Você está na página 1de 19

PAISAGENS SONORAS

Rádio, Sentidos e Identidade

Comunicação ao IV Congresso de Antropologia de Espanha e Portugal


O Homem, a Paisagem e Interrelação
Alcañices, 16 de Outubro de 2007

Filipe Reis
ISCTE/CEAS
filipe.reis@iscte.pt
I

O meu interesse pelo conceito de paisagem sonora liga-se ao facto de ter realizado uma
investigação sobre radiodifusão local em Portugal da qual veio a resultar a minha
dissertação de doutoramento (Reis 2006)1. No âmbito dessa pesquisa fui acumulando
leituras, referências e notas sobre história e teoria da rádio, bem como sobre o som
enquanto objecto de teorização e reflexão nas Ciências Sociais e, em particular, na
Antropologia. Na presente comunicação, procuro reflectir sobre as questões de natureza
epistemológica que a rádio – um meio sonoro – levanta aos teóricos da comunicação e
como essas questões se articulam com debates muito antigos sobre hierarquias
sensoriais e formas de construir e fixar o conhecimento. O meu argumento segue duas
linhas principais: 1) proporei que um entendimento antropológico da radiodifusão –
entendida como parte integrante das paisagens sonoras contemporâneas – exige uma
discussão crítica dos pressupostos que estão por detrás do que designo por matriz
visual-centrada da episteme ocidental; 2) proporei também que o reconhecimento de
que existem outras epistemes (onde, por exemplo, a audição desempenha um papel
central na construção do conhecimento sobre o mundo) pode ajudar a repensar o papel e
o significado da rádio (e das sonoridades) na vida quotidiana e na construção das
identidades pessoais e de grupo.

II

A rádio é um meio de comunicação sonora, ou, para usar uma definição de Eduardo
Medisch (1999), “uma tecnologia intelectual destinada ao ouvido”. Ou seja, a rádio usa

1
O presente texto retoma, parcialmente, em algumas das suas secções, partes do capítulo 1 da referida
tese de doutoramento (Reis 1996).

1
códigos sonoros (música, palavras, sons, ruído e silêncio) para comunicar com os
ouvintes. Como afirma um proeminente teórico do meio, na comunicação radiofónica

“Não há imagem e não há texto. O contacto, ou medium como agora se designa,


é absolutamente não-visual: os receptores, que são os ouvintes, ou uma
audiência colectiva, não vêem o emissor ou locutor tal como podem ver na
televisão ou no cinema; nem tão pouco lhes é oferecida a compensação de uma
mensagem visível e fixa, tal como na literatura. Os códigos da rádio são
puramente auditivos, consistindo em fala, música, sons e silêncio, e (...) o
ouvido não é o mais ‘inteligente’ dos nossos órgãos sensoriais (...). Os riscos de
ambiguidade ou de completo falhanço na comunicação são altos” (Crisell 1994:
5, tradução minha).

Crisell é conhecido entre os teóricos da rádio ter designado este meio de comunicação o
“meio cego” (“the blind medium”). O fascínio deste e de outros teóricos da
comunicação radiofónica pela metáfora da cegueira é, do ponto de vista epistemológico,
muito revelador do papel que a audição desempenha no seio de cultura letrada e
predominantemente visual-centrada. Eric Havelock (1996), um reputado estudioso da
poesia homérica, ajuda-nos a perceber o contexto dentro do qual a rádio pode ser
designada por “meio cego”. Este autor lembra-nos que a rádio surgiu e desenvolveu-se
em sociedades onde o texto e a imagem se haviam imposto – num processo que remonta
à descoberta da perspectiva e à invenção da impressa na Renascença – como formas
"superiores" ou "mais avançadas" ou ainda mais credíveis e legítimas, isto é, menos
ambíguas, de representação. Para o etnomusicólogo Murray Schafer (1977/1979) – a ele
voltarei mais adiante pois foi ele quem cunhou e desenvolveu o conceito de paisagem
sonora – na episteme do Ocidente o ouvido foi perdendo, de forma gradual, a sua
primazia funcional para o olho. Do ponto de vista epistemológico isto teve profundas
implicações, a mais relevante das quais, como vários autores têm assinalado, é o
ocularcentrismo que caracteriza a nossa definição de conhecimento (cf. Jones 1993
Stoller 1989; Hibbits 1992; Finnegan 2002). Culturalmente somos ensinados a
desconfiar do que “apenas” ouvimos. Em rigor, este debate epistemológico pode ser
situado em épocas ainda mais recuadas na história das ideias do ocidente: pode então
dizer-se que as observações de Crisell sobre a especificidade da comunicação e da
linguagem radiofónica estão em sintonia com os debates que, desde a Grécia Antiga,

2
vêm moldando a hierarquia sensorial da nossa cultura, nomeadamente o papel e o lugar
que a audição e a visão nela ocupam (vd. Classen 1993)2. O facto de a rádio se destinar
ao ouvido e o ouvido, como afirma Crisell, não ser considerado “o mais inteligente” dos
nossos sentidos – levanta problemas que os teóricos e didactas da comunicação
radiofónica continuam a discutir até hoje. Na comunicação radiofónica, ao que parece,
os riscos de ambiguidade são muito altos.

O uso da metáfora da cegueira na literatura sobre rádio ilustra, portanto, de forma muito
clara, as tensões, ansiedades, perplexidades e questões que a radiodifusão sonora – com
os seus códigos exclusivamente auditivos – despertaram e ainda despertam no contexto
de uma cultura predominantemente visual, letrada e literária. A legitimação cultural,
política, estética e académica da radiodifusão enquanto meio de comunicação, forma de
conhecimento, objecto de estudo e matéria de ensino foi no passado e continua a ser no
presente pensada recorrendo à imagem da cegueira e ao carácter evanescente do som
(para uma apreciação recente veja-se Lewis 2000). A "falta de confiança no ouvido”,
proverbialmente recordada por Eduardo Meditsch (Meditsch 1999:215)3 e o acentuado
pendor visual-letrado da cultura ocidental pós-renascentista parecem ter marcado
profundamente a forma como se ensina, pratica e teoriza a comunicação radiofónica.

