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Comunidades 4 deriva: Baudrillard, ao comentar em A Os detetives selvagens ilusao vital, sobre a desmedida eo nomadismo centralidade da tecnologia na vida _ da imaginagiio contemporanea, menciona uma Angela Maria Dias espécie de “greve dos acontecimen- tos” para conotar a influéncia exer- cida na Historia pela virtualidade do “hiperespago da midia e dos discursos” (BAUDRILLARD, 2001, p. 56), no qual a acao culmina numa nao-agio virtual passivel de qualquer significado, porque “congelados politica e historicamente, os eventos sao reencenados transpoliticamente, em tempo real”(BAUDRILLARD, 2001, p. 58). Nesse sentido, 0 tedrico aponta “o desaparecimento das vanguardas” (BAUDRILLARD, 2001, p. 55), num tempo que “oferece diversos exemplos desta forma baixa e exaurida de acontecimentos primarios da modernidade”, quando a Histéria entrépica “se repete e se torna farsa”(BAUDRILLARD, 2001, p. 55), em decorréncia da desrealizagao digital, capaz de fazer as coisas atravessarem o seu prdprio fim e mergu- lharem no interminavel (BAUDRILLARD, 2001, p. 49). A desconstrucao dos valores estaveis e agregadores ou a infinita prolife- racao de micro-valores alimentam a expansao da esfera social ¢ 0 “ad- vento de uma era especifica de obscenidade” (BAUDRILLARD, 2001, p.51) em que “a liberdade foi obliterada, liquidada pela liberagao; a ver- dade foi suplantada pela verificagao; a comunidade foi liquidada e ab- sorvida pela comunicagao” (BAUDRILLARD, 2001, p. 53). Mas diante desta situagio que considera “totalmente patafisica”, porque além de todos os limites, o filésofo levanta a hipotese de que as coisas, por terem atingido um estdgio de paroxismo, também teriam atingido um estado de parédia, em que a ironia como emblema da época pudesse nos liber- tar da “visio heideggeriana da tecnologia como a realizagao do estagio final da metaffsica”(BAUDRILLARD, 2001, p. 59), em favor de uma “ironia transcendental do tecnolégico”(BAUDRILLARD, 2001, p. 61), num mundo em crescente insubordinagio contra o dominio do homem. Digitalizado com CamScanner 4 [ coMUNIDADES SEM TIM ] ironia rca do estagi smaginagio patafisica da ironia como marca do estagio atu] Esta imaginaga ‘co talver seja uma das caracteristicas Prepondera, mune ora 4vel também por sua qualidade my, de Os detetives selvagens, responsi detetives selvagens, célica de elegia ao espirito combativo ¢ polémico das vanguai lica de elegia ao esp ; i comunidades de imaginacao ¢ 1" uguracao. Este romance rid i z émio R6 0, com mais de seiscentas paginas, vencedor do prémi | aaa Gallegos de 1999, eleito em 2006, 0 livro chileno mais importante dos tihtimog ee: 4 4 vinte e cinco anos, foi publicado em portugues neste mesmo ano, lo Ntes clan. ‘A obra divide-se em trés partes, que, de fato a ee i€ que se aby. com 0 diatio do poeta mexicano Juan area ; i Interrompid, Iher a segunda parte, € retomado, ao final. segunds pate perspectivista, de ponto de vista multiplo, contendo lepoimentos de inumerdveis personagens entrecruzados ¢ dispares, constitui uma e,, tensa colagem, um jogo de armar, uma rede de falas e historias isoladas ou relacionadas, que nartam eventos ocorridos entre 1976 e 1996, para acol O diario de Garcia Madero, na primeira parte, dedica-se a relatar sey encontro com os poetas real-visceralistas ¢ seus dois lideres, o chileng Arturo Belano — alter ego do autor, que viveu no México, de 1968 a 1978 — e o mexicano Ulisses Lima — que, segundo consta, seria uma réplica ficcional do poeta Mario Santiago, amigo do autor. No segundo segmento, o diarista narra a viagem do grupo formado por ele, pelos dois lideres do movimento e por Lupe, uma prostituta mexicana em fuga do seu gigold, até o deserto de Sonora, em busca de Cesérea Ti- najero, poeta fundadora de um grupo vanguardista mexicano também chamado de real-visceralista, atuante na década de 1920. Os personagens do amplo painel de vozes da segunda parte sio teste- munhas de eventos nos quais conviveram com Belano e Lima, ainda que, muitas vezes, de maneira lateral, e desfiam relatos de feitio, tam*- nho, tom e dic¢ao altamente diversificados, que guardam autonomit, Por seu cardter episddico ¢ fragmentirio e apontam para uma total dade aberta e indiscernivel. Alids, conforme observa