102, set./dez. 2009.
BUCKINGHAM, D. Media education: literacy, learning and
contemporary culture. Cambridge: Polity Press, 2003.
DEWEY, J. Democracia e educação. 3. ed. São Paulo: Companhia Editora
Nacional, 1959.
FANTIN, M. Contextos, perspectivas e desafios da mídia-educação no
Brasil. In: ELEÁ, I. (Org.). Agentes e vozes: um panorama da mídia-
educação no Brasil, Portugal e Espanha. Götenburg: Nordicon,
2014. p. 49-57.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática
educativa. Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 1996.
HALL, S.; WHANNEL, P. The popular arts. Londres: Hutchinson
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JENKINS, H. Cultura de convergência. 2. ed. São Paulo: Aleph, 2009.
JENKINS, H. et al. Confronting the Challenges of Participatory Culture:
Media Education For the 21st Century. Chicago: The MacArthur
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LUSTED, D. (Org.) The Media Studies Book: A Guide for Teachers.
Londres: Routledge, 1991.
MC GARRY, K. Literacy, communication and libraries: a study guide.
London: Library Association, 1991.
MORAN, J. Metodologias ativas para uma aprendizagem mais
profunda. In: BACICH, L.; MORAN, J. (Org.). Metodologias ativas
para uma educação inovadora: uma abordagem téorico-prática. Porto
Alegre: Penso Editora, 2017. p. 22-49.
PIAGET, J. A construção do real na criança. Rio de Janeiro: Zahar, 1970.
RIVOLTELLA, P. C. Media education: modelli, esperienze, profi lo
disciplinare. Roma: Carocci, 2002.
ROBINSON, C. Aspects of literacy assessment: topics and issues from the
UNESCO Expert Meeting. Paris: [s. n.], 2005.

29
SIQUEIRA, A. B. de. Mídia-educação a serviço da cidadania: uma
proposta para a formação de assistentes sociais. In: MACEDO, A.
X. N.; PIRES, D. U. B. S.; ANJOS, F. A. (Org.). Educação para a Mídia:
Cadernos de Debate da Classificação Indicativa. Brasília:
Ministério da Justiça/ Secretaria Nacional de Justiça, 2014.
VALENTE, J. A. A sala de aula invertida e a possibilidade do ensino
personalizado: uma experiência com a graduação em midialogia.
In: BACICH, L.; MORAN, J. (Org.). Metodologias ativas para uma
educação inovadora: uma abordagem téorico-prática. Porto Alegre:
Penso Editora, 2017. p. 50-71.

30
DESAFÍOS EN EL DISEÑO DE UN SEMINARIO
VIRTUAL DE ESCRITURA DE TESIS DE POSGRADO

María Isabel Pozzo

La expansión de los estudios de posgrado durante las


últimas décadas se ha dado a escala mundial y América
Latina no quedó exenta a ello (MOLLIS, 2010). Fue
justamente a partir de esta expansión que se requirió la
conformación de un mayor cuerpo de docentes-
investigadores para cubrir tareas inherentes al proceso de
investigación implícito en las carreras de posgrado. Estas
tareas comprenden dirigir tesis, evaluar proyectos,
solicitudes de subsidios y de becas de investigación, dictar
talleres de tesis, integrar jurados de tesis, etc. Así, la
formación de investigadores se volvió un problema en la
agenda universitaria (WAINERMAN, 2011).
En este espectro, los talleres, cursos o seminarios de
escritura de tesis, con sus distintas denominaciones,
apuntan a desplegar estrategias para promover su
finalización, ya que la concreción de una tesis constituye
el mayor reto para aquellos profesionales que deciden
emprender un estudio de posgrado. La implementación
de estos cursos mediados por plataformas –si bien aún
menos frecuente- genera nuevas perspectivas y
oportunidades. Ante todo, la posibilidad de “asistir” a
clase superando las dificultades de coincidir en el espacio
y el tiempo con el dictante y los otros cursantes. Sin
embargo, el formato implica nuevos desafíos y exige
tomar decisiones para llevar a cabo los objetivos,
aprovechando las máximas potencialidades de los medios
digitales.

31
Aunque las investigaciones sobre el dictado de cursos
destinados a la escritura de tesis y a la enseñanza de la
investigación en formatos no presenciales son escasas en
comparación con las presenciales, existen ya algunos
esfuerzos de sistematización. En tal sentido, Álvarez y
Difabio de Anglat (2018) se abocan a la retroalimentación
docente para el aprendizaje en talleres virtuales de
escritura de tesis. Por su parte, Difabio de Anglat y
Álvarez (2017) describen el acompañamiento en línea de
la escritura de posgrado. Otros trabajos se abocan a
aspectos muy específicos de la formación en investigación,
como Camarero et al. (1998), que se dedican a la enseñanza
de la estadística por medio de plataformas.
En este capítulo revisaré algunos de los desafíos
inherentes a la forma de gestionar la información y el
conocimiento en un ambiente digital concebido para
tesistas. Lo haré con ejemplos tomados del diseño de un
Seminario virtual de escritura de tesis de posgrado que
dicto en la Universidad Nacional de Rosario, Argentina.

Características del Seminario virtual tomado como caso


de reflexión

El Seminario de escritura de tesis de posgrado7 está


organizado por el Centro de Información y
Documentación Científica y la Secretaría de Ciencia y
Técnica de la Universidad Nacional de Rosario y está
destinado a tesistas de posgrado (Maestría o Doctorado)

https://www.campusvirtualunr.edu.ar/cursos_carreras/seminario_de_escritura
_de_tesis_de_posgrado.html.

32
de universidades públicas o privadas reconocidas en los
distintos campos de conocimiento.
El dictado se lleva a cabo a través del campus virtual
de dicha casa de altos estudios 8 , que consiste en una
plataforma Moodle dirigida a cursos regulares
(comunidades) y esporádicos (carreras y cursos). Los
recursos y actividades que ofrece son numerosos y
variados; de ellos, los que aquí utilizamos son: página
web, carpeta, tarea y foro, cuyas características se resumen
a continuación. “Foro” permite a los participantes tener
discusiones asincrónicas (no simultáneas), a lo largo de un
período de tiempo. “Carpeta” (folder) permite al profesor
mostrar un número de archivos relacionados dentro de
una sola carpeta, que pueden ser subidos por cualquiera
de los participantes. “Página” alude a la posibilidad del
profesor de crear una página web empleando el editor de
texto e insertando texto, imágenes, sonido, video, enlaces
de internet y de actualizar con facilidad. “Tarea” permite
al profesor recolectar trabajos enviados por los alumnos en
forma individual o como miembros de un equipo con
cualquier tipo de contenido digital (archivos) y
proporcionarles calificaciones y retroalimentación. Dicho
campus aloja también el repositorio institucional.
Más allá de mi extensa trayectoria dictando
seminarios afines, el formato totalmente a distancia me
suscitó numerosos interrogantes que decidí registrar y
luego sistematizar. Por medio de este desarrollo, anhelo
alentar a profesores a explorar los ambientes digitales y
proporcionar herramientas para aquellos profesionales

8 www.campusvirtualunr.edu.ar.

33
que estén considerando emprender una empresa similar.
Específicamente, decisiones que atañen a la gestión de la
información proporcionada por la docente, entendida
como la decisión acerca de la forma de presentarla para la
construcción del conocimiento por parte de los cursantes.
Con este propósito, se pretende aportar a dos líneas de
indagación: la de formación en investigación en general, y
la formación en investigación en modalidades mixtas
(blended) o enteramente en línea (online) en particular.

El soporte escrito

Una de las diferencias propias de un curso no


presencial es la necesidad de plasmar por escrito la
habitual verborragia de la clase presencial. Si bien se
pueden subir filmaciones de las exposiciones (aunque no
muy extensas, según las plataformas, por el peso que
suponen), las explicaciones en soporte escrito son
ineludibles y a su vez un recurso interesante para el
proceso de aprendizaje. Ni siquiera el material de cátedra,
el apunte del profesor, tendiente a compilar el desarrollo
de las clases, es equiparable, ya que estos vienen a
duplicar, a reforzar el lenguaje oral de la clase. En cambio,
en la educación virtual, el relato escrito es el de mayor
presencia. Ahora bien, como dicen Olson y Torrance (1998,
p. 37):

El ser humano natural no es escritor ni lector, sino


hablante y oyente. Esto debe ser tan cierto para nosotros
como lo era hace siete mil años. Desde la perspectiva del
proceso evolutivo, la escritura, en cualquier etapa de su
desarrollo, es un fenómeno advenidizo, un ejercicio

34
artificial, una obra de la cultura, y no de la naturaleza,
impuesta al hombre natural.

Esta expresión avala sostener que escribir la clase es


un verdadero reto para el docente. Entre los desafíos
podemos mencionar:
Prever las dudas, las incomprensiones, y anticiparse a
ellas, para evitarlas.
Lograr un estilo fluido, ameno, coloquial, sin perder
la rigurosidad del ambiente académico y más aún de la
precisión de un curso sobre investigación científica.
Para dar respuesta a ambos desafíos, el diseño habrá
de atenerse a una de las principales características del
discurso académico, y de su proceder: el orden. Aún la
presentación de los cursantes, que pretende ser un
momento de sociabilidad distendida, puede ser
encauzado dentro de algún patrón, proporcionándoles un
input similar y coherente. Así, al pedir presentarse, les
estructuro mi presentación con los mismos ítems, incluso
el que se aboca a relevar por qué se inscribió en el
Seminario (adaptado a mi condición de dictante,
naturalmente):
Sean todos bienvenidos al Seminario. Es un gusto
para mí acompañarlos en el complejo proceso de escritura
de una tesis. Comienzo por presentarme:
Mis estudios: Soy Profesora, Licenciada y Doctora en
Ciencias de la Educación por la Universidad Nacional de
Rosario y Magister por la Universitat de Barcelona,
España.
Trabajo actual: Soy Investigadora del CONICET, con
sede de trabajo en el Instituto Rosario de Investigaciones
en Ciencias de la Educación (IRICE-CONICET) […] .

35
El dictado de este Seminario se relaciona en general
con mi desempeño docente y como investigadora;
específicamente, como co-directora del Proyecto de
Investigación “Prácticas de enseñanza de la escritura de la
tesis de posgrado: estudio comparativo de experiencias en
entornos presenciales y virtuales”.
Ya he dado cursos a distancia, pero de otros temas. La
modalidad me resulta sumamente flexible y favorable, por
lo que estoy muy ilusionada en implementarla para
promover la escritura de tesis de posgrado.
Ahora los invito a presentarse en el Foro a
continuación…
En este foro nos presentaremos indicando: 1) carrera
de grado; 2) carrera de posgrado en la que está inscripto o
está por inscribirse e institución donde se dicta; 3) motivo
por el cual se inscribió al Seminario; 4) experiencia previa
en cursos no presenciales.

Nos escuchamos…

La escritura de una tesis presenta un carácter lineal,


en tanto transita las distintas etapas del método científico.
Sin embargo, conlleva asimismo un proceso espiralado
con la constante ampliación y reformulación de sus
capítulos. Por tal razón, la disponibilidad de los archivos
para ser leídos con detenimiento es otra ventaja que
proporcionan los ambientes digitales por sobre las clases
presenciales. Así, la presentación personal de los cursantes
se complementa con el siguiente recurso:
En esta carpeta vamos a subir lo que hayamos escrito
de nuestras tesis antes de iniciar el Seminario. No importa
cuán escaso sea, o si está desordenado. Nos interesa

36
conservarlo para revisar, cuando hayamos terminado el
seminario, cuánto hemos progresado, en qué aspectos, etc.
Para una fácil localización, por favor denominen el
archivo con su apellido.

El tiempo en el desarrollo de los contenidos

Otro desafío central de los ambientes digitales es la


distribución de temas y actividades. En la clase presencial,
el límite está dado por el horario: esta podrá haber
resultado más o menos productiva, según la cantidad y
calidad de contenidos que el docente logró desarrollar,
pero no habrá dudas respecto del tope horario. En los
ambientes digitales el tiempo no tiene límites, por lo que
es preciso crear unidades discretas de la enseñanza. Estas
dependen de la extensión y densidad de los contenidos
contemplados en el texto de la página que aludiéramos en
el ítem anterior. De esta forma, distribuí los contenidos en
diez unidades coincidentes con las diez semanas que dura
el Seminario, asignando a cada unidad una complejidad
similar. En virtud de la importancia de la distribución de
contenidos y actividades por unidad reformulé mi plan
original para el inicio del Seminario de la siguiente
manera:
En un primer momento había decidido destinar la
primera unidad al Proyecto de tesis, siguiendo la
secuencia de trabajo que va del proyecto a la tesis. La
entrada a la tesis sería a través de una segunda unidad
destinado a su lugar en el concierto de los textos
académicos (CUBO DE SEVERINO, 2005) y luego a sus
características específicas (BORSINGER DE
MONTEMAYOR, 2005). Sin embargo, este orden

37
implicaba que la primera semana-unidad se destinaría a la
familiarización con la plataforma, la presentación de cada
participante ante el grupo y, ya entrado en lo propio del
Seminario: la clarificación terminológica entre
Plan/diseño/Proyecto (SAMAJA, 1994), considerar las
variantes en cuanto a su ordenamiento interno, más el
hecho (nada sencillo) que la tesis y su proyecto requiere
definir un tema, a partir de diversas fuentes de
inspiración. Por su parte, la segunda unidad sería más
bien de lectura y de tomar conciencia sobre las
dimensiones de una tesis. Es evidente que este orden
lógico-cronológico desde el proyecto a la tesis iba a
generar un desequilibrio de exigencia de la primera a la
segunda: mucho en la primera y poco en la segunda. Por
tal razón, reorganicé todo de la siguiente manera:
Por supuesto decidí conservar la presentación de los
miembros al principio, pero seguida de la definición de la
tesis en los distintos niveles del posgrado según la
reglamentación argentina, seguida de la reflexión del
lugar de la tesis en el concierto de los textos académicos
(CUBO DE SEVERINO, 2005) y sus características
específicas (BORSINGER DE MONTEMAYOR, 2005). Ya
para la segunda semana-unidad los cursantes estarán
familiarizados con la plataforma como para poder
dedicarse a la definición del tema de su investigación y a
la búsqueda de antecedentes.

El tiempo en el desarrollo de las actividades

La misma consideración acerca de la distribución


temporal de los contenidos aplica para las actividades. En

38
tal sentido, noté que en la segunda unidad, una de las
actividades quedó demasiado extensa:
Encarando la búsqueda de antecedentes:
Ingrese a los siguientes sitios web correspondientes a
bases de revistas: Redalyc: http://www.redalyc.org/ y
Scielo: http://www.scielo.org.ar.
Ingrese palabras clave de su tema y autores que hayan
trabajado sobre el mismo (si los conoce).
Seleccione los trabajos más pertinentes y guárdelos en
un directorio que cree para tal fin.
Decida la forma en que denominará esos archivos.
Constate que en cada archivo consten las referencias
bibliográficas del trabajo en cuestión; es decir, el detalle de
la revista en la que está publicado, el número de ejemplar,
las páginas. Si no contuviera dicha información, asegúrese
de tomar nota de ellas. Puede hacerlo según se indica en
el paso siguiente.
Realice un fichaje de dichos trabajos con sus
respectivos datos bibliográficos. Puede valerse de los
resúmenes de los mismos, pero deje en claro a través de
las comillas lo que está copiado textualmente de lo que
escribió con sus propias palabras.
Compile los fichajes en un solo archivo en vistas a
confeccionar un texto. Este paso se realizará en varias
etapas: la primera será ensamblar tipo collage: se tratará
de un compilado caótico de resúmenes y síntesis de
artículos y trabajos que haya leído. Tener las citas bien
apuntadas le permitirá en un paso siguiente intercalarlas
sin temor a perder de vista de dónde proviene. En este
paso también podrá eliminar aquello del fichaje que
considere prescindible, pero siempre estará disponible en

39
el archivo original. Se trata de ir intercalando para que no
quede como una mera pegatina de los materiales.
Introduzca comentarios o cambios desde su propia
voz para emerger como autor del texto, más allá del
espíritu recopilador de esta tarea. Por ejemplo, podrá
aggiornar los resúmenes de los trabajos con alusiones a la
época actual, a otras geografías o a trabajos publicados con
posterioridad.
Realice pulidos sucesivos para llegar a una sección en
la que se entienda claramente el contenido de los trabajos
recuperados, pero al mismo tiempo la vinculación con su
propuesta.
Es evidente que ya de por sí es una actividad
sumamente demandante, además de las otras previstas en
esa unidad. Mi idea inicial era, por medio de la actividad,
proporcionar las pautas de un método riguroso de trabajo,
pero ello no podía implicar un listado tan extenso. Dado
que en la unidad 4 abocada al marco teórico se retoma el
tema de la revisión bibliográfica y la forma de plasmarla,
decidí pasar la búsqueda de antecedentes allí, de tal
manera que solo quedaron los primeros cuatro pasos:

Encarando la búsqueda de antecedentes

Ingrese a los siguientes sitios web correspondientes a


bases de revistas: Redalyc: http://www.redalyc.org/ y
Scielo: http://www.scielo.org.ar.
Ingrese palabras clave de su tema y autores que hayan
trabajado sobre el mismo (si los conoce).
Seleccione los trabajos más pertinentes y guárdelos en
un directorio que cree para tal fin.

40
Decida la forma en que denominará esos archivos.
Constate que en cada archivo consten las referencias
bibliográficas del trabajo en cuestión; es decir, el detalle de
la revista en la que está publicado, el número de ejemplar,
las páginas. Si no contuviera dicha información, asegúrese
de tomar nota de ellas. Esta búsqueda requiere ser
plasmada por escrito según un procedimiento riguroso,
pero por su densidad y por la afinidad que presenta el
procedimiento con el del Marco teórico, lo
desarrollaremos en la Unidad 4.
Adviértase que pude eliminar los pasos 6 a 8
subdividiendo la tarea de realizar la búsqueda
bibliográfica de la de escribir la sección de los
antecedentes, subdivisión que indiqué en la oración final
del paso 4.

Las referencias cruzadas

Un curso a distancia exige la mayor explicitación de


los recorridos y el acceso a los recursos. Así, al interior de
una misma unidad, la actividad propone un foro para el
que era necesario compartir archivos que se subirían en
una carpeta, externa a él. Por ello, en la unidad consagrada
al encuadre de la investigación quedó la consigna en uno
y otro sitio:
En la carpeta: El encuadre de nuestras tesis
En esta Carpeta cada uno subirá la sección inicial de
su tesis una vez escrita o revisada a la luz de los conceptos
de la Unidad. En el Foro respectivo comentará sus avances
y/o los de los compañeros.
En el foro: El encuadre de nuestras tesis

41
En este Foro comentamos la sección inicial de las tesis
subidas en la carpeta respectiva. Pueden referirse a sus
avances y/o a los de los compañeros.
A este punto, me preguntaba si esta bifurcación de
una misma actividad en un foro y una carpeta era
conveniente o si sería más práctico unificarla y que los
archivos se adjunten en la respectiva intervención del foro.
Vale decir, que en la intervención esté el archivo con el
avance, en lugar de tener que ir a buscarlo en la carpeta
respectiva. Ante dicha disyuntiva elegí quedarme con la
bifurcación, porque si el foro se torna extenso con
numerosos intercambios, será incómodo buscar los
adjuntos.

La creación de actividades

Al terminar los textos de cada unidad me veo en la


obligación de crear actividades, y siento que este mandato
me pesa. Es que en un curso presencial no tengo que
hacerlo necesariamente: la tradición presencial expositiva
exime de ello, mientras que un dictado a distancia, lo
requiere. Cuando estoy diseñando la Unidad 4 descubro
que puedo repetir el mismo esquema de actividad de la
unidad anterior, pero cambiando el segmento de la tesis
que es motivo de tratamiento.
Unidad 3 > Foro: El encuadre de nuestras tesis
En este Foro comentamos la sección inicial de las tesis
subidas en la carpeta respectiva. Pueden referirse a sus
avances y/o a los de los compañeros.
Unidad 4 > Foro: Los marcos teóricos de nuestras tesis

42
En este Foro comentamos los marcos teóricos de las
tesis subidas en la carpeta respectiva. Pueden referirse a
sus avances o a los de los compañeros.
La aplicación de este patrón me trae alivio y, mejor
aún, reparo que puede proporcionar previsibilidad a los
cursantes. Ya no tendrán que ver de qué se trata la
actividad de cada unidad, sino que podrán anticiparlo de
alguna forma.

La ejemplificación

Es indudable que la ejemplificación constituye un


recurso de vital importancia en la transmisión de
información. Una duda aparentemente topológica, pero
que encierra una reflexión profunda, propia del proceso
de enseñanza, es la de dónde ubicar los ejemplos en la
secuencia de la transmisión de información. Incluirlos a
continuación del texto expositivo proporciona una
cómoda inmediatez, pero a su vez los deja demasiado
expuestos en el área central de la unidad. Mientras que
este último puede requerir ser leído varias veces, el
ejemplo no merecerá tantas lecturas. Esta necesidad de
separar el ejemplo del texto es aún mayor cuando en
realidad uno recurre a un “antiejemplo” (la muestra de lo
que no se debería hacer). Esto es lo que realizo en la
unidad dedicada al resumen, en la cual ilustro sus
características con decisiones erróneas a lo largo del
proceso de elaboración de resúmenes previos.
Una forma de separar el texto expositivo del ejemplo
es ubicarlo en otra sección, tal como una carpeta donde
adjuntar archivos con ejemplos. Opté por esta segunda
opción y la llamé “Bitácora de recursos”, nombre que

43
resulta más amplio que simplemente “Ejemplos”. Para
obtener el efecto de complementariedad es necesario
indicar muy claramente para qué segmento del texto
principal había un ejemplo. A su vez, en la carpeta,
identificar con claridad cada archivo para ser relacionado
con su correspondiente segmento del texto principal.
En esta carpeta de la unidad dedicada al Resumen,
entonces, quedó:
Un archivo con las distintas versiones en que un
resumen fue modificado por su autora a partir de las
correcciones recibidas.
Un archivo con un ejemplo de resumen que muestra
bien lo que se hará en la investigación, que era la falencia
del ejemplo previo.
Una propuesta didáctica para el desarrollo del
procedimiento lógico de deducción en el nivel secundario
Presentamos los resultados de una investigación
realizada sobre el desarrollo del procedimiento lógico de
deducción en estudiantes de nivel medio. Se aborda en
particular, el razonamiento de tipo condicional categórico.
Se muestran los resultados del diagnóstico realizado, en el
cual se revelan los errores más frecuentes que cometen los
alumnos. Se propone una estructuración didáctica para la
formación y desarrollo de este procedimiento lógico
mediante la asignatura matemática; se detalla la aplicación
de esta propuesta a la práctica y los resultados que se
alcanzaron en esta experiencia pedagógica.
Durán Jarrín Alexis. Programa de “Congreso de
Pedagogía”, p. 270. La Habana, Cuba, Febrero de 1997.
Más allá de ser un ejemplo superador, presenta un
evidente tinte de ponencia, y no de tesis, que es el foco del
Seminario. Esto se evidencia especialmente por la forma

44
en la que empieza, acotada a presentar los resultados,
aunque el detalle de las oraciones siguientes cubre el
proceso completo de una investigación.
Otra decisión a tomar con respecto a los ejemplos
atañe a la mejor forma de explotación de los mismos para
el aprendizaje. Así, en la unidad dedicada al Trabajo de
campo tenía previsto incluir ejemplos para los temas.
Concretamente, mediante un fragmento de un artículo de
revista, ejemplificaría la descripción de la institución
elegida como caso de estudio, las técnicas utilizadas y el
detalle del trabajo de campo realizado. A su vez, la
presentación del fragmento sin ningún comentario
adicional permitía ser explotado como actividad de
reconocimiento por parte de los alumnos. Se presentaba,
entonces, la disyuntiva de ponderar qué sería más
importante: si presentar el ejemplo o proponerles
reconocer los elementos metodológicos (estudio de caso,
técnicas de recolección de información). Si decidía dejarlo
como actividad, debería ser como tarea individual y no
como tema de foro, ya que el reconocimiento plantea
respuestas unívocas y no se prestan para discusión.
Además, en cuanto el primer cursante en participar dijera
las respuestas, el resto solo tendría que confirmar. Dado
que una tarea individual y unívoca resulta menos
disparadora de aprendizajes que el proceso de aplicar
nociones metodológicas en una investigación concreta
acabé con quedarme con la primera opción y presentarlo
como ejemplo, para que el tratamiento del tema no resulte
tan abstracto.

