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A TRANSIÇÃO RELIGIOSA NO BRASIL:

CONTRIBUIÇÃO SOBRE ALGUNS DOS ASPECTOS


HISTÓRICOS, SOCIAIS E POLÍTICOS.

Introdução
A presente pesquisa pretende revisitar os estudos que vêm sendo desenvolvidos
sobre o que a literatura tem denominado “transição religiosa” no Brasil com respeito aos
seus aspectos e efeitos no campo político e social, aí compreendido o campo econômico,
dos costumes, eleitorais e culturais, dentro do contexto em que o fenômeno se
desenvolve também na América Latina, com maior ênfase para o período
correspondente ao do começo do século XXI em diante sem descurar, no entanto, de
fazer pequeno levantamento histórico.

Por “transição religiosa” no contexto brasileiro e latino-americano denomina-se


a mudança de um perdomínio de profissão de fé cristã católica romana para protestante
ou evangélica (como é usado de maneira sinônima na América Latina), e os efeitos
abordados
A justificativa para elaboração do presente é a atualidade do tema dentro do
período atualmente vivido, onde um exemplo manifesto e presente é o processo eleitoral
presidencial brasileiro de 2022 onde houve marcada atuação de líderes religiosos
realizando proselitismo político, conforme é amplamente noticiado, dentro de uma
conjuntura social de verdadeira crise humanitária no país causada pelo desemprego e
carestia e consequente reinserção do país no Mapa da Fome produzido pela Organização
Mundial das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO);
A metodologia adotada busca dentro de uma perspectiva histórica no que diz à
construção histórica do país analisar os aspectos mais característicos da quadra porque
vem passando o Brasil nos últimos tempos através da análise de bibliografia (teses,
dissertações, pesquisas tanto qualitativas quanto quantitativas, artigos, livros, relatórios
e publicações tanto em veículos especializados quanto em órgãos jornalísticos)
buscando explorar, de maneira resumida, os aspectos sociais e políticos da transição
1
religiosa em curso.

Os resultados foram obtidos através da coleta dos dados relativos aos temas
abordados – transição religiosa, aspectos políticos, sociais, eleitorais e culturais – dentro
da bibliografia apontada.

1. Fundamentação teórica
O presente trabalho resultou da análise de bilbiografia relativa ao assunto
composta tanto por livros tratando de história como também material, recente e nem
tanto, composto por trabalhos acadêmicos, relatórios, pesquisas de opinião, matérias
jornalísticas, artigos publicados em revistas especializas e relatórios analisando os temas
pretendidos. As perguntas realizadas foram: pode-se falar numa transição religiosa no
Brasil (e na América Latina)? Se sim, em que consiste? Existem características
peculiares ao fenômeno no que diz respeito aos comportamentos sociais, econômicos,
eleitorais e culturais? Quais as características que compartilham os países da América
Latina nesse sentido? Quais são seus efeitos aparentes mais evidentes?
Para obtenção dos resultados foram relacionados movimentos sociais e políticos
relativos ao fenômeno da transição religiosa assim como números encontrados em
pesquisas quantitativas tratando sobre o tema analisando fatores como maior ou menor
participação semanal nos cultos, maior ou menor busca de fundamento “moral”, maior
ou menor “animação” nos cultos, assim como outros menos óbvios – como diferenças
nas tendências ao tratamento com as pessoas em situação de maior vulnerabilidade, ou
ainda a tendência maior ou menor ao proselitismo político através de agentes religiosos.
Os resultados obtidos buscam contribuir para a construção do debate continuado
sobre o tema.

