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Conselho Cientfico ‘Aon ite Gets Mos (sien Flo Pak -BRASI) ‘Aon Mari Rigo (Poni Unerie Cai Rn BRASIL) ‘sto Geil (ir Cae, LA Calin BUA) Jean Le Gand (Remes2Hae Bagn-FRANGA) in A Ros (fae de Pilg, Unie arc Aor ARGENTINA) ini Aber (Unie Esc do Ride ai BRASIL) Vera Lopes Besset Henrique Figueiredo Carneiro (organizadores) A SOBERANIA DA CLINICA NA PSICOPATOLOGIA DO COTIDIANO ric © ants 2009, Di pen ie “mean sovsan lntramondom be Gaal Andon orm Caan ‘nats, CATALOGAGADNAFONTE Asher dln ppl dao Lope Bee, Hee gan Cam gana)“ ne Garood 09 iSaNomessarseo Pci Paap cli 3. Pict LB Ve Lope IC ee Hei Fg Todos os dts eseadoe. A seproduio ao auorinds dan publao poe ‘ialguer mio, ej tl oa pari coi vio da Lei 9510198. Sumario Apesentagfo 7 CONTRIBUIGOES SOBRE A PSICOSE Sobre a fantasia no sujito psistco: de sua cana e648 sub f408 3 Jean-Claude Mateva, Michel Grolier, Gwénola Druel-Saimane A pragmitice do sntoma no tratamento possivel da psicoses Jesus Santiago ‘Sobre a apicapao do método psicanalitco no ‘ratamento das psicoses Gustavo Dessal 61 ‘Sintomas e supléncias: uma tentativa de problematizag 80... 101 Sidi Askofaré CORPO ESINTOMA, CConsideragbes sobre o sintoma, Hebe Tisio 0 corpo eo arrebatament0 Angélica Bastos 1135 Corpo esintoma na experiénciaanaitica ua Vera Lopes Besset, Brana P.M. Brito, Gabriella ¥. Dupim daSilva, Marina Vieira Espinoza ATUALIDADES EM PSICOPATOLOGIA ‘Aamnésia infantil em um caso de perversio. 169 Henrique Figueiredo Carneiro Pesicopatologia: a perspective freudiana... 83 Ika Franco Ferrari, Sérgio Laia 0 pai e seus enigmas, crimes Marta Gerez Ambertin Sobre o ato mutilatrio na transgenitalizagao masculina 29 Marcia Mello de Lima seutando o desejo de adota... 243 Edilene Preive de Queiroz Associago livre e metifora, . 267 Valeska Zanello, Francisco Martins Sobre 0$ A408 ssn vn 268 Apresentacao Esta publicagio congrega autores brasileiro ¢estrangeiro,psicanalis- ‘as engajados no ensino cna pesquisa da psicopatologia epsicanlise no seio de insituigdes universitiriase de pesquisa no Brasil eno exterior. Fruto da iiciativa do Grupo de Trabalho Psicopatologia e Psicanélise és ANPEPP (Associaglo Nacional de Pesquisa © Pés-Graduagio em Psicologia, tem como finalidade incrementare promover a divulga- lo da producto referente psicopatologia desenvolvida em ambiente scadémico a partir do referencial teérico-metodolégico da psicandlise. ‘Sendo assim, ¢ uma obra tecida no contexto dos lags de trabalho entre ‘0s membros desse grupo, profesores-pesquisadores inseridos em ins- tiuigdes de ensino de virios estados do pais. Ao mesmo tempo, reflete (98 intercimbios, consolidados ou em construglo, dos membros desse grupo com outros pesquisadores brasileros ¢estrangeiros. Esses pes- ‘quisadores, convidados pelos organizadores em fungi das reflexBes ¢ atividades que sustentam, relacionadas com a clinica psicanalitca, contrbuiram com artigos ou na funeo de consultores ad hoe: (Os textos inéditos agui reunidos petcorrem diversos temas que ceoncerem a problemiticas e impasses encontrados na pritica clinica a psicose, a perversio, a relagao do sujito com o corpo, osintoma, 8 dogo, a reproduglo ¢ a transexualidade Assim, esta coletinea prima pela abordagem da clinica psicanaiticae suas incidéncias na psicopa- tologia do cotiiano, Partcularmente, no que tange ao tema das psicoses,diversos auto- res partem de questdes colocadas pela clinica para diseutie conceitos © 'metodologias com base em principios teérieos determinados, tanto no «que concere ao tatamento quanto & problematizaglo de abordagens 7 torcas precisa. Ika Franco Fear e Sérgio Lia trazem, no texto Psicoptologia: aperspectiva reudiana, um eceseamento ds cont- bigs de Freud para o campo da pscopatologneefletem sobre suas incidéncias no diagnstio das afecpbespsiquicas, No artigo initulado A prognéiica do sintoma no tratamento posivel das psicoses, sus Santiago conse sua argumentagSo sobre um tratamentopossvel