Flores (FLORES: oe eae ah cipio que rege a aie ‘oé. erm ee : incerteza do sentido vevale £0 da “esttica da imp recisio”. Ou a0 dos. destinos, exboculos eee pike ate eat a até a construgio dos fn mente pela multidio de depoime fo 8S, jd que tanto Belano quanto Lima™ Digitalizado com CamScanner CANGELA Mania DIAS ~ comuntpaDts A DERIVA J t@m voz ¢ so construfdos tanto através do diario partir das falas e confissdes da infinid na segunda parte, denominada “ de Madero, quanto a nfinidade de personagens que desfilam os detetives elvagens”, Nesse sentido, a multidio de pe Sonagens secundérios responde pelo delineamento dos perfis dos pro tagonistas que, na sa istori: i oat S que, na profusao de histérias e circunstancias, aparecem sempre mais controvertidos e indetermina- dos. Belano, como uma cortuptela do chileno Bolafio, e Lima, que, em- bora sugerindo o seu amigo, poderia bem ser um Ulisses degradado sem Penélope sem heroismo, apenas um vagabundo que se move pela diregao do vento: os confins sérdidos da Cidade do México, um barco no Mediterraneo, o isolamento do deserto de Sonora, os bares deceidos de Barcelona, Tel Aviv, Paris, Viena, Nicaragua. O fundador da revista Lee Harvey Oswald — que vendeu drogas para publicar poemas, plantou “a semente do realismo visceral”, nos anos 70, e depois juntou-se ao amigo chileno — inspira no leitor perplexo a vontade de um sentido que se esfuma e nunca aporta, Numa espécie de espelhamento da busca dos personagens pela enig- matica Cesérea Tinajero, fundadora do movimento nos anos de 1920, o leitor também se transforma em detetive, no decorrer de uma leitura que é investigacao frustrada, em varios niveis, As certezas sao palavras, eas palavras fugidias e volateis. O fantasma das promessas da moder- nidade, na busca de uma geragio nascida nos anos de 1950, em plena juventude nos anos de 1970, desdobra-se em algumas questdes, sempre pendentes. Nessa épica degradada, equilibrada no hibridismo entre a narrativa de aventuras e outros géneros - como 0 diario ¢ 0 romance po- licial — qual a finalidade da viagem, o que af significa a vanguarda, onde se inscreve o sentido desta interminavel malha de relatos que poderiam “atravessar o proprio fim” e continuar indefinidamente? Tomando-se a viagem, sua meta e seus ganhos, a meméria da geragio beat acorre imediatamente. A imagem de Jack Kerouac e seu emble- matico On the Road se impdem prontamente. Seu vitalismo herdico pela literatura esponténea, sua sede de viver ¢ de gravar literariamente a experiéncia, no processamento roméntico da tradigio literdria, sio revisitados por estes jovens inquietos e errantes que, em plena Cidade do México, em meados dos anos de 1970, discutem literatura, usam drogas, trocam livros entre si e deslocam-se incessantemente. Digitalizado com CamScanner 75 [ coMUNIDADES SEM FIM J ia da exploragao dos diversos universe incia | ocupa uma posigao ceng, ista Lee Harvey Oswald. a por Ulisses Lima, a S lite, importa Por outro lado, aims she ratios como bit veriéncia vital Ari 10 bussolas da experienc ' seralistas. A propria rev! nae saga dos real-visceralls tas. cinada pelo dinhei vyenda de marijuan i eiro da venda der é a sate inada pelo dinheit ando 0 assassino do presidente am ic grotesco do nome, homenagea al i Id, que, segundo : tora de Paris, a P- J Oswald, que, segundo yy i inspirada por uma editora de i q doums He een to diario de Garcia Madero, teria publlcado um livtg he Matthien Messagier, um dos autores do Manifeste ectrique aur paypie | de jupes, publicado em 1971, pelo conjunto dos mais representatiy, poetas do Movimento Elétrico O movimento francés se propunha a estabelecer Laas entre re. cursos e praticas tomadas 20 Surrealismo eas ee a dos poetas da geracio beat, na tentativa de uma espécie ie alianca entre a pratica literdria radical e a vivencia da poesia. Miche! Bulteau, um de seus integrantes, em 1976, viajou a Nova Torque e aproximou-se de poetas da geracio beat, como Burroughs, por quem foi considerado um relevante explorador da psique. Ainda segundo o diarista Garcia Madero, este manifesto, como também os livros de outros poetas envolvidos no mesmo movimento, eram por- tados por Ulises Lima em um dos seus encontros. A obra de Messagier, auto-intitulado um iconoclasta, bem como a de outros poetas do