45
A modo de cierre

A lo largo de este capítulo hemos revisado algunos


desafíos que se presentan en el proceso de diseñar un
particular curso universitario a distancia. Se trata de
decisiones prácticas traducidas en acciones muy concretas
que, sin embargo, involucran desafíos acerca de la mejor
forma de gestionar la información y el conocimiento en
ambientes digitales. En tal sentido, el lugar de la
verbalización oral y escrita, la distribución temporal de
contenidos y actividades, la progresión de los contenidos,
la creación de actividades, la ejemplificación, las
referencias cruzadas, se debaten entre dos dimensiones
decisivas: la modalidad en línea del Seminario, y las
especificidades del discurso académico y la investigación
científica en el marco del género tesis de posgrado.
A este punto cabe preguntarse: ¿pensamos todas estas
cuestiones en un curso presencial? De mi parte,
respondería que no. En la didáctica del nivel superior no
invertimos tantas reflexiones en las actividades, mucho
menos a este nivel de detalle. La educación a distancia nos
pone en situación de preguntarnos sobre estos aspectos, y
seguramente que el alumnado percibe este dinamismo.
Este capítulo fue elaborado durante la etapa de diseño
del Seminario en línea a priori de la implementación.
Futuros estudios deberían indagar la percepción de los
cursantes acerca de los temas cubiertos y, con
posterioridad, de los resultados de aprendizaje obtenidos
en las distintas circunstancias.

46
REFERENCIAS

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y aprendizaje en talleres virtuales de escritura de tesis. Apertura.
Revista de innovación educativa, Méjico, v. 10, n. 1, p. 8-23, 2018.
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formación de investigadores educativos: estudio de casos a través

47
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R. (Org.). La trastienda de la investigación. Buenos Aires: Manantial,
2011. p. 27-51.

48
A CONTRIBUIÇÃO DA GESTÃO
EDUCOMUNICATIVA DO CONHECIMENTO PARA
A CONSOLIDAÇÃO DE CIDADES EDUCADORAS

Lígia Beatriz Carvalho de Almeida


Iasmin Araújo Bandeira Mendes
Claviano Nascimento de Sousa

As sociedades complexas da atualidade convivem


com um grande fluxo de informações globais e locais, que
colocam na berlinda costumes, valores e conhecimentos
adquiridos, conformando um ambiente de incertezas, de
frequentes transformações e rupturas de paradigmas. A
informação, outrora afixada exclusivamente em suportes
impressos, transforma-se rapidamente em digital. A
ambiência dos relacionamentos pessoais e sociais
igualmente virtualiza-se. Para que uma sociedade
mantenha-se competitiva nessas circunstâncias, deve ser
constituída por cidadãos questionadores, aptos a
responder criativa e produtivamente às demandas.
O cenário é desafiante para gestores públicos
comprometidos com o desenvolvimento social. Requer a
adoção da gestão compartilhada, em que a
responsabilidade sobre as decisões e os resultados seja
coletiva, o que se aplica inclusive à educação, preparando
os cidadãos para decidir o que é necessário aprender,
capacitando-os a acessar digitalmente a informação e a
construir, com seus pares, o conhecimento a ser aplicado
nos locais em que vivem. Para esse objetivo converge a
educomunicação, que recorre aos campos de
conhecimento da comunicação e da educação para formar
cidadãos críticos e neles desenvolver a competência da

49
gestão coletiva da informação e da comunicação,
orientada para a construção cidadã de conhecimento.
É, também, a partir desta perspectiva que diversos
municípios no Brasil e no mundo vêm adotando um
modelo de gestão denominado Cidade Educadora, que visa
à constituição de cidades inclusivas, justas e
participativas, dando ênfase às políticas voltadas ao
protagonismo infantojuvenil e ao exercício pleno da
cidadania pelos diversos públicos que compõem a
sociedade, tornando todos eles educandos e educadores
desta grande escola, que não se limita a muros, chamada
cidade. O que se pretende é a formação integral dos
habitantes, por meio de agentes pedagógicos que
ofereçam suporte ao desenvolvimento do potencial
humano.
Neste texto, são apresentadas experiências
educomunicativas vivenciadas no projeto Univerão,
Universidade de Verão, promovido em 2018 9 , por
município localizado na região metropolitana de
Salvador, na Bahia, a Cidade Educadora Lauro de Freitas.

1 Gestão do conhecimento: educação interativa online

Por muito tempo, na história da humanidade, a


informação, que é base para a construção do
conhecimento, esteve cuidadosamente guardada em
prateleiras de bibliotecas. De modo geral, a forma como se
transmitia informação para construção desse

9Conforme divulgado em
https://www.laurodefreitas.ba.gov.br/site/noticia/univerao-atrai-publico-de-
todo-o-estado-interessado-em-conhecimento-cultura-e-diversao/483.

50
conhecimento estava condicionada à pesquisa, ao estudo
solitário e a investigação por experimentação, que levava
em consideração, na grande maioria das vezes, uma única
solução para um dado problema.
Nos dias atuais, as bibliotecas ainda existem e são
responsáveis por guardar boa parte do que é construído a
partir do conhecimento de inúmeras pessoas. Todavia,
com a ascensão da tecnologia, os espaços para construção
de conhecimento se difundiram a ponto de não ser mais
preciso se deslocar até uma biblioteca para ter acesso à
informação, como acontecia outrora. O acesso à rede
mundial de computadores, sobretudo a partir das Novas
Tecnologias da Informação e Comunicação – NTICs, é
capaz de promover uma experiência pouco utilizada em
outras épocas da história da educação. Na
contemporaneidade, o estudante, mais do que nunca, é o
principal construtor daquilo que Pierre Bourdieu (2005)
chama de Capital Cultural e, ao mesmo tempo, do
conhecimento que o tornará capaz de resolver os mais
diversos conflitos e desafios, inclusive o de consumir
informação na internet.
Lévy (2014) destaca que a educação interativa online
pode ser viabilizada, uma vez que técnicas de gestão da
informação e do conhecimento em ambientes digitais já
estão disponíveis, contudo é preciso “programar cabeças
para a construção do conhecimento coletivo”, atividade a
ser protagonizada pelo professor, que precisa ele mesmo
dominar “essa nova gerência de conhecimento para
depois passá-la aos alunos” (LÉVY, 2014, p.15), passo
essencial para o desenvolvimento da inteligência coletiva
e reflexiva.

51
As metodologias educomunicativas de gestão da
informação e da comunicação almejam capacitar os
cidadãos para: a) localizar informações necessárias à
solução dos seus problemas; b) comunicarem-se
digitalmente com outras comunidades com interesses e
necessidades semelhantes para que, colaborativamente,
construam conhecimento inovador, adaptando-o às
características das suas comunidades e do momento em
que vivem.
Como nunca antes, a construção do conhecimento
está potencializada por ter se tornado desterritorializada,
descentralizada e poder acontecer em redes. O interesse
comum é que coloca em relação os atores desta construção.
No entanto, a capacidade de interagir é essencial e pode
ser desenvolvida. A escola é o local privilegiado para isso
e pode estimular crianças e jovens a pensarem
criativamente, desenvolverem o senso de comunidade,
serem gestores do conhecimento e protagonistas de sua
educação, preparando-os para comunicarem-se e atuarem
nas redes de compartilhamento de forma responsável e
colaborativa.
Ao passo que as tecnologias da informação e da
comunicação despontam em todo o mundo, contribuindo
para mudanças socioculturais significativas e
promovendo o fenômeno da midiatização, ainda é
possível observar o que podemos chamar de ilhas sociais,
nas quais sujeitos sem acesso à internet acabam sendo
excluídos da vivência desse novo contexto cultural. Por
outro lado, outras ilhas se apropriam do uso da internet,
enquanto efeito do movimento de convergência, para
promover a participação significativa de comunidades e

52
povos de forma interativa e coletiva por meio de práticas
de alteridade.
O professor Marco Silva (2001) destaca que
historicamente temos ocupado o papel de espectadores de
informações transmitidas por um emissor. Nas
celebrações religiosas se recebe informação de pastores,
padres, líderes; se analisarmos o passado encontraremos a
figura do rei emitindo suas insatisfações, proezas ou
simplesmente discursando; o livro entregando
informações para o leitor; a televisão falando para os
telespectadores. Em todos os exemplos citados, o receptor
está fadado a, tão somente, receber as informações.
Quando relacionamos esse modelo de comunicação com o
atual cenário da educação, nos deparamos com um
sistema educacional que reflete parte disso na medida em
que o professor se presta a função de fonte detentora de
informações e, portanto, de conhecimento a ser divulgado,
que se consolida em conhecimento a ser emitido, e o aluno
receptor dessas informações, compondo o que Paulo
Freire (2005, p. 68) define como Educação Bancária.
Entretanto, quando pensamos nesse modelo de
comunicação, extinguimos a possibilidade de
interatividade, de troca e de construção coletiva. Nesse
sentido,

[...] Interatividade é um conceito de comunicação e não de


informática. Pode ser empregado para significar a
comunicação entre interlocutores humanos, entre
humanos e máquinas e entre usuário e serviço. No
entanto, para que haja interatividade é preciso garantir
duas disposições basicamente: 1. A dialógica que associa
emissão e recepção como pólos antagônicos e

53
complementares na co-criação da comunicação; 2. A
intervenção do usuário ou receptor no conteúdo da
mensagem ou do programa abertos a manipulações e
modificações [...] (SILVA, 2001. p. 5)

Dialogando com os princípios de construção coletiva


da Educomunicação, defendidos por Ismar Soares (2011),
Silva apresenta a proposta de um modelo de comunicação
que deixa de ser unidirecional e passa a seguir o fluxo
multidirecional comunicacional que pode se estabelecer
entre professores e alunos, alunos e professores e ainda de
aluno para aluno, proposta que também converge para o
pensamento de Sartori (2006).
Analisar a importância da mediação no processo de
construção do conhecimento em ambientes digitais online
e, sobretudo, relacionar esse processo com formas de
comunicar mais próximas da realidade dos sujeitos, pode
ser a ponte entre o sistema educacional em vigor no
cenário nacional, fortemente criticado por especialistas e
pelos alunos, e uma educação moderna e menos
tradicionalista. Nesse contexto, a figura do
educomunicador surge como o elemento capaz de
relacionar maneiras de comunicar com o processo de
aprendizagem.
Nesse cenário de possibilidades quase que infinitas de
informações, o professor, que pertence a uma geração
diferente da dos seus alunos, sendo considerado, segundo
Prensky (2001) 10 , um imigrante digital, pode ser

10“Aqueles que não nasceram no mundo digital, mas que, em algum momento
de suas vidas, ficaram fascinados e adotaram muitos ou a maioria dos aspectos
da nova tecnologia são, e sempre serão comparados a eles” (PRENSKY, 2001, p.
2).

54
duramente penalizado diante das metodologias e
pedagogias usadas para estabelecer uma relação entre
ensino, aprendizagem e o uso de tecnologias por parte de
seus alunos. Diante da enorme possibilidade de
informações existentes, a construção de conhecimento
pode ser baixa, comprometendo o rendimento do
alunado. Por outro lado, para o estudante – este que é
considerado por Prensky (2001)11 nativo digital, uma vez
que nasce imerso nas novas tecnologias – a gigantesca
gama de informação disponível pode ser capaz de
confundi-lo, em alguns casos, bloqueá-lo e, também, levar
ao baixo rendimento de aprendizagem. Isto porque, o
fenômeno de uma informação imediata, globalizada e cuja
fonte muitas vezes se desconhece é muito recente, de
forma que, enquanto sociedade, não foi possível ainda
compreender como controlá-lo para não ser controlado
por ele.
Estudos posteriores ao de Prensky – e mesmo ele – já
reconheceram que a dicotomia nativos/imigrantes é
generalista, uma vez que homogeneíza dois grupos sociais
e ignora a exclusão digital; mas, de seu texto Digital
natives, digital immigrants (PRENSKY, 2001), há dois
quesitos que não podem ser relevados: a necessidade de
um diálogo mais democrático entre a nova geração e as
anteriores e a definitiva reviravolta à qual a tecnologia tem
submetido a sociedade do século XXI. Como aprender
neste novo contexto? Como ensinar?

11“Falantes nativos” da linguagem digital dos computadores, videogames e


internet” (PRENSKY, 2001, p. 1).

55
2 Cidades educadoras

Reflexões sobre como ensinar e aprender ou sobre a


função da educação, se é que é possível definir apenas
uma, perpassam a pedagogia há milênios. A educação
burocratizada e tecnicista falhou muito antes da inclusão
das tecnologias digitais e, definitivamente, faliu, a partir
deste fato. Subjugou-se a educação a quatro paredes e se
permitiu que ela se afastasse do mundo real, do contexto
sociocultural dos aprendentes, da finalidade humana com
foco na cidadania, para a finalidade puramente técnica
com foco em uma prova de múltipla escolha. Supôs-se que
só adultos ensinam, apenas crianças aprendem e somente
na escola se constrói educação, receita que acarretou o
enraizamento das desigualdades sociais e a queda nos
rankings globais das comunidades que a adotaram.
As cidades educadoras, neste sentido, surgem com a
intenção de desmistificar essa ideia reducionista e retomar
o conceito platônico “pantakhoû” - a sociedade como um
todo educante (MANACORDA, 2010, p. 12). É necessário
perceber que a educação formal é apenas uma das três
pilastras da educação e que, desconsiderando as outras
duas, não se consegue estabelecer uma política de
desenvolvimento social.

56
Quadro 1 - Educação formal, não formal e informal.

Conceito Exemplos

Instituições cujo objetivo


Instituições explícito é ser espaço de Creches,
formais de ensino-aprendizagem. Escolas,
ensino Formalizadas por órgãos Universidades
superiores.

Organizadas a partir de
Educação no
Intervenções objetivos explícitos de
tempo livre,
educativas formação ou ensino, mas
Escolas de
não formais fora do sistema do ensino
idiomas
regulamentar.

Espetáculos,
Propagandas,
Vivências Vivências difusas e
Relações de
educativas penetrantes sem objetivo
amizade
informais explícito de educar.
Redes Sociais,
TV, Rádio
Fonte: Adaptação do texto introdução ao documento “A cidade educadora” da
prefeitura de Barcelona. I Congresso Internacional das Cidades Educadoras.
1990. p. 13 (apud BRADA; RIOS, 2004, p. 35). Em destaque, contribuições dos
autores.

Vemos, a partir do quadro, que, ao contrário do que


acontecia antigamente, quando a educação era delegada
apenas à escola e à família, atualmente, “a influência
educativa é exercida a partir de vários âmbitos – família,
trabalho, associações, etc. – e por meios diversos: televisão,
multimídia, etc., que, às vezes, se opõem às propostas
educativas escolares” (GOMÉZ-GRANELL, VILA, 2003,
p. 17). Para lidar com um modelo globalizado de
sociedade, considerando a ação imediata e sem fronteiras

57
da informação, é necessário segundo Goméz-Granell e
Vila (2003, p. 17):

por um lado, [que] o conjunto do sistema educativo se


envolva no tecido social da cidade [...], e, por outro lado,
é necessário que essa mesma sociedade assuma sua
responsabilidade educativa, e que cada um dos agentes
seja consciente de sua cota de responsabilidade.

Os autores completam ainda que “a cidade deve


promover [...] um conjunto de valores e atitudes que
permitam à população, a partir da participação crítica e
ativa, criar um modelo de sociedade para o futuro e uma
maneira de viver juntos” (GOMÉZ-GANNEL, VILA, 2003,
p. 26), o que é conceituado enquanto Cidade como
Pedagogia. Experiências na cidade de Barcelona na
Espanha (VINTRÓ, 2003) e nas regiões sul e sudeste do
Brasil, respectivamente nos municípios de Porto Alegre
(TOLEDO; FLORES; CONZATTI, 2004) e São Paulo -
bairro de Vila Madalena (ALVES, 2004), para citar
algumas, mostram que é possível democratizar a cidade
através da Educação. Desta forma, por que não trazer esta
experiência para o Nordeste brasileiro? Foi o que a
prefeitura de Lauro de Freitas na Bahia pensou ao
idealizar a Universidade de Verão com o tema “Conexões
Democráticas para uma Cidade Educadora” e que
resultou nas experiências que serão narradas
subsequentemente.

3 Educomunicação

A Educomunicação, enquanto campo de


conhecimento inovador baseado no tripé educação,

58
comunicação e cultura, contribuiu com experiências
educativas ocorridas na Universidade de Verão ao adotar
uma metodologia atual de intervenção, que considera as
necessidades dos educandos e educadores do século XXI,
estabelecendo um viés de aprendizagem contínua e
formação cidadã que se alinha com as intenções da
formação de uma cidade educadora – ou
educomunicadora.
Enquanto campo transdisciplinar, a Educomunicação
reafirma a educação enquanto condição elementar para a
transformação da sociedade, percebendo-a indissociável a
outras áreas de conhecimento e atuação, tais quais,
linguagem, tecnologia, informação e cidadania.
Paulo Freire afirmava “os homens se educam entre si,
mediatizados pelo mundo” (FREIRE, 2005, p. 68), reflexão
que confere ao diálogo um caráter de centralidade, mesma
posição ocupada por ele no arcabouço teórico da
educomunicação, pois se entende que é através dele que
os indivíduos transformam a si mesmos e ao contexto em
que vivem. Aos ambientes nos quais os diálogos ocorrem,
sejam eles presenciais ou virtuais, dá-se o nome de
ecossistemas comunicativos. O Educomunicador é o
gestor da comunicação, que cuida da “saúde desses
ambientes educativos e do bom fluxo das relações entre as
pessoas e os grupos humanos”, garantindo igual
oportunidade de interlocução para todos os envolvidos
(SOARES, s/d).
A comunicação mediada por tecnologias é um dos
objetos de trabalho do Educomunicador, que considera
que, na atualidade, o acesso e a utilização das tecnologias
da informação são vitais para a manutenção dos
ecossistemas. Um dos seus objetivos é então inseri-las no

59
cotidiano das comunidades, no entanto a perspectiva da
inserção é a contra-hegemônica, considerando a relação
produção – recepção das mensagens: não se concebe os
indivíduos como meros receptores, prepara-se os cidadãos
comuns para atuarem como produtores e disseminadores
de informação, estratégia trabalhada no evento em Lauro
de Freitas, como se verá pelos cursos ofertados no evento.

4 A experiência de Lauro de Freitas

A cidade de Lauro de Freitas – descrita no site


institucional de sua prefeitura como “a porta de entrada
do Litoral Norte da Bahia”12 – fica ao lado de Salvador e
tem cerca de 165 mil habitantes.
Entre os dias 15 e 21 de janeiro de 2018, a cidade
sediou a Universidade de Verão (Univerão), uma
iniciativa da Prefeitura em parceria com o Governo do
Estado e instituições de ensino superior. O evento contou
com mais de 120 minicursos, conferências, palestras, rodas
de conversa, oficinas; todo o evento foi gratuito e aberto à
sociedade.
Estudantes do curso de Educomunicação da
Universidade Federal de Campina Grande foram
convidados para facilitarem atividades na interface
comunicação/educação/cultura no evento baiano. As duas
atividades que serão tratadas neste tópico permeiam a
gestão educomunicativa do conhecimento, através do
meio digital.

Disponível em: https://www.laurodefreitas.ba.gov.br/site/noticia/perfil-do-


12

municipio/120 . Acesso em: 10 abr. 2019.

60
Uma destas oficinas teve como objetivo capacitar
professores para o uso do recurso WebQuest em sala de
aula. O estudo que embasou a oficina teve como base a
área de intervenção comunicativa Mediação Tecnológica,
que, segundo Almeida (2016, p. 25), visa a

incorporação das tecnologias da informação e da


comunicação nos processos educativos, de forma a
ampliar e multiplicar as oportunidades de aprendizagem,
sempre privilegiando a sua utilização humanizada e
colaborativa, tendo como centro do processo o educando
e o processo de aprendizagem e não o conteúdo e nem a
tecnologia.

Uma vez que, na formação de uma cidade educadora,


observa-se a sociedade de maneira abrangente,
enxergando os vários grupos que a mediam – dentre eles
os meios de comunicação – a oficina foi desenvolvida para
que os professores tivessem a experiência não apenas de
discutir a importância de introduzir a tecnologia em sala
de aula; mas a de desenvolver uma atividade prática para
utilizar em suas aulas, nas quais os alunos seriam
realmente sujeitos ativos.
Como conceituado em artigo anterior,

a WebQuest é uma ferramenta metodológica de ensino


que coloca em prática vários conceitos discutidos até
então. Trata-se de uma tarefa passada aos aprendentes –
através do PowerPoint ou sites específicos – que permite

61
que estes tenham autonomia em sua pesquisa e resolução
de problemas (MENDES; BEZERRA, 2018, p. 08)13.