das Pscoses dentro da perspectva da psicanslise a partir do objeto voz Gustavo Dessalanalsa a distingo entre pscoseoriniriae picose extraordinra no texto Sobre a aplieaedo do método psicanalitieo no ‘raxamento das psicoses. Em Sintomase supléncas: wma tncatva de problematizagd, Sidi Askofaré tee uma reflex em toro da possbi- lidade da Fungo do sintoma como supléncia nas pcos. Jean-Claude Maleval, Miche! Grolier e Gwénola Druel-Salmane, no texto Sobre a famasia no sujet psicétco: de sua crénca e seus substinuos, om base em dados da clinica, penguntam-se do que o stjcito se vale con- tra a invasto de goza na esquizarena a pantie da nogo de “imagem indeléve, que viria no lugar da fantasia fundamental que no hi. A cxempl de autores consagrados, Angélica Bastosuilizn a refer ‘uma ob literria em sua contribuigo sobre o tema do corpo na psico- se,em O corpo €0arrehatamento.Aportes da linguistic consttuem, por our lado, atrial prvlegiado por Valeska Zanelloc Francisco “Marin, no artigo Asaciado ire e metdfra, para 0 aprofundamen- to de wma temética crucial para a metodologia da clinica picanalitca 10 tratamento dos sffimentos pguicos, ene eles os que afm 0 corpo. E também corpo que comparce em vrios texts cujs temas se ligam as vicisstads da clinica na atualidad e indicam a ampla alia da psicandisee sua inser no social. No texto Considerar es sobre osintoma,coneaponde sntma com trnstomo, Hebe Tizio enfoca as relagdes eno sintoma eo corpo entre osintomasubjetivo 0 sintoms social, Mrcia Mello de Lima abordao tema da transex lidade como sintoma social apart de fundamentosteéricos dados da clinica no stig Sobre o ato mutlatirio na ranegenitalizaao masc- lina. Sob ilo A annésa inant em un caso dé perversdo, Heni- ‘que Figueiredo Carneiro propbeelaboragbes inéitas sobre a perversto 4 partir de um caso clinico em que os temas do sexo e do amor tém lugar prevalente. As rlagSes enre o psiquismo e as patologi do cor- ‘po comparecem pela via das questbes sobre a infetifidade no texto de [ailene Frere de Queiroz, Escutando o desejo de adotar, que tea uma abordagem atval e dinimniea do tema da adogdo,Pelo vgs da reprod- fo assistidae suas incidéncias na subjetvidade, 6 ainda o corpo que entra em cena na discussdo desenvolvida por Marta Gerez Ambertin em O pai e seus enigmas, a propésito da Funea0 do pai e seus enig- ‘as. Enfocando alguns impasses da clinica na atulidade, Vera Besset «colaboradorestecem reflexes sobre o tratamento das vicissitudes do corpo com o recurso da fala, préprio proposta da clinica psicanalitia, no artigo Corpo e sintoma na experiéncia analtca Na onganizapto desta coletinea, destacamos a competente eines- vel colaborapio do Conselho Cientfico, eomposto por Ana Clee Guedes Moreira (UFPA), Ana Maria Rudge (PUC-Rio), Gustavo Gei- rola (Whittier College, L. A., California) Jean-Lue Gaspard (Rennes 2-Haute Bretagne), Lula A. Rossi (Fac. de Psicologia, Universidad de Buenos Aires) ¢ Sonia Alberti (UERI). Nossos agradecimentos ao corpo de consultores ad hoe formado por Ana Cleide Guedes Moreira (UFPA), Ana Maria Rudge (PUC-Rio), Edson Luiz André de Souza (UFRGS), Glacy Gonzales Gorski (UFPB), Jean-Luc Gaspard (Ren- nes 2-Haute Bretagne), Jinia de Vilhena (PUC-Rio), Jorge Degano (Univ. Nac. de Rosério- Argentina), Leonardo Danziato (UNIFOR), Luiz Augusto Monerat Celes (UnB), Marcelo Veras (UFBA), Marta Rezende Cardoso (UFRJ), Meri de Souza (UFSC), Néstor Braunstein (UNAM-México), Sonia Alberti (UERJ) e Susane Vasconcelos Zanot- 1i (UFAL), que, respeitando as regras da avaliaglo cega e a8 normas ‘desta publicaso, conribuiram para a qualidade da obra que trazemos 4 piblico, Agradecemos, nesta ocasito, aos que traduziram ¢ rvisa- ‘am os textos em lingua estrangeira: Alain Besset, Andréa Figueiredo, Angélica Bastos, Ilka Franco Ferrari, Marcelo Veras ¢ Thiago Costa Matos. E, muito especialmente, a Gabriella V, Dupim da Silva e Mari- 1a Vieira Espinoza, pela partcipagdo como assstents de edigto desta publicasdo, Aos