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FICHAMENTO DE LEITURA

AUTOR
Nereu Antonio de Costa Junior
Mestrado - Programa de Pós Graduação em Desenvolvimento Regional (PPGDR)
Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR)
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
VEIGA, J. E. O desenvolvimento agrícola: uma visão histórica. São Paulo: Hucitec,
1991. Capítulos 1 e 3.

BREVE RESUMO
A obra “o desenvolvimento agrícola: uma visão histórica” de José Eli da Veiga apresenta a
evolução história da atividade agrícola em países chamados desenvolvidos ou de
capitalismo avançado, apoiada no trabalho e na gestão da propriedade familiar a partir de
políticas agrícolas estatais, passando pela modernização da agricultura e as diferentes
formas de economia que subsidiam o trabalho no meio rural em diferentes épocas, em
especial durante os períodos de crise ocorridos entre as duas guerras mundiais, o período
de recuperação nestes países após a 2ª Guerra Mundial, assim como a replicação ou as
tentativas de replicação destas ações em países em desenvolvimento, como Japão,
Taiwan, Coréia do Sul, Egito e México após a 2ª Guerra Mundial.
SÍNTESE
A Parte I apresenta o nascimento da agricultura moderna, abordando a constituição
do agricultor familiar como ator social no desenvolvimento econômico dos países de
capitalismo avançado a partir da transição do feudalismo para o capitalismo comercial, na
grande depressão econômica e na Primeira Guerra Mundial.
Neste período, surgem as lutas de combate a políticas protecionistas e ao
liberalismo e a favor dos movimentos sindicais rurais e da reforma agrária em países como
a Inglaterra, culminando na perda do valor da terra, assentamento de famílias rurais em
pequenas propriedades, melhoria nas condições de vida dos agricultores e integração da
agricultura com o mercado; na Dinamarca, a revolução agrícola adota métodos baseados
na propriedade familiar de subsistência; na França, a Grande Depressão e a Terceira
República consagraram a agricultura familiar ao atingir a autossuficiência alimentar do
país.
A partir de 1929, a crise econômica afetou duramente a agricultura em diversos
países, como EUA, França, Inglaterra, Alemanha e Japão, gerando déficits no setor
agrícola e a adoção de medidas protecionistas e intervencionistas. Nos EUA houve a
saturação do mercado pela concentração de renda e queda dos preços agrícolas
impulsionados pelas colheitas abundantes, falência de propriedades, transformação de
proprietários de terras em arrendatários e êxodo rural. Mesmo com medidas paliativas no
governo Roosevelt, entre 1933 e 1937, a melhoria do setor agrícola só ocorreu realmente
após a Segunda Guerra Mundial, quando houve a expansão das exportações, retomada
de empregos e mecanização do setor; Na França, a crise de 1929 gerou a queda do
consumo, redução da renda da população urbana, aumento do desemprego e êxodo rural,
mas reagiu em 1936 com a subida da Frente Popular, retomada do crescimento
econômico com incentivo ao aumento do consumo e mobilização popular e medidas no
âmbito do crédito rural e na fixação do preço do trigo que auxiliou os agricultores a
retomares suas atividades; na Inglaterra, a crise de 1929 foi mais amena, ocorrendo a
queda nos salários reais dos ingleses, muito em razão da boa preparação no pré-guerra a
partir do estímulo à produção de trigo e artigos pecuários, compra e importação de outros
artigos; na Alemanha, Hitler entrega a pasta da Agricultura a Walter Darré, que pregava a
total proteção aos agricultores, considerados a fonte do abastecimento alimentar do povo
alemão; no Japão, a crise de 1929 afetou a terra, pois proprietários e arrendatários
recebiam valores diferenciados por um mesmo produto, o arroz, surgindo lutas que
originaram organizações de agricultores e de proteção aos arrendatários. O problema só
foi resolvido no Pós-Guerra, com a reforma agrária introduzida pela ocupação dos EUA.
A parte II apresenta a intensificação do poder dos países de capitalismo avançado,
que produziam 60% da produção industrial e eram responsáveis por 67% do comércio