Salientando a especificidade do meio radiofónico enquanto tecnologia que se destina ao


ouvido, a metáfora da cegueira tem ajudado a reflectir sobre os códigos “puramente
auditivos” de que é feita a linguagem radiofónica, tem inspirado criadores de textos
2
O prestígio do Ouvido, que Aristóteles concebia como um importante instrumento educativo e
intelectual, foi crescendo na Idade Média em boa medida devido ao carácter oral da cultura medieval
onde saber escrever era um ofício, do qual até o rei podia prescindir (cf. Goody & Watt 1963; Goody
1988). Nos países protestantes, sobretudo a partir do século XVII, privilegia-se o Ouvido por sobre a
Vista, uma postura que encontra o seu fundamento e justificação numa passagem da Epístola de São
Paulo aos Romanos: “Pois a fé vem da pregação e a pregação é pela palavra de Cristo. Ora, eu digo: será
que eles não ouviram? Entretanto, pela terra inteira correu a sua voz; até aos confins do mundo as suas
palavras” (Paulo, Cartas aos Romanos 10, 17-18). O Deus da tradição bíblica é um Deus que se ouve, não
se vê e manifesta-se amiúde através de sons e ruídos (Checa sd.). Por outro lado, em contextos
predominantemente iletrados o acesso aos textos (sagrados ou outros) faz-se predominantemente através
de interpretações/exegeses autorizadas e escutadas pelos fiéis (cf Iturra 1989; 1990; 1991). As reflexões
acerca do uso da rádio para educar (ver Ribeiro 1962) bem como as tentativas de usar a rádio como
instrumento para o desenvolvimento em populações não escolarizadas, reabilitam até certo ponto esse
velho prestígio do ouvido.

3
O autor escreve: “Que tipo de conhecimento pode ser construído no “ar”, onde tudo se dissolve e
desfaz? Se este paradoxo também diz respeito a outras formas de informação electrónica, na rádio a
perplexidade ainda se torna maior pela limitação auditiva. (...) [A] falta de confiança no que é percebido
pelo ouvido está de tal modo incutida em nossa consciência colectiva que se tornou proverbial. (...) «o
que entra por um ouvido sai pelo outro» se contrapõe ao «ver para crer»...” (Meditsch 1999:215).

3
radiofónicos e continua a instigar radialistas e ensaístas (Beck s.d./B). Esta imagem algo
neurótica (Beck s.d./A) reflecte o lugar que o sentido da audição desempenha na
hierarquia sensorial de uma cultura visual-centrada. A visão desempenha um papel
dominante nas nossas definições comuns do que é conhecer e entender – dizemos “estou
a ver” como sinónimo de “estou a entender, estou a perceber”. A “limitação auditiva”
desafia a reflexão sobre as potencialidades da rádio enquanto forma de expressão num
mundo onde, diz-se, “uma imagem vale por mil palavras”. E no entanto, a rádio,
propõe-nos “dar a ver o mundo” (um conhecido slogan da TSF), um mundo feito de
palavras e sons.

Como é que, então, o que apenas pode ser ouvido pode reivindicar o estatuto de
conhecimento e representação do mundo? Para responder a esta questão parece ser
necessário, de alguma forma, ultrapassar a episteme visual-centrada que caracteriza a
nossa matriz cultural, desde os antigos gregos.

III

“ (...) nada é mais falso do que o verdadeiro e nada mais verdadeiro do que o construído.
(...) O som falso pode ser mais radiofónico do que o verdadeiro” (Ribeiro 1964:89 e 90)

Steven Jones (1993), num estimulante ensaio onde propõe reexaminar a história da
apreensão, consumo e produção da realidade através das tecnologias áudio, mostra
como os discursos contemporâneos acerca da “realidade virtual” tendem a ser
exclusivamente visual-orientados. Criticando o “ocularcentrismo” dominante na teoria
social e nos modelos filosóficos sobre o conhecimento e a comunicação, Jones reflecte
acerca do papel das tecnologias de registo, produção e difusão sonora na criação de
novas realidades. Que mudanças trouxeram as tecnologias de armazenamento,
tratamento e difusão de som no modo como apreendemos e representamos o mundo?
Qual é o papel das tecnologias de registo, produção e difusão sonora na criação de
novas realidades? Que mudanças e consequências têm espoletado na forma como
percepcionamos o espaço e o tempo?

Algumas observações de Eric Havelock remetem, de modo significativo e raro (cf.


Hibbits 1992), para estas questões: a rádio acelerou e comprimiu o espaço e o tempo ao

4
expandir os poderes da voz humana muito para além da dimensão de uma audiência
fisicamente presente. A ideia de “encantamento oral”, ou a tão popular expressão
“magia da rádio”4 surgem, assim, como formas de no imaginário ocidental se explicar o
retorno, sobre forma de mediação electrónica, da oralidade (cf. Havelock 1997).

Por outro lado, como sustenta Jones (1993), a radiodifusão, bem como as tecnologias de
registo sonoro, na medida em que tornaram possível desincorporar, descontextualizar,
repetir, eternizar e manipular as sonoridades e as vozes, proporcionaram novas
possibilidades de imaginar e representar a realidade.