membros do GT, Ana Maria Rudge, Angélica Bastos, Eailene Freire de Queiroz, Francisco Martins, Glaey Gonzales Gors- i, Ika Franco Ferrari e Susane Vasconcelos Zanotti, pela colabora- ‘lo decid, Constituido em 2000, 0 GT Psicoparologia e Psicandlise reiine-sesistematicamente desde entfo, notadamente nos Simpésios de Pesquisa e Intercimbio promovides pela ANPEPP a cada dois anos. ‘Seus membros so pesquisadorese professores de universidades brasi- Jeiras, na graduago ena pés-praduacto, comprometidas com questbes cruciis para a formagdo de profissionis na drea da clinica na psico- logia. Ancorados na experiéncia do ensino, da pesquisa eda extensio «em dados da experncia clinica, desenvolvem um debate continua- do que 6 alvo de divulgasio em congressos cintificos da drea e em publicapdes especalizadas Alguns temas de trabalho contemplados 20 Tango dos ilkimos anos so otratamento da angstia o uso do psicofér- ‘maco na abordagem do psicopatol6gico, as perspectivas © os desafios 4 ensino da pesquisa em psicopatologiae psicandlise eas contribui- .8es da psiconatologia e da psicanslise nas quesdes levantadas pela pritica de avaliagio, Este liveo tz a piblico o fruto de um trabalho inspiado pelo mais vivo da clinica, suas quest0es,solugdes, desafios, impasses © invengdes, Trata-e de textos elaborados dentro do melhor igor acadé- ‘ico, aguele que serve para fazer avangar a nossa reflendo,instigada pelo dia-a-dia da clinica, prvada ou institucional. Esperamos que esta ‘obra sea til aos pesquisadotes © profissionaisinteressados nas ques- ‘es colocadas pelo campo da psicopatologia &pritica clinica, Vera Lopes Be et e Henrique Figueiredo Carne Organizadores 10 CONTRIBUICOES SOBRE A PSICOSE Sobre a fantasia no sujeito psicdtico: de sua caréncia e seus substitutos' Jean-Claude Maleval ‘Michel Grolier Ginénola DruelSalmane Como concliar a tse da fala do fantasma no sujito psicétco com a ‘constatago da rqueza inventva de seus cendsiosimaginiros? Primei- ro, ressaltando que preciso distinguir estes dims da fantasia funds ‘mental, aquelaeujo matema Lacan produz, eserevendo $ <> a (Lacan, 1998e, p, 785). Fantasia fundamental que designa a const@ncia de wma coordenagioenite o sujeito do inconsciente eo abjeto do goze nega- tivizado pela castragSo, causa do desojo. E apreensivel, no neutiico, por intermédio de uma frase que permanece recalcada, somente obtida pela construpio no tratamento. Para que tal fantasia constitua © motor da realidade psiquica do sujito divide para que o dote de uma bissola que the permita se corientar na existncia, uma extraglo do objeto a mosira-se necessi- ria. Ora, a caréncia da fantasia fundamental & uma das consequéncias cessencias da foracusio do Nome do Pi Caracterizar sujeto psicético como um “sujeito do g070" por- que ele tem o objeto ano bolso (Lacan, si) indica uma falha no engu dramento da realidade e na manutensao do go70 & distincia. Na cin cn da esquizofrenia isso é sempre mais claramente dscemnivel. Nel, todo o simblico agarra-se ao real, como indica Lacan, de modo que © sujeito esquizofénico se encontra sem defesa contra a invasto do ‘Tilo ag "Dene cere st pci Des cae ran “rand apa Bn revi ar Ans Baers Vr ops Bose B ‘seu corpo por um ozo deslocalzado. A fungi de abturago do real, rGpria& fantasia fundamental, no opera nesse caso. Dever-se-ia con- ir, entio, que osujito psicdtico nlo disp da fantasia? Sobre isso, Lacan parece se orientar mais em direpio & busea de uma especificidade da fantasia nessa estrutua, posto que no se recusa a utilizar 0 temo “fantasia” tanto no texto “De uma questdo preliminar” (Lacan, 1998a, p. $66) quanto no seminério sobre as psicoses (Lacan, 1985, p. 76) a fim de caracterizar a intuig20 que se imp0e a Schreber & beira de sua psicose clinica. Observa-se, no centanto, uma certa reserva no recurso a esse conceito. Em outra passagem do texto sobre a questo preliminar, nlo fez mengio a cle 20 se refer a0 mesmo fendmeno, Na ocasito, sublinhando a predomindncia do imaginéro, indica implicitamente uma caréncia do simbélico 0 processo do delitio, esereve o autor: iniciou-se muito antes, no momento em que surgi seu primeiro sina ‘em Schreber, sob a aparéncia de uma desss ieiashipnopémpicas ‘que, em sua fagilidade, apresentan-nos uma espécie de tomograi? 