Você está na página 1de 156
A PRERISTORIA 92 _. edigao revista e aumentada GRAHAME CLARK da Universidade de Cambridge ZAHAR piblioteca de cultura histdrica | EDITORES A PRE-HISTORIA (nova edigio, aumentada) estima lo 4 siulemnente sho poe sas, to contri, € alg que, adequadamente com ag emg Pirinea num cnfoque mats vido, ela perspec. ee Ee ae Fel hte foc nen nie Se calbeelo pot Mae unas a ae Ei Cosemat soem. gives: otro. 9 a ids arte sais co cange't die eee er Deca aul 0) posan te Wane ol sok eae bs nm ate hel Peet a tee Se fam ire ue pants contort aie ee ee es Fe es oe eeraren ter te Eee regen ye tere ee ee eat hone cae a Bees a et renters a ee ee ects ecciaie y cee See 1 oan eee Pn aces ae ene fore Teaiim sree Yo suse ees epee een ee a Ley ts Gos erate epee re gnc weet, ete 7 Araitoge tan ddaadn Si eee! Pec ee ee ee Pues dn Scoge cuss" Tint, pte ee ee footesinctio 2 pean aa ere font ¢ tcrocial a aungutrpesoe ben ene ee ee ees ae pease eee ee eee Mette ndenig Sinuar ness Bote eee on nes eos flcrante schnn das aches Ste anc tae fence coring oe tole Senet ae tee ct rs See eee rennet oe Spee Bers ce tr sam pe cadherin gies ou Se (ee sivas oy oor eae, ee Theos com othe So yee cos engntadt Felis tm to tah eta cro ee lea eek ‘ha Universidade de Cambridge, tendo reeserito gus Miciumente es sega sacs Someta Selina a Soe tiene a rent AMUTIUD Aq ADTrOLLA! A PRE-HISTORIA BIBLIOTECA DE CULTURA HISTORICA scultura em marfim da cabera de uma mulher do aleoltico Superior, de Brassempouy, Franea ihe GRAHAME CLARK da Universidade de Cambridge A PREHISTORIA Tradugao de EpMonp Jorce Segunda eticéo, revista e aumentede ZAHAR EDITORES RIO DE JANEIRO Titulo original: WoHla Prehistory: 4 New Ouiline Traduzido da segunda edigso inglesa, publicada em 1969 pela ‘CAMBRDGE UNIVERSITY PuEss, de Londres Copyright © 1969 by Cambridge University Press capa de Bico 197s Direitos para a lingua portuguesa adquirides por s ZAHAR EDITORES Caixa Postal 207, ZC-00, Rio que se seservam a propricdsde deste versio Impress no Brasil INDICE Pretdew Introdugao. © Lugar do Homem na Naturexa AyENOLCKO do HoMEM: Os Primatas — Os Australopitecinos {8°0 enero tomo — Homo erectus — Hom sapiens — Homo sapiens sapiens — As races modemas 40. homem. MUDANCA -AMGIENTAL, Subdivisoes Jo. Period Glacial — A {uestio oe perledos pluvime — Mudaneas neostatieas « bio- {gicas oe Period Glacial — Clima Neotérmico Cocauores do Paledlitco Inferior & do Paleolitico Medio A Fabricago_ de instrumentos como eriféne de himanigade =A Wvblueso de trabalh em flex e aedra Bwoluio Fewea © propresso. coltral-Alguns_ elementos, o6sions tt eronomin pafeoitica Fala ntelinivel e consciéncia de st uswo — Fabricagio de instrumentes de corte (Estilo 1) “Incistrias de -machado de mio (Estilo 2) — Indistrias de: ndleos:¢:Tascas. preparados (Estilo-3). Culinras, dos Pateolitica Sunerior serais "A. primeiras cuituras do Pateotitice uperiér A sequeneia Frances’ Gravetiano Oriental ‘Atte Jo Paleslitce Superior — Bxpansio das culturas do Paleoltic. ‘Superior. ‘Sibgrla . Batremo Ooriente — Reins nescentes.africanos. Os Primérdios “da Agricultura no: Velho “Mundo ‘AL vonsequncias d> agriculturs — Caca especiatizade Pro (Gtipos silvesres-dor primero: cereais cullivados — Muilanca climatica, do Plistoctnd Rucente ao Neotérmice —_-Cagadoras- ppiscadorés do Mosolitico —- Os primeiras agricuifores do. Velho Mundo — Zagres — © Oriente Médio — Anatélia, u B 7 3s 8 Invoice A Conquista da Civiliapio no Sudoeste da Asia ALDEAMENTOS NEOLiTICOS NOS ALTIPLANOS: Curdistéo, Ind e Ture coménia — Anatélia, Siria ¢ Iraque Setentrional — Comu- nidades do Neolitico Recente. ‘crmnizacho URBANA NA sunciwa: Ubaid — Warka — Suméria protoletrada — Perfodo Dinistico Inferior — Acddios e ba- ilénicos. avmizacho Nos aLnLavos: Anatélia ¢ os hititas — © Orien- te Médio — Ir e Turcoménia, As Boses da Civilizagdo Européia: ¢, 6000 — 1500 a. Ambiente geogrifico — Os primelros agticultores da Grécia — Os Balcis © as rezides central e oriental da Europa — © Meditecrinco © a Europa ocidental — 0 Baitico oeldental = Uso do cobre na Europa central — Civilizagao mindica — Helidico Inferior — Comércio egeu — Difusto das clmaras morufris — Grupos do “Neulitco Secundsro” —~ Culturas ‘Acha de Guerra © da Cerimica Campaniforme — Capa dores-peseadores do Artico, Expansio - As Bases da Civilicapdo Européia: De Micenas & Idede da Origens: micénicas — Metalurgia do bronze na Europa central = Comércio micénico com sociedades bérbaras — Wessex « Stonehenge — Recessio no Mediterraneo oriental — Culturas das_Umss. Funerdrias na Europa central — Mineragio. de cobre no Tirol — Expansio das Culturas das Umnas Funerérins — Grécia ‘protogeométrica — Génese © difusio do uso do ferro — 0 allabeto. — Colénias gregas — A detrota dos persas pelos atenienses — Os etruscos — Os citas — A Idade do Ferro de Hallstatt — Ia Tene — Expansio do Império Romano — A Idade do Ferro germanica eo periodo de mi. ‘ragdo — Difusio do Cristianismo — A idade da exploracso, Africa... Cazadores mesoltces — Comeso da agricutura no Baixo Egito — Badarianoe do Ato. Exito "Eto PreDineay Ele — PreDintico Recente — Unifeato go ales aixo Eeito — Epto Dintsico ~ Comeso da ditusio. doo diusko de alimentos na" Africa —<‘Pesworsom ty Peo, Gneatal — ‘A difusio do trabsiho em foro =A Aichi “Rstéricae © mundo’ ltrado, Indéstrias. microlticas — Ageicultores calcoliticos em Brive quisto © Sind — A civilizagio de Harapa — Culturas cates. Uticas pésharapanas_nas bacias do Indo © do Ganges Comunidades ealcolfticas em Malwa e Declo — Cultures do 9 m1 nm 201 10 a 2 Inpice, machado de pedra polida — Difusio do uso do ferro — © Império Mauriano. China e 9 Extremo Oriente . ‘cuuna: Agricultores do Yangshao — Lungshan e a difusio a agricultura para_o Sul — Os Dinastas Shang (Yin) — Dinastia Chou (1027-222 aC) — Ch'in (222207 ac) — Han @07 a.C-20 AD). sumisrs sci, mova % a5 rmarois: Cultura Honbniana —"Indistriasmicrolitias — “Cultura das enxés quadrangu- Jares de pedra polida da Indochina, Tailindia © Malésia — Bromzes Dongson — Melanésia aavho: Aldcamento _pré-cerimico — Cagadores-pescadores Jomon — Agricultores Yayoi — Japio protohistérico, ‘Nonnesre DA ists: Casadores-pescadores. Australdsia e 0 Pacifico ... Motors ausmadtia: Rota de migragio para_a Austrilla — Tasmania- ‘nos — Migragdes australdides — Os primeiros habitantes da Austrilia — Periodo Mesolftico — Perioda Neolitco, ‘© Pactnico: Polinésia — Nova Zelindia, © Novo Mundo .. yaisist6RA: Os primeiros imigrantes — Cacadores de me- gafauna — Cultura do Deserto. da Grande Bacla — Cullura Areaica do Leste da América do Norte. ‘qunzAcKo sursuoR xo Novo MUNDO: Primérdios da produ- so. de alimentos — Ascensio da civlizagio.-meso-amerieana =, Teotihuacén — Maia — Pés-clissiea da Meso-América: Toltecas © Astecas — Civilizagdo primitiva no Pera — Os Incas. CULTURAS ManoRWNS: Culturas Pueblo ¢ de Cesteiros do Su- dosste norteamericano — Cultura. dos bosques — Cultura do Médio Mississipi — Comunidades de cacadores, pescado- es ¢ coletores — Cultura costeira. do Noroeste. — Culturas Denbigh ¢ Dorset do Artico — Culturas antigas do mar de Bering, Thule © esquimés recentes — Povos Yahgan, Ona fe Alacatuf da Terra do Foso. 238 258 IN MEMORIAM V. CORDON CHILDE O.G.S, CRAWFORD PREFACIO Ao sonco de quatro reimpression da eiigfo original dase Wore, 36 me foi possivel inserir pequenas mudangas e corregées. Ao preparar esta nova edigio, aproveite: a oportunidade para fezer uma revisio radical, Ievando em conta o progresso das publicasses sobre Arqueologia ¢ minhas oportunidades de viajar e refletir, desde 1961. Embora tenha conservado 0 mesmo plano bisico, resultado € um livro praticamente nove, com excegio dos dois capitulos referentes @ Europa, Escrevi nova Introducéo e eliminei o Retrospecto. Os Capiti- los 1 a 8 contém praticamente 0 mesmo material encontrado na edigao original, mas foram reescritos. Acrescentet um novo Ca- itulo 4 para levar em conta os progressos radicals em nossa com- Preensio da transigao da caca e coleta pare os aldeamentos agri- oles. O Capitulo 5, que contém grande parte do material antes abordado no Capitulo 4, foi reescrito em grande parte. Nesta edi- 0, 08 Capitulos 6 ¢ 7 ficaram praticamente inalterados. O Capi- tulo 8, que tratava da Pré-Histéria recente da Africa e da ascen- sio do Egito Dindstico, foi substancialmente revisto, reescrito e situado no livro mais adiante, para se harmonizar com a evidén- cia dada pelo Carbono-1s para a prioridade da agricultura no Sudeste europeu. O antigo Capitulo 8 foi substituido por dois ou tros (Capitulos 9 e 10), dedicados respectivamente & India e 00 Extremo Oriente. Os capitulos sobre a Austrélia e 0 Pacifico (11) ¢ 0 Novo Mundo (12) foram amplamente revistos e reelaborados, tendo sua soqiiéncia invertida para concordancia com as desco- bertas da cronologia aleancada pelo Carbono-14. Numa obra que abrange © mundo insine, a cronologia de sempenha um papel vital, e aproveitou-se plenamente 0 volume muito maior de determinagées feitas com 0 Carbono-th, disponi- veis desde « primeira edigéo deste livro. Em vista do uso que fiz dessas determinagées, torna-se necessério fazer algumas obseroagies, 12 Prericro A primeira é que niio se deve depositar muita confianga nas espe- cificagdes individuais: as fontes potenciais de erro devido a con- taminacio, coleta mal feite, lapsas de rotulagem e processamento defeituoso sao, por si s6, sugestivas 0 bastante para que se tenka ‘eautela; e 0 fator fortuito inerente na anélise do Carbono-L4 tem inferéneias que nem sempre sao adequadamente ponderadas. O que conta nio sto as datas individuais, mas o podréo resultante de varias delas, Por isso, listas de determinagées basicas so anexadas aos Capitulos 2 a 4, 6, ¢ 8 a 12. Cada determinagio é citada com (0 seu mimero de referencia de laboratdrio, a fim de que se possam procurar todos os detalhes na série de Radiocarbon Supplements:e outias» publicagéesi ‘Avsegundasobservigio:necesséria,é quey:até'qie'se fentha deter- sminadose, efeitoivdas-varingéesy na int tidovdis':Pernib comrexatidao\ suficientepara’ perinitire correeo defititiva das. datas'do: Curbont-14y serd melhor ‘eonsiderd-las mais eomoezelatiods; dovique: comdvabsolutas ‘ee ntimero:de- atids. Onde datas:do Carbono-1hsio.ditadasyelas"@ xo comio as'do Carbono-th € ndo como datas exatas em anos salares: Terédira;-e- subsiitente w esta; paroée importante citar todas es datas do: Carbonio-14.:em> terms ‘comuris. Citeitodas as ‘datas ‘ent termos'da Era Cristde obedect*&s reclamagies da’ Conferéncia de Cambridge €°%" préttea do” Carbono-14 "baseando-as ina “meta- stida de'5568"°% 80 anos Gostaria, uma ved micis;de' agradecer pelo interesse & euide> ‘dos demanstradas peta equipe da Cembridge University Press. Guarani Crane Porovhonee,: Cambridee 20 de dezembro de. 1967 INTRODUCAO are Joti on teapot ams dua 0° Proliotiie’ = ali ap pria’Histéria’ nao’ podia'mais ser equacionada com a experién- ‘cia das niagées ‘européias internamente ou além-mar, ou com seus predecessores’ imediatos. Como \téntaréi salientar neste livro, a civ Tizagéo ‘ocidental ¢omo a\conhecemos é ‘uma das muitas aventuras na ivide ‘iterdria-comunal,\\cada:uma das quais tem origem rela-~ tivamente tecentecnuma experiénicia pré-histériea, de imensa :anti- iguidade:’ Isso\de:‘naneira algumd\ diminui\@:tmportincia: da. cit Tiaagag cidental;.dntes\a réalea: Afinal:de contes, unia'des. glérias da:Europa' joi ter'desenvolvido os processos,industriais qué trazs- formaramovviodo-de widade todas as:civilizagies e\da:maioria ‘das:culturas; ‘assim -acelérando: asscomunicagées ‘de’ modova \fazer do ritinde binteirovuia entidades; Mais:»apropositadé ainda::tem sid6,a-contribuigdo veiropéia para'a estrutura cénocittal da Hina: nidadeAfilosofia especulativa,a: formulacio'de: leis tebricas qué gowername.so: Universo .e\que chamamos:-de. ciéncia” natural, :¢. 0 ‘conceita de histéria: pelo qual. ;homem, se\libertow das timitacdes\ do.tempo presente, todas. so :campos.aos-quais 3 outras civiliza-* Ges ¢, ‘na, aérdade; 0. préprio;:homem, printitiva ocontribuiram até certo ,ponta,.Néo, ebstante,, so, campos, nes,.quais,a eantribuicao ceuropéia, tem, sido, netdnel desde, a.époen, dos, are i Nos \iiltimoswanoso\mundoy atingiuna, maioridade, Néose trata apenasido fataide que, ailiderangaxna -éiénéia.\evenui-suas: aplicagies na itecnologia\:passbuia seritompartithadaxe, em: cinda,\pata,o Sub-borea ‘5500 — 3000 waa Atlantica forimo “7000 ~ 5500 MI Boreal Reeente {climitico ‘7700 = 7000 v Boreal Anterior 8300 = 7000 Vv Pré-boreal Glacial Recente ur Dryas Recente 1 Osellagio Allerod Te Dryas. Antigo 11509 = 10500 1b Oxcilacko Boling 115000 = 11500 la Dryas Remoto, CACADORES DO PALEOLATICO INFERIO} EB DO PALEOLITICO MEDIO A fabricacio de instrumentos como eritério de humanidade Ensoona a maioria 4 él maioria dos paleontélogos concorde que a adogdo da Postura ercia seja muito importante. para justifies a coteagss dos hominides dos grandes macacos, poucos sustentarso. ser nos. sivel dstinguir, em bases puramente aoolgias, ents esses om las que permaneceram pré-humanos e 0s que atingiram a com. igo humana. Para se qualificar como homem, o hominids ton por assim dizer, dose justifiear com obras: os exitérios deinam de ser menos biolégicos para so tornarem mais culturais, Nao obstante, é evidente que deve haver uma estreita, interrolasse centre a realizagio cultural © 03 dotes bioligicos. A adocio de uma postura exeta, que talves tenba sido uma reagso so desapa, recimento da floresta e & conseqiiente necessidade do atravecor © campo aberto, entre duas reas florestais, facilitou a aquisigao dda cultura. As mios, liberadas do trabalho de locomosdo: tora, ram-se disponiveis para a utlizagio de instrumentes e yor fire para a sua fabricagio, atividades essas que estimularamn o desem, volvimento do eézehro. Ao mesmo tempo, elas facilitaram tal desenvolvimento pelas modificagdes na arquitetura do erinio: » popel menos importante dos dentes para comer ¢ manipuler teve © feito de redusirthes 0 tamanho, o peso do mesilan sf das saliéncias da testa eos ligamentos musculares, Bor sue Jado, a posigéo sobre os dois pés tinha seus rice e; freak? Cagapones po Pateoririco Ineenion e Ménio 35 s6 sobreviveram os hominidas que fizeram uso inteligente de instrumentos ¢ armas. De fato, a capacidade de adquirir cultura teve, evidentemente, um valor adaptativo, no sentido de que ae variedades mais eapazes disso foram aquelas cujos gendtipos se propagaram com mais abundancia no decorrer da selegio natu- ral. Isso bem pode explicar por que © aumento do tamanho du cérebro, que permitiu progressos culturais cada vez maiores, desenvolvew-se tio rapidamente no decurso do Plistoceno, Mesmo 1 evolugio biolégica dos hominidas mais avancados foi, em grande parte, o resultado de aperfeigoamentos culturais. Sob muitos aspectos, o mais surpreendente deles, ¢ 0 mais, suscetivel de encontrar ‘reflexos no registro arqueoldgico, € a hpabilidade de produzir implementos. Aqui, a distingso entre a capacidade de usar instrumentos e a de fabrieé-los deve ser acen- tuada: pode ser verdade que uma tonha derivado da outra, mas é importante que, como inventor, 0 homem se distingue dos seus companheiros primates. Pelo uso de um instrumento entendemos 2 manipulagio ativa, por um organismo, de algum objeto tirado- dy meio externo, para a execugio de seus objetivos; assim, citando- exemplo do Dr. W. H. Thorpe, uma lontra marinka da Cali- fornia, que apanhe pedras do fundo do mar para quebrar molus- cos, est usando um acess6rio, ao contrario de uma gaivota que deixa o molusco eair sobre a pedra. A utilizagio de implementos zno sentido exato remonta a formas muito inferiores de vida, mas significa, em si, inteligéncia ou percepgio. Até mesmo os ‘grandes maeacos, embora xovolem certa destreza no uso de varas @ cordas ¢ no empilhamento de caixas, apresentam