2. Resultados alcançados
Os resultados apontam efetivamente para um movimento de perda da hegemonia
da confissão religiosa cristã católica romana para a confissão protestante ou evangélica,
termos utilizados em toda a América Latina como sinônimos, com efeitos que não estão
restritos unicamente à mera profissão de fé.
Relatório produzido pelo Pew Research Center chamado Religion in Latin
2
America (Religião na América Latina, tradução livre do Autor) onde foram analisados
latino-americanos de 18 países (incluindo os 55 milhões à época vivendo nos EUA) e no
protetorado norte-americano de Porto Rico e divulgado na internet em novembro de
2014, apontava que 84% dos entrevistados haviam sido criados na fé católica,
permencendo nesse credo 69% deles, com uma diminuição bruta de 15% e proporcional
de 17,8%; por outro lado, se apenas 9% foram criados em lares protestantes, 19%
professavam as vertentes evangélicas, um crescimento bruto de 10% e proporcional de
111,11%.
No Brasil, em que à época da pesquisa 61% identificavam-se como católicos e
26% protestantes, 54% dentre os que professavam credos evangélicos haviam sido
criados em lares católicos, comprovando a tendência substancial de migração dos
professantes católicos para o protestantismo e a transição religiosa.
Pesquisas posteriores indicaram o progresso na mudança, com levantamento
realizado pelo Datafolha em 13/01/2020 apontando 50% de entrevistados declarando-se
católicos, 31% evangélicos e 10% sem relígião1.
Além dos aspectos professionais e das modificações na sociabilidade daí
advinda, não sendo de somenos importãncia sublinhar o desenvolvimento da Teologia
da Prosperidade, é fundamental sublinhar os aspectos político-eleitorais relativos ao
fenômeno abordado: estudo aponta para o funcionamento de denominações religiosas
neopentecostais como bastiões de propaganda e apoio político disseminado pela postura
dos pastores manifestamente favorável às pautas conservadoras e, mais especificamente,
apoiando incondicionalmente o governo do atual Presidente da República.
Essa postura originou um fato social com impacto direto sobre a vida política do
pais, tendo em vista que uma maioria substancial dos eleitores evangélicos
acompanharam a orientação pastoral e apoiavam o candidato e Presidente da República
Jair Bolsonaro, como pesquisas eleitorais demonstraram2, além de entrevistas
comprovarem a influência da influência religiosa sobre a decisão política3.

1
Maiores informações em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/01/13/50percent-dos-brasileiros-sao-
catolicos-31percent-evangelicos-e-10percent-nao-tem-religiao-diz-datafolha.ghtml.
2
Entre muitas outras, verificar: https://www.poder360.com.br/poderdata/bolsonaro-tem-62-do-voto-
evangelico-mostra-poderdata/.
3
Como verificado na matéria: https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2022/10/5040952-evangelicas-
definem-voto-com-pastores-orientacao-divina-e-reflexao-propria.html.
3
Conclusões
O fenômeno discutido no presente é por demais amplo e possui efeitos das mais
diversas naturezas, sendo impossível em tão poucas páginas abarcar todos os aspectos
com o que se pretende, principalmente, trazer uma contribuição baseada em extensa
pesquisa bibliográfica.
Os resultados obtidos indicam estar acontecendo uma modificação dentro da
profissão de fé na população brasileira sendo acompanhada, por seu turno, de outros
aspectos sociais daí advindos – como a sociabilidade oriunda da Teologia da
Prosperidade – além de político-eleitorais, como o processo eleitoral ocorrido em 2022
comprova cabalmente.
A Transição Religiosa configura-se, atualmente, como um dos aspectos
fundamentais a moldar a sociabilidade brasileira e, talvez ainda mais significativamente,
impactando o modelo de democracia que se está buscando construir no Brasil,
principalmente em se considerando a guinada conservadora nos costumes.
A guinada conservadora no campo dos costumes está acontecendo,
paralelamente, com uma associação visível entre seguimentos ligados às igrejas do
segmento cristão evangélico com partidos políticos, em especial os do campo
denominado de direita – tanto “moderada” quanto extremada – como a eleição do bispo
da Igreja Universal do Reino de Deus, Marcelo Crivella, para prefeito da cidade do Rio
de Janeiro (2ª maior população e com 2º maior PIB municipal do país, além de ser a
antiga capital federal), assim como a eleição em 2018 de Jair Messias Bolsonaro para
presidência da República (ROCHA 2021).
Importante sublinhar que, a despeito do aspecto meramente superficial, insincero
ou “marketeiro” que o comportamento do atual (outubro de 2022) Presidente da
República Jair Bolsonaro possa denotar, durante seu mandato foi dado destaque
substancial a quadros políticos oriundos do meio cristão-evangélico, como a pastora
Damares Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos entre 1º de
janeiro de 2019 e 30 de março de 2022, abdicando ao cargo ministerial para concorrer –
e ser eleita – Senadora da República pelo Distrito Federal com 714.562 votos.
A maior representatividade social do segmento cristão-evangélico, coerente e
compatível com nossa percepção relativa a uma transição religiosa importante em curso,
diz respeito às reiteradas declarações do atual Presidente da República com respeito à