grupo, por sua heterodoxia, manifestam uma forte vinculagdo com a pinturae as artes graficas, o que tera alguma importancia, caso se tome em consi- deracao 0 Ginico poema de Cesérea Tinajero citado por um dos depoi- mentos da segunda parte, o de Amadeo Salvatierra, um contemporineo da poeta que, num longo testemunho, de 1976, fracionado em varios blocos, narra suas experiéncias com ela, a jovens nao identificados. ee pepe sucediam apenas o desenho de trés linhas — uma ret, ee aaa quebrada, oO exercicio da interpretagao deste © romance tematiza, As ti en da desorientagio do sentido au Neen es res inhas figurariam diferentes condicdes “¢ » palavra oculta pelo titulo e, ao mesmo tempo, poderiam, co de Quetzalcoatl a feb, Significagdes alegéricas, apontar para “o bit © encefalograma do capi 30 Aha ea meni ou de uma mei perficie do mar” (BOLAN Ahab ou o encefalograma da baleia, aS 10, 2006, p. 414) ¢ assim, indefinidamente~ Digitalizado com CamScanner [ANGELA MARIA DIAS ~ COMUNIDADES A DERIVA ] Por outro lado, a viagem, celebrada attisticamente como signo d peldia e criatividade pelos beats, na esteita de Thoreau e Whit no encontra, entre os real-visceralistas qualquer justificagao. Consag ada ha busca de Kerouac pela “pérola que Ihe seria oferada” ou ainda no ‘Long poem of these states” de Ginsberg sobre a beleza do fluxo e do deslocamento, a viagem dos “detetives selvagens” aa é ica re. baixada de Bolao, ao deserto de Sonora, em busea da poeta Ceadrea Tinajero, s6 se perfaz como encontro inécuo, perseguicao e morte. Seo grupo de quatro viajantes — Lima, Belano, Garcia Madero e Lupe — depois de muita peregrinagao e cansaco encontra a poeta, também se depara com Alberto, 0 cafetdo de Lupe, e um policial, no encalgo de Be- Jano, perseguido como imigrante ilegal. A partir dai, o duplo encontro resulta num desenlace abrupto, totalmente sem sentido. O diario de Garcia Madero interrompe-se logo depois, com a separa- cdo do grupo e o que sabemos de Lima e Belano, em suas andangas internacionais, se encontra no contrapontismo difuso da segunda parte. Os personagens relacionam-se seguida e variadamente com uma gama enorme de pessoas — mais proximas ou distantes, amigos de ocasido ou conhecidos com os quais esbarram —e mais nada acontece de relevante. Sobra um repetido desgaste, em que so todos mastigados pelo devir de acontecimentos aos quais se expdem, num mar de acasos sem objetivos, em que sexo, amizade, amor, literatura, livros e militancia intelectual aparecem ociosos, gratuitos, sem temissio. O passado nao acolhe, o presente nao preenche, o futuro nao promete; apenas a existéncia co- tidiana, a vida nua, galhardamente encarnada pelos herdis e seus pai- deumas ecléticos: Lautréamont, o Manifeste Electrique aux paupiéres de jupes, Michel Bulteau, Mattieu Messagier, Alain Jouffroy, Sophie Podol- ski, Raymond Queneau, Brian Patten, Adrian Henri, Spike Hawkins. s esquecidas € poesias desconhecidas, Sio poetas perdidos, com revista’ ssconhec desprezam ou ridicularizam, que ninguém nunca leu e a quem muitos pelo titulo que se auto-imputaram € pela viagem sem passaporte ou Tetorno a que se entregaram. Seu perfil difuso, a indeterminagio do legado da comunidade que construiram passa pela inexisténcia material ‘0 dos dois mimeros da revista de da obra de seus adeptos. Com excegii ad Lima, a Lee Harvey Oswald, publicados, em 1974, como uma espe de preimbulo aos real-visceralistas, hi s6 0 ntimero de Caborca, a revis- ta editada pela lendaria Cesarea Tinajero, guardada como reliquia Por Amadeo Salvatierra, o velho melancélico, ex-estridentista. O roteiro da Digitalizado com CamScanner 7 [-COMUNIDADES SEM FIM J a, Belano e os real-visceralistas, en, , leserto, se encontra todo na sequéngg ™ i agem lbs intmeros depoimentos deste fascinante ae td , Sobre uma - ade do México, quando bebeu € conversoy, z rapazes nao identificados, em janeiro dg in Jina pela hipdtese mais dbvia de i istas, acai visitantes seriam os dois protagonistas, = ae que a dan coin exatamente, com 0 momento em que, peras ee 0 dito , Garcia Madero, tinham partido para 0 deserto de Sonora, em buscy de Cesérea. mitologia adotada por Lim da poeta desaparecida no d em sua casa, na Cid: dia amanhecer com dois rap? A primeira vista, 0 Icitor se inc! ssinalada “estética da imprecisig» Emerge ai mais um sintoma da ja a c ral que o livro fornece, Setig apesar de toda a indicagao espago-temporal ¢ 7 uma armadilha do narrador-attifice deste intrigante jogo de armar, uma pista falsa para surpreender 0 leitor? E como se a indicagao da data da entrevista na casa de Amadeo seguisse 0 estado de trépega embria guez em que o anfitrido passou a noite de confissdes ¢ melancolia. 