A utilização da tecnologia na educação formal como


mudança de paradigma e não apenas como ferramenta
tecnicista de disseminação de métodos arcaicos tem muito
a contribuir com a adaptação dos processos de ensino
aprendizagem no ambiente escolar para os dias atuais. E o
desenvolvimento da educação formal como um dos tripés
da cidade educadora é essencial para sua consolidação.
A oficina, que durou cerca de três horas e meia,
aconteceu em um laboratório de informática de uma
escola estadual da cidade e cada participante pode usar
individualmente um computador; a questão estrutural
contou bastante para o sucesso da oficina. Participaram 11
professores e futuros professores, de diversas áreas
(educação infantil, ciências, português) e estes tiveram o
desafio de desenvolver uma WebQuest para público e com
tema escolhido por eles. A ideia foi que o material
desenvolvido na oficina pudesse ser colocado em prática
pelos professores, em uma situação real de ensino. As
imagens a seguir são capas de duas das WebQuests
produzidas:

13A oficina de Webquest foi relatada no artigo “Experiências com WebQuest:


capacitação docente para mediação tecnológica em sala de aula” (MENDES;
BEZERRA, 2018).

62
Figura 01 – Resultado obtido na oficina de WebQuest, na UniVerão, em Lauro
de Freitas, BA.

Fonte: Produção dos participantes da oficina.

Figura 02 – Resultado obtido na oficina de WebQuest, na UniVerão, em Lauro


de Freitas, BA.

Fonte: Produção dos participantes da oficina.

Outra atividade mediada durante o evento em Lauro de


Freitas foi o minicurso Aprendizagem Interativa online
na educação básica. Com a metodologia baseada em ações
dialógicas e práticas, foram desenvolvidos momentos de
integração, inserção e inclusão na perspectiva de
desenvolver: uma proposta de formação no campo do
letramento digital para professores, que tem por

63
finalidade apresentar os desafios do uso de tecnologias,
navegação e pesquisa online por parte de alunos e, ao
mesmo tempo, construir de modo participativo,
alternativas para garantir o estudo orientado e interativo
por parte de seus alunos na perspectiva da mediação
tecnológica (SOUSA; ALMEIDA, 2018, p. 6)14.

A construção das alternativas propostas no


minicurso, que contou com a participação de 15
professores da rede de ensino de Lauro de Freitas, se
fundamentou na possibilidade de criação de espaços
interativos online capazes de proporcionar a construção de
conhecimento por meio tecnológico, mas tendo o
educador como sujeito mediador do espaço utilizado e os
alunos como cocriadores do conhecimento. Para tanto,
construiu-se coletivamente a ideia de interatividade e
constatou-se que, em se tratando de pesquisas de motores
de busca na internet, o resultado aponta para pesquisas
aleatórias sem critérios e não orientadas.
O destaque dado por Moran (2007, p. 90) no sentido
de que as mudanças tecnológicas promovidas nos espaços
educacionais ainda não fazem parte da centralidade do
ensino e que o fato de assumirem um caráter periférico
acaba não colaborando com a construção do
conhecimento, foi provocadora para que, no minicurso, se
pensasse alternativas de interação aluno-professor,
professor-aluno e aluno-aluno por meio de espaços online.

14O minicurso Aprendizagem Interativa online na educação básica foi relatado


no artigo “Aprendizagem interativa online na educação básica: um relato de
experiência educomunicativa em Lauro de Freitas-BA” (SOUSA; ALMEIDA,
2018).

64
Compreendendo que a interatividade se dá ao passo
em que emissores e receptores cocriam a mensagem, os
professores foram questionados sobre como pesquisavam
em plataforma de busca e ainda como orientavam seus
alunos nas pesquisas. O resultado revelou o que
consideramos ocorrer com a maior parte dos professores
da educação brasileira: a pesquisa aleatória, sem critérios
e não orientada. Apresentamos alguns exemplos de como
essa forma de pesquisa pode comprometer a construção
de conhecimento por parte do alunado. Aproveitando a
presença de professores de disciplinas diferentes,
pesquisamos sobre temas que seus alunos certamente têm
acesso.
O primeiro exemplo, feito em tempo real com auxílio
da internet, foi pesquisar sobre “a Fórmula de Bhaskara”,
a análise quantitativa do número de resultados obtido
norteou o debate. Do momento em que o botão ENTER foi
acionado até a apresentação dos resultados na tela se
passaram 0,41 segundos e o Google, plataforma usada
para busca pelo fato de seu uso ser massivo, apresentou
mais de 16 mil resultados. O segundo exemplo usado foi
acerca do uso dos “por quês”. Para esse exemplo, em 0,47
segundos a plataforma devolveu 121 mil resultados. Por
fim pesquisou-se sobre a cidade que sedia a Universidade
de Verão. Ao digitar “Lauro de Freitas” e efetuar a busca
chegou-se a 19.200.000 resultados em 0,65 segundos.
O objetivo desse exemplo, que deixou os professores
surpresos, é demonstrar a quantidade de resultados que
um aluno, ou qualquer outra pessoa, pode ter ao fazer
uma busca de modo aleatório. Além disso, os resultados,
na grande maioria dos casos, não estão relacionados às
modalidades interativas de aprendizagem. Para esses

65
casos, a possibilidade quase que infinita de conteúdo e
informação resulta em construção de conhecimento muito
pobre, numa relação inversamente proporcional à quantia
de resultados obtido, e ainda na eliminação de uma das
principais ferramentas que um professor pode usar na
relação com o aluno: a interatividade, que consiste em ir
além da sala de aula para auxiliar o estudante a se tornar
um sujeito aprendente.
A apresentação de uma série de espaços de
interatividade na internet serviu para inspirar os
participantes da atividade a pensarem como seria capaz
de fazer uso dos meios para promover inovações no
campo da educação de suas práticas didáticas.
A partir dessa ideia, o projeto “Aula Normal” 15 ,
desenvolvido numa escola da cidade de Campina Grande,
Paraíba, foi o primeiro exemplo dado como referência
para as relações dialógicas mediadas no espaço online. O
projeto consistiu no uso do Periscope – aplicativo para
transmissão de vídeos em tempo real –, como ferramenta
de preparação para o vestibular sob mediação de
professores. O projeto colaborou para aproximação entre
alunos e professores e ainda provocou debates nas aulas
presenciais. O aplicativo permite a visualização das aulas
posteriormente à transmissão do vídeo ao vivo e acabou
atendendo não só os alunos envolvidos no projeto. Outra
iniciativa apresentada foi a do Poliedro Educação no
YouTube. A rede que relaciona sistema de ensino, colégio

15Projeto desenvolvido por alunos do Curso de Comunicação Social com linha


de formação em Educomunicação da UFCG sob orientação da professora Lígia
Almeida. Artigo sobre projeto disponível na Revista Tecnologias na Educação,
disponível em: http://tecedu.pro.br/ano9-numerovol20-edicao-tematica-iv/

66
e curso está presente em mais de 20 estados brasileiros e
se apropria de videoaulas curtas e mediadas por seus
professores no canal da escola no YouTube.
O estudo de temas mais complexos é facilitado pelo
carisma e interatividade dos professores, o que leva o
perfil do Poliedro a ter mais de 180 mil pessoas inscritas
no canal. Por fim, foi apresentada a proposta do Google
Classroom, a ferramenta de mediação tecnológica do
Google que consiste na criação de um Ambiente Virtual de
Aprendizagem – AVA, em que o professor insere vídeos,
apostilas, imagens e hiperlinks para tratar dos temas
específicos de suas disciplinas. O pré-requisito básico para
utilização é possuir uma conta de e-mail vinculada ao
Google. Na plataforma é possível deixar comentários,
criar listas de discussões que envolvem alunos e professor.
Como resultado do minicurso, foram esboçados pelo
menos doze ecossistemas comunicativos mediados
tecnologicamente por meio de plataforma ou sites.
Apropriando-se dos exemplos apresentados, da troca de
experiências e da própria criatividade, educadores e
educadoras puderam pensar em estratégias de construção
do conhecimento de modo coletivo, participativo e
interativo por meio das tecnologias da comunicação e
informação.

5 Considerações

Considerando a vasta bibliografia estudada e os


resultados das experiências educomunicativas em Lauro
de Freitas, percebe-se a importância de possibilitar
formação continuada aos professores, estimulando-os a
repensar a sala de aula na qual atuam, principalmente em

67
um contexto incerto e variável como este no qual nos
encontramos. A discussão é o primeiro passo para a
quebra de paradigmas. O segundo é o domínio das
técnicas e métodos, sempre pautados na teoria,
constituindo, assim, a práxis freiriana (FREIRE, 2005),
para a qual é essencial reflexão e ação. Foi isso que ambas
atividades propuseram: a reflexão sobre as novas formas
de ensino e de aprendizagem, seguido pela prática de um
recurso ou abordagem que pudesse ser colocado em
prática em uma situação real – não apenas ideal.
É importante destacar, ainda, o papel do
Educomunicador nesse processo. Como defende Ismar
Soares (2011), é o Educomunicador que tem, a partir de
sua formação, elementos para diagnosticar lacunas que
podem ser preenchidas pela relação entre educação e
comunicação, propor soluções, proporcionar o
protagonismo e avaliar os processos de construção do
conhecimento, seja por parte de professores ou alunos.
Renovar o espaço formal de educação, adequando-o
aos paradigmas da sociedade da informação é uma das
contribuições da Educomunicação na formação de uma
cidade educadora, pois permite que a escola dialogue com
os meios educacionais que excedem seus limites. A partir
disso, é possível começar a conscientizar a população,
através dos professores, alunos e pais de alunos,
sucessivamente, a enxergar a cidade como um todo como
ambiente de educação e enxergar a própria educação
como exercício de cidadania.

68
REFERÊNCIAS

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70
CIBERCULTURA E EDUCOMUNICAÇÃO: UMA
PROPOSTA PARA A GESTÃO DE COMUNICAÇÃO
DO PRIMEIRO SETOR

Moabe Breno Ferreira Costa

1 Introdução

A proliferação e democratização de redes digitais


propõem novas formas de participação dos cidadãos nas
tomadas de decisões das organizações sociais. Essas
dinâmicas da cibercultura – a cultura digital, influenciada
pelo desenvolvimento da cibernética (LEMOS, 2002) –,
têm exigido das gestões públicas, posturas mais
democráticas, utilizando de potencialidades interativas
dessas mediações. Isso chama a atenção para se pensar em
novas formas do desenvolvimento da comunicação
praticada por órgãos púbicos, como vem desenvolvendo a
Secretaria de Educação de Lauro de Freitas (Semed),
município que integra a Região Metropolitana de
Salvador, capital da Bahia.
Lauro de Freitas é um município que apresenta
elevado Produto Interno Bruto, chegando a mais de seis
bilhões de reais, em 2016. Ainda, tem um grande potencial
turístico, a partir das suas características ambientais,
geológicas e culturais, ressaltando a reminiscência de
quilombos, tribos indígenas e diversos grupos sociais que
dinamizam as identidades do lugar. A população é de
quase 196 mil habitantes. Desses, aproximadamente 30 mil
integram a comunidade escolar municipal (educadores,
educandos, gestores e servidores).

71
Na tentativa de apropriação dos espaços e
equipamentos públicos ao processo educativo, a Semed
vem trabalhando com o conceito de Cidade Educadora.
Com a proposta, a secretaria vem desenvolvendo ações
que ultrapassam os limites materiais e mentais da escola.
Para tanto, o órgão vem utilizando diversas estratégias de
ampliação dos horizontes educacionais, penetrando em
diversas esferas da cultura, da economia, das relações
sociais, apropriando-se da cidade, de seus equipamentos
e dinâmicas como linguagem educativa. Nesse contexto,
estão ideias de participação popular, convergências,
territórios educativos, educação na integralidade da
criança, envolvendo aspectos físicos, cognitivos, motores
e sua relação com a sociedade, entre outros fatores que
apontam para conexões entre escola, sociedade e
governos.
Por sua vez, observa-se que estes processos têm
materializado e contribuído para a atualização da ideia de
educomunicação, estendendo-a para a própria gestão
governamental. Com base em Soares (1999) e Alves (1999),
a educomunicação corresponde a uma forma de gestão
que se apropria do próprio conhecimento popular para a
produção de informações e conteúdos voltados para
ampliar a consciência de si e o conhecimento dos
interlocutores sobre a própria cultura. Por essa
perspectiva, é possível se pensar educomunicação como
uma estratégia de gestão da comunicação organizacional.
De acordo com a categorização de Souza (2006),
classifica-se a Semed como uma organização de utilidade
e serviços públicos. Isso pressupõe a necessidade de um
processo comunicacional constituído por produções
territorializadas, capazes de fomentar interações sociais

72
que apontem para a diversidade de grupos culturais e
indiquem a multiplicidade de identidades que compõem
a rede de ensino. De acordo com o autor, as produções
comunicativas devem assumir objetivos instrumentais,
disseminando informações precisas e prestação de
serviços; e objetivos consumatórios, estimulando a
afetividade e subjetividade do usuário e sua participação
nos processos comunicacionais.
Estes aspectos têm sido identificados na página da
Semed no Facebook (fanpage:
https://www.facebook.com/educalauro/). No ambiente há um
processo coletivo de produção no qual, a gestão deixou de
ser apenas produtora de conteúdo, passando a ser também
receptora, o que converge com a ideia de Cidade
Educadora desenvolvida pelo próprio órgão. Desse modo,
a administração precisou desenvolver um processo de
moderação da página, conciliando as informações da
secretaria com o conteúdo gerado pelo usuário. Nesta
prática, os interlocutores trocam mensagens codificadas,
gerando efeitos cognitivos, afetivos e mesmo motores.
De certo, tais processos estão relacionados a áreas de
intervenção da educomunicação já que viabilizam
informações, conhecimentos, trocas de experiências,
comportando-se como aspectos da cultura de
convergência e de participação significativa. Para Jenkins
(2009; 2014), a convergência corresponde a um processo
que ocorre na mente das pessoas, envolvendo aspectos
sociais, econômicos, políticos e tecnológicos. Em um
processo de produção coletiva, estas convergências

73
culminam na cultura da participação significativa 16 , ou
cultura da conexão.
Assim, para contextualizar a perspectiva aqui
desenvolvida, este artigo apresenta no primeiro tópico
intitulado ‘#ParticipaçãoSignificativa’, uma reflexão sobre
a comunicação organizacional no Facebook, ilustrada pela
dinâmica da fanpage da Semed. No segundo, tópico, ‘Uma
proposta educomunicativa para a comunicação pública’,
apresenta-se um modelo de gestão da comunicação,
fundamentada pela educomunicação, cultura da
convergência e participação significativa.
A abordagem segue o método crítico-dialético, que,
segundo Martins (1994), apoia-se na concepção dinâmica
da realidade, incluindo relações dialéticas entre sujeito e
objeto, conhecimento e ação, teoria e prática, com
interesses transformadores. Obtém-se a validade científica
por meio de correlações que levem ao desenvolvimento de
uma lógica interna. Nesse âmbito, para o desenvolvimento
do estudo, utilizou-se como procedimentos
metodológicos a pesquisa bibliográfica, o monitoramento
da fanpage da Semed, no período de 15 de junho a 20 de
julho de 2019, e diálogos com gestores e educadores da
rede, neste mesmo período.
A imersão desses processos na cultura educacional
exige que se pense a comunicação organizacional como
uma atividade social, visto que os significados atribuídos
à mensagem estão vinculados às experimentações

16A ideia de cultura da participação significativa tem raízes em Jenkins, em 1992,


ao usar o termo “cultura participativa” para se referir a produções culturais e
processos interativos de comunidades de fãs, diferenciando-os de outros tipos
de espectadores.

74
cotidianas. Portanto, considera-se que na atual
cibercultura, a comunicação pública deve assumir uma
postura cada vez mais democrática e menos
personalizada, na qual a produção deva partir de
perspectivas comuns dos interlocutores – organização,
colaboradores e sociedade.

2 #ParticipaçãoSignificativa

A comunicação organizacional prescinde de


estruturações sígnicas para a constituição de mensagens
com uma determinada intenção. Comunica-se para causar
efeitos, ligando membros de uma cultura a partir de
determinadas perspectivas, que, por sua vez, colaboram
para a promoção de redes sociais, físicas e/ou virtuais, nas
quais são partilhados sentimentos, experiências e
conhecimentos. A interatividade em redes propõe a
comunicação como um ciclo, no qual começo e fim se
intercalam em sequencialidades infindáveis, constituindo
um processo relacionado ao movimento e interação das
coisas.

A comunicação é um processo precisamente porque se


desenvolve num contínuo espaço-temporal em que
coexistem e interagem permanentemente múltiplas
variáveis. [...] Além disso, a comunicação não tem
princípio e fim bem definidos porque a cadeia de causas
e a cadeia de consequências de um acto comunicativo são
parcialmente indetermináveis e, de algum modo,
infinitas. (SOUZA, 2006, p. 28).

75
Em uma direção que pode ser associada à semiótica
peirceana 17 , o autor propõe que o processo de
comunicação é influenciado por aspectos da percepção,
interpretação e significação contidos no universo do
receptor, que a partir de suas perspectivas, vinculadas a
experiências anteriores, penetra no processo (ou não). Para
o autor, o receptor percebe bem aquilo que quer perceber,
conduzido, a princípio, por emoções e subjetividades
contidas em sua memória, que estimulam a percepção, e
em seguida pela razão cognitiva.
Nesse sentido, é pertinente à comunicação
organizacional buscar nos processos culturais de seus
públicos, signos que estimulam a interatividade, gerando
produtos que alimentem continuamente o ciclo
comunicacional. “Uma organização não se dissocia do seu
ecossistema. Ela envia mensagens para o meio externo e
acolhe mensagens do meio externo” (SOUZA, 2006, p. 50),
fluxo que tem caracterizado a produção comunicacional
na fanpage da Semed. Ao se apropriar do conteúdo gerado
pelo usuário, a Secretaria estabelece conexões diretas entre
ações administrativas e práticas da comunidade escolar,
possibilitando que as representações da cultura
educacional sejam definidas pela própria comunidade,
afinal o Facebook propõe diversas formas de conexões entre
os interlocutores.

17 Para Peirce (2005), os processos de significações têm início a partir das


percepções dos sujeitos sobre qualidades dos signos, que correspondem à
primeiridade, perpassa pelas experiências e relações entre interlocutor e objetos,
fomentando um processo de interpretação que corresponde à secundidade, até,
finalmente, chegar ao processo de significação e produção simbólica da cultura,
o que corresponde à terceiridade.

76
Spadaro (2013), Coelho (2014), Marchi (2014) e
Mittermayer e Santaella (2014) apontam como principais
características do Facebook, a facilidade de
compartilhamentos, possibilidade de encontrar amigos, a
vantagem de utilizar diversas linguagens em uma única
postagem, facilidade de atualização, além da capacidade
da plataforma de desenvolvimento. Além disso, o Facebook
tornou-se um ambiente de discussões sobre temas da
atualidade. Dada a sua capacidade de transformação e de
interatividade, o ‘Face’, como é chamado popularmente,
tem se tornando também um ambiente de informações
sobre organizações e personalidades públicas.
A Fanpage da Semed tem possibilitado diversas
formas de interação e interatividade na comunidade
escolar, como foi observado durante o monitoramento da
página. Criada há três meses, a @educalauro tem uma
dinâmica bem específica, como deve ter toda página de
fãs. Geralmente, são realizadas, por dia, quatro
publicações, que seguem a dinâmica do público-alvo. A
primeira postagem ocorre entre as 7h30min e 8h10min; a
segunda, por volta das 11h30min; a outra, no intervalo
entre as 16h30min e 17h. Já a última publicação é realizada
entre as 19h e 20h.
O conteúdo varia entre informações produzidas pela
própria organização e gerado pela comunidade escolar,
que são educadores, arte-educadores, educandos ou
mesmo os pais dos educandos. A maior parte do conteúdo
manifesto pelo usuário, o que predomina na página, diz
respeito a metodologias de trabalho dos educadores bem
como a atividades desenvolvidas pelos educandos, nas
diversas disciplinas do currículo pedagógico e nas

77
produções extracurriculares como atividades literárias,
esportivas, artísticas e audiovisuais.
Para indicar o conteúdo gerado pelo usuário, a página
passou a usar, no período da monitoria, a hashtag
Participação Significativa (#ParticipaçãoSignificativa).
Como pontuaram educadores e gestores, em diálogo
durante o processo de observação empírica, com essa
dinâmica, a gestão alimenta o sentido de rede de ensino,
possibilitando que a comunidade escolar se sinta membro
integrante do processo produtivo da comunicação oficial.
A comunidade escolar deixa de ser apenas receptora de
conteúdo e passa a ser condutora da informação,
compartilhando, assim, a responsabilidade pelo
funcionamento da página, que, mais que instrumento de
publicização de ações públicas, torna-se fator de
socialização.
Este aspecto é indicado pela utilização da primeira
pessoa do plural nas publicações, pela marcação de
usuários que geram o conteúdo e por compartilhamentos,
curtidas e comentários. Conforme reiteram educadores e
gestores, isso amplia a interatividade e contribui para
fomentar o sentimento de rede social, alimentando a
autoestima dos membros da comunidade escolar, que se
sentem reconhecidos e valorizados em suas ações
cotidianas. Outro aspecto importante da página, é que há
o cuidado de gerar um conteúdo explicativo sobre as
publicações, com o objetivo de educar a população sobre
o fato narrado. As figuras 01 e 02, referentes ao conteúdo
gerado pelo usuário ilustram a abordagem.

78
Figura 01 - Publicação ‘Amarelinha Africana’ na fanpage da Secretaria
Municipal de Educação de Lauro de Freitas .

Fonte:
https://www.facebook.com/educalauro/?view_public_for=167895777440589.