Deste modo, torna-se possível pensar a evolução das técnicas de registo e difusão
sonora e, em particular, as preocupações relativamente à localização espacial do som, a
partir de uma importante categoria do pensamento social: a autenticidade. Em termos de
percepção auditiva essas preocupações traduzem-se pelo termo fidelidade (ou realismo).
Uma vez que o som se propaga no espaço, registar uma determinada fonte sonora (uma
voz, o pingar de uma torneira, o trote de um cavalo, uma tempestade, etc.) implica
capturar o ambiente sonoro, ou seja, o som do espaço que rodeia essa fonte sonora.
Repare-se no seguinte exemplo (Álvares 1954:21):

[Quando a Emissora Nacional quis dar a sensação do que seria uma tempestade
na Boca do Inferno e se deslocou para lá para fazer uma transmissão] “o ouvinte,
em casa, apenas recolheu no ouvido um ruído insólito... (...) o ruído natural em
rádio resultou antinatural. (...) em Rádio, a verdade real pode muitas vezes não
ser a verdade radiofónica.”

O episódio contado por Álvares evoca o problema da autenticidade – e sua relação com
a localização espacial – inerente a toda a representação sonora da realidade. Aliás, o
caso da tempestade pode considerar-se verdadeiramente exemplar para ilustrar a
questão: de facto, radiofonicamente era mais eficaz e menos dispendioso produzir uma
4
Sobre isto vejam-se as observações de Adriano Vasco Rodrigues acerca daquilo que o autor considera
ser a excessiva importância atribuída aos conteúdos na maior parte das análises sobre a rádio descurando-
se a sua “função glossolálica”, isto é, o poder lúdico e encantatório do discurso radiofónico. Este poder,
para este autor, está associado a mecanismos de “higienização da linguagem”, o uso de frases curtas, etc..,
que visa transformar esteticamente a linguagem radiofónica em mercadoria. Seria então esta função
glossalálica que permitiria usar a rádio como ruído de fundo que acompanha outras actividades.
(Rodrigues, 1986:23).

5
“tempestade” em estúdio – pela oscilação de uma folha de metal, ou usando uma
“máquina de vento” – do que captar (sem o equipamento adequado) o som de uma
tempestade real. O desenvolvimento e evolução das técnicas de registo sonoro, que
aproveitaram tanto à indústria da rádio como à da produção fonográfica foram, de
acordo com Steven Jones, ditados pela combinação de factores que lhe imprimiram
dinâmica: custo, controle e fidelidade. Assim, a criação e construção de espaços
específicos de gravação e emissão – os estúdios – constitui uma forma de obter mais
controle sobre o todo o processo; é claro que a história da produção fonográfica oscila
entre a gravação/emissão localizada (como no caso da gravação de um concerto ao vivo,
ou um directo radiofónico) e a gravação/emissão no estúdio.

Enquanto que para os arquivistas e os etnomusicólogos a localização foi e continua a ser


muito importante (já que confere autenticidade ao registo sonoro), para a indústria
fonográfica o estúdio tornou-se o local por excelência de gravação, um local
insonorizado onde é possível atomizar e recombinar os sons. Deste modo, a rádio, bem
como a indústria fonográfica, fizeram do estúdio – um espaço insonorizado – o local
privilegiado de captação sonora e desenvolveram um conjunto de artifícios técnicos
para dotar de realismo e fidelidade os sons. O ruído de uma tempestade é mais cómoda
e eficazmente conseguido em estúdio; efeitos sonoros como o “eco” (delay) ou, mais
recentemente, as possibilidades da reverberação digital, permitem simular ambientes
sonoros (sala de concerto, igreja) que permitem ultrapassar as dimensões acústicas do
estúdio (que é um espaço insonorizado por excelência). Por outro lado, em termos de
percepção sonora, o estúdio insonorizado cria distanciamento em relação aos
acontecimentos noticiados, enfatizando o controle sobre os conteúdos que deve ser
exercido pelo apresentador ou o “pivot” de emissão (Crisell 1986:90, cit. in Meditch
1997, documento electrónico).
IV

Permitam-me voltar à questão da cegueira como metáfora para a comunicação


radiofónica. De facto, desde há algum tempo, vários teóricos do meio têm vindo a
criticar esta ideia. O exame de alguns destes argumentos permite re-situar a questão,
como veremos de seguida. Shingler oferece aquilo que se pode designar por uma crítica
semântica ao afirmar (Shingler 1998:74 cit. in: Beck documento electrónico:1)5:
5
http://interact.uoregon.edu/MediaLit/FC/readings/listentoradio.html

6
“O uso repetido de palavras como ‘cego’ e ‘cegueira’ para descrever a rádio
parece sugerir que os que escrevem sobre rádio consideram a sua falta de
visualismo como constituindo um problema em vez de uma vantagem: como
qualquer coisa a ser ultrapassada em vez de explorada”. (tradução minha)

Allan Beck (pub.electrónica6) propõe-se ultrapassar o tropo da cegueira por recurso à


fenomenologia: em seu entender a ideia de cegueira deverá ser percebida no quadro de
um modelo explicativo de percepção sensorial que tende a isolar cada sentido e a
destacar as suas diferenças. A obsessão dos teóricos e escritores radiofónicos com a
cegueira resultaria assim, paradoxalmente, da sobrevalorização da audição e do ouvido
por relação a todos os outros sentidos. Beck propõe ultrapassar esta perspectiva – que
designa por “modelo externalista” – recordando que, de um modo geral, a forma como
apreendemos o mundo e agimos sobre ele é um processo que envolve todos os sentidos.
Não ouvimos rádio apenas com os ouvidos. Ouvimos rádio com todo o corpo. Meditsch
(1999) reconhece que a “percepção do som ocorre principalmente através dos ouvidos,
embora a sua vibração e ressonância possam ser sentidas pelo corpo todo”.