4 apaixonada disponibilidade do velho, diante dos jovens interessados na figura de Cesarea Tinajero, seu febril entusiasmo narrativo sobre as cir. cunstncias e os circulos intelectuais da época tém um papel central no romance, pois constituem as lentes sob as quais as vanguardas se deli- neiam, bem como 0 eixo que sustenta a legenda da poeta e a motivacio indireta da expedicao dos anti-herdis ao deserto de Sonora. Amadeo Salvatierra é um personagem ficticio, assim como Cesérea Ti- najero, mas 0 movimento estridentista e seus companheiros de militin- cia estética, Manuel Maples Arce, Gérman List Arzubide e Arqueles Vela, de fato, existiram, Alids, este é um recurso que permeia todo 0 livro, onde 0s jovens personagens convivem, léem e se referem a figuras do meio literdrio real, ou seja, onde, a todo o momento, o ficticio s¢ mistura ao real e a verossilhanca se equilibra na penumbra de umbrais ambiguos, O Eatridents : : 10 ae foi um movimento vanguardista artistico ¢ multidis- ie is ado, em fins de 1921, na cidade do México, por Manuel ce, Momento em que produziu o primeiro manifesto. Nalut# O segund i ee tido manifesto acontece em 1923, na cidade de Puebla, ¢ é Po “gicas, mais violento e menos conceptual, em termos este Digitalizado com CamScanner CANGELA MARIA DIAS ~ COMUNIDADES A DERIVA ] ticos, que o primeiro, Em uma de suas partes propde um emblema bem aparentado com o Futurismo: : pee del tematismo sugerente de las maquinas, las explosiones obreriles que estrellan los espejos de los dias subvertivos, Vivir emocio- nalmente, palpitar con la hélice del tiempo, P. ia el futuro” (SCHNEIDER, 1985, p. 16) phd E, em outro trecho, chega a declarar a que a “tinica verdade es la verdad estridentista [...] Ser estridentista es ser hombre”(SCHNEIDER, 1985, p.16). Mais adiante, em funcao do apoio econémico recebido pelo governo do estado de Veracruz, Maples Arce transfere o movimento para a cida- de de Xalapas, onde assume os cargos de Juiz de primeira instancia e, pouco depois de secretario de governo do estado, Em funcao da grande atividade do movimento neste perfodo, a cidade passa a receber 0 nome literatio de Estridentépolis. O Estridentismo reine caracteristicas do Cubismo, do Dadaismo, do Fututismo e do Ultrafsmo, ou sefa, de certa forma, herda o fusionismo caracteristico desta ltima vanguarda, surgi- dana Espanha, em 1918. Uma importante peculiaridade que caracteriza a militancia estridentista é 0 compromisso politico com a Revolugéo Mexicana e com um enga- jamento atuante na vida social. O terceiro livro de Maples Arce, Urbe, de 1924, traz o subtitulo “Super-poema bolchevique em cinco cantos” e dedica-se “A los obreros de México” como antincio do programa de acao revolucionaria que delineia (SCHNEIDER, 1985, p. 22). Além desta marcante preocupacio, o livro propde também uma estética da ci- dade, pela concepgio poética ¢ imagética, o que lhe dé uma fisionomia futurista (SCHNEIDER, 1985, p. 22). Talvez por isso mesmo, se tenha tornado a primeira obra de vanguarda em lingua espanhola a ser tradu- zida para o inglés, o que gcorre em 1929, por iniciativa de John dos Pas- Sos que esteve no México poucos anos antes. O movimento abrangeu também a pintura, a escultura, a gravacao ¢ a fotografia. Como uma formagdo composta por poetas jovens, © Estridentismo ma- nifesta um marcante afa de novidade e um acirrado cosmpolitismo, en- Digitalizado com CamScanner 79 [ comunipanes sem FIM i} ntato com 0 passado, em nome do ue ge a moderna. Sua forte vinculg th 927, a convergéncia entre 4 9% Jispersao do movimento, ue, ise 4 Ue, boy governador constir Uciongy odo cor » da vida urban , ocasiona, em | ido ead protegido pelo gajado na rejcigao a t uma nova imagina governo de Ver s a queda do poder constitu dois anos ¢ meio, havia sido (SCHNEIDER, 1985, p- 32). notivo, o papel de Amadeu, um personagern ie lesfiar enredos envolvendo seus