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Semântica e o Ensino de Português: Reflexões Acerca Do Aspecto Verbal
Semântica e o Ensino de Português: Reflexões Acerca Do Aspecto Verbal
Resumo
Este artigo visa a discutir a relevância dos estudos semânticos para o ensino da língua portuguesa no
Brasil, entendendo, a partir de Franchi (2002) e Geraldi (1996), que sujeito e linguagem perfazem-se
mutuamente num contexto sócio-histórico, a partir do processo lingüístico-interativo. Assim, debatendo
as questões do funcionamento do sentido, focalizamos o aspecto, com base em Costa (1990), discutindo
sua noção, bem como analisando como o aspecto verbal tem sido tratado em gramáticas normativas. O
aspecto é uma noção semântica que se refere ao tempo interno de um fato, tendo, por traço característico,
a duração, distribuindo, destarte, em imperfectivo, expressão marcada, e perfectivo, expressão não
marcada; pode ser representado por diferentes classes de palavras. Contudo, as gramáticas normativas o
restringem ao estudo do verbo, tratado-o, em geral, com imprecisão conceitual e descritiva, apresentando,
além disso, essa categoria em listas não exaustivas e fazendo uma análise recortada do mecanismo. Ao
redimensionarmos o olhar sobre o que se compreende por aspecto, verificamos que construções sem a
marcação explícita dessa categoria podem passar a esboçá-la, se inseridas em um discurso que as tome
como etapas de processo maior. Argumentamos, assim, que o fenômeno deva ser compreendido
discursivamente, bem como que o assunto deva ser levado para o âmbito do ensino de língua portuguesa,
numa prática que promova diferentes vivências interlocutivas em sala de aula.
Abstract
This article discusses the relevance of semantic studies for the teaching of Portguese in Brazil. Franchi
(2002) and Geraldi (1996) argue that the subject and the language are mutually connected in a socio-
historical context from a linguistic-interactive process. Therefore, we debate issues regarding how
meaning works focusing on aspect (Costa, 1990). We discuss the concept of aspect, and analyze how it
has been dealt with in normative grammar books. Aspect is a semantic notion that refers to the internal
time of a fact. Its main characteristic is duration. Aspect is, thus, divided into imperfective, marked
expression, and perfective, non-marked expression. It may be represented by different word classes.
However, normative grammars restrict aspect to the verb phrase. The treatment given is usually imprecise
in its description and conceptualization. In addition, they present the category through non-
comprehensive lists making a restricted analysis of the mechanism. If we give aspect a different type of
treatment, we will see that many non-marked constructions of this category may express the idea if they
are inserted in a discourse that take them as part of a bigger picture. We argue that the phenomena should
be understood discursively and that the topic must be included in the teaching of Portuguese in a way that
promotes different interlocutive experiences in the classroom.
Voltamo-nos a tal mecanismo por ser pouco veiculado nos ambientes escolares e
mesmo acadêmicos, mas o qual acreditamos ser muito importante na construção do jogo
significativo do discurso.
O sentido, nesse âmbito, não se encerra na forma, visto que essa forma não
aporta os elementos norteadores das condições para se interpretar os enunciados em
suas nuances; além disso, o mesmo sentido (ou sua equivalência) pode ser representado
em distintas formas. Assim, os sujeitos, quando se apropriam da linguagem, partilham
não meros sons ou grafemas, mas sentidos. Logo, a linguagem se esboça, em essência,
como um recurso para significar (cf. HALLIDAY; HASAN, 1976).
Por tal compreensão, a proposta de ensino emergente é a de que o estudo da
significação, tendo como objeto o texto – unidade de sentido da língua –, seja o cerne da
disciplina Língua Portuguesa. Isso porque, segundo entendemos, “é [nos] processos
interlocutivos que o aluno vai internalizando novos recursos expressivos, e por isso
mesmo novas categorias de compreensão do mundo” (GERALDI, 1996, p.69).
