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ESTUDO DO IMPACTO DA DIMINUIÇÃO DO FLUXO DE VEÍCULOS NA

DISPERSÃO DE POLUENTES ATMOSFÉRICOS NA AVENIDA MÁRIO LEAL


FERREIRA EM SALVADOR-BA, DURANTE O PERÍODO INICIAL DA
PANDEMIA DE COVID-19.

Introdução

Ao longo dos anos o aumento do uso de combustíveis fósseis, seja para a geração de
energia elétrica ou para uso como combustível de veículos automotores, tem provocado
o aumento da quantidade de poluentes emitidos na atmosfera. Esses poluentes apresentam
potencial em afetar à saúde humana, de plantas e a integridade de estruturas (AHRENS e
HENSON, 2019; IEMA, 2014).

Ambientes com péssimas condições de qualidade do ar apresentam grande risco a saúde


humana, sendo os ambientes urbanos os que apresentam maiores índices de poluição
devido ao grande número de fontes móveis e estacionárias de emissão (GOUVEIA et al.,
2021).

O controle dos níveis de poluentes na atmosfera é de grande importância não só para


preservação da vida como para o controle de eventos que influenciam a economia local,
como os custos relacionados a cuidados médicos, diminuição da produtividade e
diminuição da qualidade de vida (GOUVEIA et al., 2021; SHEPHERD et al., 2016). Para
isso, é necessário monitorar a concentração de poluentes no ar, e através de políticas
públicas reduzir as emissões e implementar novas tecnologias nas fontes de emissão
(OLIVEIRA, 2018).

As fontes móveis veiculares são uma das principais fontes de poluição atmosférica nos
centros urbanos. O tráfico de veículos é responsável por cerca de 90% das emissões de
monóxido de carbono (CO), 80 a 90% das emissões de óxidos de nitrogênio (NOx), é
responsável também pela emissão de hidrocarbonetos e de uma quantidade significativa
de material particulado (MP) (HABERMANN; GOUVEIA, 2012; HABERMANN;
MEDEIROS; GOUVEIA, 2011). Os veículos grandes como ônibus e caminhão são
responsáveis pela maior parte da emissão de óxidos de nitrogênio e de enxofre, enquanto
os veículos leves são os principais responsáveis pela emissão de monóxido de carbono e
hidrocarbonetos (TEIXEIRA; FELTES; DE SANTANA, 2008).

O fluxo de veículos é uma variável que está ligada diretamente ao nível de atividade da
fonte móvel de emissão e, consequentemente, à quantidade de poluentes emitidos em uma
região (JACONDINO, 2005). Quanto maior o fluxo de veículos em uma avenida, por
exemplo, maior será a concentração de poluentes ao longo desta avenida. Em março de
2020, medidas de restrição estabelecidas em Salvador para conter o avanço da pandemia
de COVID-19, afetaram diretamente o fluxo de veículos em toda cidade.

Objetivo do trabalho

O presente trabalho tem como objetivo realizar o estudo da dispersão de poluentes


atmosféricos por intermédio da modelagem matemática e simulação na Avenida Mário
Leal Ferreira em Salvador - BA, considerando o fluxo de veículos nesta via antes e após
a implementação das medidas de restrição para conter o avanço da pandemia de COVID-
19. Uma vez que não há monitoramento das concentrações, os resultados obtidos
permitirão comparar com os resultados de trabalhos anteriores e com a legislação
vigente.

Metodologia utilizada

Visando avaliar o impacto da diminuição da frota circulante na av. Mário Leal Ferreira
na concentração de poluentes provenientes de fontes veiculares nesta via, as simulações
foram realizadas no softrawe AERMOD View, para os meses de abril de 2019, janeiro,
fevereiro e abril de 2020. De acordo com os dados de fluxo os meses de janeiro e fevereiro
de 2020 possuem uma frota circulante semelhante, dessa forma, os dados desses meses
serão inseridos em uma única simulação. Como o mês de março apresenta um perfil de
fluxo de veículos intermediário, uma vez que as restrições começaram na última semana
do mês, março não será avaliado no estudo.