Figura 02 – Vídeo da publicação ‘Amarelinha Africana’ na fanpage da Secretaria


Municipal de Educação de Lauro de Freitas

Fonte:
https://www.facebook.com/educalauro/?view_public_for=167895777440589

Como é possível perceber por meio da Figura 01, a


postagem tem como função principal educar a população
sobre o método de ensino desenvolvido pelo professor,

79
utilizando dos próprios recursos tecnológicos do docente,
ilustrado na Figura 02. Isso representa o processo de
convergência, já que se utiliza de tecnologias, práticas e
pensamentos do próprio educador, atribuindo significado
total à sua participação na fanpage. Nas trilhas de Alves
(1999), essa prática apresenta uma perspectiva orgânica da
comunicação pública, pondo em jogo aspectos como modo
de vida, posicionamento crítico, pluralismos, valores,
subjetividades, ideologias e poder.
De acordo com o educomunicador, esses aspectos
cooperam para a construção da cultura educacional como
uma unidade social, por meio das quais é possível o
desenvolvimento de políticas educacionais
fundamentadas nas práticas sociais, o que vai ao encontro
da ideia de Cidade Educadora proposta pela Semed.
Nessa direção, observa-se que a apropriação do conteúdo
gerado pelo usuário, a despersonalização da plataforma e
a exposição de ações da comunidade escolar atribuem
maior dinamismo à comunicação da Secretaria de
Educação, estabelecendo uma relação simbiótica entre as
funções instrumentais e consumatórias, afinal, ao mesmo
tempo em que se informa ações da gestão municipal,
estimula-se a subjetividade do público-alvo – a
comunidade escolar.
Nota-se uma mudança de cultura da organização, que
deveras é formalista, mas acaba sendo “provocada,
empurrada” por uma nova dinâmica de comunicação.
Afinal, o seguidor ser produtor de conteúdo é algo
também novo na cultura educacional, pois ela é marcada
por relações muito mais verticalizadas. Neste modelo, isto
começa a ser alterado. Assim, é possível identificar maior
entrosamento entre público-alvo e organização, gerando

80
sensação de pertencimento, trocas de conhecimentos,
elevação da autoestima dos educadores, educandos e
técnicos, redução de conflitos de interesses e a
publicização das diversas identidades culturais que
fomentam a cultura da organização.
Nas palavras de Alves (1999), esse processo de gestão
da comunicação a partir da cultura educacional, estabelece
sentidos de construção de sujeitos sociais, já que os
seguidores são agora produtores de conteúdos. Com isso,
desenvolvem-se modelos de articulação ampliada e de
educatividade em movimento, propondo ciclos contínuos
de migração e acumulação simbólicas. Por esse caminho,
verifica-se que a página coopera para a construção coletiva
da identidade da Semed, gerando signos de participação
na gestão, que acabam conduzindo a práticas
administrativas, que priorizam o diálogo com a
comunidade escolar na tomada de decisões (talvez o
termo participação aqui passa a ter um significado
concreto nas tomadas de decisão).
Por esse motivo, reitera-se, seguindo a proposta de
Souza (2006), que a comunicação de uma organização
[pública], como a Semed, deve abranger em um primeiro
momento os públicos internos, no caso a comunidade
escolar, para em seguida propor conexões com públicos
externos. Aliás, em tempos da cultura de convergência,
impossível pensar a produção comunicacional sem
conceber processos interativos e a apropriação dos
conteúdos múltiplos gerados pelos públicos.
Os processos comunicacionais desenvolvidos na
fanpage da Semed confirmam a perspectiva apresentada
por Jenkins (2009) de que o cidadão contemporâneo, cada
vez mais tem a necessidade de manifestar suas opiniões,

81
emoções, percepções, vontades, necessidades,
interferindo nas produções da informação das
organizações públicas. “A nova mídia opera sob
princípios diferentes daqueles que reagiam a mídia de
radiodifusão e que dominou a política americana por
tanto tempo: acesso, participação, reciprocidade e
comunicação ponto-a-ponto, em vez de um-para-muitos”
(JENKINS, 2009, p. 288).
Essa sistemática ‘sociodigital’ sugere que
organizações públicas comecem a repensar suas
estratégias e práticas comunicacionais, cujos sentidos
devem ultrapassar a lógica funcionalista da Escola
Americana 18 , principalmente no campo governamental,
acolhendo manifestações dos cidadãos, e por meio delas
estimular os campos perceptivos, motores e cognitivos dos
próprios cidadãos. Assim, com base na experiência da
fanpage da Secretaria Municipal de Educação de Lauro de
Freitas, apresenta-se no próximo tópico, uma proposta de
gestão da comunicação. Acredita-se que a lógica da
educomunicação seja um caminho propício para essa
construção, que deve priorizar processos de socialização e
despertar da cidadania em detrimento de imposições
ideológicas, como têm praticado governos, ao longo da
história.

18De acordo com Mattelart (2004), as pesquisas da Escola Americanas são


caracterizadas pelo funcionalismo, medidas quantitativas e concepção da
sociedade enquanto formação de massas. “O pensamento da sociedade como
organismo, como conjunto de órgãos desincumbindo-se de funções
determinadas, inspira as primeiras concepções de uma Ciência da
Comunicação” (MATTELART, 2004, p. 13).

82
3 Uma proposta educomunicativa para a comunicação
pública

A experiência da fanpage da Secretaria Municipal de


Educação de Lauro de Freitas mostra que é possível e
necessária uma mudança nas práticas comunicacionais de
organizações públicas. Afinal, na rede, estão segmentos
sociais ávidos por respostas práticas a suas inquietações,
que potencializam a política da participação, não se
contentando apenas com narrativas informativas vindas
de um único eixo produtor. Conforme sinaliza Jenkins
(2014), esse movimento caracteriza a mudança na ideia de
comunicação social e aqui se aplica à comunicação
organizacional, centrada no deslocamento da ação de
distribuição de informação, típico dos meios eletrônicos e
impressos, para o processo de circulação em ambientes
digitais, o que fomenta uma cultura participativa.
Compreende-se cultura da participação como um
processo produtivo no qual o público não pode mais ser
visto apenas como consumidor de mensagens e produtos.
São usuários que estão dando as diretrizes dos processos
comunicacionais, a partir de suas intervenções nas
estratégias empresariais e governamentais, não apenas
compartilhando, mas também moldando e
reconfigurando conteúdos em narrativas específicas, de
modo que se torna impossível prever e controlar as
manifestações sociais em plataformas digitais.
Um caminho para cumprimento desta proposta, é sem
dúvida, trabalhar com processos de educomunicação na gestão
da informação organizacional. Pelas discussões propostas aqui
e partindo de proposições de Alves (1999) e de Soares (1999),
entende-se educomunicação como um conjunto de ações

83
inerentes ao planejamento, implementações e avaliação de
processos, programas e produtos destinados a criar e a
fortalecer ecossistemas comunicativos, qualificados como
abertos e participativos. A comunidade escolar municipal
de Lauro de Freitas é um exemplo, considerando,
inclusive, que na perspectiva da Cidade Educadora, esta
comunidade não se restringe a professores e educandos,
mas à totalidade de munícipes e de outras organizações
que se interessam pela dinâmica educacional (formal e
informal), e que de alguma forma ligam-se a ela.
Isso implica que um planejamento de gestão da
comunicação deve ter objetivos definidos, delimitação de
estratégias operacionais e de produtos comunicacionais,
considerando os diversos públicos da organização. Por
sua vez, compreendem-se que estes produtos são digitais,
envolvendo a multiplicidade de linguagens possíveis no
ciberespaço; impressos, que atribuem materialidade à
informação; e produtos sociais, que possibilitam a
interação face a face entre gestão e públicos. Abaixo está o
modelo de gestão da comunicação, tendo como referência
a experiência da fanpage da Semed-Lauro de Freitas.

4 Objetivos

1. Construir processos educativos e


autotransformadores referentes à cultura
organizacional;
2. Estabelecer a comunicação de forma estruturada
dentro de uma perspectiva participativa;
3. Desenvolver produtos e estratégias de
comunicação com base na cultura da convergência;

84
4. Estimular o compartilhamento de pensamento e
informações entre os públicos internos e externos
da organização;
5. Propor articulação entre organização e seus
públicos internos e externos;
6. Propor articulação entre organização e imprensa;
7. Estimular a participação de públicos internos e
externos da organização na produção
comunicacional, incluindo neste âmbito projetos e
ações socioeducativas;
8. Gerar debates sociais.

5 Estratégia de ação

A estratégia de ação corresponde ao desenvolvimento


de caminhos apropriados para se atingir os objetivos
propostos. Isso implica, na delimitação de temáticas
conceituais que direcionem as práticas operacionais.
Nesse âmbito, observam-se que as áreas de atuação da
educomunicação propostas por Soares (1999) se
constituem com trilhas ideais para o desenvolvimento da
gestão da comunicação de setores públicos. Elas tratam da
conexão entre práticas comunicacionais e sociais, no
sentido de produzir informações e conhecimentos, de
modo contínuo, que podem fomentar ciclos de produção
autossustentáveis e autorrenováveis, utilizando diversas
linguagens e recursos operacionais.
Assim fazem parte da estratégia do presente plano, as
seguintes proposições:

Educação para a comunicação – capacitar gestores,


técnicos e professores vinculados ao órgão para a

85
produção comunicacional contemporânea, a partir de suas
próprias demandas.
Pedagogia da comunicação – usar recursos de
comunicação para facilitar a troca de informações entre
objetivos e propostas da organização e as perspectivas de
colaboradores e usuários dos serviços e produtos
oferecidos.
Artes e hábitos locais – apropriação da linguagem
artística e de hábitos e costumes locais para promover
trocas de informações e conhecimentos bem como ampliar
os processos interativos entre os diversos públicos
internos e externos. Estratégia voltada para melhoria do
relacionamento da instituição com a sociedade e que
também deve ser utilizada em campanhas de programas
específicos promovidos pelo órgão.
Mediação tecnológica – capacitar profissionais para
inserir tecnologias nos processos operacionais.
Consideram-se tecnologias como quaisquer artefatos
utilizados pelos estudantes para desenvolverem suas
atividades. A estratégia objetiva atualizar os
colaboradores, promovendo maior sinergia com o
comportamento e perspectiva dos usuários.
Epistemologia da comunicação – promoção e
produção de estudos científicos e técnicos sobre temas
produtivos da organização e aqueles propostos por seus
públicos.
Gestão da comunicação – implantar e otimizar fluxos
de informação junto aos públicos internos e externos do
órgão. A estratégia envolve o diagnóstico, planejamento,
implementação e avaliação de todos os processos sociais
desenvolvidos pela organização.

86
Produtos – A execução dessas estratégias deve
compreender produtos digitais, impressos e sociais.

Produtos digitais

Site: espaço para informações sobre a organização,


descrevendo suas atividades. Deve conter os seguintes
links:

• Institucional (contendo objetivos, estrutura


organizacional, legislação, equipe e diretrizes
operacionais);
• Rede Produtiva (definição dos setores da
organização. Por exemplo, no caso da Secretaria de
Educação deve conter: níveis de ensino, polos
regionais, unidades educacionais, dados
estatísticos, programas e projetos, organizações de
professores, organização de alunos, conselhos
municipais, conselho tutelar, conselho municipal
da criança e do adolescente e a vara da infância e
da juventude, entre outros setores);
• Serviços (ambiente voltado para
operacionalização de serviços úteis aos públicos
internos e externos da organização. No caso da
secretaria de educação pode ser: área do servidor,
área do aluno, produção docente, editais e
portarias, fontes de pesquisa, artigos científicos
sobre educação e educomunicação,
desenvolvimento de atividades pedagógicas,
disponibilização de links para outros sites úteis);
• Conteúdo Informativo (notícias, fotos, vídeos –
devem ser referentes não apenas à organização,

87
mas à totalidade de aspectos que estão a ela
relacionadas. Isso implica em espaços para a
disponibilização de conteúdos noticiosos
produzidos pelo público interno);
• Redes (Fanpage, grupo privado no Facebook,
Instagram, Twitter, YouTube);

O site deve ser atualizado diariamente com


informações referentes a ações da instituição, das
unidades educacionais, disponibilização de conteúdo
educativo, entre outros temas de interesses dos públicos
alvos. A construção deste produto, segue as estratégias da
mediação tecnológica, pedagogia da comunicação e
epistemologia da comunicação, pois se trata do
desenvolvimento de processos interativos por meio de
ambiente digital voltado para compartilhamento de
informações e conteúdos científicos.

Redes

• Twitter – ferramenta importante para pautar a


imprensa. Deve ser atualizada a cada ação da
Secretaria e/ou da gestora representando a
organização, seguindo a estratégia de mediação
tecnológica;
• Instagram – atualizado periodicamente com cards,
memes, fotografias, produzidos pela organização e
por seus públicos internos e externos, além de
transmissão ao vivo de eventos. Os produtos
devem valorizar especificidades, personalidades e
curiosidades da cultura local (a utilização desta

88
rede obedece às estratégias de mediação
tecnológica e artes e hábitos locais);
• Fanpage – espaço para trocas de informações,
contato com públicos internos e externos,
disponibilização de conteúdos produzidos pela
organização e por seus públicos,
compartilhamento de cards, memes, vídeos,
transmissões ao vivo de eventos. De acordo com o
estudo sobre a fanpage da Semed – Lauro de
Freitas, nota-se que a produção comunicacional no
Facebook pode estar relacionada a todas as áreas
de intervenção da educomunicação propostas por
Soares (1999), que correspondem às estratégias
operacionais que direcionam este plano.
Mediação tecnológica, artes e hábitos,
pedagogia, epistemologia e educação para a
comunicação são todas estratégias que orientam a
produção de uma fanpage. Além disso, o
monitoramento é um exercício importante para o
desenvolvimento de estratégias da gestão. No
entanto, verifica-se que as manifestações dos
usuários devem ser analisadas a partir de uma
metodologia que permita a relação entre o
conteúdo gerado em rede e as experiências,
contexto social e seus conceitos sobre as propostas,
produtos e dinâmicas da organização, como por
exemplo, a análise da memória coletiva. Afinal, no
período de monitoramento da fanpage da Semed,
notou-se que o conteúdo gerado pelo usuário
define a identidade da página, porque tem maior
poder de representação.

89
• Grupo privado no Facebook – Deve reunir o
público interno da organização para discussão de
temáticas do interesse de todos, correspondendo a
uma estratégia de gestão da comunicação;
• Canal no YouTube – Espaço para disponibilização
de programas produzidos pela organização e por
seu público interno. Os programas devem ser
voltados para temas da cultura organizacional e
local, em diversos formatos: entrevistas,
reportagens, talk shows, blogs, humor,
documentários, seguindo estratégias de educação
pelas artes e de mediação tecnológica.

Produtos impressos

Os produtos impressos devem seguir estratégias da


mediação tecnológica, mediação tecnológica, artes e
hábitos, pedagogia da comunicação, epistemologia da
comunicação e educação para a comunicação, todas
estratégias que orientam a elaboração dos produtos
impressos, que envolvem produções jornalísticas,
publicitárias e técnico-científicas.
• Informativo quadrimestral – folhetim sobre as
ações da organização, valorizando resultados
obtidos pelos públicos externos, bem como
dissipando informações sobre projetos e
perspectivas do órgão. As editorias devem ser
flexíveis, elaboradas seguindo a sugestão dos
públicos internos e externos, observadas em redes
sociais;

90
• Folder educativo – com informações pertinentes às
demandas geradas em rede, construídos a partir
da análise das manifestações dos usuários;
• Coletâneas técnico-científicas – periódico
semestral ou anual, contendo procedimentos e
descobertas técnicas desenvolvidas pelos
colaboradores da organização, com análises a luz
de correntes teóricas.

Produtos sociais

Os produtos sociais estão relacionados a estratégias


de gestão da comunicação, utilizando para tanto, de
diretrizes da educação para a comunicação, artes e
hábitos, epistemologia e pedagogia da comunicação e
mediação tecnológica.

• Reuniões periódicas com setor administrativo do


órgão – avaliação da produção total, comentários
sobre projetos, sugestões de ações, sugestões de
temas para debates.
• Reuniões periódicas com setores operacionais –
discussão de ações da organização e sobre temas
pertinentes à contemporaneidade, sugeridos
diretamente pelo público alvo e/ou a partir da
análise de suas manifestações nas redes digitais. A
partir das discussões, colher sugestões para
elaboração de projetos e de tomadas de decisões da
organização.
• Desenvolvimento de projetos intersetoriais – tem
a função de potencializar os fluxos de informações
horizontais e verticais da organização, reduzir

91
ruídos e formação de subgrupos fechados no
interior da organização (‘panelinhas’), ampliar
processos inovadores e criativos, favorecer à
diversidade, conciliar interesses, ampliar a
dinâmica da organização, ampliar a troca de
conhecimentos, valorizar os colaboradores e
fomentar processos de socialização no interior da
organização.
• Reuniões periódicas com públicos externos – A
ideia é discutir a atuação da organização em
eventos pontuais, utilizando artes e hábitos locais,
propondo sempre temáticas do interesse popular
para discussões.

O desenvolvimento desta estratégia propõe que o


máximo possível de setores administrativos participe do
processo comunicativo. Essa perspectiva colabora para a
dinamização dos fluxos informativos entre
departamentos, ampliação das relações interpessoais,
redução de ruídos internos, e propõe uma gestão
compartilhada da informação e produção de
conhecimentos. Busca-se envolver todos os públicos da
organização na produção comunicacional, fomentando
um processo ativo de convergências e participação
significativa.
A proposta consiste na valorização das condições de
expressividade, mediante práticas culturais e artísticas,
assim como através do uso dos recursos disponibilizados
pela cibercultura. Desse modo, considera-se que este
plano gerencial colabora para a construção de uma gestão
democrática dos processos de comunicação no setor
público, fugindo a lógica funcionalista e imperativa que

92
tem dominado a produção de conteúdos e informações
dos setores governamentais.

6 Considerações

A análise da fanpage da Semed propõe que a


comunicação de uma organização pública deve assumir
uma postura democrática, na qual a produção deva partir
de perspectivas comuns dos interlocutores (organização,
colaboradores e sociedade). Como a comunicação coopera
para a construção de realidades, conclui-se que a partir de
uma gestão da informação e de conteúdos pertinentes à
organização fundamentada em pilares da
educomunicação, cultura da convergência e da
participação significativa é possível a incorporação do
conceito de Cidade Educadora desenvolvido pela
organização.
Ou melhor, não somente a incorporação do conceito,
mas também colocar este viés da comunicação, com esta
concepção de educomunicação, para fortalecer a
construção de Lauro de Freitas como uma cidade
educadora. Nesse conceito de educomunicação há
também um aspecto relacionado com a interação dos
saberes dos diversos sujeitos envolvidos; não é apenas um
lado – que detém simbolicamente poder, tecnologia,
conhecimento – que está apto para produzir conteúdo e
informações (no caso o poder público – Semed), mas a
comunidade escolar também e no mesmo espaço.
Está mais do que claro que, na contemporaneidade, os
órgãos públicos precisam rever seus métodos de atuação
e de produção de conteúdos, criando articulações entre
demandas populares e práticas administrativas. Em

93
tempos de cultura da convergência, a comunicação
organizacional deve se valer de diversas estratégias,
atribuindo simbioticamente caráter instrumental e
consumatório às produções. Isso implica na geração de
conteúdos precisos, claros e objetivos, ao mesmo tempo,
capazes de estimular aspectos sensíveis e cognitivos que
compõem as práticas individuais e coletivas dos públicos-
alvo da organização.
Desse modo, considera-se que a proposta elaborada
para a comunicação do setor público, fundamentada na
experiência da fanpage da Semed, é pertinente para
despertar nos cidadãos sentimentos de pertença à
instituição, reconhecendo-a como elemento importante da
sociedade. Por sua vez, a atual cibercultura propõe que é
preciso buscar na consciência popular aspectos que devem
ser apropriados às produções comunicacionais,
envolvendo fatores tecnológicos, sociais e econômicos.
Assim, verifica-se que comunicação pública deve
envolver aspectos das subjetividades e cognições dos
cidadãos. Para tanto, os órgãos devem se apropriar de
diversas plataformas de mídia, construindo narrativas
complementares e interdependentes. Principalmente,
deve-se buscar nas experiências dos colaboradores e da
sociedade, elementos que, de fato, reflitam suas relações e
perspectivas para com a organização.
Por fim, afirma-se que a gestão comunicacional dos
órgãos públicos deve superar o antigo modelo
tecnocrático de produção de releases e demais dispositivos
de consenso, e atuar como um processo interativo que
promova o compartilhamento de consciências entre
gestão e públicos, situando a comunicação e a própria
organização no âmbito da contemporaneidade.

94
Importante destacar que, como hoje, as pessoas estão
conectadas pelo digital, nos processos de participação será
preciso também inovar considerando esta nova era, afinal,
hoje os desafios são também de outra ordem.

REFERÊNCIAS

ALVES, L. R. Política de formação e formação política de gestores para


a comunicação e a cultura. In: BACCEGA, M. A.; COSTA, M. C. C.
Gestão da comunicação. São Paulo: Paulinas, 1999. p. 189-220.
COELHO, P. Um olhar semiótico sobre CityVille do Facebook. In:
SANTAELLA, L. Sóciotramas: Estudos multitemáticos sobre redes
digitais. São Paulo: Estação das Letras e Cores, 2014. p. 105-130.
JENKINS, H. Cultura da Convergência. 2. ed. São Paulo: Aleph, 2009.
JENKINS, H. Cultura da conexão: criando valor e significado por meio
da mídia propagável. São Paulo: Aleph, 2014.
LEMOS, A. Cibercultura: Tecnologia e vida social na cultura
contemporânea. Porto Alegre: Sulina, 2002.
MARCHI, C. F. A sinalização sociocultural do design do Facebook. In:
SANTAELLA, L. Sóciotramas: Estudos multitemáticos sobre redes
digitais. São Paulo: Estação das Letras e Cores, 2014. p. 159-177.
MARTINS, G. de A. Manual para elaboração de monografias e dissertações.
2. ed. São Paulo, Atlas, 1994.
MATTELART, A. e M. História das teorias da Comunicação. 7. ed. São
Paulo: Loyola, 2004.
MITTERMAYER, T.; SANTAELLA, L. Dialogismo no Facebook. In:
SANTAELLA, L. Sóciotramas: Estudos multitemáticos sobre redes
digitais. São Paulo: Estação das Letras e Cores, 2014. p. 91-100.
PEIRCE, C. S. Semiótica. 3. ed. São Paulo: Perspectiva, 2005.
SOARES, I. de O. Comunicação e Educação: a emergência de um novo
campo e o perfil de seus profissionais. Contato, Brasília, n. 2, ano 1,
jan./mar, 1999.
SOUZA, P. J. Elementos de teoria e pesquisa de comunicação dos media. 2. ed.
rev. ampl. Porto: [s. n.], 2006. Disponível em:
http://www.infocambiouniversitario.com.br/pag/sousa-jorge-
pedro-elementos-teoria-pequisa-comunicacao-media.pdf/ . Acesso
em: 15 de abril de 2016.
SPADARO, A. WEB 2.0: redes sociais. São Paulo: Paulinas, 2013.

95
96
O DESENVOLVIMENTO DE UM APLICATIVO
MÓVEL NO CONTEXTO DO TELETANDEM

Aldemi Severino da Silva


Aliny Vieira Carneiro
Fábio Marques de Souza

As tecnologias digitais de informação e comunicação,


doravante TIDCs, apresentam presença marcante no
contexto social e educacional vigente. Isso corresponde
afirmar uma sociedade sediada pela diversidade de
serviços/benefícios advindos desse novo modelo/formato
tecnológico, os quais podem ser bastante promissores para
o cenário educacional e, em especial, para o processo de
ensino-aprendizagem de línguas adicionais.
Este texto tem como objetivo relatar um projeto PIBIC
que teve como foco o planejamento, a concepção, o
desenvolvimento, a implantação, a testagem e o
aprimoramento de um aplicativo para smartphones para
ser utilizado pelos interagentes participantes das ações do
“INTERCULT: aprendizagem colaborativa e intercultural
de línguas via Teletandem”, para auxiliar os participantes
do Teletandem via UEPB com vistas a mediar e
potencializar seus processos de intercâmbio linguístico-
cultural.