Em muitas sociedades, de modo particular em contextos rituais, tira-se partido destas


propriedades do som para induzir estados de consciência alterados e estabelecer
comunicação com o além (Needham 1967; Jackson 1968). No campo da Antropologia
há um conjunto de estudos que têm mostrado como noutros contextos sociais e culturais
as hierarquias sensoriais variam daquelas com as quais estamos familiarizados: os Suya
do Mato Grosso no Brasil, estudados por Anthony Seeger (1975) atribuem uma enorme
importância à palavra e à audição, enquanto que a visão está associada a
comportamentos anti-sociais, como a feitiçaria. O mesmo acontece com os Kaluli da
Papua Nova Guiné, escutados por Steven Feld (1990; 1994) onde o ouvido constitui o
sentido por excelência para classificar, ordenar e experienciar o mundo, organizar as
emoções e fornecer um modelo de apreciação estética. Também os trabalhos de Alfred
Gell sobre os Umeda (1975; 1995) e de Paul Stoller (1989) sobre os Shongay
constituem excelentes etnografias sobre epistemes onde, diferentemente do “ver para

6
http://interact.uoregon.edu/MediaLit/FC/readings/listentoradio.html

7
crer”, o mundo é experimentado e percebido a partir da ideia de “ouvir para crer”
(Thorn 1996).

Entre nós, as possibilidades de manipulação digital do som no cinema, nos locais de


entretenimento ou nas nossas próprias casas, mostra que o som se tornou um poderoso
recurso que aumenta a “impressão de realidade”. Meditsch (1999:251) reconhece que,
no caso da rádio “a habitual precariedade dos aparelhos receptores não permite uma
utilização do mesmo nível, (como no cinema) mas ainda assim a captação
somatossensorial do som não é totalmente desprezível”.

A ideia de que todo o corpo, e não apenas o ouvido, está implicado no processo de ouvir
rádio constitui um importante contributo para reconceptualizar a especificidade da
comunicação radiofónica. Alan Beck destaca o facto de cada ouvinte poder visualizar
um rosto e um corpo para as vozes dos locutores, cheirar o odor da confecção de
alheiras descrito pelo repórter ou saborear uma iguaria regional, ou “ver o jogo a cores”.
Tomemos um exemplo: a apresentação promocional de um programa radiofónico como
o Feira Franca (Antena 1 aos domingos) diz a dado passo que “ao domingo a rádio tem
sabores e cheiros”7. O que faz com que esta frase não nos espante é o facto, não
negligenciável, de estarmos dispostos a aceitar que cheiros e sabores podem ser
comunicados através de palavras (é agridoce, é picante, é delicioso, etc.) e de acções
(percebidas enquanto ruídos como mastigar ou inspirar profundamente).

Um dos anúncios promocionais da estação TSF prometia-nos uma rádio que “dá a ver o
mundo”. Não achamos invulgar que o sentido da visão não diga unicamente respeito
àquilo que temos diante dos nossos olhos. Graças aos estudos sobre percepção visual e
estética, sabemos que a visão convoca sentidos como o tacto. A distinção entre “haptic”
e “optic” sugere, justamente, no campo da percepção visual, que as imagens, pinturas ou
fotografias, podem ser apreendidas em profundidade (a textura ou grão) e/ou pela leitura
das suas linhas e formas: ou seja, a visão raramente opera sem os restantes sentidos.
Partindo destas considerações, Beck lança a sugestão de que, tal como acontece na
visão, a sinestesia constituiria um dos aspectos da audição radiofónica (Beck pub.
electrónica: 14):

7
Para uma crítica desta forma de olhar para a especificidade da linguagem radiofónica ver Meditsch
1997.

8
“(…) ouvir pode também dividir-se em optic ( onde o sentido da visão é
transferido para o ouvido) e em haptic (onde o som é corporeamente e
sensualmente experienciado através do corpo, e do toque)...”

Os estudos sobre os mecanismos da percepção sonora mostram ainda que o ouvido é o


“sentido hiperestésico por excelência” (cf Meditsch 1999:253), isto é, “o organismo é
estimulado ininterruptamente pela vibração sonora e reage também ininterruptamente”;
por outro lado, comparando o sentido da audição com o da visão, constata-se que
percebemos o que vemos como exterior a nós, enquanto que a “audição (...) provoca
uma integração entre a percepção do ambiente e a autopercepção”. Os sons que o meu
corpo produz e emite fazem parte do cenário sonoro que me envolve. O som envolve-
nos. A visão distancia-nos. Já Simmel (1908/1981; ver também Fortuna 1999) observou
que podemos devolver (ou desviar) o olhar, enquanto que a audição, o ouvido, é egoísta,
só nos permite receber. Mas, ao mesmo tempo, “partilha de um mesmo ambiente sonoro
(pode) promover o sentimento particular de “colectividade”, mesmo quando a
consciência da sua unidade, assente em meios sonoros e auditivos, se revele bem mais
abstracta do que a conseguida em torno da comunicação oral e da fala”. (Fortuna
1999:106; cf. Simmel 1981:234).

Chego aqui, com estas observações de Simmel, a um ponto crucial e de viragem na


minha argumentação: a ideia segundo a qual a partilha de um ambiente sonoro, ou
paisagem sonora, pode “promover o sentimento particular de colectividade”. Para poder
avançar desenvolver esta linha argumentativa é necessário agora dirigir a nossa atenção
para o conceito de paisagem sonora.