A simulação na avenida foi realizada inserindo a frota total de cada período sem
diferenciação por categoria. Sabendo que os veículos automotores apresentam diferentes
fatores de emissão, foi utilizada uma média ponderada dos fatores de emissão para o
cálculo do fator de emissão (Fe) total da via para cada poluente. Os poluentes
considerados foram o monóxido de carbono (CO), material particulado (MP10) e os
óxidos de nitrogênio (NOx).

A obtenção do fator de emissão para cada categoria veicular é o primeiro passo para o
cálculo do fator de emissão de cada sentido da via. O fator de emissão depende do ano de
fabricação e do tipo de combustível que o veículo está consumindo. Os fatores foram
obtidos a partir da metodologia definida no Inventário nacional de Emissões Atmosféricas
por Veículos Automotores Rodoviários do Ministério do Meio Ambiente (2013). Os
veículos pequenos, por exemplo, são compostos por veículos a gasolina, a álcool, do tipo
flex, a diesel e gás natural de diferentes anos de fabricação. Um automóvel pequeno a
álcool de 2007 emite um determinado poluente com um fator diferente de um veículo flex
do mesmo ano ou a diesel de um ano diferente. Nos anos de 2020 e 2021 foi utilizado o
fator de emissão de 2019 uma vez que os dados utilizados foram fornecidos pela CETESB
até o ano de 2019.

Depois de obter os fatores de emissões, calculou-se a emissão de cada poluente para cada
sentido da via e em seguida calculou-se um único fator para todas as categorias somando
a contribuição de cada categoria veicular para cada poluente e dividindo pela frota total
da via. Como os meses de janeiro e fevereiro possuem perfil de frota semelhantes, os
dados desses meses foram inseridos em uma única simulação, assim, foi calculado um
fator médio para o período considerando a frota e o fator de emissão de cada mês.

Resultados obtidos ou esperados

DISPERSÃO DE MONÓXIDO DE CARBONO


A dispersão de monóxido de carbono (CO) foi avaliada a partir do perfil de concentração
obtido para a média de 8 horas nos meses de abril de 2019, janeiro, fevereiro e abril de
2020. A modelagem foi realizada com duas linhas tipo volume para cada sentido da via.

Figura 01: Pluma de dispersão de CO no mês de abril de 2019.

Figura 02: Pluma de dispersão de CO no mês de abril de 2020.

DISPERSÃO DE MATERIAL PARTICULADO MP10

A dispersão do material particulado (MP10) foi avaliada a partir da média de


concentração para 24 horas e 1 ano, nos meses de abril de 2019, janeiro, fevereiro e abril
de 2019. A modelagem foi realizada com duas linhas tipo volume para cada sentido da
via.

Figura 03: Pluma de dispersão de MP10 em 24h no mês de abril de 2019.

Figura 04: Pluma de dispersão de MP10 em 24h no mês de abril de 2020.

Análise dos resultados

DISPERSÃO DE MONÓXIDO DE CARBONO


Para o mês de abril de 2019 a simulação para 8 h apresentou valores de concentração
entre 143,25 e 14.313,16 𝜇𝑔/𝑚3 . A partir do mapa de dispersão, mostrado na figura 01,
é possível estimar as concentrações para cada receptor.

Em abril de 2020 o resultado da simulação para 8h, na figura 02, apresentou uma faixa
de concentração entre 82,45 e 8.209,11 𝜇𝑔/𝑚3.

Em abril de 2020 os valores de concentração de CO caíram consideravelmente devido ao


menor fluxo de veículos nesse período. Mas ainda é possível observar que existem alguns
trechos da avenida com concentrações mais elevadas. Essas regiões são regiões de vale
com altitudes mais baixas, cercada de construções o que dificulta a dispersão do CO.
Evidenciando que a altitude do terreno é um fator importante na dispersão das emissões,
por ser determinante na intensidade dos ventos, já que em altitudes mais baixas a
velocidade do vento é menor.