colegas dy ei idente dimensio ideolégica, no . te, o reptidio do seu criador ding, Jectuais e politicos. Certamente por este m cional estridentista a d guarda his a, carrega uma ev! manifesta, irénica € enviesadamen deste tipo de coexisténcia entre intel to de Amadeu sobre a efervescéncia cultural € as disputes dos seus anos de juventude é bastante nostalgico, beirando, em deter minadas passagens, a ingenuidade, numa especie de jogo de sentido em que sobressai a intencionalidade critica do autor Bolajio, em relagio 4 vida literdria e as vicissitudes dos intelectuais, em suas relagdes com o poder. ‘Assim se Amadeu figura um velho dobrado pela vida e descartado do panteao das celebridades literdrias, — ja que nao passa de um simples es- criba de “petigdes, requerimentos e cartas” (BOLANO, 2006, p. 205), capaz, num assomo disparatado, de comparar-se a Octavio Paz, pelo fato de ganhara vida esérevendo = elé se cotpbrtard como uma espéce de meméria autoral do “passado do México”, depositario farsesco de certas ideias do escritor Bolafio, ou visiondrio as avessas: “e assim como ha mulheres que enxergam 0 futuro, eu enxergo o passado, enxergo 0 passado do México” (BOLANO, 2006, p. 249). Nessa linha, suas rela- ges com 0 general Diego Carvajal, amigo de Maples Arce, ¢ segundo GOLAN artes [...] mas também homem de Obregén” so da promsculdede dos Inert pce de ings cont um dos generais vitoriosos ee com G poder politico. Obregon 5 sos na Revolucio M i do pais (1920-1924) durante quase toc c40 Mexicana, e presidente do P (1921-1927), quase todo 0 periodo de vigéncia do estridentisme O depoimen Digitalizado com CamScanner CANGELA MARIA DIAS ~ coMUNIDADES A DERIVA] de todos os detalhes da hist6ria sérdida revela a dimensio funcional do personag ides autorais. , Soa absolutamente grotesca € ¢M como satirico porta-voz das posi Nio deixa de ser bastante sintomético das comunidades intelectuais, sobretudo das de vanguarda — pelo proprio helicismo implichc sa le, nominagio — esta espécie de esgrima de perspectivas ¢ posigdes, ilus- trando a babel das linguas, tao bem dlelineada na passage mencionachs acima, em que um dos lideres do movimento Estridentista, de reconhe- cida importancia na histéria intelectual e attistica do México, aparece reduzido ao papel de intimo comensal de figura tao controvertida. A propria referéncia a Estridentépolis, no delitio alcodlico de Amadeu aparece emoldurada com indisfarcével ironia: E entio voltei a pensar na Estridentépolis, em seus museus e bares, em seus teatros ao ar livre e em seus jornais, em suas escolas e em seus alojamentos para os poetas de passagem, naqueles alojamentos em que dormiriam Borges e Tristan Tzara, Huidobro e André Breton. Vi meu general conversando conosco outta vez. Eu o vi fazendo planos, beben- do e encostado a janela, recebendo Cesdrea Tinajero, que trazia uma carta de recomendagao de Manuel, eu o vi (BOLANO, p. 369-370). Certamente o general Diego Carvajal, personagem grotesco de Bolafio, alude a0 general Heriberto Jara (SCHNEIDER, 1985, p. 23), gover- nador de Veracruz e amigo de Maples Arce. Nao é por outro motivo que a aurdtica Cesdrea aparece, no passado de recordagées de Amadeo, como secretaria do militar, a partir da carta de recomendagiio do poeta. Ainda, por isso mesmo, Cesdrea ird mais adiante tornar-se estridentista, para, em seguida, romper com o movimento, em decorréncia de una tusga de cardter pessoal, Sua revista Caborca, de tinico niimero — Sree oficial, por assim dizer do realismo visceral” (BOLANO, 2006, p. 27 ~guardada com devogao por Amadeo, foi encontrada em a 0 primeiro manifesto do Estridentismo, a folha de Sr teva i L que apareceu colada nos muros da Cidade do ee ( ‘ ee 1985, p. 11). A ironia da mengao é flagrante, quando Amadeo afirma por interm Ja, cidade que acolh \édio de seu personagem, 1 Bolafio, provavelmente por engano, .eu! o segundo manifesto que a folha foi colada nos muros de Puebl € nko este primeiro, Digitalizado com CamScanner 81 [.coMUNIDADES SEM FIM i 4 imeiras cntusiasmadas postulagdes do manifests a examinar as prime autonomia do criador ¢ da ctiagao ese, que o autor homenageia a au! Tt dO oe ao Tame en diante de quaisquer poderes, na diregao opos que o me ian na mento tomaria, logo em seguida: ‘em coisas bonitas, como quando