A noção de paisagem sonora (soundscape) é correntemente usada nas discussões sobre


música e som em geral. A sua definição inclui tanto os sons naturais como os sons
criados pelos seres humanos e é geralmente atribuída a R. Murray Shafer. Este etno-
musicólogo canadiano define-a como “um qualquer campo de estudo acústico. Pode

9
tratar-se de uma composição musical, um programa de rádio ou um ambiente acústico”
(Schafer 1979:21). Segundo Carlos Fortuna, de entre as Ciências Sociais, aquela que
mais atenção tem dado às sonoridades (ou a que tem sido menos afectada pela surdez
epistemológica) tem sido justamente a Geografia.

Para este autor isto deve-se ao facto de haver uma “intimidade entre o som, o
movimento e o espaço” (Fortuna 1999:106). Orlando Ribeiro, por exemplo, faz
múltiplas referências aos ambientes sonoros característicos das cidades islâmicas. Um
geógrafo como Paul Rodaway utiliza o trabalho Murray Shafer para distinguir entre
campo sonoro e paisagem sonora:

“…O campo sonoro refere (-se) ao espaço acústico gerado a partir de uma
determinada fonte emissora que irradia e faz distender a sua sonoridade a uma
área ou território bem definidos. O centro deste campo sonoro é um
determinado agente emissor, humano ou material, que, à medida que o som que
produz se propaga e mistura com outros, tende a ver obscurecida e
indeterminada a sua origem. Por isso, a expressão acústica que constitui o
campo sonoro é sempre uma expressão híbrida e, de certo modo,
desterritorializada”.( Fortuna 1999:107)

Geralmente dentro de determinados limites físicos e geográficos existe não um mas sim
vários campos sonoros que se sobrepõem; o resultado desta sobreposição constitui uma
paisagem sonora, isto é,

“ (...) um ambiente sonoro multifacetado que envolve os diferentes sujeitos-


receptores. A paisagem sonora é, assim, fundamentalmente antropocêntrica já
que, ao contrário do que sucede com o campo sonoro, não é um agente emissor
indiferenciado – humano ou material – mas o sujeito humano concreto que, na
sua qualidade de receptor, constitui o seu centro. Dito de outra maneira,
enquanto os campos sonoros fazem destacar a acção da produção/emissão de
sonoridades, as paisagens sonoras referem-se ao acto da sua
apropriação/recepção e parecem, assim, capazes de reterritorializar e tornar
específica a acústica indiferenciada do campo sonoro” (Fortuna 1999:107).

1
Nas cidades as paisagens sonoras estão próximas do que se considera ruído; Schafer
designava esta amálgama de fontes sonoras cacofónicas “bruma sonora”. Fortuna
propõe a distinção entre paisagens sonoras de tipo “low-Fi”, caso das cidades, e as de
tipo “hi-fi” – “as sonoridades ou as musicalidades próprias dos ambientes naturais, dos
espaços rurais ou das pequenas comunidades urbanas” (Fortuna 1999: 109).

Como sugere Fortuna, a decifração de uma paisagem sonora traduz sempre um acto de
atribuição de sentido. Pode assim falar-se em relação às sonoridades de significado
denotativo (relativo à singularidade da fonte que o emite) e conotativo (relativo à
combinação com outros sons).

“Este relativismo sonoro está profundamente ligado à nossa experiência social


e biográfica: pode revelar uma memória e um passado e, deste modo, uma
identidade vivida, como pode, igualmente, enunciar um estado de
estranhamento e desconforto perante sonoridades desconhecidas”
(idem:ibidem)

Por outras palavras: as sonoridades ou as paisagens sonoras que nos envolvem podem
articular-se e ligar-se a formas pessoais e grupais de construção da identidade. Uma
conhecida canção do cantor português Rui Veloso expressa bem esta ideia quando, a
dada altura, diz “não se pode amar alguém que não ouve a mesma canção”. Mas
permitam-me voltar a Shafer e às considerações que teceu sobre o facto de a rádio se ter
tornado, “paisagem sonora natural no mundo contemporâneo”.

Schafer escreve: A rádio tornou-se o primeiro muro sonoro, encerrando o indivíduo no


que lhe é familiar, excluindo o inimigo. Neste sentido assemelha-se ao jardim da Idade
Média que, rodeando o castelo, erguia os seus pássaros e as suas fontes contra o
ambiente hostil da floresta e das regiões selvagens. A rádio tornou-se o canto do pássaro
do mundo moderno, a paisagem sonora ‘natural’, rejeitando as forças hostis vindas do
exterior” (Schafer 1979:137). É necessário explicar que Schafer via com grande
preocupação a degradação das paisagens sonoras no mundo contemporâneo e
considerava que os modos de difusão e consumo da rádio no final dos anos 70 eram
parte desse processo. A audição indiscriminada, a difusão sonora em espaços públicos, a
potencial omnipresença da rádio na vida quotidiana levam mesmo Schafer a sugerir que,

1
num mundo onde “as fábricas mataram as canções”, a rádio estaria a tornar-se a
paisagem sonora ‘natural’ do quotidiano. (Schafer 1979). Até certo ponto é possível
compreender as preocupações do etnomusicólogo canadiano pela degradação da
qualidade das paisagens sonoras no mundo actual. Mas, por outro lado, a sua posição
algo nostálgica em relação aos bons velhos dias da rádio coarcta a possibilidade de
pensar as dimensões contemporâneas de consumo e apropriação quotidiana da rádio.
Definir a rádio exclusivamente como “muro sonoro (...) que encerra o indivíduo” limita
drasticamente a possibilidade de pensar uma variedade de modalidades de
(re)organização e (re)invenção das sociabilidades experienciadas pelos radiouvintes.
Pense-se, por exemplo, no jovem que no seu quarto sintoniza, em altos berros, a sua
estação de rádio favorita. Provavelmente o volume sonoro impede-o de ouvir o que se
passa no resto da casa e ocasionalmente provoca os protestos do resto da família e
vizinhos; poder-se-ia dizer que estamos perante um “muro sonoro”erguido pelo rapaz
ou rapariga contra os outros que vivem na mesma casa ou nas imediações. No entanto,
esta interpretação apenas dá conta de um dos aspectos da questão: a sonoridade da rádio
poderá exprimir a vontade de sentir-se separado dos que estão imediatamente próximos;
mas, por outro lado, essa sonoridade liga esse rapaz ou rapariga a outros jovens que
partilham das mesmas preferências radiofónicas e experiências auditivas.