4o eu, idea euja Fungo imaging énos sufcientementeindicada «em sua forma: como seria belo ser uma mulher na hors da copula. (Lacan, 1998, p. $50) Essa linas identificam a fantasia central de Schreber em uma iia que surge num estado de semissono nos incitam a buscar suas caracteristcas em uma construgdo “frgil", por falta de um suporte simbélico que opere um corte radiogrtico no eu (moi) do sueito. Essa “ima indicago faz evo a uma das fungBesatibuidas fantasia funda- ‘mental do neurdtico, a de constitu 6 “estajo™ do {Eu} primordialmen- te recaleado (Lacan, 1998b, p. 831). Lacan parece consideri-la como Aiscerivel no sujeito psicStico, porém frgil, imagindria, carente de 1” Rronogia an octet decal eigenen pvt rig ‘uma cae ies om wa eda pra 2 NIE Report tno peda port do exe Lat; oman ston ment, pr ps gu cent rig quem oh “ y consisténea, por ndo poder encontrar uma substincia em investmen- {0s de objeto. Por outro lado, a fantasia maior de Schreber apresenta a paticn- Taridade de ser entendida por ele como uma ideia desagradavel contra a qual se evolta. Ndo ocore © mesmo com o newr6tico, euja fantasia fundamental esti a servigo do principio de prazer. A intuigHo de Sch reber traz, de said, oindicio de uma desregulamentago do goz0 que abre para um além do prazere que situa o sujeito em posigdo de objeto submetido a um Outro gozador. Do surgimento desse goz0 invasvo, nto negatvizado, deduz-se uma falha da fungHo limitadora do fal, (Ora, ao mesmo tempo, 0 sujeito procure remedié-la pela “impossibil- dade de sero falo que falta mac", observava Lacan (19988, p. $72). Restava a Schreber “a solugdo de sera mulher que falta aos homens” dem, ibid) Inicaeio precisa, pois sublinha que um efeito de sign ficagdo nao coordenado ao fal, mas relacionado & sexuagdo, pode ter | am eft de paicaro para omit psistico. ‘Algumas caractristicas do substiuto da fantasia parccem se des- ‘acar: em primeiro lugar, a carénci da fungdo fica ea tentativa de remedié-la, mas também seu surgimento na conscignca,testemunho de uma fatha do recalque ede una predomingncia do imaginaio,e até ‘mesmo uma certaaptido para doar o sujito de um “estofo" consis- _tente. Quando falta a ancoragem em uma fantasia que fixa 0 sujito emt ‘um modo de gozo imutivel, o eu se vé faclmente inconsistente, post 60, simulado até mesmo disperso, com muita dficuldade para cobrir 0 vazio do sueito = LL "Neste estudo, nosso interesse no reside nas excrcéncias' dos substitutos da fantasia ern um deliro, tampouco na carécia radical da defen cont o real prio eaquizfrenia. Esssfendmenos slo es tivameate bem coahecides. Bm compensa, fungo da fantasia ma iversidade clinic da psicoseonindra ainda nfo fo objeto de muitas | investigages.Entretanto, sua abordagem consti ua questo ess ‘ial paraodignéstic estutuale para a condugdo do tatament ou; Sabe-se que 0s psicStieos ondinérios, cada vez mais numerosos ‘nos consultrios dos aalistas, se apresentam em geral sob uma aparén- cia que se confunde facilmente com a dos neurbticos. “Nada se parece ‘mais com uma sintomatologia neurética que uma sintomatologi pré- psictica” (Lacan, 1985, p. 216), jé observava Lacan em 1956 £ precisamente para ultrapassar uma clinica demasiadamentelimi- fada a sinfomatologia que se deve buscar um aprofundamento a dis- \ingo da caréncia da fantasia fundamental. Jacques-Alain Miller con- lula a Conversation d’Areachon, em 1997, com uma preocupasio da onhecemos 0 desejo como mesma ordem : “Ne neurose", observa, retonimva da falta a ser. Como € sso na psicose ?O que ‘mia da flea foraclusiva? A palavra de desejo convém para isso? Talvez melhor a de deserto, © deserto sera « metonimia da falta foraclusiva Em todos os casos, é dese