Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
2017
2
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2017
3
Examinada por:
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2017
4
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, filhos, genro, nora, irmãos, sobrinhos, todos os familiares e
amigos em especial Wallace Lopes, por me incentivar e descobrir outras
possibilidades de leitura do mundo.
Aos Professores Doutores que dedicaram o seu tempo para ler esta Tese e
participar da Banca, em especial ao Professor Doutor Júlio Aldinger Dalloz que
esteve presente desde o inicio da minha caminha nesta instuição de ensino.
asesinos,
en la boca de los niños dormidos.
RESUMO
RESUMEN
ABSTRACT
The core subject of the present doctoral thesis is the analysis of the
relationship between Literature and mass culture. It is centered in the study of the
chapter The crime part, part of the book 2666, by Roberto Bolaño and emphasizes
the aesthetical and structural strategies appropriated by Bolaño from secondary
and B genders, mainly the crime novel. This study aims to understand how the
author uses the structures that form the basis of the crime novel, and also how this
appropriation brings him to restructure his own narrative, proposing a, alternative
way of reading his work from a new aesthetic, a new style and a new voice, all of
which combined are named the ‗infracrime novel‘.
In order to support the construction of this body of thought, a deep dive into
the concepts proposed by several authors and researchers was necessary. Those
texts will dialogue with the Bolaño‘s work in an interdisciplinary and intertextual
approach, bringing together literature, mass culture and the multiple shapes that
crime novel can take. This allows for a more detailed comprehension of the
dialogues between The crime part and several academic fields, such as literature,
cultural studies and sociology. Theoretical inputs from Edgar Morin, Elias Canetti,
John Carey will be used to think and understand mass culture. Works from Slavoj
Žižek and Karl Erik Schollhammer will be used to understand violence. Works by
Ruy Braga and André Singer will help to comprehend employment and under-
employment. To think about Bolaño‘s writing style and literary influences, essays
written by Felipe A. Ríos Baeza, Celina Manzoni, Patricia Poblete Alday and others
will be analyzed. Finally, in order to understand crime novel, noir novel and new
crime novel, works by Mempo Giardinelli and essays complied by Daniel Link will
serve as input and support.
SUMÁRIO
Introdução .......................................................................................................14
Introdução
2
Fragmento do prefácio do livro Los muros de água de José Revueltas.
Disponível em: https://tintaguerrerensedotcom.files.wordpress.com/2015/03/los-muros-de-agua-
jose-revuelta-user16.pdf. Acesso em: 21.01.2017
15
3
Toda vez que for citada a palavra violência ela deve ser entendida como fenômeno social
gerado a partir do ódio, portanto manifestação.
18
―violência mítica ou divina‖ e essa estaria além das duas anteriores, pois ela
aparece de repente, do ―nada‖. Por isso, Žižek abordará conceitos de dois tipos
de violência, a ―simbólica‖ e a ―sistêmica‖.
A primeira (simbólica) é indireta, invisível, ardilosa, perversa e está
ligada à linguagem e suas formas, mas não apenas às formas e nem de como
os discursos são formulados e reproduzidos para uma dominação social, mas
que, sobretudo, está coadunada à linguagem em si e na maneira que as
pessoas a incorporam e agem para camuflar o entendimento desse tipo de
violência, promovendo a imposição de um universo de sentido que mantém, de
certa maneira, a ordem, pois as palavras não são neutras, possuem uma carga
de sentidos e significados que, dependendo da colocação, servem para atacar,
estigmatizar, gerar desconforto. A ―violência simbólica‖ só é efetiva, imediata,
existente e eficaz quando incorporada pelo próprio oprimido, que deve
entender que a violência está sendo praticada para o seu próprio bem. Esse
ser humano oprimido acaba criando mecanismo para suportar esse tipo de
violência, pois se não o criasse, seria difícil continuar vivendo.
A segunda ele chama de ―violência sistêmica‖, aquela que provoca
consequências catastróficas, pois acontece a partir do funcionamento regular
dos sistemas econômicos e políticos. A violência está onde aparentemente não
existe violência e nesse aspecto ela aparece de forma mais brutal, pois
mantém a ordem, cada um no seu lugar e as coisas do jeito que devem ser. A
violência não é somente uma abstração. Ela é um tipo de intervenção brutal
sobre o real, com a finalidade de encobrir certa impotência, mostrando uma
falha daquilo que acontece e onde se pode estar, tornando-se uma reação
diante da impenetrabilidade e da confusão do capital global que empurra o ser
humano a violar certas normas elementares de convivência.4
A violência, como tema, provoca um entendimento da mesma ser vista
como mercadoria e entretenimento, pode-se pensar o auge da violência como
lazer, esse apogeu está presente nos jogos de estratégias, nos vídeo games,
nos filmes e, inclusive, na literatura com a propagação dos romances com
trama policial.
4
Taxi Driver, Slavoj Žižek y la violencia.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Ocysa_cYtr4
Acesso em: 08.03.2016.
19
5
Empresas de montagem e acabamento de produtos para exportação, instaladas em território
mexicano. A grande maioria é norte-americana. Elas trazem peças e componentes, que foram
fabricados em outros países, para montar os produtos no México. Principalmente
eletroeletrônicos, peças de automóveis e têxteis. Pagam menos impostos que as empresas
mexicanas, utilizam uma força de trabalho muito barata e possuem regulamentações
ambientais que nunca são cumpridas.
20
pois quanto mais detalhes o narrador dá dos crimes, mais repleto de teor e de
crítica fica o discurso, porque, nesse caso, a exaustão leva à reflexão.
Será possível que Roberto Bolaño, utilizando a base de construção do
romance policial tradicional e toda influência recebida das suas leituras de
Jorge Luís Borges, consegue reordenar, reestruturar e reescrever de uma
maneira tão singular que possa propor uma nova variante do gênero?