Vou terminar dando dois exemplos de etnografias recentes onde a rádio é pensada como
forma de estabelecer sociabilidades e (re)construir identidades.

O primeiro exemplo provém de uma investigação sobre os significados sociais dos usos
da rádio em contexto doméstico levada a cabo pela antropóloga Jo Tacchi. Tacchi
(1998) analisou, através de entrevistas com habitantes de Manchester, as funções que o
som radiofónico pode desempenhar na vida quotidiana das pessoas partindo das
seguintes considerações:

“O meu ponto de partida é a ideia de que o som da rádio cria uma ‘paisagem
sonora’ com textura dentro de casa, no interior da qual as pessoas se deslocam
e vivem as sua vida quotidiana (...). O som da rádio pode ser usado como forma
de preencher o tempo e o espaço. Pode funcionar como um ponto de referência
de memórias e sentimentos, de outros lugares e épocas. Pode servir para ligar

1
alguém ao presente. Pode ajudar a estabelecer e manter identidades, e é
frequentemente usado como marcador temporal” (Tachi 1998:26)

O artigo de Tacchi mostra duas coisas: em primeiro lugar produz uma interpretação
antropológica da ideia do senso comum segundo a qual a rádio providencia companhia e
conforto no quotidiano doméstico de ouvintes individualizados. Ela apresenta, entre
outros, o caso de um homem de 29 anos, fiel ouvinte de uma emissora especializada na
difusão de sucessos musicais dos anos 60. Tacchi sugere que a preferência deste jovem
habitante de Bristol por esta “classic gold station” permite-lhe criar em sua casa um
ambiente sonora evocador de um passado e uma sociedade imaginadas – os anos 60 –
do qual ele ouvira falar através das histórias contadas pelos seus pais. Além disso, o
homem em questão associava essa época a uma forma de sociabilidade experienciada
em campos de férias durante o seu tempo de estudante. Através da rádio sentia-se assim
em contacto com essa realidade e tinha oportunidade de idealizar um passado que, dada
a sua idade, apenas tinha experienciado de forma mediatizada ou indirecta, através das
histórias dos pais e das recriações dessa época nos campos de férias. (cf. Tacchi
1998:32-34). Articulando este exemplo com um estudo na área da etnomusicologia
sobre a recriação de um estilo musical particular entre os Yoruba da Nigéria, a autora
realça a importância que as sonoridades podem desempenhar nos processos de
construção e reinvenção da identidade nas sociedades contemporâneas. Para os músicos
Yoruba que cultivam e recriam a música popular na Nigéria contemporânea, a
diversidade de estilos dá-lhes a oportunidade de situar-se a si próprios face à mudança
nos gostos musicais em contextos sociais urbanos marcados pela heterogeneidade
cultural (cf. Tacchi 1998:32-34). O reconhecimento e consolidação de um novo estilo
musical como a escolha de uma determinada estação de rádio articulam-se aqui, de
modo evidente, com políticas da identidade.

O segundo exemplo que gostaria de vos apresentar provém da minha investigação sobre
um programa radiofónico (emitido em regime de antena aberta) intitulado Bom Dia Tio
João (é emitido por uma rádio de Bragança – RBA – desde 1990 e pode ser escutado
numa vasta área da região norte interior de Portugal e Espanha (pode por exemplo ser
escutado aqui, em Alcañices). O programa em questão é transmitido diariamente em
horário matinal (6-8 da manhã de segunda a sexta-feira; 6-10 da manhã aos sábados) e

1
tem como público-alvo a população rural e idosa que habita nas aldeias da regiãoO meu
estudo de caso ilustra a tangível dimensão de proximidade que se pode estabelecer entre
emissores e receptores num quadro comunicacional, social e territorial concreto.
Através da démarche etnográfica procurei dar a perceber o processo através do qual a
imaterialidade das ondas hertzianas se materializa tanto no espaço privado como no
espaço público, criando novas formas de interacção social para um vasto auditório. Ao
contrário do que acontece com o estudo de Jo Tachi acima referido, estas emissões não
se limitam a providenciar companhia, criando no espaço doméstico onde são ouvidas
uma “textura sonora” e uma ilusão de participação, percebida enquanto pseudo-
interacção social. No caso estudei, a rádio cria, de modo efectivo, novas formas de
interacção social e contribui até para re-orientar as sociabilidades dos ouvintes. Na
verdade, o programa “Bom Dia Tio João” vai mais longe, do ponto de vista
comunicacional: cria uma densa rede de relações sociais que vai para além do que
acontece em antena e o sucesso do programa passa, em grande medida, pela forma
como, cíclica e regularmente, os ouvintes alternam entre formas de interacção
mediáticas à distância e formas de interacção social cara-a-cara no contexto dos
encontros e das festas organizadas pelos e para os ouvintes.