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indicação e nomeação de pessoas com perfil “terrivelmente evangélico” para os cargos
de Ministro da Justiça e para concorrer a um cargo de Ministro do Supremo Tribunal
Federal, numa importantíssima guinada ideológica onde a meritocracia não mais se
sustenta na técnica (in casu, jurídica), mas na afiliação religiosa compatível com as
pautas políticas preconizadas.
Durante o processo eleitoral de 2022, sucessivas pesquisas quantitativas de
cunho eleitoral demonstraram que os brasileiros de profissão religiosa cristã evangélica,
em maioria significativa, apoiavam a candidatura do atual Presidente, Jair Bolsonaro,
como o levantamento de 20/10/2022 realizado pelo Instituto Datafolha sob encomenda
do jornal Folha de São Paulo e da emissora de TV Globo – 10 dias antes do segundo
turno – indicando 65% tendentes a lhe confiar seu voto contra 27% dos que afirmavam
pretender votar no desafiante, o ex-Presidente Luiz Ignácio Lula da Silva (votos totais;
válidos 70,7% X 29,3%, respectivamente).
Importante salientar que nesse mesmo levantamento realizado entre 17 e 19 de
outubro de 2022 com 2.912 entrevistas (779 dos ouvidos identificando-se como cristãos
evangélicos, 1.505 como cristãos católicos), o atual Presidente tinha menor intenção de
voto que o desafiante entre os católicos (36% X 57% totais; 38,7% X 61,3% válidos ) e
entre os entrevistados totais (44% X 47% totais; 47,3% X 52,7% válidos).
A última pesquisa divulgada pelo mesmo Datafolha antes do 1º turno do pleito
em 30 de setembro de 2022 tinha quadro semelhante, com Bolsonaro liderando com
folga entre os entrevistados declarados cristãos evangélicos (47% votos totais ou 56,6%
dos válidos), enquanto perdia entre os cristãos católicos (26% dos votos totais contra
49% do ex-Presidente Lula), entre os espíritas kardecistas (32% das intenções de votos
totais contra 40% do ex-Presidente Lula) e entre os entrevistados totais (34% dos votos
totais para o atual mandatário e 48% para o desafiante).
Os resultados, apesar de não poderem ser decisivamente caracterizados como
apoditicamente garantidos, indicam fortemente uma razoável unidade de propósito do
ponto de vista político com vistas a garantir uma maior participação das pautas político-
ideológicas de viés evangélico – conservadorismo ou reacionarismo nos costumes,
ultra-liberalismo econômico – traduzida em número crescente de candidatos aos cargos
proporcionais (deputados federais) com denominações como “pastor”, “irmão” etc.

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Referências bibliográficas

GUADALUPE, José Luís Péres; CARRANZA, Brenda. Novo Ativismo Político no


Brasil: os evangélicos do século XXI. Rio de Janeiro, Konrad Adenauer Stiftung, 2020.
MARTINA, Giacomo. STORIA DELLA CHIESA: da Lutero ai nostri giorni IV – L’etá
contemporanea. Brescia, ed. Morcelliana, 2006.
SCHWARCZ, Lilian Moritz; STARLING, Heloisa Murgel. BRASIL: uma biografia.
São Paulo, Ed. Companhia das Letras, 1ª Edição, 2015.
ROCHA, Luiz Sérgio Cordeiro da. A NOVA “QUESTÃO RELIGIOSA”: a chamada
transição religiosa e a política partidária no Brasil recente. In: Humanidades, Políticas
Públicas, Desigualdades. Orgs. Wilson Madeira Filho, Luiza Alves Chaves. Rio de
Janeiro, ed. Autografia, 2021.

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