O professor como mediador intercultural e as TDICS

A inserção da internet como aliada no processo de


ensino-aprendizagem não se resume na utilização de
recursos digitais, implica numa reformulação de todo o
processo, no qual o professor deixa de ser o detentor do

97
saber e passa a ser mais um mediador na construção do
conhecimento.
É importante, no ensino mediado por recursos
digitais, que os materiais didáticos utilizados sejam
adequadamente planejados de acordo com cada situação,
possibilitando uma integração dos conteúdos formais,
abordados em sala de aula, com atividades reais de
interação na língua-alvo propostas para a internet,
possibilitando que o aluno amplie e aprofunde sua
compreensão acerca dos conteúdos estudados na sala de
aula.
Os envolvidos no processo de aprendizagem mediada
por recursos tecnológicos precisam desenvolver a
habilidade de saber utilizá-los, relacioná-los, sintetizá-los,
analisá-los e, por fim, avaliá-los no seu potencial
educativo para aprendizagem (LÉVY, 2010, p. 174).

Neste sentido, Almeida Filho (1993) argumenta que,


para potencializar os processos de ensino-aprendizagem
de línguas, somente uma mudança no material didático
por parte das instituições não é suficiente, temos que levar
em consideração todos os elementos envolvidos na
operação global do ensino de línguas:

Para produzir impacto (perceptível), mudanças


(profundas) e inovações (sustentadas) não são suficientes
alterações apenas no material didático, mobiliário, nas
verbalizações do desejável pelas instituições, nas técnicas
renovadas e nos atraentes recursos audiovisuais. São
cruciais novas compreensões vivenciadas da abordagem
de aprender dos alunos e da abordagem de ensinar dos
professores (ALMEIDA FILHO, 1993, p. 13).

98
A utilização de recursos tecnológicos digitais pode
influenciar de maneira positiva o processo de ensino-
aprendizagem de línguas adicionais, principalmente por
meio de aplicativos móveis, que vêm conquistando um
espaço de grande importância e popularização por meio
dos indivíduos que buscam aprender novos idiomas para
além dos espaços formais, mostrando que o engajamento
e o gerenciamento da autoaprendizagem têm se destacado
como uma característica marcante da educação
contemporânea.

Do Tandem ao Teletandem

A utilização de recursos tecnológicos digitais pode


influenciar de maneira positiva o complexo processo de
ensino-aprendizagem colaborativo e intercultural de
línguas adicionais, principalmente por meio de aplicativos
móveis, que vêm conquistando um espaço de grande
importância e popularização por meio dos indivíduos que
buscam aprender novos idiomas para além dos espaços
formais, mostrando que o engajamento e o gerenciamento
da autoaprendizagem têm se destacado como uma
característica marcante da educação contemporânea.
De acordo com Souza (2017), no âmbito das pesquisas
em Linguística aplicada, o termo complexo utilizado para
referir-se ao ensino-aprendizagem aqui apresentado, não
faz alusão a um vocabulário usado para comparação
“simples” versus “complexo”, uma vez que se associando
à teoria de Edgar Morin, que diz respeito a complexidade
do latim complexus representando aquilo que é tecido em
conjunto, “a complexidade é efetivamente o tecido de
acontecimentos, ações, interações, retroações,

99
determinações, acasos, que constituem o nosso mundo
fenomenal” (MORIN, 1991, p. 17).
A partir de uma consistente revisão bibliográfica,
Benedetti (2010) apresenta que, embora ainda pouco
conhecida no Brasil, a aprendizagem de línguas em tandem
surgiu na Alemanha no final dos anos 1960, tendo se
difundido nas décadas seguintes a outros países da
Europa como uma modalidade alternativa e
complementar à aprendizagem formal de línguas
adicionais.
Inicialmente, o termo tandem fazia referência a uma
bicicleta para duas pessoas, que se sentam uma atrás da
outra e que tem pedal para ambos. Com o passar do
tempo, este termo também passou a ser utilizado para
definir um conjunto de duas pessoas que tem uma
atividade comum ou que colaboram em algo. No campo
do ensino-aprendizagem de línguas, “a aprendizagem em
tandem consiste no intercâmbio e compartilhamento de
conhecimento entre indivíduos de culturas diferentes,
com propósitos de aprendizagem de línguas de modo
colaborativo” (BENEDETTI, 2010, p. 21, grifo do autor).
Esta prática está baseada na concepção sociocultural
do desenvolvimento humano e concebe, portanto, a
aprendizagem como processual e socialmente mediada
que fomenta a constituição de parcerias entre pessoas que
desejam aprender uma língua adicional e concordam em
atingir essa meta por meio de práticas com falantes
proficientes no idioma que se deseja aprender.
Resumidamente, aprendizagem em tandem significa
provimento recíproco de apoio e instrução entre dois
aprendizes, onde cada um deles é falante nativo (ou
proficiente) na língua-alvo do outro que se realiza

100
presencialmente ou mediante outro meio de comunicação
(BENEDETTI, 2010).
São características da aprendizagem em tandem: i)
aberta, já que não segue um programa curricular fixo; ii)
intercultural, pelo fato de envolver diferentes línguas e
culturas; iii) interpessoal, praticada por pares de
aprendizes; iv) socialmente simétrica, envolve a
alternância de papéis, já que num momento se é aprendiz
da língua do outro e, noutro, professor do seu próprio
idioma.
O trabalho em tandem pode ser realizado em
diferentes perspectivas:
• Presencial – chamado também face a face. A
comunicação é predominantemente oral, porém os
participantes podem recorrer, sempre que
queiram, a materiais escritos e também podem
fazer anotações.
• Por correio eletrônico (e-mail) – Conhecido também
por e-tandem. Levando em conta que os
participantes em e-tandem se encontram em lugares
diferentes, é difícil organizá-lo seguindo as
mesmas pautas que no tandem presencial.
• Teletandem – Diferencia-se do tandem presencial e
do e-tandem por permitir uma interação completa
(escrita, áudio e vídeo) em tempo real entre os
participantes, devido a alguns programas de
comunicação gratuitos através da internet
(RAMMÉ, 2014).

Independente da perspectiva adotada, trata-se de


uma possibilidade para comunicação autêntica na língua-
alvo. Neste contexto, as informações negociadas a respeito

101
da cultura, da forma de vida, dentre outros elementos de
determinado país, provêm de uma pessoa concreta, com
sua personalidade e percepção do que está a sua volta.
É um complemento para a aula de língua adicional,
tanto se for realizado de forma presencial como pela
internet. Aprender em tandem é uma prática realizada por
meio de comunicação autêntica com um interlocutor
nativo ou com um bom nível de proficiência na língua-
alvo, que serve de modelo e que pode corrigir e auxiliar na
hora de expressar-se.

Em sua concepção atual e em suas muitas formas (em


duplas, em grupos, em e-tandem, tandem face a face,
teletandem, etc), o tandem tornou-se, antes de tudo, uma
atividade complementar ao processo tradicional de
aprendizagem de línguas (em sala de aula,
principalmente), pois coloca os aprendizes de língua
estrangeira em contato com falantes nativos da língua
alvo, propiciando assim ambientes comunicativos
autênticos onde estes podem desenvolver suas
habilidades sociocognitivas, interculturais e linguísticas
de maneira plena e irrestrita (RAMMÉ, 2014, p. 5, grifo do
autor).

O fato de que ambos podem de alguma forma, falar a


língua do outro, permite que possam se ajudar
mutuamente mediante explicações, comparações entre as
culturas ou os esquemas linguísticos. Além disso, ao
estabelecer uma comunicação entre pessoas de diferentes
comunidades de línguas e de culturas, facilita-se
igualmente a aprendizagem intercultural.

102
O desenvolvimento da alteridade e da competência
intercultural se apresenta como um fator importante com
a mediação tecnológica. Sempre fez parte da
aprendizagem de línguas, no entanto, atualmente tem
adquirido uma crescente importância. Uma vez
apresentado em que consiste o Teletandem, no próximo
item contextualizaremos essa prática no âmbito da UEPB.

O Teletandem na UEPB como Extensão, Pesquisa e


Ensino

Na Universidade Estadual da Paraíba, o projeto


“INTERCULT: Aprendizagem Colaborativa e
Intercultural de Línguas via Teletandem” vem sendo
desenvolvido desde o ano de 2014. Atualmente, conta com
a colaboração da Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE), do Instituto Federal da Paraíba (IFPB), da
Universidade Federal de Integração Latino-Americana
(UNILA), da Universidad Nacional de Rosario (UNR), da
Universidad Autónoma de México (UNAM), do Instituto de
Idiomas de Salta e o Profesorado Superior de Lenguas Vivas de
Salta.
A proposta visa fomentar o intercâmbio linguístico-
cultural entre os alunos em português e espanhol como
línguas adicionais e compreende o linguístico como
elemento fundamental no processo de integração regional
e, dessa forma, o espanhol e o português são pensados
como línguas adicionais multidimensionais e
interculturais de forma a promover uma integração que
considere a América Latina como uma construção
cultural, histórica, política e não somente uma construção
geográfica (SOUZA, 2014).

103
.Na última reforma do Projeto Político de Curso (PPC)
de Letras-Espanhol do Campus I da UEPB, em 2016, foram
incluídas as “PRÁTICAS DE INTERCÂMBIO
LINGUÍSTICO-CULTURAL VIA TELETANDEM” como
um componente curricular optativo (60h), na qual o PPC
está em fase de implantação e – em breve – este
componente curricular será oferecido regularmente e
contará como crédito na integralização curricular dos
alunos.

Contribuições das interações para o desenvolvimento e


aperfeiçoamento do aplicativo

As interações realizadas em prol do aperfeiçoamento


e desenvolvimento do aplicativo ocorreram por meio do
projeto de extensão: “TELETANDEM UEPB”. É
importante destacar que “a aprendizagem em tandem
consiste no intercâmbio e compartilhamento de
conhecimento entre indivíduos de culturas diferentes,
com propósitos de aprendizagem de línguas de modo
colaborativo” (BENEDETTI, 2010, p. 21, grifo da autora).
As duplas foram selecionadas de acordo com
disponibilidade de horário e interesses em comum. As
interações foram realizadas no período de janeiro a
dezembro de 2016, por duas duplas: dupla 1 - composta
por Aldemi Severino da Silva, brasileiro de 24 anos e
Sebastian Vildoza, argentino de 23 anos; dupla 2 - formada
por Aliny Vieira Carneiro, brasileira de 23 anos e Inés
Castillo, argentina de 41 anos. Ambas mediadas pelo
professor Francisco Reynaldo Martins Gabriel, mestre na
área de Linguagens, Culturas e Formação de Docente pelo
Programa de Pós-Graduação em Formação de Professores

104
(UEPB). Desse modo, os interagentes vivenciaram e
observaram de maneira positiva o uso das tecnologias
digitais no processo de ensino-aprendizagem de línguas
adicionais.
Os procedimentos aqui descritos e compartilhados
durante a pesquisa que delinearam as ações em Teletandem
merecem um olhar atento no que diz respeito a algumas
lacunas existentes, no que se diz respeito à internet,
câmera, microfones e outros componentes de que as
interações dependiam para ser realizadas, ocasionando o
adiamento de algumas interações, que eram feitas através
do Skype, entretanto todos esses acontecimentos
contribuíram e instigaram para a fomentação do aplicativo
INTERCULT-UEPB como forma de colaborar para o
melhor acontecimento das interações e aprendizagem
advindas de tal método de ensino-aprendizagem
colaborativo e intercultural de línguas adicionais.
Para esta etapa do projeto, foram iniciados trabalhos
específicos e detalhados para confecção e produção de
materiais do qual o aplicativo estava necessitando para ser
finalizado. Para isso, ocorreu a utilização do aplicativo
inicial em fase de teste e com pouco conteúdo, mas com o
tempo e com as observações ocorreram melhorias
significativas com a intenção de contribuir para que o
material fosse um mediador eficaz no processo de ensino-
aprendizagem de línguas adicionais, desenvolvendo a
competência intercultural que, segundo Salomão (2012, p.
108), é “a capacidade de perceber, usando-se de todos os
mecanismos disponíveis, a diversidade do outro, e sendo
capaz de dominar seus sentimentos pessoais, de
neutralizar suas crenças e de pensar de forma a poder se
colocar no lugar do outro”.

105
O desenvolvimento e a popularização de dispositivos
móveis vêm revolucionando e tornando mais acessível o
acesso à informação, abrindo espaço para ser descoberto e
aperfeiçoado para também contribuir no processo de
ensino-aprendizagem.
Nos novos tempos, a aprendizagem pode ocorrer por
meio de vários recursos midiáticos e, principalmente, em
plataformas de massa como, por exemplo, as redes sociais
e os aplicativos móveis. A sociedade atual,

Vivência uma realidade em que as crianças nascem e


crescem manuseando as tecnologias que estão ao seu
alcance. [...] A era da informação é fruto do avanço das
novas tecnologias que estocam, de forma prática, o
conhecimento e gigantescos volumes de informações. [...]
Estas novas tecnologias permitem-nos acessar não apenas
conhecimentos transmitidos por palavras, mas também
por imagens, sons, vídeos, dentre outros. (VIANA, 2004,
p. 11-12)

Sendo assim, através do contato autêntico com a


língua meta, por meio das interações que consistem em
um importante intercâmbio cultural, ainda é possível
compreender de uma forma mais ampla que,

[a] aquisição de uma língua estrangeira passa a exigir na


contemporaneidade que se acompanhe ainda mais o
passo da evolução que a sociedade tem experimentado
com as inovações tecnológicas, em todos os seus âmbitos.
Ao letramento digital e ao domínio de estratégias de
categorização de informações soma-se a necessidade de que
se priorize a em uso, grávida de sentidos, numa prática reflexiva
(CRUZ, 2011, p. 107, grifo do autor).

106
Alguns resultados

A partir das observações e interações realizadas”,


ocorreu a finalização e aperfeiçoamento do aplicativo para
celular móvel Intercult-UEPB, estando pronto para o uso
por parte de aprendizes que buscam a aquisição de uma
nova língua de forma inovadora e interativa. O aplicativo
móvel foi publicado no dia 21/07/2018 na PlayStore.
Dentro da proposta de elaboração e concepção do
aplicativo Intercult-UEPB, houve reflexões e
preocupações em favorecer um material em que as
funcionalidades gerais deixassem o acesso à informação
mais intuitivo e eficaz. Para que isso ocorresse, podemos
destacar algumas de suas funções que incluem:
• Acesso facilitado à plataforma do Teletandem, sem
precisar sair do aplicativo;

Figura 01 - Captura de tela do aplicativo


Intercult UEPB – Tela de acesso.

Fonte: Play Store. Corpus reunido durante o


desenvolvimento do projeto "INTERCULT".
• Acesso a material de apoio (Google brasileiro e
espanhol, dicionário online em português e

107
espanhol e conjugador verbal em português e
espanhol);
Figura 02 - Captura de tela do aplicativo
Intercult UEPB – Material de apoio.

Fonte: Play Store. Corpus reunido durante o


desenvolvimento do projeto "INTERCULT".

Palavras não conclusivas

Tendo em vista os aspectos observados, foi possível


compreender e avaliar as principais contribuições e
impactos esperados pela proposta da criação do aplicativo
a partir do desenvolvimento e a popularização de
dispositivos móveis, que vêm revolucionando e tornando
mais acessível o acesso à informação, abrindo espaço para
ser descoberto e aperfeiçoado para também contribuir no
processo de ensino-aprendizagem de línguas adicionais.
Dessa maneira, a pesquisa permitiu colaborar para o
estudo e apresentação de aplicativos móveis como um
novo espaço educacional, uma enorme fonte de cultura e
conhecimento, contribuindo para o melhoramento dos
recursos da aprendizagem dos interagentes participantes
das ações do “INTERCULT: aprendizagem colaborativa e
intercultural de línguas via teletandem”, além de gerar

108
dados para futuras pesquisas que tenham por finalidade
potencializar o ensino-aprendizagem de línguas
adicionais.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA FILHO, J. C. P. Dimensões comunicativas no ensino de línguas.


Campinas: Pontes, 1993.
ANDRÉ, M. E. D. A. Etnografia da Prática Escolar. Campinas-SP: Editora
Papirus, 1995.
BENEDETTI, A. M. Dos princípios de tandem ao teletandem. In:
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110
NET-ATIVISMO E AS NOVAS NARRATIVAS NO
CONTEXTO DA COMUNICAÇÃO EM REDE

Marina Magalhães

1 Introdução
O advento da Internet, sobretudo a partir da sua fase
web 2.0, possibilitou a criação de páginas pessoais,
transformou cada usuário das redes sociais digitais em um
potencial meio de comunicação. Tal processo teria levado
a uma passagem dos “meios de massa” para uma “massa
de meios”, com o empoderamento da pessoa através de
atributos antes restritos aos canais tradicionais de
comunicação (ALVES, 2017).
Foi neste cenário que o sistema midiacêntrico,
baseado na mídia que propagava tudo conforme seus
próprios interesses e critérios de produção, viu-se forçado
a dividir espaço com blogs, páginas e canais pessoais em
redes como YouTube, Facebook, Twitter e Instagram,
comandados por usuários que ganharam poder e controle
na gestão da informação nos ambientes digitais.
Nas conexões entre esses novos canais pessoais,
definidos por Rosental Calmon Alves (2017) como vetores
de uma massa de meios, assistimos também ao
surgimento de movimentos de ativismo em rede, aqui
tratados sob o signo do net-ativismo (DI FELICE, 2017).
Por meio de ações colaborativas emergidas de forma
espontânea nas redes sociais digitais, através da
integração de humanos e não humanos (LATOUR, 2012) –
incluindo nestes últimos as redes digitais, os aplicativos,

111
os dispositivos de conectividade e as territorialidades –,
abriu-se um terreno marcado pela tomada coletiva da
palavra, sobretudo por minorias e grupos marginalizados
pelos meios de comunicação tradicionais. Em dimensões
complexas e com bandeiras diversas, as novas narrativas
impulsionadas por tais movimentos enfrentam a
hegemonia da mídia massiva, reivindicando as suas vozes
na sociedade em rede.
É sobre o net-ativismo e as novas narrativas nos
contextos da comunicação em rede que trata este artigo,
que busca apresentar uma atualização conceitual do
fenômeno do ativismo em rede e oferecer um panorama
descritivo sobre a experiência vivenciada por inúmeros
movimentos ao redor do globo, com destaque para o 15-M
(Indignados), da Espanha, e para as Jornadas de Junho de
2013, no Brasil.

2 Da comunicação em massa para a comunicação em rede

Para entender a emergência das novas narrativas


forjadas por esses movimentos nas redes sociais digitais,
cumpre situar a comunicação em rede na esteira das
revoluções comunicativas. A escrita (no século V ª C., no
Oriente Médio), o surgimento da prensa (século XV, na
Europa), a cultura de massa na era da eletricidade (séculos
XIX e XX, no Ocidente) e a cultura digital (século XXI, em
todas as latitudes) proporcionaram, de maneiras distintas,
profundas transformações nos modelos de comunicação e
organização das sociedades.

112
Se partirmos da visão que as tecnologias midiáticas
apresentaram vocações democráticas em diferentes
épocas e civilizações, sobretudo relacionadas ao acesso e
gestão do conhecimento e informação, não devemos
ignorar o avanço da participação popular nesses
processos. Massimo Di Felice (2010) sublinha os marcos
dos seus contributos, apontando o teatro grego como o
palco inicial da democracia ateniense, com o voto do
público nos espetáculos e as discussões sobre a pólis.
A prensa de Gutenberg teria vindo possibilitar a
reprodução de periódicos e livros em larga escala,
retirando o monopólio dos livros dos monges e das
hierarquias eclesiásticas; seguida, quatro séculos depois,
por um processo acelerado pelo advento da eletricidade e,
com esta, dos media de massa. Estes últimos são
considerados fundamentais para a difusão e a
consolidação dos estados nacionais, marcando o
desenvolvimento da sociedade pós-moderna – uma ideia
próxima a que Gianni Vattimo (1992) havia tratado como
o fim do imperialismo e do colonialismo europeu frente à
multiplicação de visões de mundo impulsionada pela
ascensão da cultura de massa.
Com a revolução digital, marcada pela transformação
do modelo de comunicação bidirecional (baseado na
distinção identitária entre emissor e receptor comum na
mídia massiva) ou piramidal (com o topo da pirâmide
dominado pelo Estado e pelos conglomerados midiáticos)
em um modelo rizomático (DELEUZE; GUATTARI, 1995),
também conhecido como reticular (DI FELICE, 2010),
novas mudanças se disseminaram em uma lógica de

113
comunicação horizontal que potencializou o fim dos
pontos de vista centrais.
Dentre tais mudanças, Di Felice (2010) destaca: a
tomada coletiva da palavra, a substituição de uma agenda
pautada pelos media (agenda setting) por uma agenda
pautada pelas redes sociais digitais (agenda building), a
possibilidade de protagonismo pelas minorias ou grupos
marginalizados e, consequentemente, uma crescente
perda do controle da informação por parte das empresas,
das instituições públicas e do Estado. Enquanto antes do
incremento do digital as informações relacionadas às
gestões políticas amontoavam-se em pastas e arquivos
cobertos por burocracia e pó nos gabinetes das repartições
públicas, em tempos de transparência os dados devem ser
atualizados na velocidade dos cliques.
É nesse contexto que surge o fenômeno do net-
ativismo, movimentos e ações colaborativas surgidos em
rede e nas redes, a partir de qualquer ponto digitalmente
conectado. Tal expressão, sugerida como construção
linguística que deve ser compreendida como um oximoro,
composta pelo prefixo “net” e pela palavra “ativismo”, é
utilizada para indicar as interações características de um
novo tipo de ecologia que reúne seus diversos membros
em um social não mais limitado ao âmbito humano do
“socius”, mas expandido às demais entidades técnicas,
informativas, territoriais, de forma reticular e conectiva
(DI FELICE, 2013).

A forma de cidadania e ativismo que caracteriza tais


movimentos é resultado de uma interação fecunda com a

114
tecnologia digital e expressão de uma interação não
opositiva entre sujeitos, grupos e territorialidades com as
tecnologias de informação, as redes informativas e as
diversas interfaces realizadas (DI FELICE, 2012, p. 36).