O programa “Bom Dia Tio João” constitui uma paisagem sonora. Trata-se de uma
paisagem sonora discursivamente produzida no contexto das emissões, através das
conversas que ouvintes e apresentador mantêm dia após dia, manhã após manhã. O
programa organiza-se em torno da ideia de “família” sendo a sua audiência designada
por “família do tio João”. Esta designação, usada tanto pelo apresentador do programa
como pelos ouvintes que diariamente participam através do telefone nas emissões,
constitui o principal tropo ou metáfora que organiza e confere coerência aos discursos
feitos em antena (durante as emissões) e fora dela (nas festas e encontros do
apresentador com a audiência). Escutado sobretudo pela envelhecida, católica e pouco
alfabetizada população rural de Trás-os-Montes e regiões vizinhas, o programa “Bom
dia tio João” providencia uma família virtual a pessoas que por diversas razões –
viuvez, migração para as cidades, emigração para o estrangeiro, desertificação das
aldeias – vive relativamente isolada. A rádio e o telefone constituem para esta
população recursos tecnológicos que permitem activar redes de sociabilidade e
providenciar novas formas de entretenimento e de encontro virtual (no ar) e real (nos
encontros e festas). A “família do tio João” constitui nesta medida um espaço onde é

1
possível reinventar, reafirmar e reconstruir a identidade num contexto marcado pela
pós-ruralidade e pela dispersão imposta pelos movimentos migratórios.

VII

“ (...) vozes vindas do nada controlando tudo por dentro, convoluções de uma
história que flutua no ar e nos entra nos ouvidos para que o drama seja
apreendido bem atrás dos olhos, nessa taça que é o crânio, uma taça
transformada num palco, um globo sem limites, contendo inteiras criaturas
como nós. Quão fundo vai a nossa audição! Pensem em tudo o que significa
compreender algo que simplesmente ouvimos. A qualidade divina de ter
ouvidos!”

Este excerto de um livro do escritor americano Philip Roth (1999: 326) condensa, de
forma eloquente, o que procurei argumentar aqui. Numa tradição que remonta a
McLuhan (1964/ 1996) e que tem entre os seus actuais representantes o teórico dos
media Paul Levinson (1998), os media são vistos como “extensões do homem”. A
sobrevivência e evolução de certas tecnologias e o desaparecimento de outras são assim
explicadas por razões de natureza antropocêntrica. Se compararmos o caso da
sobrevivência da rádio na paisagem mediática contemporânea com o declínio do cinema
mudo, percebemos a importância que a audição tem na hierarquia sensorial da nossa
cultura visual-centrada, bem como a sua enorme relevância nos padrões de comunicação
humanos: mal se tornou possível juntar som à imagem, o cinema mudo entrou em
rápido declínio e extinguiu-se. No entanto, algo diferente aconteceu com a chegada da
televisão. Porque razão não se tornou então a rádio totalmente obsoleta? Ao contrário
do cinema mudo que não sobreviveu ao sonoro, a rádio sobreviveu ao seu “sonoro” – a
televisão. É como se estivéssemos dispostos a tolerar um “meio cego” – a rádio – mas
não um “meio surdo” – o cinema mudo. Para Levinson, tal mostraria que os meios de
comunicação tendem a evoluir no sentido de se aproximarem dos padrões humanos de
comunicação: o sonoro aproximou mais o cinema daquilo que é a nossa experiência
sensorial do mundo. Ver sem ouvir é de certo modo “estranho às relações sensoriais
humanas”, enquanto que ouvir sem ver corresponde a uma experiência que nos é bem
familiar: podemos sempre cerrar os olhos, cai a noite e deixamos de ver, mas não de

1
ouvir. Não temos pálpebras nos ouvidos, por assim dizer: o som envolve-nos e, mais do
que isso, somos também parte do ambiente acústico que nos rodeia. Podemos ouvir
ruídos, sons ou vozes sem necessidade de ver quem os produz, e mesmo sem
necessidade de ver/ler o que está a ser dito.

Termino, pois, com algumas considerações muito breves:

Procurei ao longo desta comunicação explorar o conceito de paisagem sonora e ensaiar


a sua aplicação ao universo da radiodifusão sonora. Trata-se, como vimos, de um tópico
atravessado por questões de ordem epistemológica onde a audição é, ora subvalorizada,
ora sobrevalorizada.

Entender a rádio como paisagem sonora no mundo contemporâneo implica, por isso,
compreender que as formas de estruturação e organização da experiência sensorial
variam, tanto ao longo do tempo como de cultura para cultura. Deveríamos por isso
estar atentos à diversidade de paisagens sensoriais que compõem o nosso mundo.

Tanto uma antropologia dos sentidos (Gell 1975; 1995; Hibbits 1992; Seeger 1981;
Stoller 1989; Feld 1990) como uma etnografia crítica dos usos e apropriações das
tecnologias intelectuais destinadas ao ouvido (Bull 2000; Finnegan;2002; Glevarec
1996; Manuel 1993) parecem constituir-se enquanto importantes contributos para
pensar o lugar do ouvido no mundo contemporâneo.

BIBLIOGRAFIA REFERIDA

Álvares, Patrício 1954 Radiodifusão Nacional. Função da Rádio, Estética Radiofónica.


Um Critério, Lisboa: Imprensa Libânio da Silva.

Beck, Alan s.d.A “Is radio blind or invisible? A call for a wider debate on listening-in”,
http://interact.uoregon.edu/MediaLit/FC/readings/blind.html (acedido em 19.10.99).
__________s.d.B “Listening to radio plays: fictional soundscapes”, in
http://interact.uoregon.edu/MediaLit/FC/readings/listentoradio.html (acedido em
19.10.99).
__________2002 The Dead of Radio? An Essay in Radio-Philosophy for the Digital
Age, Sound Journal.

Bull, Michael 2000 Sounding Out the City – Personal Stereos and the Management of
Everyday Life, Oxford & New York: Berg.

