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Rio de Onor

Comunitarismo Agro-pastoril
Autor: Jorge Dias

1º ano de licenciatura em Sociologia – 1º semestre

Antropologia Cultural

Ano Letivo: 2022/2023

Alunos: Maria Gonçalves Anastácio 51045; José Leonardo Vasquez Escobar


49285; Victoria Maldonado nº49534; David Gaspar nº50755
No livro "Rio de Onor", o autor, Jorge Dias, apela para a geografia como uma explicação, mas
sobretudo enquanto fator condicionante de isolamento preservador: "A explicação da
persistência, nesta região, de formas de exploração coletiva do solo e de organizações sociais
adequadas às exigências desse tipo de economia, deve encontrar-se na geografia. Com o
decorrer dos tempos, as terras férteis e abertas às influências estranhas foram passando por
sucessivas fases de evolução agrária e social, enquanto as mais pobres e fechadas ao convívio
mantiveram-se até os nossos dias aspetos económicos e sociais oriundos de um passado muito
remoto. Rio de Onor, pela sua especial situação geográfica deve ser o caso mais perfeito de
conservação de um tipo de economia e organização social que se manteve desde o início até os
nossos dias."
O conservantismo que a situação geográfica torna possível, diz respeito a um mundo de
influências várias que se amalgamaram para construir uma cultura local integrada numa região
de “confluências culturais as mais variadas” (p.64) e de uma “riqueza de complexos culturais
tão flagrante que os próprios habitantes das várias aldeias têm consciência disso e estão mesmo
convencidos de diferenças étnicas” (p.65). Contudo, embora ressalte que “a extensão do
fenómeno (organização comunitária) não implica, necessariamente, que tivesse havido unidade
cultural no passado, da qual os vestígios comunais, encontrados nas regiões serranas, seriam
prova irrefutável” (p.21), conclui que “é indiscutível que os traços comunitários são mais vivos
na região da Península onde houve maior influência céltica” (p.62), como é o caso de Rio de
Onor.
O Rio de Onor trata se de uma povoação de fronteira, situada entre Portugal e Espanha, e
também de uma estrutura social que tem vindo a ser preservada ao longo do tempo e, portanto, é
um elemento de conservantismo. Esta pequena aldeia conta com 348 habitantes e está localizada
num vale entre planaltos transmontanos do Nordeste, “região típica de povoamento
concentrado” (p.90), torna se cenário onde se mesclam, através de uma estrutura social
persistente e aproveitada, as influências bem sedimentadas de uma tradição multissecular e as
inovações técnicas de um mundo civilizado e “exterior”. O fato de ser cortada pela fronteira faz
com que a maioria dos seus habitantes sejam bilingues e até mesmo, trilingues (português,
castelhano e rionorês), distinguido se Rionor de Arriba, ou Rio de Onor de Espanha e Rionor de
Abajo, ou Rio de Onor de Portugal. Une os as mesma cultura e dialeto e as nacionalidades
diversas não são obstáculos aos intercasamentos.
Encarada como um todo, Rio de Onor apresenta uma série de facetas organizatórias pelas quais
é justamente esta espécie peculiar de “todo”. É através da família extensa e do conselho que a
comunidade se organiza em seus planos essenciais e se verifica a posse e administração dos
bens locais. Cada fogo (casa) representa um “vizinho” e cada vizinho tem a sua representação
no conselho (embora depois de 1914 se pronunciem certas tendências desorganizadoras neste
sentido e haja, no momento, famílias que não gozem dessa representação, sendo as mais pobres
da comunidade. “O Concelho (al conseio) rionorês é a organização de todos os participantes na
propriedade coletiva integral. Pode dizer se que até princípios do séc. XX, o concelho era a
organização social que permitia a todos os habitantes comunitários de Rios de Onor fazer face
aos múltiplos problemas da sua economia de povos ganadeiros e lavradores” (p.137). O
concelho é, portanto, decorrência da propriedade coletiva, embora não se limite á sua
administração: “A ação do concelho é importantíssima em toda a vida da comunidade, e não só
regula as atividades quotidianas e tradicionais, como resolve muitos casos acidentais e, por
vezes, inéditos … O concelho não intervém só nos trabalhos da propriedade coletiva. Inúmeros
trabalhos agrícolas da propriedade privada estão igualmente sujeitos á regulamentação do
concelho” (p.138).
Rio de Onor tem uma economia agro-pastoril relativamente recente (antes, era
predominantemente pastoril), quase de subsistência, com poucas relações de mercado, no qual
“além do gado, apenas o trigo lhe dá algum dinheiro” (p.164), realizando a maioria das suas
permutas internas in natura (pagamento de multas com vinho, dos segadores com castanhas
cozidas, de outros artigos com centeio).
A estrutura de interdependência que une os vizinhos entre si estende-se ao sobrenatural para
incorporá-lo na vida comunitária, expressando-se pelos mesmos padrões que presidem as
relações entre os homens.» Na medida em que se pode encarar a estrutura social também como
uma série de paradigmas éticos, como um sistema ideal nem sempre cumprido sem desvios, um
dos aspetos que confere ao local realmente o seu caráter de comunidade é o funcionamento de
sua justiça independente da justiça de Bragança, não apenas por uma formulação de penalidades
e multas sobre o comportamento desviante, mas pela firmeza com que são aplicadas, com a
prontidão e a eficiência dos que se movem por um consenso. "Os coutos não são propriamente
baldios do povo... Mas o sentido comunitário é tão forte que, apesar de se tratar de propriedade
privada perante a lei, funciona, na prática, como propriedade coletiva".

