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A RELIGIÃO NO ANTIGO ORIENTE PRÓXIMO (AOP)

Mapa do Antigo Oriente Próximo (útil aos dois textos)

TEXTO 1 - A habitação dos deuses: os templos


A diferença dos templos na concepção hebraica e pagã, conforme Reinke,
estava “No fato de que o politeísmo daqueles [povos] promovia cada vez mais lugares
sagrados, uma infinidade de templos e liturgias”, ao passo que o culto a Yahweh era
centralizado em apenas um locus — inicialmente o tabernáculo móvel, mas, por volta
do ano 1000 a.C., o templo erigido em Jerusalém.
O templo não era um local destinado apenas à adoração; era concebido para
ser a residência do(s) deus(ses) e o local em que eram feitos rituais e cerimônias em
honra à(s) divindade(s). Na perspectiva dos deuses do AOP, o templo era a sua
habitação na terra, uma miniatura ou cópia da sua habitação nas esferas celestiais.
Por isso, muitas culturas do AOP consideravam os templos como portais que os
conectavam às dimensões dos deuses. Os templos também representavam o
cosmos sobre o qual determinada divindade exercia controle e domínio.
O templo ainda era onde os antigos criam que os céus entravam em contato
com a terra, espaço de intersecção, de âmbito divino e transcendente, humano e
material. Um excelente exemplo é a construção mesopotâmica chamada zigurate,
estrutura piramidal em cujo topo havia uma pequena casa (ou câmara) na qual uma
mesa era preparada para a divindade. As escadarias que levaram até o topo eram
consideradas o elo entre a realidade divina e a humana; ou seja, por onde os deuses
desciam para serem servidos pelos seres humanos. Diferente dos templos normais,
o zigurate era um lugar para um determinado deus habitar; porém, as pessoas não
poderiam adentrá-lo para adorar. Provavelmente, a torre de Babel (Gênesis 11:1-9)
era um zigurate.

Zigurate de Ur, majoritariamente reconstituído. Tell el-Mukayyar, Iraque (©


Wikimedia Commons).

A Bíblia Hebraica, por fim, apresenta uma visão distinta em relação ao templo
como habitação dos deuses. O relato da criação nos dá informações suficientes para
considerar que o cosmos foi criado para ser o próprio templo e habitação de Deus, e
o lugar em que o ser humano desfruta de comunhão com ele. Se em Gênesis 1 temos
a criação do espaço sagrado, em Gênesis 2 temos a ação do ser humano como
sacerdote-cultivador desse templo-jardim, uma representação do grande templo
cósmico divino. Novamente, esse conceito nos leva diretamente a uma peculiaridade
de Yahweh, como foi expresso por Paulo em sua pregação no Areópago de Atenas:
“O Deus que fez o mundo e tudo que nele há, sendo Senhor do céu e da terra, não
habita em templos feitos por mãos de homens; tampouco é servido por mãos de
homens, como que necessitando de alguma coisa; pois ele mesmo é quem dá a
todos a vida, e a respiração, e todas as coisas” (Atos 17:24-25, ACF).

TEXTO 2 - Os ídolos
Como, então, os antigos habitantes do Antigo Oriente Próximo tinham a certeza
de que os templos eram, de fato, habitados pelos deuses? Essa presença divina era
assegurada pela imagem dessa divindade — o ídolo — na câmara interior do templo
ou santuário.

A produção de ídolos, dentro da cosmovisão do AOP, não era vista como algo
humano, mas como atividade conduzida diretamente pelos deuses, semelhante ao
conceito cristão de inspiração das Escrituras. Ao término de todo o processo de
fabricação do ídolo, o ritual mais importante realizado era o ritual de “lava-boca” do
ídolo. Ao lavar a boca da imagem, os deuses poderiam comer e beber as oferendas
e cheirar os incensos queimados em seu louvor. Após essa etapa, o ídolo era
finalmente colocado na parte mais importante do templo; palavras declaratórias eram
proferidas e, finalmente, o ídolo poderia ser adorado por todos.

A principal crítica apontada contra a prática da idolatria veio dos profetas Isaías
e Jeremias (cf. Isaías 44:9-20 e Jeremias 10:2-16). De acordo com os profetas, era
um completo absurdo em termos lógicos tributar algo de divino às imagens que são
feitas por mãos humanas. Em outras palavras: se é produto humano, não pode ser
divino. “Eles criticavam a ideia de uma verdadeira deidade estar presente dentro de
uma imagem feita por humanos.”
Por que conhecer o contexto do Antigo Oriente Próximo para compreender
melhor o texto da Bíblia Hebraica? Uma das regras mais básicas da exegese bíblica
é nunca impor ao texto aquilo que achamos ser correto. A nossa tarefa é a exegese
e não a eisegese. Isso implica dizer que conhecer não somente o texto sagrado em
si, mas também todo o caldo cultural que fez parte dos autores originais e dos
primeiros leitores, é fundamental para compreendermos hoje, depois de milênios,
como esses textos foram escritos, e compreender qual era a mensagem original, a
forma primeira, da revelação divina.

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