diz: “Exito todos og tres do México, 0 que ainda nig Tbandathades peo our prebendirio dos sinecurismos roverigy, que ainda nao se corromperam com os mesquinios clogios da erty Gfeial e com os aplausos de um pablico reles € concupiscente, tojy, os que nao foram lamber os pratos nos festins culindrios de Enrique Gonzilez Martinez, a fazer arte com 0 estilicfdio das suas menstruagse- iiselectuas, todos os grandes sinceros, 0s que niio se decompuseram ny lamentiveis e mefiticas eflorescéncias do nosso meio nacionalisa com fedores de pulqueria e rescaldos de fritada, éxito todos estes em nome da vanguarda atualsta do México a vir combater ao nosso lado nas luge feras fileiras da devouvert... (BOLANO, 2006, p. 221) Mas também t vens poetas, pintores ¢ esct A par da ironia ferina e de afirmativas sobre o carater “incendiétio ¢ atravancado” da prosa de Maples Arce, que “na época cativou generais da Revolugao”(BOLANO, 2006, p. 221), o que ha de interessante é carater altamente eclético dos nomes que compdem o “Diretério da Vanguarda”, que, segundo o relato do personagem vinham grafados er- radamente, na sua transposicao para o espanhol, Entretanto, apesar da devogio de Amadeo por Cesarea, 0 fato é que sua a a Unico ntimero, a Caborca, também sera criticada, sobretudo ‘as tradug6es provincianas e tacanhas d le poetas os a Pp como Tzara, Breto! uma arvore n thamen star en Por cima, 0 que vocés esto pensando, »NOsss opines (BOLANO, p27). Digitalizado com CamScanner [Ana ELA MARIA DIAS — COMUNIDADES A DERIVA J O parentesco entre os dois movimento: depreenda do paideuma de ambos, 0 tintas do Futurismo ¢ no fusionismo -visceral esteja mais para o Dad; divergéncias, inerentes & Babel d °8 € nitido, embora, pelo que se Estridentismo carregue mais nas ultraista; enquanto o realismo- 1 ¢ 0 Surrealismo, Entretanto, fora as sin ; los intelectuais, seus jogos e vaidades, 0 fato € que 0 tiltimo depoimento de Amadeo dé a chave da grande seme- Ihanga entre os movimentos e, com isso, emblematiza melancolicamen- tea distancia entre o México, e/ou a Amética Latina, co a Europa, enquanto o bergo da opuléncia do modelo, inalcangavel. Ao tentar, inutilmente, dissuadir Cesdrea deserto de Sonora, durante os anos de 1920, Amadeo a: mo periferia, e ou a metrépole de partir para o irgumenta: Perdeu a cabeca, Cesirea? Aqui vocé tem seu trabalho, seus amigos, Mannel gosta de vocé, €u gosto de vocé, German e Arqueles gostam de vocé, o general nao saberia o que fazer sem vocé. Vocé é uma estri- dentista de corpo e alma. Vocé nos ajudaria a construir Estrident6polis, Cesarea, eu Ihe disse. Entio ela sortiu, como se eu estivesse contando uma piada étima, mas que ela ja conhecia, e disse que fazia uma semana que tinha deixado o trabalho e que, além disso, nunca teria sido estri- dentista, mas sim real-visceralista. Eu também, eu disse ou gritei, todos 05 mexicanos somos mais real-visceralistas do que estridentistas, mas ¢ dai, o estridentismo ¢ o realismo visceral so apenas duas mascaras para chegar aonde queremos chegar. E aonde queremos chegar>, ela perguntou. A modernidade, Cesétea, respondi, & porra da modernidade (BOLANO, 2006, p. 474). Se a personagem, nao convencida, resolve partir para 0 México pro- fundo, o deserto de Sonora, para muitos anos depois, ser procurada Por um grupo de novos real-visceralistas, como uma espécie de origem, ou mesmo de “mie” — para adotar o ponto de vista de Amadeo, que a considera “mie dos real-visceralistas” (BOLANO, 2006, p. 475) a) fato é que, nos anos de 1970, a modernidade jé nfo era mais a Shangri-la Perseguida. No segundo real-visceralismo, 0 objetivo de mudar a poesia mexicana, “insustentavel, entre o império de Octavio Paz ¢ 0 império de Pablo Neruda” (BOLANO, 2006, p. 32), também se opera a partir de livros franceses — como jé se viu, 08 escritores do movimento Eletrico — Mas a estratégia ja é outra. A postura, mais Score a “se menos dos dogmatismos doutrinarios caracteristicos, inclusive, de 83 Digitalizado com CamScanner [ COMUNIDADES SEM FIM Ll das earopéias, como o Surrealism. O caminho, trig das européias, : inte que a meta. cia Madero menciona uma “ass, vangua cia made, torna-se mais importa’ infci 1 didrio, Gar ; . Logo no inicio de seu eee ot so mistetiosa” ouwvida sobte 0s real-visceralistas que, segundo