mundial. Entre 1955 e 1965 houve a melhoria da produtividade da terra e a partir de 1970
houve a extensão da área plantada. Isso, aliado à ideia de valor do trabalho de acordo
com a produtividade alterou os padrões de consumo e definiu a circulação de mercadorias
na localização social e geográfica dos mercados. Em 1970 já havia uma nítida correlação
entre renda dos agricultores e exportação. Neste ano, entretanto, as crises ocasionadas
pela alta inflação e desemprego culminaram na diminuição das exportações, mas apesar
das restrições e dos embargos ao comércio agrícola, os agricultores continuavam
ganhando mais que o de costume, expandindo áreas de plantio e investindo em terras e
maquinários.
O cenário apresentado culminou, em 1980, no endividamento e falência de muitos
pequenos agricultores junto das instituições bancárias, beneficiando médios e grandes
proprietários por meio da incorporação de novas áreas, concentração de renda e
disseminação de informação e tecnologia, contribuindo com a expansão da produção,
aumento da oferta, queda dos preços agrícolas e aumento do valor da terra.
Após a 2ª Guerra Mundial, a agricultura familiar nos EUA mostra-se mais
competitiva para o mercado interna, gerando comida farta e barata com base na sub-
remuneração do trabalho e do capital, diferentemente do que ocorria com a agricultura
patronal, que garantiam seu lucro por meio da exploração de mão de obra barata, redução
da carga fiscal e especulação fundiária. Na Europa, a recuperação do setor agrícola no
pós-guerra foi rápida, motivada por políticas de sustentação de preços que gerava muito
excedente e pouca renda aos agricultores.
Na França, as políticas estruturais foram marcantes, como o Plano Monnet, que
orientava o país na adoção de salários e nível de vida baixo para os trabalhadores, o
Plano Marshall, que visou estimular a adaptação do país ao novo quadro internacional, e
uma Lei Complementar do General De Gaulle que combinada sustentação de preços e
estrutura seletiva amena, adequando a agricultura francesa às exigências do crescimento
econômico. Tais medidas transformaram a França no segundo maior produtor de
alimentos do mundo em 1974 e, assim como nos EUA, houve o endividamento dos
agricultores, culminando no declínio do preço da terra agrícola em 1980.
Na Inglaterra, a recuperação se deu pela secular manutenção da política de comida
barata sem prejudicar os agricultores, mudando o eixo produtivo da agricultura patronal
para a agricultura familiar. Este modelo foi revisto em 1980 a partir da necessidade de
mudanças de posicionamento dos países desenvolvidos tratadas em dois eventos, um no
Japão e outro no Uruguai, que previam a correção das políticas agrícolas e a redução dos
excedentes estruturais, que não chegaram a vingar.
No Leste Asiático, foram observados três países, Japão, Taiwan e Coréia do Sul,
que formavam a chamava Trilha do oeste, que se destacavam pela autossuficiência
alimentar, com regulação e queda dos preços reais, pela definição da agricultura familiar e
pelo desenvolvimento da atividade industrial.
No Japão, destaca-se o período entre abril de 1947 e dezembro de 1948, quando o
governo promove a reforma agrária e transforma 90% da área agrícola do país em
propriedades familiares, que tiveram seu valor congelado, medida que transferiu renda
fundiária aos agricultores. Em 1961, a promulgação da Lei Básica da Agricultura buscou a
paridade entre a renda dos agricultores e a dos demais setores, através de uma
racionalização do setor agropecuário.
Em Taiwan, houve a emancipação do país após a 2ª Guerra Mundial, que passou
por rápida industrialização, reforma agrária, ajuda financeira dos EUA e ações de
desenvolvimento rural da Comissão Chinesa-Americana.
Na Coréia do Sul, a guerra se estendeu até 1953 em razão do conflito com a Coréia
do Norte. A reforma agrária ocorreu a partir da transferência de terra e renda aos
agricultores arrendatários, à custa da expropriação dos agricultores fundiários. Houve a
reconversão do sistema produtivo para a produção de hortifrutigranjeiros e pecuária,
gerando abastecimento alimentar a baixos preços. Ações governamentais de