Em suma, tal concepção nos ajuda a pensar as novas


tecnologias da informação e da comunicação como o
emergir de uma nova relação que se distancia tanto do
paradigma tecnocêntrico quanto daquele antropocêntrico,
em uma dimensão que põe em forma não mais dialética a
relação entre a tecnologia e a sociedade.
Face a um modelo reticular cada vez mais distribuído,
no qual a comunicação é feita de todos para todos,
independentemente da posição geográfica ou da condição
social de cada membro, os pontos de vista antes
centralizados pelas instituições tradicionais (Igreja,
Estado, Imprensa, etc.) tiveram de abrir espaço a novas
narrativas reivindicadas em pontos distintos ao redor do
mundo, que elevaram questões locais a uma visibilidade
global. Envoltos nesta nova ecologia da ação em rede, tais
movimentos também revelaram uma forma de
transformação social distinta do conceito de revolução, de
disputas clássicas de poder (esquerda x direita), através do
ativismo digital, anônimo, anárquico e atópico
(MAGALHÃES, 2018).
Na busca por melhor se adaptarem ao cenário
globalizado nesta era das redes, os atores sociais
contemporâneos cada vez mais são desafiados a construir
a sociedade em que vivem a partir deste entrelaçamento
digitalizado com as coisas, também considerados actantes

115
nas ações colaborativas. Tais ações não se limitam à esfera
política, às reivindicações claras e de temática única, mas
atravessam e misturam demandas ecológicas, econômicas,
sociais ou culturais, em contextos distintos no mapa-
múndi, como veremos a seguir a partir de um panorama
global do fenômeno, centrado nos seus principais marcos.

3 Marcos do net-ativismo

A nova forma de ativismo, denominada net-ativismo,


passou a se articular com a maximização das
possibilidades de autonomia e sustentabilidade do
desenvolvimento e da criatividade. Não pela oposição à
globalização, mas pelo advento de uma identidade cidadã
global, habitante das redes digitais, que não se nega à
diversidade local e cujas pautas reivindicatórias e de ação
“glocal” avançam na direção do atendimento das
necessidades comuns, tais como a democracia, equidade,
consumo consciente, sustentabilidade, etc.
(MAGALHÃES, 2018).
A fim de oferecer um panorama dos principais
movimentos ao redor do globo, partimos da tríade
proposta por Di Felice (2017), que divide os seus marcos
em fases distintas.
A primeira delas seria a fase preparatória, referente ao
advento da Internet em sua primeira forma, que
possibilitou a divulgação e o compartilhamento de textos
entre os internautas.
A segunda seria a fase da experimentação das primeiras
formas de conflitualidade social, que se difundiram

116
através da Internet em uma espacialidade informático-
planetária.
Como terceira fase, teríamos a atual fase web 2.0 e social
network, marcada pela emergência de movimentos de
protestos, subversões de vários gêneros e pela constituição
de redes eficazes de ativismo digital.
Como exemplos da primeira fase podemos destacar
os personagens coletivos Hakim Bey e Luther Blissett,
emergentes do período inicial da Internet, marcado pela
popularização das conexões através de computadores
pessoais, a partir dos anos 1990. Hakim Bey surge sob o
signo do cyberpunk, com a alternativa de liberar
temporariamente determinado campo da vida cotidiana
como forma de fugir da alternância entre revolução,
governo revolucionário e status quo outra vez, investindo
em uma dinâmica centrada em experiências de pico.
Com base no entendimento de que “momentos de
intensidade moldam e dão sentido a toda uma vida” (BEY,
2001, p. 5), tal liberação poderia se desenvolver tanto em
um festival, como por meio de um ataque hacker, de
invasões de espaços públicos para apresentações artísticas
(terrorismo poético) ou de sequestros relâmpagos para
realização dos desejos da “vítima”. Nada que precedesse
um ponto de origem fixo, alcançasse tamanha visibilidade
ou durasse tempo suficiente para despertar um interesse
de controle por parte do Estado.
A identidade coletiva ainda contribuiu teoricamente
ao pensar, no livro-manifesto T. A. Z.: Zona Autônoma
Temporária (BEY, 2001), a crise da política fora dos moldes
institucionais, como expressões criativas da constituição

117
do comum para além dos domínios do que é público ou
privado, convidando os seus membros a experienciarem
uma autonomia livre de políticos. Ao invés de se constituir
como partido político, associação, empresa ou instituição
organizada sob qualquer aspecto, Hakim Bey preferiu se
lançar como um bando, de identidade aberta e horizontal,
que poderia ser a de qualquer membro enquanto assim
desejasse.
No mesmo sentido anárquico surge o Luther Blissett,
que tomou emprestado o nome de um jogador de futebol
cujo fraco desempenho em temporada italiana virou
notícia internacional. O personagem teve atuação
marcante naquele país, entre 1994 e 2000, mas suas ações
desenvolveram-se também por hackers, ativistas culturais
e simpatizantes de outras partes do globo, convidados a
participar de um exercício de filosofia prática (BLISSETT,
2000).
Os membros por trás da identidade coletiva, a qual
foram atribuídas produções multimidiáticas (livros,
discos, clipes, animações), ataques a sites e projeções de
notícias falsas nas pautas dos meios de comunicação
tradicionais – em uma estratégia muitas vezes próxima a
do Tactical Media19, de fazer a crítica midiática dentro da
própria mídia, como forma de criticar a falta de apuração
das informações e o sensacionalismo midiático –,

19Movimento da teoria da estética e dos meios interessado em articular ações de


crítica aos media tradicionais através da interação com as tecnologias digitais.
Atuava em busca de uma intervenção inovadora nos campos da arte, da política
e da comunicação, a exemplo de coletivos artísticos como The Yes Men, Critical
Art Ensemble, Meme-Rider Media Team, Next 5 Minutes, RTMark, etc.

118
colaboraram para criar uma lenda em torno do “Robin
Hood da Informação”, reivindicando seus espaços de fala
em meio à guerrilha contra a indústria cultural.
Por meio de uma lógica distinta daquelas dos
sindicatos, das organizações, dos movimentos de ativismo
tradicionais e verticalizados ou dos partidos políticos, que
em geral envolvem uma demanda por filiação, inscrição
ou contratação, qualquer um poderia ser Luther Blissett,
bastava utilizar o nome do personagem. Após a realização
das ações do coletivo, a autoria costumava ser
reivindicada através do pseudônimo, desvinculando
assim o protagonismo do movimento de qualquer líder ou
figura pública real.
Enquanto Hakim Bey e Luther Blissett
corresponderiam a uma fase preparatória do net-ativismo,
a fase de experimentação das primeiras formas de
conflitualidade mediadas pelo digital teve como principal
expoente o Movimento Zapatista, um levante organizado
em 1994, por índios mexicanos, contra a entrada daquele
país no NAFTA (acordo econômico de livre comércio
entre Estados Unidos, Canadá e México). Tal movimento
ultrapassou a esfera da crítica aos media para produzir
uma diferença qualitativa nas dinâmicas dos conflitos,
revelando um novo caráter desse tipo de interação (DI
FELICE; MUÑOZ, 1998).
Embora este caso envolvesse uma espécie de luta
armada contra o Estado – a defesa das terras pelo Exército
Zapatista de Libertação Nacional –, a verdadeira arma do
movimento era o alcance da comunicação e a adesão da
sociedade civil internacional à causa indígena, a fim de

119
construir “uma sociedade cooperativa e solidária”
(VARGAS, 2009, p. 203), fator que o diferenciava das
guerrilhas latino-americanas tradicionais.
Ao invés de constituir um novo partido ou de resolver
o confronto com o Estado através de uma guerra civil, o
zapatismo tentava traduzir a América Latina por meio de
uma nova linguagem, uma mescla de referências da
própria cultura indígena e das visões de mundo que
faziam parte da sua cultura, excluídas do processo de
construção das nações vizinhas. Esta linguagem era
disseminada através da divulgação dos comunicados
zapatistas na internet, a fim de envolver outros
movimentos sociais globais na luta contra o
neoliberalismo.
Sob a inspiração tanto da influência cyberpunk e do
espírito pirata da fase de preparação, quanto das novas
formas de conflitualidade informativo-midiática da fase
de experimentação iniciada pelo movimento zapatista, a
fase web 2.0 e social network trouxe como diferencial a
emergência das formas reticulares de ativismo,
desenvolvidas em colaboração com as redes sociais
digitais, através de plataformas como o IRC (Internet
Relay Chat), Facebook, YouTube e Twitter.
Entre os casos de net-ativismo mais notórios
midiaticamente em todo o globo, no período
compreendido entre 2000 e 2018, merecem destaque
movimentos como o hacktivista Anonymous, com atuação
colaborativa em diversas latitudes em prol da liberdade de
expressão, por ideais de horizontalidade e transparência
governamentais; o Movimento 5 Estrelas (Itália), uma livre

120
associação de cidadãos unidos pelo objetivo de lançar uma
alternativa ao modelo político tradicional; a Primavera
Árabe, que reuniu países do norte da África e do Oriente
Médio na luta pela democracia e contra ditadores há
décadas no poder; o Movimento 15-M ou Indignados
(Espanha), originado por uma insatisfação generalizada
em relação ao modelo político vigente e à crise econômica
global; o Occupy Wall Street (Estados Unidos),
impulsionado pela insatisfação pública com o poder dos
bancos e a crise econômica global e; as Jornadas de Junho
de 2013 no Brasil, que começaram com protestos contra o
aumento das passagens de ônibus e se difundiram para
manifestações com bandeiras diversas (MAGALHÃES,
2018), que incluíam a melhoria dos serviços públicos e o
combate à corrupção política no país.
Estes movimentos situados na terceira e atual fase do
net-ativismo inauguraram dinâmicas próprias de
organização e interação, com ações que transitavam entre
as redes e as ruas. No que se refere às estratégias de
comunicação, voltaremos o nosso foco para o Movimento
15-M, também conhecido como “Revolução Espanhola”, e
as Jornadas de Junho de 2013 no Brasil. Tais movimentos
foram selecionados por terem originado narrativas
reticulares em oposição àquelas criadas e reproduzidas
pelos veículos de comunicação de massa, acusados pelos
net-ativistas de não representarem fielmente os seus
propósitos e interesses.

121
4 As novas narrativas no contexto da comunicação em
rede

Entre os argumentos mais comuns aos movimentos


net-ativistas, em suas diversas fases, está o da crítica aos
meios de comunicação de massa, à mídia hegemônica ou
mainstream. Em oposição às narrativas jornalísticas
tradicionais na cobertura dos protestos e das ações
coletivas, tais movimentos desenvolveram as suas
próprias narrativas, através de canais de comunicação
criados em colaboração com as novas tecnologias
comunicativas.
Nestas, seus membros e porta-vozes participaram da
tomada coletiva da palavra possibilitada pela expansão do
modelo de comunicação em rede, potencializada pela web
2.0 e pelas redes sociais digitais. Como exemplos,
abordaremos as experiências vivenciadas pelo Movimento
15-M e pelas Jornadas de Junho de 2013 no Brasil.

4.1 Movimento 15-M

O Movimento 15-M surgiu na Espanha,


impulsionado por uma sequência de mobilizações
nas redes sociais digitais, como a onda revolucionária
da Primavera Árabe e o Movimento 5 Estrelas, da
Itália. Em 15 de maio de 2011, data cuja abreviação
deu origem ao nome do movimento espanhol, teve
início a ocupação da Porta do Sol, praça central de
Madrid tomada por manifestantes antes, durante e depois

122
das eleições daquele ano. Em meio ao crescente
desemprego, seus membros lutavam por uma reforma
política, pelo fim do financiamento público partidário,
pela inabilitação para o exercício legislativo de políticos
condenados ou com processos penais, pelo fim do
desemprego e da corrupção.
A mobilização ganhou fôlego através da plataforma
civil e digital denominada ¡Democracia Real Ya! (ou
Democracia Real Já!, em tradução livre), inicialmente
articulada com mais de duzentas pequenas associações.
Cidadãos de 58 cidades de toda a Espanha foram
convocados para uma mobilização nas ruas, a fim de
denunciar os abusos cometidos sob o pretexto de uma
crise econômica que atingia a Europa desde 2008.
Reunidos por lemas como: “não somos marionetes nas
mãos de políticos e banqueiros”, manifestantes
promoveram acampadas em dezenas de praças de toda a
Espanha.
Tais acampamentos passaram a funcionar como uma
espécie de cidade autossustentável, dividida em grupos
temáticos de trabalho – como os de serviços, economia,
jurídico, enfermaria e comunicação –, com a realização de
atividades culturais e assembleias diárias para a discussão
de propostas. A iniciativa se propagou em poucos dias
para 30 localidades da Espanha, com destaque para La
Coruña e Barcelona, além de mobilizações semelhantes
nas portas das embaixadas da Espanha em diversas
cidades europeias.
O movimento ganhou destaque inicialmente na
imprensa internacional, em periódicos como o Washington

123
Post, logo na primeira semana de acampamento. Os meios
de comunicação locais, que ignoraram o princípio da
mobilização, tiveram dificuldades em abordar o fenômeno
a partir dos seus antigos moldes. Tal renovação teria
levado ao que os manifestantes consideram uma
deturpação do 15-M pelos media, que o associavam ora a
uma espécie de “confraternização ideológica” ora a uma
mobilização político-partidária. Como resultado, sempre
que a imprensa nacional tentava visitar os acampamentos
era hostilizada pelos membros do movimento, aos gritos
de “vocês não nos representam” – semelhante ao que
aconteceria no Brasil três anos depois, durante as Jornadas
de Junho de 2013.
O movimento espanhol chegou a recusar entrevistas
nas televisões locais, como a RTVE, alegando que o
coletivo não tinha um líder específico, mas que todos ali
eram líderes, não podendo o todo ser representado por um
só rosto. Além da convocação para o protesto ter sido
mediada pela Internet, desde a primeira noite de
acampadas seus manifestantes estruturaram toda a
comunicação através das redes sociais digitais,
conquistando o apoio de outros movimentos net-ativistas,
como o Anonymous, cujas máscaras20 foram utilizadas por
muitos dos “indignados”.

20A máscara escolhida pelos membros do Anonymous é a de Guy Fawkes, da


série de HQs V de Vingança, utilizada por estes net-ativistas desde as primeiras
brincadeiras na rede social 4chan, passando a ser amplamente difundida sempre
que os “anons” tomavam as ruas em protestos. Assim como os “indignados”
espanhóis, o personagem defendia ideais anarquistas, na busca por igualdade e
justiça em uma sociedade que precisa ser reestruturada para que isso aconteça.

124
A conta do twitter <@acampadasol> foi criada ainda
na praça, entre os membros que decidiram passar a
primeira noite na Porta do Sol. Em seguida, criou-se um
blog específico do movimento
<concentracionsolmadrid.blogspot.com>, com o envio de
e-mails para os endereços fornecidos pelo departamento
de estratégias da acampada. As redes traziam informações
sobre as assembleias e forneciam narrativas cotidianas do
15-M, através de uma linguagem que enfatizava as
decisões tomadas coletivamente e que poderia representar
qualquer membro. Ainda foram criados o AudioviSol <
https://madrid.tomalaplaza.net/tv/>, um serviço de vídeo
notícias do Movimento 15-M, a Ágora Sol Radio <
https://www.agorasolradio.org>, um periódico mensal
chamado Madrid 15M < http://madrid15m.org> e o
Tomalatele <http://www.tomalatele.tv/web/>, um website
utilizado para cobertura ao vivo do dia a dia no
acampamento.
As assembleias realizadas entre os manifestantes
resultaram em diversas propostas, tais como: reforma
eleitoral para que todos os votos da Espanha tivessem a
mesma validade, independência real e total entre os
poderes executivo e judiciário e reforma do Senado
(considerado pelos manifestantes como "mero trâmite" no
sistema então vigente). Outro ponto proposto foi uma
regeneração política generalizada, com a abertura pública
de listas, o não financiamento público de partidos
políticos, a inabilitação permanente de condenados por
corrupção, a supressão de privilégios e a publicação de
patrimônios de políticos.

125
Após o dia 22 de maio, mesmo com o final das
eleições, o acampamento da Porta do Sol, em Madrid,
resolveu continuar, sob a alegação que desde o princípio o
movimento se revelou como uma iniciativa apartidária,
independente de qual partido vencesse a disputa eleitoral.
As manifestações também seguiram em outras cidades,
como Barcelona, que em 27 de maio daquele ano teve o seu
acampamento da Praça Catalunia dissolvido pela
repressão policial, com 121 feridos nos confrontos entre a
polícia e os manifestantes.
Um mês após a permanência na Praça de Madri, a
Acampada Sol foi levantada em 12 de junho de 2011, sob
a promessa “nós não partimos, nos expandimos”, a qual
anunciava que as ideias seguiriam no imaginário coletivo
global. A decisão de levantarem o acampamento, com o
cuidado de deixarem a praça em melhor estado do que
quando a encontraram, foi tomada em assembleia, pelo
entendimento de que o trabalho poderia ser continuado
nos bairros, descentralizando as atividades do icônico
cartão-postal madrilenho.

Agora é a hora de trabalhar em bairros e pequenas


cidades. Somos donas e donos dos nossos propósitos.
Viemos à [Praça Porta do] Sol quando e como quisemos e
nos iremos quando e como nós decidirmos. E nunca,
nunca, de forma forçada, nem por agentes externos nem
por disfunções internas21.

21Declarou uma das “indignadas” em assembleia realizada na Porta do Sol. O


depoimento foi exibido no documentário 15M: "Excellent. A wake-up call.
Important" (2012), no trecho entre 56m04s e 56m30s.

126
Após a decisão de desocupação do espaço, a
acampada foi resumida a um posto de informações
deixado na Praça do Sol, com orientações sobre os eventos
que seriam desenvolvidos em outros bairros da cidade.
Porém, as atividades continuaram perto e longe dali,
através das mobilizações nas redes sociais digitais e de
uma série de protestos em toda a Espanha – sobretudo em
prédios abandonados, como uma espécie de resposta ao
problema da falta de moradia, transformando esses locais
em associações culturais.
O empenho em levar os protestos contra os efeitos do
neoliberalismo, como acúmulo de grandes fortunas na
mão de poucas pessoas, a especulação imobiliária, etc.
ecoou em outros movimentos, como o Occupy Wall Street,
nos Estados Unidos, que também desenvolveu as suas
próprias narrativas em rede. No documentário 15M
(2012), lançado um ano e meio após a onda de acampadas,
diversos manifestantes declararam que a maior
contribuição do movimento estava na expansão da
consciência das pessoas em relação à crise que
enfrentavam, tornando-se um problema para o governo,
no sentido da pressão e fiscalização popular, e uma ajuda
para os seus pares, no que se refere à solidariedade nos
momentos de crise (GRUESO, 2012).
A experiência de ações colaborativas é fruto também
de convivência no acampamento, onde além da coleta de
15 mil propostas para a cidadania e para melhorar a
democracia vivenciou-se uma série de trocas de serviços
entre os envolvidos, como assistência jurídica e
informática.

127
4.2 Jornadas de Junho de 2013 no Brasil

No Brasil, protestos contrários ao aumento dos


bilhetes de transporte levaram, em junho de 2013, a
manifestações heterogêneas, de origens ideológicas
distintas, que culminaram, meses depois, em movimentos
favoráveis e contrários ao pedido de impeachment 22 da
então presidente Dilma Rousseff, ocorrido em 2016. As
mobilizações brasileiras seguiram o mesmo processo de
"propagação viral" daquelas realizadas em outros países,
como a Primavera Árabe, no Oriente Médio e Norte da
África, o Occupy Wall Street, nos Estados Unidos, e o
citado Movimento 15-M, na Espanha.
A repressão policial sofrida pelos participantes em
um protesto contra o aumento das tarifas de transporte
público convocado pelo Movimento Passe Livre, em São
Paulo, em 15 de junho de 2013, fez com que o número de
manifestantes e as suas bandeiras se diversificassem e
tomassem as ruas de norte a sul do Brasil. Dois dias depois
teve início uma segunda fase de protestos, não mais
restrita aos estudantes e agora com o interesse da
cobertura midiática nacional e internacional. Segundo
dados divulgados pelos organizadores, cerca de 300 mil
brasileiros saíram nas ruas para protestar em 12 cidades
espalhadas pelo Brasil, originando uma série de
manifestações diárias que se prolongou até 21 de junho
daquele ano.

22Também tratado como “golpe” de Estado, em meio à polarização política


vivenciada no país.

128
A discussão sobre os valores cobrados e a qualidade
dos serviços oferecidos na mobilidade urbana logo se
estenderam a outros campos da vida cotidiana nas
grandes cidades nacionais. Apesar do recuo do aumento
das passagens em pelo menos 100 cidades brasileiras,
como resposta positiva aos protestos, os manifestantes
transformaram o movimento em uma luta mais ampla:
“não é por vinte centavos”, afirmava o novo lema, em
referência ao aumento inicial previsto pelas empresas do
setor de transportes.
Logo, os primeiros protestos originaram outros
novos, na ebulição da ocupação das redes sociais digitais
e dos espaços públicos no Brasil. Movimentos diversos,
com posições ideológicas conflitantes, mas que devido ao
encadeamento temporal foram tratados como as Jornadas
de Junho de 2013. Os escândalos da corrupção envolvendo
o cenário político brasileiro, o atraso na entrega das obras
realizadas para a Copa das Confederações de 2013 e a
proximidade da Copa do Mundo de 2014, bem como as
cifras investidas na estruturação de estádios para atender
às exigências da Federação Internacional de Futebol
(FIFA) levaram a adesão de milhares de novos
manifestantes às ruas.
Tais movimentos se misturaram à mobilização
iniciada pelo Passe Livre para exigir, além dos transportes,
saúde, educação e segurança “Padrão Fifa”. O ápice da
mobilização nacional, contudo, foi alcançado em 20 de
junho de 2013, data em que a Polícia Militar já estimava a
participação de 1,2 milhão de brasileiros nas ruas das
cidades. Em Brasília, cerca de 35 mil pessoas ocuparam a

129
Esplanada dos Ministérios, dentre as quais centenas
subiram a rampa e ocuparam o teto do Congresso
Nacional. Ainda assim, os media nacionais focaram a sua
cobertura no registro de atos de vandalismos em Brasília e
em outras cidades do país.
Dentre os confrontos com a polícia registrados nas
Jornadas de Junho, mereceu maior destaque jornalístico as
ações dos Black Blocs23, protestos violentos em frente aos
jogos de futebol e até o saqueamento de estabelecimentos
comerciais.
A introdução de bandeiras partidárias nas
manifestações também gerou revolta entre os
manifestantes, pelo fato de o movimento ter se iniciado
como apartidário. Também houve acusações de policiais
infiltrados nas ações com o objetivo de incitar a violência
e de prejudicar a credibilidade da mobilização. O abuso de
autoridade policial foi registrado em diversos momentos
dos protestos e em localidades distintas, com detenções de
manifestantes até por porte de vinagre24.
Assim como aconteceu aos indignados espanhóis, a
mobilização no Brasil não recebeu a devida cobertura dos
media tradicionais desde o seu princípio. Apenas após o

23 Anarquistas, vestidos com roupas e máscaras pretas, formam um bloco de


pessoas que se coloca entre a polícia e os manifestantes, geralmente em protestos
de rua. A estratégia ganhou notoriedade durante as manifestações contra o
encontro da Organização Mundial do Comércio (OMC) em Seattle, em 1999, mas
também este (esteve) presente nas Jornadas de Junho de 2013 no Brasil.
24 Substância que seria usada como proteção contra os ataques policiais com gás

lacrimogênio (lacrimogéneo) e spray de pimenta. A maior ocorrência foi


registada na cidade de São Paulo, em 13 de junho de 2013, que acabou
originando a Revolta do Vinagre (MESQUITA; BELARMINO, 2015).