Tabela 01: Concentrações mínimas e máximas de CO em cada período do estudo.

Comparando os valores de concentração de CO nos períodos do estudo com os padrões


estabelecidos pela resolução CONAMA 491/18, é possível observar que em alguns
trechos da avenida Bonocô a concentração de CO ultrapassa o padrão de qualidade do ar
estabelecido pela legislação, exceto em abril de 2020 onde o fluxo de veículos caiu
consideravelmente em função das medidas de restrição no transporte público e em
atividades econômicas não essenciais para conter o avanço da pandemia de COVID-19,
levando a uma diminuição na concentração de CO emitido por veículos ao longo da
avenida .

DISPERSÃO DE MATERIAL PARTICULADO MP10

No mês de abril de 2019 a simulação para 24 h, na figura 03, apresentou valores de


concentração entre 2,11 e 165,02 𝜇𝑔/𝑚3. Já para o mês de abril de 2020 o resultado da
simulação para 24h, na figura 4, apresentou uma média de concentração entre 0,69 e 70,38
𝜇𝑔/𝑚3.

Tabela 02: Concentrações mínimas e máximas de MP10 em 24h para cada período do
estudo.
O padrão intermediário I (PI-1) é o utilizado pela legislação brasileira, enquanto que o
padrão final (PF) é o estabelecido pela OMS. É possível observar que em comparação
com o PI-1, alguns pontos a concentração de MP10 ultrapassa os valores estabelecidos
pela legislação, exceto no mês de abril de 2020 em que a concentração máxima para 24h
foi igual a 70,38 𝜇𝑔/𝑚3. Em comparação com o PF todos os meses, tanto para 24 h quanto
para 1 ano, apresentaram concentrações máximas que ultrapassam a legislação.

Conclusões/Recomendações

A partir dos dados da frota de veículos circulantes nos meses de abril de 2019, janeiro,
fevereiro e abril de 2020, obtidos através dos registros dos radares na avenida em estudo,
foi possível constatar que após a implementação das medidas de restrições de circulação
na cidade, em meados de março de 2020 para conter o avanço da pandemia de COVID-
19 o fluxo de veículos na av. Bonocô diminuiu consideravelmente.

Os mapas de dispersão indicam que a diminuição no fluxo de veículos na avenida em


abril de 2020 levou a diminuição das concentrações dos poluentes CO e MP10 em relação
ao mês de abril de 2019. Quando comparados com os padrões (PI e PF) estabelecidos pela
Resolução CONAMA 491/18 as estimativas de CO em abril de 2019 resultaram em
valores máximos de concentração acima dos valores dos padrões, devido ao elevado
número de veículos que circularam na avenida nesses meses. Apenas as estimativas do
mês de abril de 2020 ficaram dentro do limite estabelecido pela legislação.

O mesmo comportamento observado nas estimativas de CO foi observado para as


estimativas de MP10, onde os valores máximos de concentração em 24 horas
ultrapassaram os valores estabelecidos pela legislação e as estimativas de concentração
no mês de abril de 2020 ficaram dentro dos padrões.

Embora estudos desta natureza possuam incertezas associadas à obtenção de dados para
a simulação, como os dados meteorológicos, a estratificação da frota, e os fatores de
emissão para alguns anos, a modelagem matemática se mostrou uma ferramenta
importante para avaliação do tráfego nas vias. Os valores elevados de concentrações
encontrados neste estudo indicam a contribuição das fontes móveis veiculares sobre a
qualidade do ar. Estes resultados alertam para a necessidade de implantação de medidas
de gestão, como a rede de monitoramento da qualidade do ar e ações de incentivo ao uso
de meios de transportes com menor potencial de poluição como bicicletas, veículos
elétricos e transportes públicos como o metrô.

Referências bibliográficas

AHRENS, C. D. E; HENSON, R. Meteorology Today. An Introduction to Weather,


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