graves limita- (ges om seu comportamento. Por exemplo, eles evidenciam Poquena comproensio da estitica e, no manuseio de eaixas, con- iam quese que totalmente na improvisagio ceg2, @ no na per- cepedo. Suas atividades sio dirigidas apenas & conseeusio de obje- tives visiveis, 0 que é muito significative, de modo que, ao se tomar necessério qualquer tipo de preparative, como afinar a yyonta de uma vareta para encaixéla num buraco, o elemento de previsio ¢ planejamento é realmente muito superficial. Em com- paragio, a manufatura de utensilios © a construgio de estruturas, mnesmo entre as sociedades humanas mais primitivas, basciamse num conhecimento exato das matérias-primas e dentro dos limi tes da tecnologia predominante, na mancira mais eficiente de tratélas. Além do mais, 6 caracteristico dos seres humanos terem uma pereepeio do fator tempo muito maior do que 0s outros primatas; em suas tradigGes orais (¢, no devido curso, literdries) fles recorrem a Iembrangas do passado, que Ihes servem coma 36 A Pré-Hisréma fim espécio de patriminio cultura; ‘uturo, adquirem o impeto necessério para realizar operagses, Pla sara gam, ct lie Speen Frevisiveis. Mesmo assim, vale a pena refletir que a diferenca objetos naturais © artefatos mem sempre é claramente definide Todos os implementos feitos em condiedes primitivas foram fale: cados a partir de cbjetos naturais, e mesmo as formas encontra, das na natureza muitas veres tinham de ser quebradas ou um Pouco modificadas para que pudessem ser convenientemente est puladas. Portanto, temos que fazer uma distinggo arbitrisia, Quando nos perguntamos 0 grau de modificagio que os abjetos materiais tém de exibir antes que os aceitemos como artelatee feitos pelo homem, talvez a resposta witil seja a seguinte: * cles pertencem a uma classe ou a uma reuniio de objetos modi codes segundo um padrao aceito.” O estranho pedago de oso ou pedra, alterado ou melhorado para satisfazer a necessidade passa- geira, no precisa, em si, subentender humanidade. No momento em que podemos perecber a modelagem sistematica de materiais, de acordo com algum desenho axbitrério, é que nos confronta, mos com a obra de homens condicionados por um padrio cultu. ral, padrdo esse adquirido mais por se pertencer a uma sociedads do que a uma espécie bioldgica. E como isto talvez no seja tio simples como parece, seré conveniente refletirmos que, na’ hips. tese evolutiva, a fabricagdo de utensilios deve ter surgido do uso de formas naturais sem que houveste clara solugio de continui. dade. Embora os primeiros instrumentos padronizados talvez nio tenham sido fabricados de silex ou de outros tipos de pedra, 0 frtefatos feitos com esse material tém um interesse especial para © préhistoriador, principalmente devido A sua dureza e durabi- idade, Eles constitufam os elementos dominantes na tecnologia do homem primitivo no s6 porque eram extremamente eficazcs por direito proprio, como também tinhem importincia vital para a modelagem dos materiais mais macios usados para fabricar tua grande série de equipamentos. Ao mesmo tempo, cram quase sempre exsenciais e constituem o tinico elemento que restou das eras remotas. Uma das suas poucas desvantagens é que, em eertas condigées, podiam ser modelados tanto por forgas puramente naturals como por forgas humanas. O estudo critico demonstrou diversas vezes que alguns dos silex e pedras dos quais os primei- x08 préhistoriadores dependeram como provas dos primelres imple, ments fabricados eram, na reslidade, 0 produto de forgas muito ®, tomando consciéneia do que smpre Cagavones po Patroritico Inremion x Méoio 37 diferentes. Assim, a chamada atividade “cromeriana” 6 cousiderada obra da agéo das ondas nas costas de Norfolk, na Ingla- terra oriental; muitos dos “edlitos” do Sul da Inglaterra e da Tranga sio interpretados como o resultado de deslocamento do solo ot, alternativamente, de pressio © movimentos provocados pela solusio da formagio caledrla subjacente & camada portadora do pederneiza, ¢ agora parece que a indtstria Kafuana, de Zambia, foi obra das quedas d'égua ¢ corredeiras, em gargantas profundas © ingremes. Tso tem levado os préhistoriadores a dedicar espe- ial atengio ao material litico obtido dos locais eertos, onde vive- vam os primeiros hominidas, como 03 expostos no estrato I da garganta Olduvai, na Tanzinia. Quando fésseis do Ausiralopithecus boisei (originalmente co- nihecides eomo Zinjanihropus) foram encontrados nessa camada, alguns préhistoriadores supuseram, a prineipio, que essa forma de hominidas fosse responsivel pela fabrieagio. dos implementos dle podra com os quais estava associada. Contudo, mal os rema- neseentes de um hominida anatomicamente mais semelhante 20 homer foram descobertos na mesma camada, foi aventada a pétese de que o tipo mais avangado de hominida era responsivel, tanto pela modelagem dos implementos como pela morte do A. boi- sei e dos outros animais quo lhe serviam de alimento e estavam representados na camada. As conclusées sobre isso si0 complica das pela omissio dos paleontélogos estudioses do homem, em opinar se © novo hominida deveria ser considerado apenas como variante de A. africanus ou classificado como nova espécie de homem, o Homo habilis. Se, a bem do argumento, se admitir que, por motivos morfolégicos, os