desejar um termo distinto para indicar o que faz nossa pesquisa, saber encontrar pista eseguilae apurar os signos por vezesinfimos da foraclusto” (Miller, 1998, p. 186-187) Caréncia da fantasia fundamental e clinica do deserto Somos confnados com bast equi, atalmene, com esta clnca do desert, El se enconta,princplnent, em sits focnenebem adapdoe qe oo apeeta eu tsb p cético manifesto e se quixam,exsrcnlent, de uma isfinge do deasj, "Naa tio i gure lo al prs onde vou", expres, de tsa Noe estou na rnc, Noten nem personalidad nem Imdel, Sot anni. aie capaci deinvenglo Asta ost nada, a ease, ko una inna ec, pws teu itr de sol ‘No ae tna de um momento depresv passage, mas im de an isting tig prise do dey. O to demnou sun inflci, “Podia far em um quro dante horas, em fz naa, © tenon passvs No cole, enfant qo tina ro- 16 _gramade o suicidio, O saxofone salvou-o: um duplo, diz, permitindo fazer amor consigo mesmo, Originirio de um meio socioecondmico privilegiao, su escolaridade transcorre sem problemas, Quando ini- cio seu atendimento esta terminando os estudos de medicina, Explica muito bem como péde chegar até af sem muitasdificuldades: “posso ser um bom soldado, se esperam algo de mim, Se um professor me pede para fazer alguma coisa, isso me angustia, mas me tra da inéria ‘86 posso persstr em algume coisa se a iniciatva vier de uma outra Pessoa, somente se for uma obrigagio”. Relat que ajudou uma prima por ocasito de uma mudanga,constatando: “eu era um fiel executor das suas ondens e gostava muito disso, Procur, permanentemente, um referente”. 0 t&mino dos estudos deixa-o inquieto; nfo se sente em ccondigdes de assumir responsabilidades ligadas a0 exercicio de uma profssdo,“Tenho sempre a impressto de que, se fo me chamam, sou incapaz de fazer” Norber‘ no parece apresentar qualquer distirbio manifesto da ine sguagem, No entanto, sua enunciagdo se mostra lenta, de dificil fomu- lag. Ele experiment dffculdades na expressto de seus afetos: quan- 4o seria preciso fcar com raiva, nfo consegue; em tas circunstincas, “sente que fila alguma coisa na linguagem"”, Sua enunciagéo earece de fundamento, como mostra seu temor de deixar eseapar palavras gros- seizas,embora isso jamais aeontega. Além diss, seu pensamento Ihe parece deficient; “tenho um imbriglio de conceitos na cabega. Sow ‘obrigado a me agarrar em racocinis jé prontos. Dizr “Eu" me deixa perplexo”. Adivinha, de modo fugaz, que, para remediar isso, algumas pessoas recorrem d elaborasio de um deliio:“tenbo difiuldade para enunciar a ideia de que existe uma verdade absoluta, que me abraga- ria, ue me contr -Evoca um abandono® primordial no qual situa origem de suas \lifculdades: "Tudo iso tem origem no abandono de minha mae, que rou dois meses quando eu tinka duas semanas, ou duas semanas ‘quando tinha dois meses, no sei muito bem”. Nota-se @ contamina- v7 or. ‘40 metonimica dos signifcantes nessesujeito que teme, als, que “as palavras se confundam” em sua fala, “Minha mae me disse”, prosse- que ele, “que tinha que me deixar incitada por meu pai, que queria sair de frias sem mim, rao pela qual fui entregue & minha avi. Foi no ‘momento da espera, depois era tarde demsis, ela recuperou um abje- ‘o morto, Eu me constitui na solido, no isolamento”. Para expictar ‘© que melhor o caracteriza, utiliza virias vezes a formula: “Sou por ser reeitado"? Ela nos parece exemplar da especifcidade da relagao transferencal prdpria ao sujeito psicétco,frequentemente ameayado de cir na erotomania mortfcante, quando 0 sueito se reduz a0 objeto de gozo de um Outro intusiv. (Os investimentos de objetos so pobres, falta consistincia a ima gem especulat, de modo que Norbert & um sueitodesprovido de “esto- fo". “Sou um ser tansparente, Uma mascara compésita construida com fragmentos de imagens. Sou como uma esponja: tomo apenas a forma, a entonagio do outro. Ouvindo-me, penso que adoto as ento- nagdes do outro. Quando meus pais me perguntaram © que poderiam me oferece, disse uma Ferar, mas