Ulis, ao olhando para um ponto mas se afastan lo ima, “~ Andam de costas, para tc ee aka reta,rumo ao desconhecido” (BOLANO, 2006, p, 15) alusiio ao anjo da Historia de Walter Benjamin, em sua aPropriaig gérica do Angelus Novus de Klee, ocorre imedtamente, Maso, ahucnado da excusio a Sonora e seu atabalhoado desenlac, digg um vaudeville, desmentem qualquer conclusao numa linha messianicg Muito ao contratio, 0 que ocorre depois do encontro com Cesérea nig resgata nenhum sofrimento, nao estanca nada, e afasta-se resolutamenr de todo viés de coeréncia. A estrutura contrapontistica, indeterminad, ¢ profusa do segundo e maior bloco do livro, com mais de quatrocentas paginas estendidas entre as duas partes do diario de Garcia Madero, talvez indique um possivel caminho de leitura. A impossibilidade da vanguarda, ou, nas palavras de Baudrillard, 0 de. saparecimento das vanguardas, certamente tem a ver com 0 feitio angr. quico, indeterminado e protéico desta intrincada comunidade de falas, responsivel pelo delineamento difuso do real-visceralismo como movi- mento, sem manifests, palavras de ordem ou obras escritas. O carter maniaco do segmento — que, nao por um acaso, é denominado pelo au- tor de “os detetives selvagens” — tem a ver, talvez, com a sua capacidade visionaria, de antecipar o futuro. A concepgio cosmopolita do mundo como enredo, novelo, cruzamen- to infinito de falas, em que o frescor e 0 instantaneismo de cada uma delas instaura a propria e irredutivel verdade, sugere a atual vigéncia das redes virtuais, e suas comunidades digitais, capazes de forjar solida- riedades temporirias ¢ fulminantes em torno de um mesmo tema, em Digitalizado com CamScanner CANGELA MARIA DIAS ~ COMUNIDADES A DERIVA ] em muitos outros, um discurso amplificado em muitos textos, sempre capazes de remeter a outros. A “légica contracultural” da internet, em sua vocagio para o comunita- rismo e para a descentralizagio (HOLLANDA, 2010, p. 140) ¢ a cen- tralidade da palavra que, segundo Heloisa Buarque de Hollanda, é, por exceléncia, a midia da rede virtual, deixam-se pressentir nesta narrativa proliferante que figura uma grande maquina meio desarranjada, inca- paz de calar-se, Dai que o nomadismo gratuito, a eterna disponibilidade ea fluida legenda dos real-visceralistas possa ser vista como uma grande parédia das vanguardas, em seu afi combative de emblemas ¢ estilos, em suas disputas apocalipticas. Aqui, para retomar as palavras de Bau. drillard, referidas no inicio do texto, a Histéria entrépica “se repete € se torna farsa” (BOLANO, p. 55) e a modernidade, to procurada por todos os precursores de Belano e Lima, s6 pode aparecer em “sua forma baixa e exaurida”. A técnica do relato dentro do relato exacerbada n’Os detetives selva- gens cria uma maré de histérias comparavel figuta virtual do hiper- texto ¢ satura o romance de narrativas, numa espécie de desrealizacio da linguagem, em que os limites se esfumam ¢ 0 sentido é sempre uma revelagao que nao se manifesta, acendendo no leitor-detetive a sensacio desconfortavel de uma investigagio inécua. A ironia como emblema da época, também aludida pelo pensador fran- cés, talvez possa ser vislumbrada ao final do romance, quando 0 poeta Garcia Madero, em pleno nomadismo no deserto de Sonora, nas tilti- mas entradas do seu diario, depois de alinhar varias sequéncias de luga- tes percortidos, pergunta reiteradamente: “O que ha detrés da janela?” (BOLANO, 2006, p. 622). Talvez esta seja a grande pergunta inerente ao sublime contemporaneo, Ja que vivemos atras de janelas e olhando para elas. A internet é uma in- finita janela, todas as imagens que nos cercam sao grandes janelas e nds, navegantes do cosmo virtual, incansdveis passageiros destas molduras, passamos a vida a interpretar cendrios e a buscar respostas. Garcia Madero, por seu turno, tenta adivinhar por duas vezes. Poderia ser “uma estrela” ou ainda “um lengol estendido”(BOLANO, 2006, p. 622). Poderia também ser “o olhar dos mares com mil coros”, “o silén- cio dos espagos infinitos” ou ainda qualquer outra coisa. Na literatura Digitalizado com CamScanner 85 [ cOMUNIDADES SEM FIM J | sio “barcos bébados” a Aras : . ar ao proprio vazio, a, 0, todos os personagens infinita de Bolafi infinita de oe movendo-se incessantemente pa Outras Palavras