fésseis podiam ser atribuidos com igual plausibilidade espécie Australopithecus ou Homo — pos- sibilidade essa que nio é tio extraordindria se a evoluséo for mesmo veridica — 6 forcoso saber se a questio néo poderia ser decidida levando-se em conta os fatores de comportamento. A pré- tica de se fazer trabalhos de pedra, segundo padrées socialmente dotcrminados, poderia ser considerada como um indice do com- portamento de grande valor conclusive. O simples fato de que 0H. habilis era responsivel pelo fabrico de cortadores ¢ Iaseas da strato T em Olduvai talvez, segundo esse ponto de vista, tenha evidenciado que a denominagéo H. habilis € muito bem aplicada, ja que nio hé proves de que qualquer dos primatas inequivoca- mente classificados na espécie Australopithecus fabricasse imple- mentos de silex ou pedra, para finalidades utes e, portanto, reco- nheciveis, Os f6sseis de Australopitecinos si0 encontrados amiide em depésites onde néo ha quaisquer utensilios de pedra e, inver~ 38 A’ Pré-Hisrénia samente, quando esses ocorrem, ou acompanham tragos de pri- matas de aparéneia mais humana ou pertencem 20 Plistoceno ‘Médio, oeasizo em que eram abundantes. Se adotarmos o ponto de vista de que os fésseis de aparéneia mais humana recolhidos no estrato I em Olduvai devem, nio obstante, ser incluidos na -espécie Australopithecus, isso nfo altera muito 0 quadro. Signi- ficaria apenas que a fabricagio de implementos de pedra, segundo padrées titeis, surgiu num estédio da evolucéo hominidea imedia- tamente anterior ao aparecimento dos primeiros homens. Os primatélogos em geral aceitam que nfo 6 os Australopi- ‘tecinos © o homem, mas também os gibées, os macacos © os macacos grandes cram anatomicamente adaptados a certo nivel de atividade favoravel & fabricagio de implementos; na verdade, se tem observado essa atividede entre os primatas nfo-humanos no seu estado selvagem. Talvez os Australopitecinos modelassem sistematicamente objetos naturais de madeira ou de outros mate- Tiais organicos, para dar-Ihes padrées eonvencionais, mas nio ha provas de tal fato. O que existe & uma pronunciada sugestio de que o A. africanus utilizava ossos escolhidos de animais para ceertos fins. A anilise de ossos de animais recolhidos na caverna de Makapansgat, na Africa do Sul, perto dos fésseis desse primata, insinua que eles constituiam uma amostra que esta Jonge de ser fortuita. Ao contrario, ha sinais evidentes de eles terem sido sele- ‘cionados como uma preferéneia definida por formas que poderiam ser particularmente witeis como instrumentos ou armas. Ha muito tempo se afirmou que o homem de Pequim agia desse modo, embora, em tal ca30, houvesse uma produgio de trabalhos de pedra reconheciveis. Entretanto, é preciso salientar que no ha indicios de que 0 A. africanus fizesso mais do que quebrar os ‘ossos escolhidos para facilitar seu uso: nfo hé indicagdes de que les fossem modelados para dar-lhes padrées titeis © comuns. Aliés, hebilidade para a modelagem de utensilios de osso foi um desenvolvimento relativamente tardio na tecnologia pré-histérica. A evolugtio do trabalho em silex ¢ pedra Decididamente, o maior mimero de provas sobre a cultura do hhomem paleolitico abrange os artefatos de silex © pedra dos quais, ean anilis, dependia o seu! modo de vida. Esses © a teono- , da qual so produtos ¢ expresso, oferecem o tinico fio que percorre toda a primitive PréHistéria'do homem, Fellamente, forgas evolutivas foram tGo ativas na esfera da tecnologia «quanto sna da biologia. O simples fato de que a tecnologia estava interes- Caganonzs no Parzorizico Inventor & Mépio 39 sada em sustentar ¢ facilitar o processo de vida assegura que, ‘em tltima anilise, ola estava sujeita a0 mesmo tipo de selegio ‘que 0s organismos vivos; de modo geral, as téenicas que ofere- iam a forma de vida mais eficaz provavelmente substituiriam as ‘menos eficientes. A tendéncia era o desaparecimento da tecnolo- ia obsoleta, em favor de inovagies adquiridas pela gerag3o que i transmitia, Assim, o progresso era integrado ao sistema, Toda- via, como a Pré-Historia mostra, ele era muito lento, mesmo nas regides onde se eriava mais, pois era inevitavelmente eombatido pelas forgas conservadoras ctjo papel essencial consistia em asse- Zurar a transmiso da heranga cultural, a tinica eoisa que dis finguia os homens dos outros animais. Nao é de surpreender que fessos forcas foseem mais poderosas, onde a heranca social era xnais eseassa, e essa é a raztio de o progresso ter sido extremamente Jento durante as primeiras fases da Pré-Histéria. Entretanto, posivel observar um nitido avango durante a dade Paleolitics, a teenologia do, trabalho ‘em flex, e pers. 10 & de se esperar do produto de um processo evolutivo, os Se ee a ee © caso de uma forma de tecnologia ter cedido lugar a outra & medida que as possibilidades téenicas foram ampliadas pela ado- (¢40 de novos proeessos. O gran de superposigéo demonstra que fas mudangas das quais os préhistoriadores dependem para faze- rem a periodizagio eram, em. geral ocasionadas mais pela difusio de idéias do que como resultado de movimentos reais de povos. ‘Além disso, ¢ mais comum verse determinadas atividades com- binar técnicas de mais de um periodo de desenvolvimento, Entre 03 fatores que levavam as pessoas que viviam no