130
protesto de 13 de junho de 2013, marcado pela forte
repressão policial que chegou a ferir jornalistas em
exercício profissional, os meios de comunicação ligados às
grandes empresas começaram a transmitir o evento. A
Rede Globo foi uma das mais criticadas durante os atos,
por ter inicialmente tratado os manifestantes como
“vândalos” (AVELAR; BARBOSA FILHO, 2015) e por não
ter disponibilizado uma cobertura ao vivo das
mobilizações, sendo acusada até de manipular o número
de manifestantes, como forma de minimizar a relevância
das ações.
Os repórteres da Globo chegaram a ser hostilizados
nos protestos e expulsos das mobilizações. A hashtag
<#AbaixoRedeGloboPovoNãoéBobo> alcançou o topo dos
trending topics do Twitter naquele período, quando as
manifestações nas ruas também se encaminharam para as
portas da emissora. A Rede Globo também teve a conta do
Twitter invadida por membros do Anonymous Rio, que
passou a exibir três palavras: Democracia real já – o
mesmo lema do Movimento 15-M.
Também foram registrados ataques a equipes de
televisão e veículos de outras empresas de comunicação,
como a Rede Record e o SBT. Isto demonstra como parte
dos manifestantes depositava a sua confiança nas
coberturas oferecidas pelas redes sociais digitais, não
apenas como um meio de convocação para os protestos,
mas como a fonte de informações considerada mais
“imparcial”, com espaços de denúncias para os abusos
cometidos por policiais e para a análise da manipulação
midiática do movimento.

131
Os net-ativistas dos Anonymous ainda contribuíram
de outros modos para esse mosaico de narrativas. Para
responder às críticas midiáticas sobre a falta de
reivindicações claras no protesto, lançaram na Internet um
vídeo intitulado “Anonymous Brasil - As 5 causas!” 25 ,
sugerindo os principais motivos consensuais pelos quais
as pessoas estariam se manifestando: rejeição à PEC 3726;
renúncia de Renan Calheiros da presidência do Senado
Federal; investigações e punição de irregularidades nas
obras da Copa do Mundo a ser realizada no país; lei que
tornasse corrupção crime hediondo e o fim do foro
privilegiado para políticos.
Em menos de 24 horas, o vídeo lançado pelo
movimento hacker recebeu mais de 1 milhão de
visualizações, tendo alcançado, em menos de uma
semana, milhares de republicações em outros canais e sites
de vídeos, potencializando o efeito viral na Internet.
Dentre as causas listadas pelos “anons” 27 , duas
parecem ter resultado rapidamente: a rejeição à PEC 37,
que se tratava de uma causa de forte apelo popular, e a
aprovação, na Câmara, de uma lei que classificasse a
corrupção como crime hediondo no país. Essa última

25 Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=v5iSn76I2xs. Acesso em:


7 mai. 2019.
26 A Proposta de Emenda Constitucional 37/2011 foi um projeto legislativo que

pretendia emendar a Constituição brasileira para incluir a apuração de


investigações criminais como atividade privativa da polícia judiciária. Foi
proposta pelo deputado Lourival Mendes, então filiado ao PTdoB do Maranhão.
27 Como um diminutivo para Anonymous, propagado no discurso dos próprios
membros do movimento.

132
ainda não figurava de forma explícita durante as
manifestações, vindo a ser posteriormente citada durante
o Pronunciamento Presidencial da então presidente Dilma
Rousseff28, que a divulgou entre as metas anunciadas no
discurso sobre os "Cinco Pactos".
Desde a mobilização pelas eleições diretas, em 1984, e
pelo impeachment do então presidente Fernando Collor
de Mello, em 1992, capitaneado pelo movimento dos
Caras Pintadas, não era registrado no Brasil uma
mobilização nacional de tamanha expressão como aquela
iniciada pelas Jornadas de Junho.
Paiva e Barreto (2015) explicam que no primeiro caso,
na luta pelas eleições diretas, tratava-se de um período em
que não havia Internet nem redes sociais digitais e as
influências midiáticas eram regidas pela televisão, isto é,
uma campanha que contava com a força dos sindicatos,
das representações de classes e dos estudantes que
tentavam se organizar após vinte anos de ditadura. Já na
época pró-impeachment de Collor de Mello, nos anos
1990, o cenário era outro: a era da globalização, com os
movimentos de base fragilizados pela explosão do
consumismo, diversificando-se entre ativistas feministas,
gays, ecologistas, índios, membros do Movimento dos
Sem Terra e camadas médias preocupadas com a
corrupção.
Na fase dos social media, em que a televisão começou
a perder, tendencialmente, a sua audiência – sobretudo

28 O pronunciamento está disponível em:


https://www.youtube.com/watch?v=qtGPYTvHoMw. Acesso em: 27 mai. 2019.

133
entre o público mais jovem – para a Internet, o movimento
das Jornadas de Junho de 2013 se articulava de forma viral,
com a integração das mais diversas bandeiras. Em razão
desse hiato de duas décadas desde a última grande
manifestação, expressões como “O gigante acordou”, em
referência ao despertar do povo brasileiro para as
mobilizações, foram as mais repercutidas, tanto nas redes
sociais digitais quanto nas ruas de todo o país.

Mais de 20 anos depois (em 2013), o contexto era outro.


Havia uma gestão de centro-esquerda no poder, desde a
eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002, até a gestão
de Dilma Rousseff (a partir de 2012). E em conjunção com
as manifestações e revoltas populares no mundo inteiro,
os movimentos sociais eclodem, primeiramente em 2013,
em protesto pelo custo das passagens nos transportes
urbanos, multiplicando-se ad infinitum até o evento da
Copa (jun./julho 2014); e a imprensa e as mídias fazem
parte dos desdobramentos destes acontecimentos, por
vezes informando, por vezes – ideologicamente –
gerando ruído e distorções em vez de esclarecer a opinião
pública. [...] Os discursos da indignação saltam do
inconsciente coletivo e ocupam em modo viral as praças
públicas virtuais e presenciais, que mobilizam as
narrativas e ações sociais (PAIVA; BARRETO, 2015, p.
228).

Uma dessas iniciativas de criação colaborativa de


narrativas que alcançou maior destaque e que se expandiu
nos anos posteriores – pelo menos até o ano de publicação
desse artigo – foi a Mídia NINJA (sigla de Narrativas

134
Independentes, Jornalismo e Ação). O coletivo de
jornalistas brasileiros surgiu em meio às Jornadas de
Junho de 2013, com o objetivo de oferecer nas redes sociais
digitais e através das suas tecnologias uma cobertura dos
movimentos sem a mediação dos interesses dos grandes
grupos midiáticos. Assim se apresenta o coletivo em sua
página na internet <http://www.midianinja.org/>.

Surgimos em meio a multidão. Num momento decisivo


em que a história do país se pôs diante de nós. Fomos os
olhos, a voz e o coração de milhares de pessoas.
Transmitindo de dentro os acontecimentos, nos
envolvemos e fomos parte do processo de transmutação
política de nossa geração29.

A Mídia NINJA se define como uma rede de


comunicação livre, voltada para novas formas de
produção e distribuição de informação a partir das novas
tecnologias e de uma lógica colaborativa de trabalho. Tal
projeto se baseia no entendimento da comunicação
democrática como um direito humano, voltado para a
defesa do interesse público, a diversidade cultural e o
direito à informação.
A partir desse modelo, o coletivo criado para cobrir
de forma “independente” as Jornadas de Junho de 2013,
realizando coberturas ao vivo de dentro dos protestos,
através de “múltiplos pontos de vista invisíveis na mídia
tradicional”, continua em atuação em 2019. Hoje

29 Disponível em: http://midianinja.org/quem-somos/. Acesso em: 1 jun. 2019.

135
desenvolve narrativas que dão visibilidade a temas
relacionados a causas identitárias, cultura, meio ambiente,
juventude, entre outros assuntos de interesse
contemporâneo.
Com 2 milhões de apoiadores e cerca de 500 pessoas
diretamente envolvidas com o suporte de causas diversas
em todo o país, a Mídia NINJA funciona através de
financiamento coletivo, não vinculado a empresas ou
partidos políticos, disseminando palavras, imagens e sons
em redes sociais digitais como Facebook <https://pt-
br.facebook.com/MidiaNINJA/>, Twitter
<@MidiaNINJA>, YouTube <
https://www.youtube.com/user/midianinjafly> e
Instagram < https://www.instagram.com/midianinja/>.
Em julho de 2013 o volume de participantes nos
protestos em que iniciativas como a Mídia NINJA
surgiram diminuía a cada evento, fenômeno atribuído
pelos media tradicionais à onda de vandalismo e
depredações gerada pelos Black Blocs, que utilizavam a
tática de atacar símbolos do poder e do capital. O final da
Copa das Confederações, que ajudava a atrair as atenções
da imprensa internacional para o Brasil em 2013, também
contribuiu para arrefecer o clima de manifestações, que
resultaram na adoção de poucas medidas por parte do
Governo Federal e do Congresso Nacional para atender às
reivindicações dos manifestantes – a chamada "agenda
positiva" (MAGALHÃES, 2018).
A pluralidade de causas e o envolvimento oportunista
de sindicatos, partidos políticos e figuras políticas na
organização dos movimentos acabaram por acentuar uma

136
polarização dos protestos, que em 2015 voltaram às ruas
do Brasil divididos em ações contra ou a favor do
impeachment da presidente Dilma Rousseff, depois de
reeleita em 2014. Rousseff foi afastada do poder em 2016,
após uma votação final polêmica no Senado Federal,
sendo substituída pelo seu então vice-presidente, Michel
Temer (PMDB), também citado na mesma Operação Lava
Jato30 em que a sua antecessora teve o nome envolvido.
Com as ações desenvolvidas pelo movimento net-
ativista Anonymous e as novas narrativas criadas e
difundidas pelo coletivo Mídia NINJA, as Jornadas de
Junho de 2013 encerram a nossa proposta de mapeamento
dos movimentos net-ativistas da fase web 2.0 e dos social
media. Na impossibilidade de elencar todos os
movimentos em nosso percurso descritivo, os casos
apresentados servem-nos como material empírico para
que sejam retraçados os aspetos gerais da ação em rede,
uma simples extrato, uma amostra, um recorte temático e
temporal do fenômeno.

30Conjunto de investigações em andamento pela Polícia Federal do Brasil, que


cumpriu mais de mil mandados de busca e apreensão, de prisão temporária, de
prisão preventiva e de condução coercitiva, visando apurar um esquema de
lavagem de dinheiro que movimentou bilhões de reais em propinas. A operação
teve início em 17 de março de 2014 e conta com 61 fases operacionais,
autorizadas pelo então juiz Sérgio Moro, durante as quais mais de cem pessoas
foram presas e condenadas. Em 2019, Moro foi nomeado ministro da Justiça e
Segurança Pública do Brasil na gestão de Jair Bolsonaro, presidente eleito em
2018, que sucedeu à gestão de Dilma Rousseff e de Michel Temer.

137
5 Considerações finais

A experiência da elaboração e propagação de novas


narrativas no interior do modelo de comunicação em rede,
que segue em franca expansão, nos convida a refletir sobre
diversos aspectos. Cumpre aqui destacar a importância de
superar a visão das tecnologias comunicativas como
simples instrumentos para a utilização dos movimentos
net-ativistas, uma vez que estes surgem não através de
uma relação de uso, mas de colaboração com as novas
tecnologias, através de uma novo ecossistema em que se
transformam qualitativamente as formas de ação e
dinâmicas de interação experimentadas por seus
membros.
A emergência de um modelo distribuído de
comunicação, com a possibilidade de difusão de
mensagens de todos para todos, proporcionou o que o
modelo de comunicação massivo há quase um século
negava: um caminho para a tomada coletiva da palavra
por parte do cidadão comum, que reivindica cada dia mais
o seu espaço no espetáculo da sociedade tecnológica, o
direito de produzir as suas próprias narrativas.
Hakim Bey e Luther Blissett, com suas ações
anárquicas, influências cyber e pirata, difundiram as
críticas ao conceito de revolução e identidade,
respectivamente, em uma fase inicial dos movimentos em
rede, marcada pelas instituições media de massa como
alvos. Os Zapatistas, por sua vez, trouxeram as redes
digitais para dentro da experimentação de um conflito
político, econômico e cultural, distribuindo para fora delas

138
uma nova linguagem elaborada pelos indígenas
mexicanos, transformando uma questão local em uma
causa de apelo global, contra os efeitos do neoliberalismo
econômico que a quase todos afetava de formas diversas.
Mas é na fase da web 2.0 e dos social media – por meio
de movimentos como Anonymous, Primavera Árabe,
Occupy Wall Street, Movimento 15-M, Jornadas de Junho
de 2013, etc. – que a propagação das novas narrativas se
torna mais evidente. Em suma, potencializada pela criação
de páginas e perfis pessoais e pela oportunidade de
partilha em ritmo viral, através das redes sociais digitais e
dos aplicativos de mensagens instantâneas disponíveis na
palma da mão, em tempos de mídias móveis.
Se cada usuário das redes sociais digitais representa
um potencial meio de comunicação, como enuncia Alves
(2017), os novos conteúdos produzidos por essa massa de
meios dividem cada vez mais os seus espaços com aqueles
dos media de massa tradicionais. Estes seguem desafiados
dia a dia a repensar as suas formas de relatar os fatos
sociais, seja na utilização de conteúdos produzidos por
coletivos como o 15-M e a Mídia NINJA, seja através da
busca por uma integração crescente dos antigos
“receptores” na produção do espetáculo midiático, que
hoje reivindicam o direito de narrarem as suas próprias
histórias.

139
REFERÊNCIAS

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eficiência. In: MARTINS, G. L.; REINO, L. S. A.; BUENO, T.
Performance em ciberjornalismo: tecnologia, inovação e eficiência.
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redes sociais. João Pessoa: Editora da UFPB, 2015. p. 133-144.
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crítica midiática. São Paulo: Paulus, 2006.
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COMUNICAÇÃO, 26. 2013. Manaus. [Anais...]. Manaus: Intercom
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140
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Madrid.15M.cc., 2012.
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coberturas jornalísticas das manifestações de rua e redes sociais.
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NUNES, P.; SOARES, T. (Org.). protestos.com.br: fluxo livre de
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redes sociais. João Pessoa: Editora UFPB, 2015. p. 223-234.
VARGAS, S. Com a arma da palavra: trajetória e pensamento do
subcomandante Marcos. Revista Territórios & Fronteiras, Cuiabá, v.
2, n. 2, p 202-222. jul./dez. 2009.
VATTIMO, G. A Sociedade Transparente. Lisboa: Relógio d’Água, 1992.

141
142
LYRIC VIDEO – A CONSONÂNCIA SONORA E
VISUAL

William Takenobu Akamine

1 O videoclipe contextualizado pela música

Quando ouvimos a palavra videoclipe, logo a


associamos ao contexto musical, no qual os artistas do
segmento lançam suas principais faixas do álbum como
forma de impulsionar a sua carreira e, consequentemente,
alavancar as vendas.
Inicialmente, a definição de videoclipe estava
relacionada aos vídeos de curta duração construídos para
o segmento publicitário. No decorrer das décadas, o termo
acabou sendo associado à publicidade fonográfica e
tornou-se uma expressão simbólica do mercado musical.
O que atualmente constatamos é o resgate do termo
devido à publicação de vídeos compactos, expressos
massivamente pelo advento das redes sociais e não sendo
exclusivos ao mercado sonoro.
O americano Richard Lester é considerado por muitas
pessoas e pelo canal MTV como o pioneiro na execução da
linguagem dos videoclipes musicais. Ele foi responsável
pela direção do longa-metragem da banda inglesa The

143
Beatles, com o filme A Hard Days Night31, o qual foi lançado
em 1964, combinado ao álbum homônimo.
Nessa década, o cinema ainda era um grande sucesso
de público, lotando as salas de cinemas com os filmes
lançados. A banda inglesa viu, então, uma oportunidade
de divulgar as músicas nesse veículo cinematográfico.
Podemos notar uma hibridização de um enredo de um
filme clássico associado à música. Dessa maneira, Lester
fez os primeiros ensaios criando uma narrativa musical
nas telas dos cinemas. Acredita-se, também, que os Beatles
tenham divulgado suas músicas no cinema como uma
maneira de evitar suas apresentações ao vivo, pois a
euforia dos fãs era expressivamente exagerada. Dessa
forma, o público poderia apreciar a música sem a
necessidade de uma apresentação física da banda. A
proposta, apesar de ousada na época, rendeu bons frutos,
abrindo o rígido segmento cinematográfico para outras
direções, inclusive para o que viria a ser o videoclipe que
conhecemos atualmente.
A década de 80 é considerada como o apogeu dos
videoclipes musicais. Neste período, com o avanço
tecnológico e com a era da computação gráfica, permitiu-
se inúmeras possibilidades de criação. É possível
identificar vários clipes com aspecto de filmagens dos
longas-metragens. Além dos dispositivos tecnológicos,
surgiu outro suporte que viria a ser um grande canal

31A Hard Days Night é o terceiro álbum da banda inglesa The Beatles. As músicas
não eram apenas parte da trilha sonora do filme. Foram lançadas diferentes
versões em outros países.

144
televisivo do segmento, o americano MTV (Music
Television). Inicialmente, a proposta do canal era ter a
programação preenchida por músicas tornando-se um
veículo promissor e mais eficaz para divulgação dos
videoclipes. Cantores como Michael Jackson, Madonna e A-
Ha, por exemplo, lançavam seus clipes performáticos que
apresentavam altas produções de caráter do cinema
hollywoodiano.

[...] Em 1981, o serviço Nickelodeon 32 do canal a cabo da


Warner, que já exibia um programa dedicado aos vídeos
musicais chamado Popclips, adquiriu a capacidade de
exibição na TV em som estéreo, o que proporcionou um
território propício à exibição de clipes vinte e quatro
horas por dia. Foi assim que, segundo J. Wyver33, nasceu a
Music Television (MTV), que oficialmente começou a
operar em 1º de agosto de 1981, tendo exibido como
primeiro clipe, Video Killed the Radio Star, do Buggles 34 .
(SOARES, 2012, p. 25).

Nesse contexto, o mercado fonográfico permitia a


criação de projetos mais inovadores, construindo ou
desconstruindo as narrativas clássicas adotadas pelo
cinema. A nomenclatura videoclipe passou a ser

32 Nickelodeon é uma divisão da MTV Networks e Viacom. É a maior empresa


de entretenimento juvenil.
33 WYVER, J. La imagen en movimiento. Valencia: Filmoteca Generalitat

Valenciana: 1992.
34 The Buggles, uma banda britânica formada em 1977 por Trevor Horn e Geoff

Downes.

145
conhecida como clipe, termo que comumente escutamos
como clipe musical.

A princípio, o clipe foi chamado simplesmente de número


musical. Depois, receberia o nome de promo, numa
alusão direta à palavra “promocional”. Só a partir dos
anos 80, chegaria finalmente o termo videoclipe. Clipe,
que significa recorte (de jornal, revista, por exemplo),
pinça ou grampo, enfoca justamente o lado comercial
deste audiovisual. (SOARES, 2012, p. 33).

2 Lyric video: o letramento cinético

Diferentemente da facilidade que temos hoje com a


internet, onde podemos buscar as músicas assim como a
sua letra e tradução, há algumas décadas essa não era uma
tarefa tão simples. As letras das composições eram anexas
normalmente junto aos Long Play Discs (LPs) ou vinil,
dispositivo no qual era possível ouvir músicas sem utilizar
o rádio. As letras para acompanhar as músicas também
poderiam ser encontradas em revistas nas bancas de
jornal.
A Figura 1 apresenta a famosa revista Música & Letra35,
na qual eram apresentados os artistas, bem como suas
músicas. O mecanismo para conseguir acompanhar as
músicas tocadas nas rádios e em outros dispositivos
sonoros eram concebidos por meio da leitura de textos em

35A Revista Música & Letra era publicada pela Bandeirante Editora Musical
Ltda.

146
mídias impressas. Trata-se de um procedimento muito
comum neste período, visto que era possível seguir a
composição sonora com as letras permitindo, assim, uma
imersão no conteúdo musical.
O clipe, conforme mencionado anteriormente, surgiu
como uma estratégia de divulgação que os artistas do
segmento fonográfico utilizavam para apresentar suas
músicas para fins comerciais. Notou-se que este veículo,
composto por imagem e som, teve uma grande adesão
pública. Então, por que não utilizar o meio audiovisual
dos videoclipes associado ao letramento musical? Foi
então que surgiu o lyric video, uma vertente dos clipes.

Figura 01 – Capa de uma edição da revista Música & Letra.

Fonte: https://http2.mlstatic.com/revista-musica-letra-n-de-1959-dalva-de-
andrade-D_NQ_NP_164311-MLB20530587540_122015-F.webp.

147
O lyric video (em português, lyric significa letra) é uma
maneira de inserir as composições musicais no contexto
audiovisual. Nessa modalidade, as letras são apresentadas
em consonância com a semântica musical, diferentemente
do que era apresentado nos clipes tradicionais, nos quais
existia uma narrativa atuante composta pelo próprio
cantor, ator ou pelas interferências artísticas. As palavras
são dispostas sincronicamente com a melodia,
diferentemente dos filmes legendados ou os famosos
GC’s36 dos programas televisivos, cujas informações eram
dispostas nas telas dos cinemas ou televisores. Dessa
maneira, a letra musical deixa de ser a coadjuvante e
torna-se a protagonista do clipe, sendo emitida
paralelamente à trilha musical.
Figura 02 – Recorte de Sign O’ the Times

Fonte: Prince (2010). Disponível em:


https://www.youtube.com/watch?v=8EdxM72EZ94 .

36GC significa gerador de caracteres. As informações mais relevantes são


inseridas visualmente para identificar um lugar, transcrever ou nomear uma
pessoa.