aescritura de Os detetives selvagens i dices deste romance polifénico com, em The inoperative community, ci scurso que trabalha a comunicagao, entendida em | dutividade nao produtiva, na passagem de um a outro, em comum dos homens. : Roberto Bolafio, ao comentar lineia em poucas palavras as con “literatura”, na acep¢ao de Nancy, seja, como o dit dinamica de pro pelo compartilhamento do ser alavras do escritor, a0 reconhecer a propria condi. legados da tradicao literaria da modernidade, de interlocutor no interminavel dig. Sao as seguintes as pi Gio de herdeiro de varios /egados bem como a sua inerente situagao logo da comunidade literaria: ‘Assim Os detetives selvagens esta mais ou menos esquecido por mim, Eu posso apenas aventar algumas hipéteses sobre ele. De um lado, eu © vejo, como uma resposta, uma das muitas, a0 Huckleberry Finn; 0 Mississipi de Os detetives selvagens € 0 fluxo de vozes na segunda parte do romance. Ele é também a mais ou menos confidvel transcrigio de um segmento da vida do poeta mexicano Mario Santiago, de quem eu tive a sorte de ser amigo. Nesse sentido, 0 romance tenta refletir uma espécie de derrota geracional e também a alegria de uma geracdo, uma alegria que, em alguns momentos, delineia coragem, e também os limites da coragem. Ei ébvio declarar que eu sou permanentemente devedor das obras de Borges e Cortézar. Eu acredito que ha tantos modos de ler 0 meu romance, quantas vozes existem nele. Ele pode ser lido como um Jamento de morte. Ele também pode ser lido como um jogo (BOLANO, 2004, p. 353), O sentimento da comunidade é deveras marcante na fala de Bolafio, 20 privilegiar, através da literatura, a partilha de vozes distantes, envolvidas na inscrigao de um sentido, “cuja transcendéncia ou resaal a é indef- nidamente e constitutivamente diferida” (NANCY. 2008 P. 80) Nessa linha de compreensio, Os detetives sel i selvage ect va de seu autor quanto na do: gens, tanto na persp' $s personagens que cria, encarna a literatU- Digitalizado com CamScanner CANGELA MARIA DIAS ~ COMUNIDADES A DERIVA ] ra, segundo a abordagem de Nancy, como um campo que nao chega ao fim, no ponto mesmo em que termina: nas bordas do texto. E nao chega ao fim, na medida em que passa do autor para o leitor, ¢ desse leitor para outro leitor ou para outro autor, ou mesmo para outras obras do mesmo autor, ou ainda para outras obras de outros autores (NANCY, 2008, p. 65). Esta cadeia infinita, de certa forma concretiza a inope- rincia de uma produtividade sem producio, alegorizada, no romance pelo que acima foi considerado 0 nomadismo gratuito, a eterna dispo- nibilidade e a fluida legenda dos personagens, a comunidade dispersa dos real-visceralistas, também encatados como uma grande parédia das vanguardas. Ainda na esteira das palavras de Bolafio, o “Mississipi” da segunda par- te do romance, em seu cruzamento de falas, dispostas numa dinamica capaz de desdobrar-se indefinidamente, constitui a imagem alegérica do “comunismo literério” invocado por Nancy, no enlace entre a comu- nidade como “infinita resisténcia a tudo aquilo que poderia engendrar a prépria completude” (NANCY, 2008, p. 80) ea inscric&o desta “infinita resisténcia” pela escritura ou pelo discurso da literatura. Literatura, entao longe do pragmatismo da mera diversio ou de outras mistificag6es, constitui a metafora fiadora da soberana exposiciio a este excesso, inerente 4 incompletude de cada ser finito e singular, em sua incomensurével relagao com o além ou 0 fora de si mesmo. Por isso mesmo, a indeterminagao ¢ 0 nomadismo dos sentidos mobili- zados pelo romance Os detetives selvagens, paradoxalmente endossam e desencorajam a operacio de interpretar que, na acep¢ao de Barthes, nao é dar um sentido (mais ou menos embasado, mais ou menos livre), mas estimar de que plural sao feitos os textos (BARTHES, 1992, p. 39). Digitalizado com CamScanner 87 Referéncias BARTHES, Roland, $/2 Uma anise de Sarrasine de Honoré dei, Trad. Léa Novaes, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1992. BAUDRILLARD, Jean A iso vital, Org Julia Witwer. Trad, Lig Trigo. Rio de Janeiro: Civilizacio Brasileira, 2001. BOLANO, Roberto. Os detetives selvagens. Trad. Eduardo Brandig Sio Paulo, Companhia das Letras, 2006. 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