mesmo plano temporal a manter ow a abandonar velhas formas, enquanto ado- tavam outras novas, figuravam, naturalmente, as variagées no am- hiento a que elas tinham de so adaptar. Antes de relacionar 0s rincipais estégios da teonologia litiea durante a Tdade da Pedra, € preciso salientar com certo vigor, que embora eles formassem uma seqiiéncia homotaxial no sentido de que, por mais incom- Jeta que fosse a sucessio, a ordem era sempre a mesma, s6 rara- eee pee yeaa No quadro que se vai ver adianto, a sucesso de tecnologias liti- ‘eas é equacionada de modo geral com as principais ¢ mais antigas fases da Idade da Pedra, tal como sio concebidas comumente na Europa © em partes contiguas da Africa e da Asia, Outro ponto que precisa ser realgado € que, embora esses métodos fosem homotaziais, eles no eram, de modo algum, uni- versais. Em primeiro lugar, os tervitérios ocupedos pelo homem 40 A Pré-Histénta primitivo tendiam a expandirse no decorrer da PréHistéria, & medida que as culturas adaptavam-se a uma série cada vez melon de ambientes. Em segundo, a competigio, que, em iiltima anilise, assegurava 0 progresso tecnolégico, $6 se aplicava a regives aces, sivels & difusio de novas idéias. Em territérios relativamente afas. tados daqueles em que as inovagées apareciam, as velhas formas de tecnologia podiam sobreviver pelo simples fato de néo serem recusadas. As indistrias de Estilo I, que dever ter sido praticadas durante um periodo de tempo imensamente longo, sio encontra. das_em todo 0 territério ocupado pelo homem primitive. As do Estilo 2, por outro lado, néo conseguiram aleancar o Sudeste Asia. tieo ou a China. re eee wee eens tO ee OO Teenologias liticas dominantes Divisies convenefonais das mais ‘antigas fase da Idade da Pedra Estilo 5: Componentes microliticas de artefatos heterogineos Mesolitico Estilo 4: Laminas para. perfurar ¢ bater, com retogues exagerados Paleolitico Superior Estilo 3: Tnstrumentos de lascas feitos de nécleo preparado Paleolitico Médio Estilo 2: Machados de mio lascades nas duas} faces Paleolitico Inferior Estilo 1: Tnstrumentos de corte feitos de laseas As invengées do Estilo 3 também nfo penetraram nessas. re- gides do Extremo Oriente mas, por outro Jado, estenderam-se para © Norte entrando na Rissia européia © no interior da Asia, Iss0 menos surpreendente porque, quando os primeiros homens al- eangaram a Austrélia, stravés da Indonésia, provavelmente car- segaram uma tradigéo litiea do Estilo 1 e quando se espalharam pela primeira vez pelas regides setentrionais da Europa e da Eurd- sia, levaram consigo as indistrias Iitieas dos Estilos 4 ou 5 que foram, sucessivamente, conduzidas para 0 Novo Mundo, Evolugao fisica © progresso cultural Visto que a fabricagio de ferramentas faria exigéncias excep- cionais & correlagio exata de mios, olhos ¢ eérebro, seria de ad- Caganones no Patroritico Inrenion » Mépio 4 mirar que nio houvesse um amplo grau de afinidade entre a aparéneia dos progressos sucessives na manufatura de utensilios de silex e pedra ¢ 0 advento de tipos progressivamente mais avangados de homens. Entretanto, nfo ha nenhuma ligagdo exata centre os dois. Por excmplo, o H. erectus continuo a desenvolver por algum tempo a tradicéo dos apetrechos de corte iniciada apa- rentemente pelo H. habilis, mas passou a introdusir 0 machado de mio. Por outro lado, a tradigio do machado de mio atingiu © sou desenvolvimento maximo pelas primeiras formas de H. sa- iens, mas foi o H. sapiens, em sua fase neandertaléide mais, ampla de crescimento, o responsivel pela tradigfo do miicleo pre- parado. Por conseguinte talves seja errado supervalorizar 0 fato de que 0s estidios finais da tecnologia litica do Peleolitico, jun- tamente com progressos altamente significativos na esfera da cons- cigneia humana, estavam associados com o aparecimento do ho- mem modemo (H. sapiens sapiens). Afinal, a evolugéo biolégica cultural do homem desabrochou no mesmo meio temporal. Como vimos, néo havia nonhuma ligagfo fntima entre os tipos sueessivos de homens e 0s estagios especificos de realizagio técnica. Nao hé justificativa alguma para a idéia de que os poros que, por um ‘motivo ou outro, permaneceram temporariamente num nivel nico inferior, tal como aconteceu apsrentemente com os habitan- tes do Leste da Asia, durante grande parte do Plistoceno Médio © Superior, devam ter continuado num estédio anterior de evo- lugio fisica, Nada mais certo do que o fato de que mesmo as culturas mais simples ¢ aparentemente mais primitivas dos tem- pos modernos foram atribuidas a povos eujo direito ao status de A. sapiens sapiens era tio vilido quanto o dos antropélogos que (5 descobriram. As caracteristioas fisieas dos homens, incluindo suas atuais pecvliaridades raciais, sio uma coisa. Outra muito di- versa sio as suas caracteristicas culturais que podem ser trans nnitidas rapidamente por meio de contactos sociais. Alguns elementos bisicos da economia paleolitica Se a manufatura sistemética de implementos como auxilio para manipular 9 ambiente era uma earacteristiea dos primeiros omens, mesmo atontecia com a forma da sua organiagio. A julgar pelos materiais_biolégioos recolhides dos seus aldeamentos, em diversas partes da Europa, Afriea e Asia, 0 homem paleolitico desfrutava, mesmo a partir dos perfodos mais