modernização tecnológica e estímulos às políticas de preços contribuíram para que no ano
de 1977 o país se tornasse o maior produtor de arroz do mundo.
No Egito, a reforma agrária não surtiu o mesmo efeito, pois o país não tinha crescido
economicamente até o século XIX e sua indústria foi destruída pela ocupação britânica em
1882. Entre 1900 e 1945 a exportação de algodão egípcio entra em decadência, reduzindo
o número de grandes propriedades e aumentando o contingente de famílias sem-terra. A
partir de 1950, os agricultores marginalizados passaram a lutar por melhorias e, em 1952,
após um Golpe de Estado, a prioridade do governo foi a reforma agrária, mas com
medidas extremamente moderadas se comparadas com as ocorridas no leste asiático.
No México, o governo Cárdenas, entre 1934 e 1940, adotou políticas reformistas e
utilizou a reforma agrária como meio de desenvolver a economia rural. Os três governos
sucessores viam a agricultura como auxílio à industrialização, priorizando as grandes
propriedades e as políticas de estímulo à industrialização em substituição às importações.
Em 1980 é criada uma nova política agroalimentar que criou condições para que os
camponeses se tornassem agricultores familiares economicamente viáveis.
A parte III mostra as dificuldades em analisar a relação agricultura e indústria a partir
de quatro pontos principais:
1-Industrialização da agricultura: De acordo com o pensamento crítico, a agricultura
não pode se tornar mais um ramo do setor industrial. Ideia defendida por economistas que
acreditavam que o capitalismo teria a capacidade de superar as questões naturais.
2- Melhor do que o termo industrialização da agricultura é utilizar a dupla tendência
criada por Goodman, com os termos apropriacionismo e substitucionismo. O primeiro é a
apropriação industrial de determinadas etapas do processo produtivo da agricultura; o
segundo é o momento em que os produtores agrícolas são substituídos por matérias-
primas não agrícolas e mais apropriados ao processamento industrial.
3- É necessária cautela ao pensamento de que a biotecnologia, microeletrônica e
robótica possam perfazer a Terceira Revolução Agrícola, pois nem toda tecnologia pode
substituir os processos biológicos de reprodução e crescimento de vegetais e animais.
4- Deixa-se de lado as economias de escala, pois se entende que os custos mais
baixos de produção não estão nas propriedades maiores.
Enfim, não foram os critérios socioeconômicos, mas sim, o movimento histórico que
criou a agricultura familiar nos países de capitalismo avançado no século XX, a partir da
mudança no comportamento de governos a partir de 1920 que passaram a colocar à
disposição da agricultura familiar todos os meios que ela necessita para o seu
desenvolvimento, como crédito abundante, insumos adquiridos na quantidade e formas
desejados, acesso a informações tecnológicas, compra e venda de terras e informações
sobre preços. Desta forma, o desenvolvimento da agricultura capitalista ocorreu por meio
do processo tecnológico que, juntamente com as políticas agrícolas, passaram a combater
instabilidades e incertezas, reduzir preços de alimentos ao consumidor e melhorar a
qualidade de vida dos agricultores. A intervenção estatal voltada à modernização ocorre
através de investimentos em pesquisa, extensão, infraestrutura e linhas de crédito, assim
como, de políticas comerciais de regulamentação de preços dos produtos, que apoiaram a
produção agrícola familiar e contribuíram com o desenvolvimento de uma agricultura de
base familiar. No Brasil, são necessárias ainda várias reformas com apoio estatal para a
definição da agricultura familiar.
CITAÇÕES Pág.
A agricultura moderna nasceu durante os séculos XVIII e XIX em diversas áreas da
Europa. 21
Um intenso processo de mudanças tecnológicas, sociais e econômicas, que hoje
chamamos de Revolução Agrícola, teve papel fundamental na decomposição do 21
feudalismo e no advento do capitalismo.
Na Inglaterra, a decomposição do feudalismo gerou uma famosa trindade: o
proprietário fundiário rentista, o arrendatário-patrão e o trabalhador agrícola
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assalariado