A prática escolar deve, então, proporcionar a reflexão sobre os elementos que
promovem os efeitos de sentido de um texto e, a partir dessa reflexão/análise, permite
ao aluno-sujeito a ampliação do domínio das várias possibilidades de significar que a
língua oferece. Nesse quadro, pode-se destacar a relevância dos estudos semânticos para
o ensino, por tomar, como objeto de análise, os mecanismos que promovem a
significação no campo restrito da linguagem verbal. Se os recursos significativos não
são trabalhados e apreendidos pelo aluno-sujeito, a dimensão de uso efetivo da língua
fica perdida, perde-se sua instância criadora. Assim, inferimos que os desígnios
semânticos são fundamentais para os processos viabilizadores do ensino.
A noção de aspecto
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Para melhor compreensão da dêixis, é oportuno considerar a categoria de pessoa. Quanto a isso, escreve
Fiorin (2005, p. 42): “Como a pessoa enuncia num dado espaço e num determinado tempo, todo espaço e
todo tempo organizam-se em torno do ‘sujeito’, tomado como ponto de referência. Assim, espaço e tempo
estão na dependência do eu, que neles se enuncia. O aqui é o espaço do eu e o presente é o tempo em que
coincidem o momento do evento descrito e o ato de enunciação que o descreve.”
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de tempo interno, mas tão somente que ele não é explicitado. O imperfectivo, por seu
turno, referencia a temporalidade interna de três modos: “ou considerando-a como um
fragmento de tempo que se desenrola [...], ou selecionando fases desse tempo
interno[...], ou expressando, ainda, estados resultativos [...]” (COSTA, 1990, p.30).
O primeiro ponto que merece atenção volta-se para o fato de existir ou não uma
abordagem acerca do assunto em pauta, ainda que minimamente, pois algumas
gramáticas sequer mencionam explicitamente o aspecto, como, por exemplo, Rocha
Lima (2001). Um outro ponto diz respeito à sua abrangência, visto que as gramáticas
que discutem ou citam a categoria costumam inseri-la restritamente nos estudos do
verbo, especificando, por vezes, no campo exclusivo das locuções verbais. Decorre daí,
duas observações: primeiro, não é pontuado se o aspecto configura-se ou não como
uma propriedade de todos os verbos; segundo, que noção subjaz a expressão ‘locução
verbal’.
(2)a. – Rafa teve um desenvolvimento muito rápido na escola. Quando ele começou a escrever, o
pai nem pode acompanhar porque estava morando fora.
b. – Quando João começou a digitar o trabalho, já era noite,
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(3) Estou ansiosa. Meu pai já está para chegar e eu ainda estou por fazer o jantar.
(4) Desde que me formei, só tenho me realizado: passei no concurso do estado, na seleção da
universidade e já estou para concluir o mestrado. Depois, é só partir p’ra o doutorado.
Mais uma vez verificamos que os sentidos não estão prontos aprioristicamente no
sistema, como afirmamos inicialmente, visto que as formas só assumem sentido quando
vivificadas nos processos enunciativos e esses, por seu turno, só acontecem através do
trabalho lingüístico de sujeitos interlocutores. Essas ponderações implicam que a escola,
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para atingir o seu propósito educacional, deve ser o lócus de práticas de linguagem, para
isso, estudando seus mecanismos, não para simples descrição, mas para conhecimento
visando um uso bem-sucedido.
Considerações finais
Discutimos, nesse breve artigo, a noção de aspecto e sua abordagem nas
gramáticas normativas de língua portuguesa. Para estabelecer correlação com tal noção,
a priori, situamos a importância dos estudos semânticos para o ensino de língua
materna subjacente à concepção interativa de linguagem.
Referências
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Paulo: Nacional. 1978.
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FIORIN, J. L. As astúcias da enunciação: as categorias de pessoa, espaço e tempo. 2.ed.
São Paulo: Ática. 2005.
FRANCHI, C. “Linguagem: atividade constitutiva”. Revista do Gel, n. especial, 37-74.
2002.
GERALDI, J. W. Linguagem e ensino: exercícios de militância e divulgação. Campinas,
SP: Mercado de Letras – ALB. 1996.
PERINI, M. P. Gramática descritiva do português. 2.ed. São Paulo: Ática. 1996.
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Janeiro: José Olympio. 1994.
SACONI, L. A. Nossa gramática: teoria. 11.ed. reform. 1990.