remotos, uma ‘mentagio quase que inteiramente onivora, muito mais do que a de qualquer dos primatas nfo-humanos sobreviventes. Em particular, 42 A Pré-Hisréna ‘© homem primitive era carnivoro. Considerando que os grandes macacos, embora no avessos a comer ocasionalmente alimento animal, so predominantemente vegetarianos, os primeires homens, ceujos restos alimentares so conhecidos, evidentemente podiau obter grande variedade de carne animal. Se o H. habilis estava restrito sobretudo & eaga de animais pequenos, isso néo se aplica to Hi, erectus, euja eapacidade como eagador contrasta notavel mente com a pobreza dos scus implementos materiais. Nao parece haver diivida de que o homem apareceu e se transformou,é come espécie dominante, principalmente em cagador. Resultado grada. tivo da grande variedade de sua alimentaggo foi a possibilidade de explorar uma série muito maior de ambientes, algo em que foi muito ajudado, com o correr do tempo, pelo desenvolvimento de seu equipamento material. Outro resultado foi 0 inicio da sub. divisio do trabalho que provaria ser uma das molasmestras do Progresso humano; enquanto os homens perseguiam a capa e, quando necessizio, combatiam-se uns aos outros, suas companhet- as eoneentravam-se nos euidados da familia e na coleta de plantas ¢ alimentos de origem animal, como ovos ¢ insetos. Mais do que qualquer outra coisa, a parceria organizada dos sexos é a base da femilia humana, uma instituiglo que aumentou de importincia & medida que se amplion 0 campo de aco c de aleance da cul tura que eada geraeéo tinha de adquirir desde a infaneia. A im- portincia do sustento também se reflete no aprego crescente que se dé a0 abrigo permanente. O homem paleolitico continuava predatério e némade: nfo criava qualquer animal nem cultivava planta alguma, e dependia apenas do que podia apanhar ou coletar da natureza selvagem. Tendo em vista que precisava de amplas areas para seu sustento, cra por isso obrigado a viver fem pequenos grupos muito disperses, compostos do miimero mé- ximo de adultos suficientes para uma cacada. Mesmo assim, era foreoso que avancasse As vezes por territérios extensos, no deco rer do ano, explorando as fontes naturais de alimentos & medida que elas amadureciam. Entretanto, mesmo o homem mais primi- tivo precisava de um abrigo para servirlhe de base e que fosse mais permanente ¢ sélido do-que os refiigios noturnos dos chim- panzés. A medida que se acentuavam as necessidades do protegio © educagio para 0s jovens, e de maior quantidade de equipamen- tos para a vida didria, mais importante se tornava o trabalho de covinhar e mois vital, ainda, astegurar uma base proxima da eaga, da dgua, agradivel para’ viver e prépria ao des as Prop: empenho di tarefas essenciais & vida Caganones no Pausonitico Ivremion e Méoio 43 Fala inteligivel ¢ consciéncia de si mesmo Mesmo que as provas existentes sejam muito eseassas, 6 pos: sivel que 0 homem primitivo tenha devido 0 seu dominio sobre ‘o mundo animal a qualidades muito menos coneretas do que sua teenologia ou modo de subsisténcia, Em particular, muito mais & sua capacidade de compreender © ambiente em que vivia, de acumular e transmitir sua experiéncia e de assegurar 0 funciona- mento adequado das sociedades artificialmente definidas que 0 ‘cereavam, Sem dhivida, a linguagem inteligivel foi um dos tmeios prineipais que empregou para classifiear seu ambiente, reunir e transmitir suas experiéneias ¢ desenvolver seus modos tradicionais, de comportamento, s estudiosos dos grandes macacos concordam que uma das suas maiores desvantagens é a auséncia da linguagem, o que basta para impedilos de adquirir os clementos da cultura. E verdade ‘que 0s chimpanzés tém um registro de expressio emocional mais amplo que a maioria dos humanos, e que podem transmitir, uns 05 outros, no s6 05 seus estados emocionais, mas também de jos e impulsos definidos; entretanto, como Kahler salientou, “sua ‘gama de fonética € inteiramente subjetiva e s6 pode expressar emo- es, nunca designar ou deserever objetos”. Com relagéo a tal fato, 6 interessante notar que, no seu famoso empreendimento de ceriar 0 chimpanzé Viki, desde os trés dias de idade até os trés anos, o Dr. Hayes ¢ sua mulher constataram ser possivel treiné-lo ‘a ponto de fazé-lo obedecer certos comandos, mas depois de de- zoito meses de ensino intensive nio conseguiram fazé-lo “identi- ficar seu naziz, olhos, mios e pés”. Até que os hominidas tives- sem desenvolvido palavras como simbolos, praticamente nfo exis tira possibilidade de transmitir nem de acumular cultura. A fala, ‘envolvendo 0 uso de simbolos, deve ter sido uma das primeiras Jndionpes de Iumarddnde: Sua Sale, defitincs, comp extso ‘40 prévhistoriador, é a impossibilidade de se verificar sua Elstnciay a perir dat eras humanas mais romous. A deepito de sugesties em contrivio, a opiniso paleontolégica mais abalizada € contriria @ nogio de que se chegue a uma dedusio sobre a fala inteligivel, seja pela conformagio da mandibula, seja por meio de esiudo’ dos moldes das superfices intrnas doe erfnios. Pro yavelmente 0 melhor indicio € o aparecimento de ferramentas de forma padronizada e reconhecivel, }é que nfo so pode acreditar ‘que elas se tenham popularizado e transmitido sem o uso de simbolos verbais. “4 A Pré-Histénta A evidéncia