seo fizessem, sso revelaria minha ignominia, minha pequenez. Nio combinaria com 0 deseo de me p- 10", Ele explica, sem davida com pertinénea, que a pobreza de suas rodugées fantasmticas esti na origem da partida da sua namorad: “eno a impressto de que cla me deixou porque fall em forjar uma fibula que nos envolvesse, uma ideia que poderiamos ter acalentado juntos”. Acrescenta que “as garotas querem ser tratadas como objets, ‘querem que a gente decide por elas", © que constitu uma difculda- de fundamental para um sujeito que s6encontra seu motor no outro. Deposita uma esperanca, dia, em um encontro que podria dinami- ilo, Aliés, testa procurar na anélise algo da mesma ordem, quando confi tr feito dois anos de andlise “sem maiores efeitos”, anda que teaha parado “porque sente necessidade de um chamado do analist, ‘que do experimentava no tratamento precedents”. E indicapio a ser “_ Ievada a sro pare a diregdo do tatamento, que deye se orientar a par- TE None ee 8 tir de uma oposigao A tentagdo do “deixar caie” que esté no principio «a posiglo desse suit. Norbert no apresenta distirbios psiéticos evidentes, nem dis- trios neur6ticos bem consituidos. Muito o classifcariam, hae, na categoria “saco de gatos” dos “borderines”, na falta de uma abertura para uma clinica do desertofundamentada na caténcia da fantasia une damental, Propomos outros exemplos dessa cin ““O que me vem? Um grande vazio",responde, sob minh incita- «0, um sujeto com falta de associagbes desde as primeras entevis- tas, Acrescenta: “E precisamente a vacuidade do pensamento que me faz sofer.Estou muitas vezes no para qué? Ou no o que pensar? Nio ‘into quem eu sou. Tive que aprendé-lo pela psicologiae a psicand- lise, mas & um processo artificial, puramente mental” “Temo a apa tia", confia-me outro, “sou sem consistineia..NBo tenbo um motor. ‘Tenho apenas vagos descjos". Consegue precisar melhor: “Quando quero fazer algo”, constata, “devo busear minhas motivagdes, preciso me interrogarlongamente, nao creio que todo mundo seja assim. Pro- uro um apoio em mim, quando falta a forga do hibito Isso me toma supersticioso, na esperanga de encontrar sinaisexteriores para me dii- ir. Quando tenho uma obsessio, isso me tranquiliza pogue, de costu- me, sou mas flutwane,disperso, mais ou menos angustiado; enquanto ‘0s outros t&m um alvo, ou véros, sabem o que querem, eorrem ats Nao é 0 meu caso, Muitas vezs fag lists para organizar minba vida; sua vantagem & de nfo serem infinitas” [Arielle Hpresenta uma queixa semelhante ¢ tenta também reme- eal no fundamental com grandes esforgas de organizago. “Minha vida" firma el, “é feita de cenas descosturadas, Teno uma tgestio penosa do quotidiano que nio € sustentada por um objetivo Minhas anotages compulsivas refletem isso, tenho notas por toda a Parte, sou invacids, multiplico as nots, tenho muita difculdade em lassiticLas, no consigo pr ordem nelas, nem em minhas ideas, No entanto isso me ajuda a presevar © quotdiano, Redijo muitas grades horirias, que me permitem vislumbrar melhor o dia seguinte. Mas 0 19 teno fio condutor. Nio sei o que é uma meta, Sou incapaz de fazer ‘rojetos. Como nao sei, sou obrgada a confiar. Espero que meu marido se decida, depois eu me alinho, Geralment, regulo-me por esquems, mas 0 sentido me faz falta. Cultivo o nada. Estou agarrada 20 nada: ‘no ten opinido, no tenho saber, no fago nada. Adapo-me a todas as situagbes, 0s outros no se apercebem de nada, mas nao hai motor, isso no faz sentido. Tenho a impressio de que algo em mim empurra para a more. $6 aia gente encontra a calma... Nio tenho projeto, (Ou, entko, seria necessirio algo de excepcional, mas que vtia sozinho, para o qual eu no teria nada a fazer". Esse profundo transtomo no ‘ransparece de modo algum na vida coidiana de Arielle. Bem adapta- «dana vida familiar ou na profissBo que exerce na rea da sade, essa adaptaglo & sentida por cla como artificial “Tis casos ndo so “no to raros", como afrma, apropriadamen- {e, EP