Desde os anos 1760 houve superpopulação relativa no meio rural. Massas de


camponeses eram cada vez mais privadas de seus antigos direitos comunais.
Paralelamente, as manufaturas e as primeiras indústrias foram suprimindo o
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suplemento de renda que, até ali, era obtido pelas atividades artesanais femininas.
Formou-se, assim, uma multidão de desocupados e precários, e a miséria passou a
ser o padrão de vida de grande parte das famílias de trabalhadores rurais.
Uma terrível recessão da indústria têxtil, que rebaixara as condições de vida dos
trabalhadores urbanos a níveis assustadores, criou as condições objetivas para que
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o movimento pelo livre comércio triunfasse.

A questão agraria teve enorme importância na agenda política do período situado


entre o final da Grande Depressão e a Primeira Guerra Mundial.
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Como na Inglaterra, no Leste Europeu também foi a vitória histórica da nobreza


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fundiária que caracterizou a transição para o capitalismo.
Os vinte anos de depressão geraram enorme descontentamento, o que acabou se
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traduzindo no plano político por uma forte pressão em favor do protecionismo.
O duplo movimento de crescimento das explorações de tamanho médio, e de 68
contínua redução da importância das grandes propriedades e micro
estabelecimentos, finalmente transformou em realidade social esse mito da
agricultura familiar tão frequentemente evocado e glorificado desde o início da
Terceira República.
Em janeiro de 1922, o secretário da Agricultura, Henry Wallace, convocou nova
conferência nacional. E foi nela que, pela primeira vez, surgiu a proposta de 74
paridade.
A ideia era simples: uma parte da colheita de cada produto seria vendida no
mercado interno de maneira a gerar um equilíbrio com a demanda, fazendo os
preços subirem até um nível de “paridade”, isto é, que estabilizasse os termos de
troca com os produtos industriais. A outra parte seria vendida no mercado 74
internacional a qualquer preço. As perdas seriam absorvidas e distribuídas
equitativamente entre todos os produtores de uma mesma mercadoria.
No Japão. Logo após a Revolução Meiji (1868), o novo governo decidiu romper com
os 220 anos de deliberado isolacionismo, absorver o progresso tecnológico europeu 75
e construir um Estado moderno.
A prosperidade dos anos de 1918-1928 se baseara numa expansão do setor de
bens de capital, através da criação de demanda efetiva decorrente da mobilização 80
da poupança dos mais ricos.
A falência de muitos agricultores americanos não foi suficiente para que se operasse
uma contração do aparelho produtivo. Muitos dos falidos continuaram trabalhando 82
como arrendatários, e outros foram substituídos por colegas menos favorecidos.
Na França, queda do consumo provocada pela crise de 1929 foi muito grave. 86
A Grã-Bretanha foi muito menos afetada pela crise de 1929 do que os outros países
europeus. 90
Para o nazismo, a segurança alimentar era tão importante quanto o desenvolvimento
da indústria bélica. O controle do comercio exterior deveria condicionar qualquer 92
importação de produtos agrícolas à compra de mercadorias alemãs.
A ambiguidade intrínseca à ideia de uma industrialização da agricultura tem sua raiz
no excessivo otimismo com que os grandes economistas avaliaram a capacidade do 177
capitalismo superar os chamados “limites naturais”.
As diferenças marcantes entre os efeitos provocados pela mecanização na indústria
e na agricultura têm consequências econômicas que ficam mais evidentes quanto 183
mais alto for o grau de intensificação da produção.
Em outras palavras, a viabilidade econômica de unidades produtivas de pequeno
porte na agricultura está muito mais ligada à possibilidade de adoção de inovações 187
tecnológicas, à localização e à qualidade do solo, do que à dimensão.
As políticas agrícolas passaram, então, a combater esse fator de instabilidade e
incerteza, procurando compatibilizar a necessidade de reduzir gradualmente os
preços alimentares ao consumidor com a necessidade de garantir um aceitável nível 195
de vida para os agricultores.
Se, para entrar no Primeiro Mundo, o Brasil for seguir seu exemplo, certamente
precisará de uma reforma agrária que desafogue os minifundistas, oferecendo-lhes a
oportunidade de se tornarem agricultores familiares viáveis; uma reforma agrária que
transforme arrendatários em proprietários; uma reforma agrária que ofereça terra 202
aos filhos dos pequenos proprietários; enfim, uma reforma agrária cuja diretriz
central seja o fomento e o apoio a nossa agricultura familiar.

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