148
Historicamente, o primeiro lyric video foi produzido
para o cantor norte-americano Prince, com a música Sign
O’ the times, divulgado em 1987. O clipe (Figura 02)
apresenta os primeiros ensaios da computação gráfica nos
televisores domiciliares, apresentando uma mixagem de
elementos cinematográficos com as linguagens de
animação. Apesar de expor uma linguagem
aparentemente simples, Sign O’ the times é considerado o
pioneiro a utilizar a tipografia37 harmonizada com a trilha
sonora de forma coesa.
Podemos dizer que os meios tecnológicos ajudaram a
impulsionar essa nova linguagem dos clipes musicais. O
maior canal de conteúdo audiovisual, o YouTube 38 ,
permitiu propagar o lyric video devido à ascensão das
redes sociais, as quais permitem conectar diretamente em
postagens, divulgando os vídeos e gerando um maior
número de views39.

Sites de redes sociais foram definidos por Boyd & Ellison


(2007) como aqueles sistemas que permitem i) a
construção de uma persona através de um perfil ou
página pessoal; ii) a interação através de comentários; e
iii) a exposição pública da rede social de cada ator. Os
sites de redes sociais seriam uma categoria do grupo de

37 Tipografia origina-se do grego: typos “forma” e graphein “escrita”, cuja


função é dar forma aos tipos impressos. O termo atualmente está relacionado ao
design em geral.
38 O canal YouTube foi criado em fevereiro de 2005, por Steve Chen e Jawed

Karim.
39 Views no YouTube se refere a visualizações do canal, quanto maior o número,

melhor a popularidade e destaque dentre os demais vídeos.

149
softwares sociais, que seriam softwares com aplicação
direta para a comunicação mediada por computador [...].
A grande diferença entre sites de redes sociais e outras
formas de comunicação mediada pelo computador é o
modo como permitem a visibilidade e a articulação das
redes sociais, a manutenção dos laços sociais
estabelecidos no espaço off-line (RECUERO, 2008, p. 103).

3 O clipe musical na convergência midiática

Como vimos, o clipe é composto pela concatenação de


imagens com a música, intencionalmente produzido a fim
de divulgação e de caráter publicitário. Essa relação de
diferentes meios de informação permite relacioná-los com
o conceito de intermidialidade, que “[...] implica todos os
tipos de inter-relação e interação entre mídias; uma
metáfora frequentemente aplicada a esses processos fala
de ‘cruzar as fronteiras’ que separam as mídias”
(CLÜVER40, 2011, p. 10).
As mídias, segundo Clüver (2011), definem um meio
de comunicação. Elas funcionam como uma parábola de
mensagens ou signos transmitidos de um emissor para um
receptor. São, normalmente, compostas por elementos
culturais, conduzem para e entre os seres humanos
assertivamente por distâncias temporais ou espaciais.
Dessas mídias, sendo elas imagéticas, escritas ou verbais,
podemos definir um texto. O fato de caracterizarmos uma

40Claus Clüver. Professor emérito, Indiana University, especialista em Estudos


Interartes e Intermediais.

150
mídia em uma categoria textual dependerá da
interpretação, ou seja, dependerá de uma construção
cultural do receptor em compreender e classificá-lo como
determinado texto dentro de uma categoria. Assim,
Bakhtin e Volochínov (2014, p. 32) definem:

[...] que a própria consciência só pode surgir e se afirmar


como realidade mediante a encarnação material em
signos. Afinal, compreender um signo consiste em
aproximar o signo apreendido de outros signos já
conhecidos; em outros termos, a compreensão é uma
resposta a um signo por meio de signos. E essa cadeia de
criatividade e de compreensão ideológicas, deslocando-se
de signo em signo para um novo signo, é única e contínua:
de um elo de natureza semiótica (e, portanto, também de
natureza material) passamos sem interrupção para um
outro elo de natureza estritamente idêntica. Em nenhum
ponto a cadeia se quebra, em nenhum ponto ela penetra a
existência interior, de natureza não material e não
corporificada em signos.

Podemos, assim, considerar o clipe musical como um


sistema intermidiático, pois há um encadeamento de
signos distintos que compõem uma interpretação ou
determinam um método epistemológico. A junção destes
textos distintos não outorga o desmembramento sem
comprometer o sentido do videoclipe. Em caso de assistir
ao clipe sem a trilha sonora, perde-se totalmente a essência
de um clipe, ou mesmo ao escutar apenas a música sem a
imagem, desvirtua-se o conceito de um conjunto que
determina o videoclipe. Assim, segundo Clüver (2011),

151
podemos denominá-los como um texto mixmidia ou
combinação de mídias41, segundo Rajewski.

[...] textos mixmídias, que “contêm signos complexos em


mídias diferentes que não alcançariam coerência ou
autossuficiência fora daquele contexto”. [...] ou gêneros
de textos, que “recorrem a dois ou mais sistemas de
signos e/ou mídias de uma forma tal que os aspectos
visuais e/ou musicais, verbais, cinéticos e performativos
dos seus signos se tornam inseparáveis e indissociáveis”.
(CLÜVER, 2011, p. 15).

A combinação de diferentes mídias referentes à


linguagens performáticas de teatro ou mesmo da linha
cinematográfica apresentam uma hibridização de textos.
Desde o roteiro ao storyboard, figurinização, sonoplastia e
outros, encontramos diversas possibilidades de
encadeamentos textuais, o que permite explanar o clipe
musical como um sistema plurimidiático.

41 RAJEWSKY, I. O. Intermidialidade, intertextualidade e “remediação”: uma


perspectiva literária sobre a intermidialidade. In: DINIZ, T. F. N.; REIS, E. L. de
L. (Org.). Intermidialidade e Estudos interartes: Desafios da arte contemporânea.
Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2012, p. 24.

152
Examinemos o videoclipe do DJ francês David
Guetta42. Ele produziu um remix43 da música Shot me down44
(Bang Bang) interpretado pela cantora Skylar Grey 45 .
Vejamos alguns recortes do lyric vídeo (Figuras 03 e 04).

Figura 3 – Recorte de Shot Me Down.

Fonte: David (2104). Disponível em:


https://www.youtube.com/watch?v=3x2ABSAMVno

42 Músico atuante no segmento eletrônico. Vencedor do Grammy Awards em


2010 e 2011.
43 Usualmente, no momento em que o produtor de música eletrônica cria um

remix, este vai buscar manter o elemento marcante da música originária


acrescentando à derivação a sua identidade. (COSTA, C. L. F. Direito Autoral e a
Música Eletrônica. Brasília: 2010, p. 51).
44 A música foi originalmente produzida pela cantora e atriz americana Cher na

década de 60. Ganhou diversas versões. Fez parte da trilha sonora do thriller Kill
Bill de Quentin Tarantino em 2003.
45 Anteriormente conhecida como Holly Brook. Grey é cantora e compositora

americana.

153
Observando o primeiro take (Figura 03), na qual
apresenta-se o nome da música, “shot me down”, já
encontramos características que definem qual estética o
clipe adotará. Inicialmente, temos uma leitura de um
ambiente desértico, característico dos famosos filmes de
faroeste. O cenário apresentado é o Monument Valley, no
Arizona, Estados Unidos. Um local característico onde os
filmes do velho oeste foram rodados. A presença da águia,
ave característica da região, denota e afirma a localização
geográfica.
O uso das cores mais frias, que variam do azul para o
vinho, contrastam com a região, que por apresentar um
clima mais árido, e altas temperaturas, deveriam
transmitir cores mais quentes, diferente do que está sendo
retratado no clipe.
Foi utilizado um lettering 46 cujo símbolo representa
um projétil acrescido na letra “o”, evocando o disparo de
uma arma de fogo. A palavra shot significa atirar,
reafirmando a ambientalização do oeste americano. Ainda
nesta imagem, a palavra down foi utilizada em negrito e na
cor preta, sinalizando o provável estado emocional da
personagem.
Ao observarmos o clipe, constatamos a presença de
diferentes textos. Neste caso, houve uma referência à
linguagem cinematográfica e dos quadrinhos. A esta
alusão de um texto para outro, Clüver (2011) discrimina
como intertextos da seguinte maneira:

Lettering é uma fonte estilizada, com características orgânicas manuscritas.


46

Usualmente a criação é única e desenvolvida para aquele propósito.

154
[...] usando “intertextualidade” em referência a todos os
tipos de texto; é uma forma condensada de dizer que
entre os “intertextos” de qualquer texto (em qualquer
mídia) sempre há referências (citações e alusões) a
aspectos e textos em outras mídias. (CLÜVER, 2011, p.
17).

Assim, notamos comparações com a linguagem


cinematográfica. Vejamos pela narrativa. A personagem
central é uma mulher aparentemente solitária, uma forte
menção aos cowboys solitários 47 dos clássicos longas
americanos. Ela demonstra a questão do antagonismo “ser
bandido ou mocinho”48 , imparcialidade que implica em
outra caracterização dos atuantes centrais da temática do
faroeste. Existe, também, o conflito entre dois personagens
com armas de fogo e a artilharia era uma constante
narrativa dos cowboys. Temos, ainda, o “predador e a
caça”, cujo instinto de sobrevivência é simbolizado pela
águia.
Elementos relacionados à edição foram utilizados no
clipe. O uso de transições com a sobreposição de
diferentes planos demarca momentos de reflexão da
personagem e circunscrevem, assim, a passagem de
tempo. O emprego de cortes secos em situações de ação
evidenciam a trilha mais acelerada. A constante presença

47 O longa-metragem Shane de 1953, batizado no Brasil para Os brutos também


amam.
48 Na narrativa dos westerns, existia o bandido e o mocinho. Porém o herói nem

sempre sucumbia conforme as leis, existindo essa dubiedade do personagem.

155
da cinética filmográfica e o efeito parallax 49 criam
profundidade e destacam a personagem em relação ao
plano de fundo composto pelos cenários.
Além do cinema, a linguagem dos quadrinhos 50 é
constantemente mencionada. Inicialmente, pontuamos
com balões as falas dos atuantes. Estes foram utilizados
com o propósito de apresentar as letras da composição
musical. Segundo Eisner (1989, p. 26):

[...] O balão é um recurso extremo. Ele tenta captar e


tornar visível um elemento etéreo: o som. A disposição
dos balões que cercam a fala – a sua posição em relação
um ao outro, ou em relação a ação, ou a sua posição em
relação ao emissor – contribui para a mediação de tempo.
Eles são disciplinares, na medida em que requerem a
cooperação do leitor. Uma exigência fundamental é que
sejam lidos numa sequência determinada para que se
saiba quem fala primeiro. Eles se dirigem a nossa
compreensão subliminar da duração da fala.

Além da expressão vocal ambientada pelo uso dos


balões, utilizou-se também outros recursos

49 O efeito parallax é a disposição de objetos com diferentes distâncias que


permitem a ilusão de estarem se movimentando em diferentes velocidades. O
objeto mais próximo do campo de visão aparenta ser mais ágil do que o mais
distante, apesar de estarem deslocando-se no mesmo intervalo de tempo.
50 A história em quadrinhos lida com dois importantes dispositivos de

comunicação, palavras e imagens. Decerto trata-se de uma separação arbitrária.


Mas parece válida, já que no moderno mundo da comunicação esses dispositivos
são tratados separadamente. Na verdade, eles derivam de uma mesma origem,
e no emprego habilidoso de palavras e imagens encontra-se o potencial
expressivo do veículo.(EISNER, 1989, p. 13).

156
representativos como as onomatopeias 51 que evocam os
efeitos sonoros. Nesta figura foram utilizados símbolos
que evocam o disparo de uma arma.
Podemos verificar, ainda, as texturas que foram
utilizadas na composição estética do clipe. O efeito halftone
descende das impressões para simular a mescla de uma
cor à outra. Neste caso, as sombras dos personagens e dos
objetos foram criadas pela variação de cores das escalas do
branco ao preto. O efeito é concebido pela técnica
semelhante ao pontilhismo, cujo efeito é representado
pelas distâncias e tamanhos das esferas impressas, as
quais permitem a alusão de uma cor à outra de forma a
suavizar o contraste entre elas.
Uma simples gama de cores que foi utilizada (Figura
04) fazendo alusão aos quadrinhos do final da década de
30 52 , as quais utilizavam uma pequena cartela de cores,
basicamente cores primárias devido às restrições da
técnica de impressão do período. Para o público era algo
inovador, já que outros meios de comunicação visual,

51 No verbete "onomatopeia" do dicionário HOUAISS (2001), é estabelecida uma


distinção entre onomatopeias linguísticas, integradas ao sistema fonológico da
língua, e que por isso possuem uma forma similar a das palavras comuns (por
exemplo: "blémblém" e "bibi-fonfom"), e não linguísticas, que procuram imitar
os sons com maior fidelidade, usando combinações fônicas e representações
gráficas que fogem dos padrões fonéticos e ortográficos da língua (por exemplo:
o motor falhou: "fffrttoct"). (CALDAS, R. N. de. Estudo linguístico comparativo
sobre onomatopeias em histórias em quadrinhos: Português / Alemão. 2011.
Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011).
52 O primeiro quadrinho em cores do Superman foi publicado pela Action Comics

em 1938.

157
como o cinema, fotografia e televisão não apresentavam
cores, apenas tons de cinza, preto e branco.

Figura 4 – Recorte de Shot Me Down.

Fonte: David (2104). Disponível em:


https://www.youtube.com/watch?v=3x2ABSAMVno

Além da evocação aos quadrinhos, existe a alusão


marcada no estilo Pop Art, movimento que surgiu em 1954,
nos Estados Unidos e Inglaterra, e cujo propósito era
retratar a arte cotidiana. Apresentava um estilo figurativo,
com base nos símbolos da televisão, fotografia, cinema e
publicidade. O movimento ironizava o consumismo
desenfreado e, em contrapartida, acabava por apoiar o
mesmo, já que as representações acabavam fazendo
publicidade para algumas marcas53.
Por se tratar de um lyric video, a transposição midiática,
segundo Rajewsky (2012), tem por definição a combinação
distinta de um sistema a outro. Neste caso do clipe de

53 Arte das Sopas Campbell de Andy Warhol, em 1962.

158
Guetta, podemos verificar essa transposição do
letramento musical que normalmente encontramos em
clássica formatação em páginas de web e impressos, para
outro dispositivo cinético, o clipe. Assim, Rajewsky define
como a “Intermidialidade no sentido escrito de
transposição midiática (Medienwechsel), denominada
igualmente transformação midiática, a exemplo de
adaptações fílmicas de textos literários, novelizações e
assim por diante” (RAJEWSKY, 2012, p. 58).

4 Considerações finais

O clipe surgiu como uma possibilidade de expressão


sonora e visual, mesclando a linguagem cinematográfica a
uma outra mais arrojada e com maior possibilidade de se
expor em outros âmbitos.
A aparente hibridização desses conteúdos que
usualmente contrastam entre si pode gerar uma leitura
mais produtiva por meio da fusão de mídias
discriminadas por Clüver como intermidialidade e cuja
perspectiva do leitor necessita de uma interpretação mais
apurada dos textos.
Notamos que o lyric video, uma vertente do
videoclipe, permite utilizar, também, a linguagem textual
de uma composição musical mesclada a um contexto
visual e cinético, proporcionando uma imersão mais eficaz
de produção de sentido.
A tecnologia favoreceu a mudança de linguagens
tradicionais para outras mais adequadas ao sistema
regente de cada época e que, no entanto, a referenciação é

159
sempre uma constante influência das bases formadoras de
novas tendências culturais.

REFERÊNCIAS

BAKHTIN, M. (VOLOCHÍNOV, V. N.). Marxismo e filosofia da


linguagem: Problemas fundamentais do método sociológico na
ciência da linguagem. 16. ed. São Paulo: Hucitec, 2014.
CALDAS, R. N. de. Estudo linguístico comparativo sobre onomatopeias em
histórias em quadrinhos: Português / Alemão. 2011. Dissertação
(Mestrado em Letras) – Universidade de São Paulo, São Paulo,
2011.
CHRISTIN, Anne-Marie. A imagem enformada pela escrita. In: ARBEX,
M. (Org.). Poéticas do visível: ensaios sobre a escrita e a imagem. Belo
Horizonte: Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos
Literários, Faculdade de Letras da UFMG, 2006.
CLÜVER, C. Intermidialidade. Pós, Belo Horizonte, v. 1, n. 2, p. 8 - 23,
nov. 2011.
COSTA, C. L. F. Direito Autoral e a Música Eletrônica. Brasília: [s. n.],
2010.
DAVID Guetta - Shot Me Down ft. Skylar Grey (Lyric Video). [S. l.: s.
n.], 2014. 1 vídeo (3 min). Publicado pelo canal David Guetta.
Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=3x2ABSAMVno. Acesso em:
23 ago. 2019.
EISNER, W. Quadrinhos e a arte sequencial. São Paulo: Livraria Martins
Fontes Editora, 1989.
PRINCE - Sign O' The Times (Official Music Video). [S. l.: s. n.], 2010. 1
vídeo (3 min). Publicado pelo canal Prince. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=8EdxM72EZ94. Acesso em: 23
ago. 2019.
RAJEWSKY, I. O. Intermidialidade, intertextualidade e “remediação”:
uma perspectiva literária sobre a intermidialidade. In: DINIZ, T. F.
N.; REIS, E. L. de L. (Org.). Intermidialidade e estudos interartes:

160
Desafios da arte contemporânea. Belo Horizonte: Editora da
UFMG, 2012. p. 15-46.
RAJEWSKY, I. O. A fronteira em discussão: o status problemático das
fronteiras midiáticas no debate contemporâneo sobre
intermidialidade. In: DINIZ, T. F. N.; REIS, E. L. de L. (Org.).
Intermidialidade e estudos interartes: Desafios da arte contemporânea.
Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2012. p. 51-73.
RECUERO, R. Redes sociais na internet. Porto Alegre: Editora
Meridional. 2008.
SOARES, T. Videoclipe: o elogio da desarmonia. João Pessoa: Marca da
Fantasia. 2012.
TEIXEIRA, C. C. da C. A linguagem visual das vinhetas da MTV:
videodesign como expressão da cultura pós-moderna. 2006. Tese
(Mestrado em Design) – Pontifícia Universidade Católica-Rio, Rio
de Janeiro, 2006.
WYVER, J. La imagen en movimiento. Valencia: Filmoteca Generalitat
Valenciana, 1992.

161
SOBRE OS AUTORES

ALDEMI SEVERINO DA SILVA


Professor na Educação Básica. Licenciado em Letras-Espanhol
pela UEPB.  aldemi96@gmail.com

ALINY VIEIRA CARNEIRO


Professora na Educação Básica. Licenciada em Letras-Espanhol
pela UEPB.  alinyvieira0@gmail.com

CLAUDEMIR VIANA
Coordenador da Licenciatura em Educomunicação na ECA –
USP. Graduado em História (FFLCH-USP), Mestre e Doutor em
Ciências da Comunicação pela ECA-USP.
 profclaudemirviana@usp.br

CLAVIANO NASCIMENTO DE SOUSA


Bacharel em Comunicação Social (Educomunicação) pela
UFCG. Mestrando em Comunicação pela UFPB.
 claviano.sousa@hotmail.com

FÁBIO MARQUES DE SOUZA


Professor no DLA e no PPGFP da UEPB. Mestre (UNESP) e
Doutor (USP) em Educação, com estágio de Pós-doutorado em
Educação Contemporânea (UFPE). Licenciado em Letras e
Pedagogia.  fabiohispanista@gmail.com
 www.fabiomsouza.com

IASMIN ARAÚJO BANDEIRA MENDES


Bacharel em Comunicação Social (Educomunicação) e
Mestranda em Linguagem e Ensino pela UFCG. Integrante do
Grupo de Pesquisa EpisCom e O Círculo de Bakhtin em diálogo,
cadastrados no DGP do CNPq.  iasminabmendes@gmail.com
162
LÍGIA BEATRIZ CARVALHO DE ALMEIDA
Doutorou-se em Educação e obteve o título de mestra em
Comunicação Midiática pela UNESP. É bacharel em
Comunicação Social, com habilitação em Rádio e TV, pela USP
e Pedagoga pela USC. Professora Adjunta na UFCG, e lídera do
grupo de pesquisa EpisCom.
 ligiabia@gmail.com

MARÍA ISABEL POZZO


Profesora, Licenciada y Doctora en Ciencias de la Educación por
la UNR, Master en Formación de Profesores de Español como
Lengua Extranjera (Universidad de Barcelona). Investigadora
del CONICET, profesora de la Escuela de Ciencias de la
Educación y Directora fundadora del CELE, Universidad
Nacional de Rosario, Argentina.  pozzo@irice-conicet.gov.ar

MARIANA PÍCARO CERIGATTO


Docente permanente no Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade Tiradentes. Doutora em Ciência da
Informação e Mestre em Comunicação, Informação e Educação
em Televisão Digital (UNESP). Jornalista pela Universidade
Sagrado Coração (USC).  maricerigatto@yahoo.com.br

MARINA MAGALHÃES
Doutora em Ciências da Comunicação pela Universidade Nova
de Lisboa (2018), Mestre em Comunicação e Culturas Midiáticas
(2011) e Bacharel em Comunicação Social – Jornalismo (2008)
pela UFPB. Atualmente, é professora substituta do curso de
Comunicação Social (habilitação em Educomunicação) na
UFCG e professora convidada da Universidade Lusófona do
Porto.  marinamagalhaes@msn.com

163
MOABE BRENO FERREIRA COSTA
Doutorando no Programa de Ciências Sociais Aplicadas ao
Turismo (UFRN). Possui graduação em Comunicação Social
(UEPB) e mestrado em Cultura & Turismo (UESC/UFBA). É
professor universitário e tem experiência em assessoria de
comunicação de cidades turísticas e em assessoria parlamentar,
desenvolvendo projetos para diversas plataformas de mídia
com base em educomunicação.  moabebreno@hotmail.com

WILLIAM TAKENOBU AKAMINE


Editor de videografismo na Universidade Presbiteriana
Mackenzie (UPM). Graduado em Tecnologia e Mídias Digitais
pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC - SP) e
Mestre em Letras pela UPM. Participante do grupo de pesquisa
“Estudos da Intermidialidade: Teorias e ensino” (UPM).
 utakamine@yahoo.com.br

Coleção TECLIN – Tecnologias, Culturas e Linguagens

1. Velhas práticas em novos suportes? As Tecnologias Digitais


como mediadoras do complexo processo de ensino-aprendizagem de
línguas.
2. Letramentos digitais como práticas sociais: limitações e
possibilidades para a educação básica.
3. Confluências entre textos, tecnologias e educação.
4. Culturas, tecnologias e ensino de línguas.
5. Multimodalidade, metadiscurso e ensino.
6. Linguagem, cibercultura e educomunicação: gestão da
informação e do conhecimento por meio de ambientes digitais.
7. Entre língua(gens), tecnologias e discursos.

164

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