No estado vigente, as próprias atividades individuais, quando os produtos resultantes são de


interesse geral, são determinadas pelo conselho em vários pontos de sua sequência. Assim, por
exemplo, algumas fases do cultivo da uva e da castanha estão debaixo dessa norma e sobre elas
exerce o conselho ação fiscalizadora e protetora, cabendo aos homens de rodar as rondas
noturnas de controle de seu cumprimento. A família extensa e o conselho são, portanto, as
principais unidades organizatórias locais, canalizando quase todas as atividades comunitárias e a
lealdade de seus membros.
A personalidade do rionorês, os ritos de intensificação merece do autor análise minuciosa de
uma sequência de eventos que caracterizam a vida do morador local, resultando num
desenvolvimento humano característico ou numa biografia generalista detalhes ricos no
simbolismo do seu cerimonialismo e o cancioneiro. Fazendo referência à organização social,
todas as atividades do concelho e dos mordomos embora sujeitos à tradição, adaptam-se às
novas circunstâncias, mas dentro dos princípios estabelecidos pelo costume. Desta maneira o
sistema apesar de rígido apresenta grande maleabilidade e capacidade de improvisação quando
colocado perante novas situações. Na medida em que o estudo da comunidade por ser feito à
base das contínuas interações e reintegrações locais. O concelho continua a funcionar e procura
encontrar situações novas. Ora o presente volume regista um localismo ideológico e o retrato de
um estudo que não enfeixa os seus interesses dentro unicamente da comunidade que estuda, mas
estende às suas considerações à região e ao país. Que apresenta a Vila de Onor enquanto
empreendimento de poder e exploração imperial. A riqueza dos trabalhos sobre a vida rural
tradicional, e em particular sobre a cultura material, foi reconhecida. Os estudos sobre Vilarinho
da Furna e Rio de Onor, as primeiras e durante muito tempo as únicas monografias da sociedade
rural portuguesa, exerceram um forte atrativo sobre antropólogos e sociólogos do campesinato
depois de 1974. Rio de Onor é espaço regional que manifesta grandes homologias na
organização da paisagem, na economia, modos de vida e traços culturais que os acompanham,
no comportamento demográfico, nas formas de relacionamento com a cidade, enfim, na história
mais geral em que se insere e na própria periferia de um território raiano. São dois os planos
analíticos que aqui se cruzam correspondendo a dois ângulos de abordagem: a aldeia como
forma social que se constitui enquanto totalidade e a casa ou unidade económica, social e
simbólica que, no quadro de uma aldeia que detém e gere amplos recursos comunais, é a
unidade de conta na partilha dos direitos e deveres inerentes à sua fruição. Na apresentação da
aldeia no Capítulo 1 é ensaiado um primeiro nível de problematização da fronteira, que
interrogamos na sua presença no tempo e na qual encontramos um fator que ajuda a explicar a
permanência tardia da organização económica, social e política local e as diferenças que se
observam entre Rio de Onor e Rihonor de Castilla. Também aí tomamos contacto com as linhas
de estruturação do território ou termo da aldeia, propondo a leitura comparada dos
levantamentos cadastrais efetuados em 1900 e em 1975; assim como, o seu comportamento
demográfico. No plano da aldeia, os modelos da organização comunitária adquirem a sua
máxima visibilidade nos coletivos instituídos, máxima a instituição de cúpula que, como órgão