Deffieux jf no titulo do trabalho apresentado na conversagao de ‘Aeachon,no qual apesenta um sujeitocuja queixa essencial se asse~ melha dos tres analisandos precedentes. "Nao tem nenhuma vontade, <6 incapaz, est parado em sua vid, no tem desejo de nada no conse- ‘eve decidir nada, ole “gerencia as coisas do dia-e-dia’ etc. Regularmen- te, em seu discurso, comparece:‘Falta-me energia" (Delieux, 1998, 1.15). Um outro anaisando, que se queixa de “estar em um nevoeto”, atendido por H. Castanet,afrma de sada: "Nem sei o que esperar, é muito magante” (Castanet, 1998, p. 19). Desereve muito claramente a fatha da significago fica que todos esses sujeitos manifestam, seja pela dfieuldade em conectar os clementos de um pensamento disperso ‘© 08 momentos descosturados de uma existecia, seja pela impotén ‘em fazer uma escolha, Dia el: Eu me questono com alguma cosa. Nao sei mais com © qué. No ‘momento de fla, no tenho mais certeza de nada. No seo que se ‘passa comigo, Bu me forgo para dizer alguma coisa. Eu penso, vem ‘© contra, A eabegs fica ton. O que digo do tem base. Ento, por ‘que fla? [..] Mew pensameato & rejetado masmo antes de apare- «er. Quando fil, € aquela mela [..] Um tago meu: confuso [.] 2 [Nioentendo por que inssto em ficar vivo. No sa o que sou. No ‘me agaro nada, em lugar nenhum. Nao sei que me fiz vive, eta paixio de continuse vivo. Quem nos dirt. a verdade?(Castanet, 1998, p2) Acinica do desert, em conto direto com acaréncia da fantasia fundamental, nfo se enconta apenas nos consults ds aalisas Uma de sus formas extrema se encontareltada por Minkowski des- de 1927 qe tem a sensagio dese confontarcom um vzio subjeivo aerorzate, mass intresapatcalamente por ese doen. Des- creve sus observa com uma grande preciso porque la confirma © ue considera ester no principio da esqizfinia, a saber, a pera do contato vital com areaidade, Inigo qu no dixa deer uma cea rertngcia estrtural:aearncia d fnasia fundamental exprimese frequentemente por uma per do lan via © caso, em si mesmo, é banal, sfima Minkowski, embora 20 sujet em questo nada mais reste do que una vide poten em ‘uma instituigdo especializada, Trata-se delum jovem engenheirs sai- do da Escola Central que perdu o emprego por ers nos célslos © desenhs.“Apdsalgumas vis tentatva do mesmo tip, lata Min- owaki (1927, *coloca-se como simples ‘escriba’ numa companhia de spurs. Mas, itmbém, resutade€o mesmo: engans-sefzen- oa fturas que est encaregado de estbelecer. Vota, eno, pra cas dos pas. Ema depradasio pid eprofinds (.») Fo inter de sade. La, nis 0 abservamos durante virios, mses, No detetamos nee nem alcinagdes, nem ies diate, sem, apesar de exames eterado,o inimo snl de uma atividade interior. E um quadro aterrorizante de um desinteresse completo, Pas- $2 todo o tempo em seu quarto, sent em uma cada ou andando para ie parac Noe ineressa por ms ada, no pga um jor, no exprime nenhum deseo, no dirgeespontaneamente a palavzaa ningoém" (9.156) ‘nado em uma ca Te hap Pr: aye, 12 a "Gostarfamos muito de encontrar nele nem que fosse uma peque- comenta Minkowski, “mesmo sob um aspecto das Em vio, Nao percebemos nenfum ofss naquele desert, nada a que ‘os agarrar, para colocar nossa alma, um pouguinho que Toss, 0 iapasio da sua, Vemos apenas 0 vazio dante de ns. Ele no fax nada, absolamente nada, e realmente acabo por acreditar que tam- ‘bém no pensaem nada, Sua attude, no entanto, continua a er core- fa, seu trae & cuidado, no encontramos nele nem negativsmo, em hostlidade em relago 20 ambiente. De modo que a supervisor, que © vA mesa de efeigdes, chegn a dizer dele: ‘Nuo diz nada eno se rmexe, mas é bonzinbo". Quando se fala com ele, responde. Suas sssociages si curtas, mas no se pode dizer que seu pensamento sejadisociado.Também ndo encontramos neahuma bzarice de lis- _suager em suas declarapes. Sua frases slo correla. Suasrespostas ‘ho petinentes. Quando insists, tent justifiar sua attude: acha ‘que € preferivel nfo empreender mais nada, posto que as tenativas