palpivel de uma autoconseiéneia cada vex maior surge a partir de um estadio quase recente da Pré-Historia, So. no Plistoceno Superior é que temos a primeira evidéncia do sepul. tamento sistemitico dos mortos pelo homem do Paleolitico Meio, E somente quace no final desse periodo, numa época de répida inovagio téeniea, é que eneontramas pela primeira vez provas de uso de adornos pessoais ¢ a pritiea da arte, ambas no contexte do H. sapiens sapiens. Fabricagio de insirumentos de corte (Estilo 1) s instrumentos de corte, que na maioria das regides poderiam. ser feitos com extrema conveniéneia, tirando-se algumas lascas em um ou em dois sentidos dos lados de um seixo, formavam o ele. mento mais importante, juntamonte com suas lascas, do equipa mento material nfo 96 do H. habilis como também das vérias formas de H. erectus, que proliferaram nas diferentes partes da Africa, Asia e Europa, durante as primeires fases do Plistoceno. Médio. Além disso, nas regides orientais da Asia que jamais ado- taram 0 machado de mio 0 costume persistiu, em certo grau, até © final do Plistoceno; ¢ & possivel que a tradicio que os primeiros cagadores Ievaram para a Austrélia, em perfodo mais avangado do Plistoceno Superior também fosse basicamente do Estilo 1. Do ponto de vista geogrifico, a tradi¢io das indiistrias liticas coexistia amplamente com as dreas ocupadas pelos primeiros ho- mens, © sua presenga na Afriea Oriental ja foi comentada, Na Africa do Norte ela foi particularmente hem estudada no Marro- 0s, onde apareeeu no contexto de uma fauna villefranchiana e continuou a se desenvolver por varias estidios do Plistoceno Mé- dio. Descobertas recentes indicam que, no Ocidente, existiram em teritérios bem 20 norte, indo até a Europa Central onde, por exemplo, foram encontrados instrumentos de corte e lascamento bem definidos, feitos de seinos de silex cémeo e quartzite, asso- ciados @ oss0s de animais do Plistoceno Médio, numa pedreira de travertino, em Vértesszillés, na Hungria. Na verdade, so accitarmos quo os trabalhos de sflex que reesberam nome de Clacton per- tencem a mesma tradigf0, podemos dizer que eles ce estenderam até a parte ocidental da planicie do Norte da Europa, Para o Leste, sou aloance também se estende dos trépicos até a sone temperada. As indvstriaslitieas Soan, encontradas nos depésitos do Plistoceno Médio, no Nordeste do subeontinente indiana, figuravam ‘entre as primeiras do seu tipo a serem identificadas, elém dae que foram descobertas na planicie da China setentrional. No Su. Cagaponzs bo Paeouizico Invemion : Méoio 43 deste Asiético apareceram diversos trabalhos feitos de material di- ferentc ¢ iis vexes rijo, mas ajustandose ao mesmo padrio bisi notadamente 0 Aniatiano da Birmania, 0 Tampaniano da Malisia ve 0 Pajitaniano da Indonésia, Infelizmente, em muitos casos, os préprios implementos de pedra © 08 depésitos geolégicos em que so encontrados nos dio a tiniea fonte de informagao sobre 0 grupo humano que os fabri. cou. As vezes encontramos restos dos préprios fabricantes e, muito freqiientemente, também vestigios dos animais que Ihes serviamn de alimento. A julgar pelo que se recuperout no estrato 1 da jazida de Olduvai, oH. habilis progredira muito ao adotar a alimenta. so onivora earacteristica do homem; ele mio s6 eapturava peixes, aves ou pequenos animais, como certamente conseguia obter car” cagas de grandes animais. Os homens de Vértesszillés tinham um regime earnivoro pronunciado parece evidente, pela carbonizagio de alguns dos ossos desearnados, que se utilizvam do fogo. O mesmo se aplica, e com maior certeza, aos primeiros homens (IL. erectus pekinensis) da planicie da China setentrional. Ainda so poueos os detalhes conhecidos sobre as deseobertas o Plistoveno Inferior em Chanchiawo na provincia de Shensi. Por ‘outro lado, hé fartas informagGes sobre os descobrimentos feites em Choukoutien. Os estratos mais antigos, no Ioeal 13, e que da- tam do comego do Plistoceno Medio, revelaram a ocorréncia de ‘um utensilio tipico de eorte feito de um seixo de silex edrneo Jascado alternadamente, 0 que The dava um gume sinuoso. A fenda principal (local 1), datando mais para o fim do Plistoceno ‘Médio, ¢ a fonte de restos de mais de 40 representantes do homem de Pequim, tem revelado intimeros artefatos de pedra feitos de materiais duros como 0 diorito, 0 silex eémeo e 0 quartzo bruto. Deve-se admitir que muitos destes eram tio toscos que dificilmente Poderiam ser reconhecidos como de origem humana, se extraidos de um depésito geolégico ordinério, Nao obstante, grande parte do material obtido naquele local, e que estava intimamente asso- seiado a vestigios de fogueiras e outras atividades humanas, tem ‘eertas caracteristicas bem definidas: no hi artefatos compardveis ‘203 machados de mio da Africa, ou os de partes da Europa e do Sudeste Astiticn; os seixos e as laseas exam usados como mat& Hio:prima para a confecco de instrumentos. As lascas, as vezes, exam formadas eamagando-se nédules entre duas pedres, 0 que resultava em sinsis de percussio, das duas extremidades; os reto- «ques secundérios ram esca:sos irregulares e 0s implementos principals dostinavam-se a cortar e raspar, sendo os primeiresy {geralmente, feitos de scixos rolados, dos quais se tiravam algumas

Você também pode gostar