de poder, preside à gestão do património comunal e dos modos de acesso a ele. No Capítulo 2,
procedemos à identificação do conselho de vizinhos, a sua composição, ao seu grau de
representatividade em relação ao total das casas que constituem a aldeia, as variações desta ao
longo do tempo e a configuração das sessões como espaço social de intensa comunicação e de
apagamento formal dos conflitos. No Capítulo 3, são definidos os seus poderes e competências,
num âmbito de ação que tem nos coutos ou lameiros comunais o seu centro nevrálgico e
produtor de tensões. Mas é igualmente a perda dos seus poderes que neste capítulo nos leva à
análise do político numa pequena comunidade, que já havia sido introduzida no capítulo
anterior e sobre o qual concluiremos no Capítulo 4 depois de descrevermos as 38 sessões do
conselho a que assistimos no ano de 1976. Todavia, a visibilidade dos coletivos de que
referimos outros dois: as quadrilhas das debulhas e os moços solteiros, com a sua ilusória
unanimidade esconde quase sempre, não apenas a conflitualidade que atravessa a aldeia e que,
no presente trabalho é frequentemente focada, como também tende a obscurecer e a deixar
invisíveis outros princípios de organização e partilha que decidem sobre as condições de
reprodução das casas e da aldeia. No Capítulo 5. abordamos o princípio da rotatividade que,
pela sua recorrência, propriedades dinâmicas e modelo de funcionamento determina efeitos de
estruturação topológica, social e ideológica da aldeia. No Capítulo 6, os sorteios são analisados
pela forma como se referenciam à aldeia como um todo e reafirmam as partes que a constituem
os que têm direito à sorte e como nele se projeta uma conceptualização da equidade, difícil de
gerir e alcançar. No Capítulo 7, abordamos os leilões enquanto princípio de organização e modo
de constituição de um fundo comunal em terras, géneros e dinheiro, e a circulação destes bens a
montante e a jusante. Com eles diretamente nos deparamos com as diferenciações econômicas
entre os vizinhos da aldeia, vítimas de situações conjunturais mais ou menos duráveis (ou
mesmo estruturais) que as casas atravessam. É sobre estas, a identificação dos bens e direitos
que integram o seu património, a diversidade relativa que apresentam e as estratégias de
reprodução e fatores que para esta se manipulam e combinam, que incide no Capítulo 8. Para
Concluir através de uma leitura transversal de todo o trabalho com indicação das questões
muitas vezes implícitas enquadram e orientam a análise e a ordem de enunciação do presente
trabalho. Está presente sobre a aldeia como forma social onde se produzem modelos igualitários
e as casas se diferenciam; que se produz como unidade sobre tensões e contabilidades sociais
que trazem a fragmentação; e em que os processos temporais que participam da sua
historicidade também eles são produzidos, vividos e percebidos a partir de lógicas definidas
pelos dois espaços sociais que mutuamente se implicam a própria aldeia e as casas que os
vizinhos representam. Não através de um prisma pictórico, mas de uma série de conceções e
métodos que muito têm esclarecido a posição dessas unidades e particularmente no plano
espacial, temporal e cultural, recorrendo a análises de teor conceptual e métodos sincrônicos.

Bibliografia:
Jorge Dias (1953). Rio de Onor, comunitarismo agro-pastoril. Porto.

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