feitas no passado se mostraram infutifera. A demonstraco esti fi- ‘a, de maneira defintiva. Consequentemente,preoeupa-se menos do que antes com seu futuro. Aiton, pouc pou, de tad. Ndo se pode também se ocupar dele Indefnidamente, sem gue iso sirva para alguma cols’? Qualque en- tava nova 8 pode estar destinada uo fracas. O pasado esl para provilo, No se deve insist: J4 que os paies o despedirum,tnham certamente boas res para faz-o.Hé, de resto, muitos camaradas © trabathadores que, obrigados a tabalar ote hors por di, muitas vezes ‘sb a cha, invejriam sua sorte. E se a6 no vive como ele, inativo, ‘40 lado ds lari? (Minkowski, 1927p. 169-171) le nlo vé assim toda a miséria de sua vida”, constata Min- kowski ‘Seu élan vital est rompid e esse disirbio ver se refleti filmen- te em seu pensamento. Ligico em seus silogismos, ele sb persegue 2 r uma meta: servi-se do passado pare nega futuro. No tem mais nenhuma perspectiva no tempo, neshuma prospec para o futur, ‘Constréi unicamente a partir das expergncas lastiméves do passa- do, exquece que seu a¥6 tem oifenta anos eel vinte eta e ue seus lar suicidio, que tinha por objetivo restabelecer a ordem do mundo incitando as forgas armadas a recolocar o imperador no lugar que Ihe era devido. LL lise formal dessas imagens indica como principal pon” Uma {fo comum 0 fato de que todas elas piem em primeir plano alguma coisa do compo que de costume permanece escondida: a nudez, 0 cad- ver ou o sexo. O corpo encontr-se i numa potigio pouco vantajosa dois cadiveres que acabam de ser executados, uma mulher paraplégica maltratada, uma erianga que urna. Quanto Aquele que toca © sexo do ‘primo num bank, ele teme chocaro psicdlogo fazendo-the essa con- fidéncia, personagem central da cena ou o prépro sujeito ou uma imagem & qual ele se identifica, Ven, quer sera crianga que ela viu trina; a Senhorita B, sent-se maltratada como a sua avé quando um hhomem a toca; Mishima dé su vid pelo Imperador, a exemplo de Sto Sebastio, qu sacifica a sua por Cristo; Sehaefer fi parar nas miios «a Justga,condenado & pena suprema, como Catle Kate, ¢ além do mais conta que, quando desejava uma mulher e queria mati-a,rouba- va suas roupas, vestia-se com elas e enforcava-se ele mesmo no lugar dela (Schaefer, 1992, p. 110), Scja a imagem agradivel ou penosa, sua conotagao sexual ésubli- ‘hada por todos os suetos; todos encontram nela o enquadramento de seu gozo. Ele confere, também, um certo estfo a0 eu: Ven. a procurt numa imagem masculina, a Senhorita B. percebe-se como vitima de lum homem, Mishima afirma-se como um esteta néerofilo, J comporta- se como um inocent atraido pela homossexualidade e Schaefer encar- ha um carrasco jusiceiro, Um indice discreto de que essas imagens ‘fo convocadas como supléncia a uma posi fica fala pode ser iscemido no fato de que elas tém dificuldade em mascararo ser de Aejeto do sujeto, Isso é manifesto para a Senorita B., que se apreende 2 ‘como 0 objeto maltratado de um Outro onipotente. Do mesmo modo, 8 identiicagdo imaginéria dominante de cada um dos quatro outros sujits leva em germe uma inclinagdo a exclusto socal, pela dificl- dade em assumie uma mudanea transexualista, por uma pritica homos- sexual acompanada de uma ignorineia claramenteingénua sobre sexo, enfim, pelo crime ou pelo martro, ‘ais imagens indeléveis distinguem-se claramente das lembran-_ sas-encobridors. Possvem uma importinciadecisiva para o sujeito porgue ele situa nelas 0 devir do seu mod de goz0. Ora, Freud subli- sha que um dos caracteresprincipais dale de “num conteido totalmente indiferente, prépro a sua fungo, que cconsste em efetuar “um recelque com substiuigdo de alguma coisa préxima’” As imagens indeléves, plenamente em conexo com 0 2020 o sujeito,colocam em primeir plano o que a lembranca-encobrido- ‘a fem por fungdo mascarar. “E precisamente”, esereve Freud, “o que ‘hd de grosseiramente sensual na fantasia que Faz com que ela no se

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