1
Checa, B. s.d. Los Cinco Sentidos y la Arte, Madrid: Ed. do Museu del Prado.

Classen, C., 1993 Worlds of Sense: exploring the senses in history and across cultures,
London: Routledge

Crisell, Andrew 1986/1995 Understanding Radio, London & New Y.ork: Routledge,
2ºed.

Feld, S., 1990 Sound and Sentiment: Birds, Weeping, Poetics, and Song' in Kaluli
Expression, Philadelphia: University of Pennsylvania Press.

Finnegan, Ruth 2002 Communicating – The Multiple Modes of Human Interconnection,


London & New York: Routledge.

Fortuna, Carlos 1999 “Paisagens Sonoras. Sonoridades e ambientes sociais urbanos” in


Idem 1999 Identidades, Percursos, Paisagens Culturais, Oeiras: Celta, pp. 103-117.

Gell, A. 1975 Metamorphosis of the Cassowaries. Umeda Society, Language and


Ritual, London: Athlone Press.
________1995 “The language of the Forest: Landscape and Phonological Iconism in
Umeda” in Hirsch, E. & M. O'Hanlon (eds.) The Anthropology of Landscape:
Perspectives on Place and Space, Oxford: Clarendon Press.

Glevarec, Hervé 1996 “Antenne et Hors-Antenne à France Culture. Introduction de


l’auditeur et formes d’engagement dans la parole”, in Reseaux, 77, pp. 163-187.

Goody, Jack; Watt, Ian [1963] “The Consequences of Literacy” in Goody, Jack (org.)
1968 Literacy in Traditional Societies, C.U.P

Goody, Jack [1977] 1988 A Domesticação do Pensamento Selvagem, Lisboa: Presença.

Havelock, Eric A. [1988] 1996 “ A rádio e a redescoberta da retórica” in A Musa


Aprende a Escrever. Reflexões sobre a oralidade e a literacia da Antiguidade ao
Presente, Lisboa: Gradiva, pp.45-49.

Hibbits, Bernard J. [1992] "Coming to our sensens", Emory Law Journal 4 (1992),
reprinted by permission of the Emory Law Journal (acedido na web).

Iturra, Raul 1988 "Cultura escrita, cultura oral: uma avaliação” in O Estudo da História,
nº2, 45-48
_________1990 Fugirás à escola para trabalhares a terra, Lisboa: Escher.
_________1991 Memória e Aprendizagem em Vila Ruiva, Lisboa: Escher.

Jackson, A.1968, 'Sound and ritual', Man 3 (2) 293-300.

Jones, Steven 1993 “A Sense of Space: Virtual Reality, Authenticity and the Aural” in
Critical Studies in Mass Communication, 10, pp. 238-252.

1
Levinson, Paul (1997) 1998 A Arma Suave. História Natural e Futuro da Revolução da
Informação, Lisboa: Bizâncio.

Lewis, P.M. 2000 “Private passion, public neglect – the cultural status of radio” in
International Journal of Cultural Studies, Vol. 3(2), pp. 160-167.

Manuel, Peter 1993 Cassete Culture: Popular Music and Technology in North India,
University of Chicago Press.

Mcluhan, Marshall [1964] 1996 “Rádio: O Tambor Tribal” in Os Meios de


Comunicação como Extensões do Homem, Cultrix: S. Paulo (6ª edição), pp. 334-345.

Meditsch, Eduardo 1999 A Rádio na Era da Informação. Teoria e técnica do novo


radiojornalismo, Coimbra: Minerva.
_________________1997 “A Nova Era do Rádio: o discurso do radiojornalismo
enquanto produto intelectual electrónico” (disponível na Biblioteca On Line de Ciências
da Comunicação).

Needham, R.1967 “Percursion and Transition” Man vol.3 (4), 606-614.

Ong, Walter 1982 Orality and Literacy: the technologizing of the word. London:
Routledge.

Parry, A. (ed.) 1971 The Making of Homeric Verse: he Collected Papers of Milman
Parry, Oxford: Oxford University Press.

Reis, Filipe 2006 Comunidades Radiofónicas. Um estudo Etnográfico sobre a rádio


local em Portugal, Dissertação de Doutoramento, Lisboa: ISCTE, (polic.)

Ribeiro, Fernando Curado 1962 Rádio. Produção- Realização-Estética, Lisboa: Arcádia

Rodrigues, Adriano V. 1986 "A rádio: medium do nosso tempo" in AA.VV 1986 60
anos de Rádio em Portugal: 1925-1985, Lisboa: Vega.

Roth, Phillip 1999 Casei com uma comunista Lisboa: Dom Quixote.

Schafer, M. (1977) 1979 Le Paysage Sonore. Toute l’histoire de notre environnement


sonore à travers les âges, J-C. Lattès (tradução do inglês de Sylvette Gleize).

Seeger, Anthony 1981 Nature and Society in Central Brazil: the uya indians of Mato
Grosso, Cambridge: Harvard University Press.

Simmel, George 1981 (1908) “Essai sur la sociologie des sens” in Idem Sociologie et
Épistémologie, P.U.F. (taduzido do alemão por L. Gasperini), pp. 223-238.

Stoller, Paul 1989 The Taste of Ethnographic Things, Philadelphia: University of


Pennsylvania Press.

1
Tacchi, J. 1998. Radio texture: between self and others. in D. Miller, (ed.). Material
Cultures: Why Some Things Matter. London: UCL Press, pp. 25-45.

Thorn, Richard 1996 “Hearing is Believing – the Evidence”, disponível em


http://www.ukc.ac.uk/sdfva/sound-journal/thorn981.html

Você também pode gostar