Roberto Bolaño, no momento em que mergulha na forma e na estrutura
do romance policial, penetra nas reais tensões da realidade, a problematiza e
relativiza o caráter das variantes pertencentes ao gênero romance policial. A
partir dessa imersão, dessa caída vertical, dessa possibilidade de
desconstrução, emerge a possibilidade de outro tipo de narrativa, que pode
também ser sentida como periférica e de fronteira e mais elaborada para tratar
das questões atuais.
A hipótese que norteará este estudo será a de tentar demonstrar,
através da análise de La parte de los crímenes, da obra 2666 de Roberto
Bolaño, que o autor talvez já aponte, a partir do romance policial clássico, como
leitura de entretenimento, a possibilidade de outra maneira de escrever o
gênero, entendido como infrapolicial, pois as escolhas dos temas, da trama, da
estética de sua prosa, da linguagem empregada e da configuração dos
personagens seguem por outro caminho. Um caminho que ele aprofunda e
reafirma: que o romance policial, na América Latina, deve ser lido com
características infrarrealistas. Esse aspecto pode ser observado já na escolha
dos títulos dos seus livros anteriores que refletem a retomada e a sua
proximidade com o Movimento Infrarrealista: Consejos de um discípulo de
Morrison a um fanático de Joyce, livro escrito, em 1984, com Antonio García
Porta, cujo título é uma paráfrase de um poema de Mario Santiago
Papasquiaro, intitulado Consejos de un discípulo de Marx a un fanático de
Heidegger6. Outros títulos de livros ratificam essa modificação: Putas Asesinas;
Una novelita Lumpen; Los detectives salvajes e Llamadas telefónicas.
Desse modo, existe a premissa de entender que autor escolhe
escrever, sob uma nova estrutura, para dialogar melhor com qualquer tipo de
público, dessacralizando o que é considerado ―alta literatura‖, tradição literária,
6
Ver poema - ANEXO I (p.196-201)
22
Locomotoras, gritos,
arsenales, telégrafos.
El amor y la vida
son hoy sindicalistas,
8
y todo se dilata en círculos concéntricos.
8
Poema Prisma de Manuel Maples Arce, um dos fundadores do movimento estridentista
mexicano que influenciou as ideias do movimento infrarrealista. Disponível em:
http://www.poemas-del-alma.com/manuel-maples-arce-prisma.htm. Acesso em: 03.01.2017
28
9
Fragmento do Manisfesto Infrarrealista, Déjenlo todo, nuevamente, escrito, em 1976, por
Roberto Bolaño. Retirado do livro: Nada utópico nos es ajeno. México: Tsunun, 2013, p.51-62
Disponível em: https://tsunun.files.wordpress.com/2013/05/nada-utc3b3pico-nos-es-ajeno-
manifiestos-infrarrealistas1.pdf. Acesso em: 19.01.2017.
29
10
Ver anexo II. (p.202-218) Texto disponível em:
https://cuentoshistoriasdelmundo.blogspot.com.br/2014/11/la-infra-del-dragon-georgij-
gurevic.html. Acesso em: 03.01.17
30
Nesse fragmento já fica estabelecido que para ler 2666, assim como
para ler Benno von Archimboldi, é preciso um olhar mais astuto e audaz, muito
mais cuidadoso, prestando atenção nas pistas que possam levar a uma nova
forma de narrar, em direção a uma nova variante do gênero. Uma forma de
narrar que não despreza nenhum elemento, que retoma formas, ideias,
características e conceitos apresentados por autores dos movimentos artísticos
do inicio do século XX, quando a arte deixa de ser pensada em nicho e começa
32
a ser pensada para ser vista em qualquer lugar, onde arte pode ser tudo e
estar em todos os espaços.
intelectual, onde um dos focos era uma mudança real que incidisse na vida das
pessoas. Pode-se dizer que, nestes aspectos, os infrarrealistas receberam a
influência, tomaram e ressignificaram as ideias estridentes do grupo. Vale
resaltar que no grupo de estridentistas também havia pintores, artistas
plásticos, que juntos pensaram uma das mais produtivas obsessões estéticas:
criar uma metáfora de uma grande metrópole moderna que foi denominada
Estridentópolis (PRIETO GONZÁLEZ, 2012).
Entretanto, por estarem mais perto em termos de realidade temporal,
foi a Geração Beat que talvez tenha influenciado mais o grupo infrarrealista,
pois eles viam naquela geração uma espécie de espelho, queriam montar
também sua gangue transviada, rebelde, marginal e, assim como eles,
buscavam extravagância, entusiasmo e uma vida sob a intempérie, a
experiência das ruas, dos becos, dos bares e dos cantos lúgubres das cidades.
O espírito que Bolaño e seu amigo Mario Santiago Papasquiaro buscavam nos
jovens, para compor o grupo, era igual ao que apregoava Jack Kerouac no seu
romance En el camino:
la única gente que me interesa es la que está loca, la gente que está
loca por vivir, loca por hablar, loca por salvarse, con ganas de todo al
mismo tiempo, la gente que nunca bosteza ni habla de [con] lugares
comunes, sino que arde, arde como fabuloso cohetes amarillos
explotando igual que arañas entre las estrellas y entonces se ve
estallar una luz y todo el mundo suelta un ‗¡Ahhh!‘ (KEROUAC, 2005,
p. 16)
11
Fragmento do Manisfesto Infrarrealista, Por un arte de vitalidad sin límites, escrito, por José
Vicente Anaya. Retirado do livro: Nada utópico nos es ajeno. México: Tsunun, 2013, p. 44
Disponível em: https://tsunun.files.wordpress.com/2013/05/nada-utc3b3pico-nos-es-ajeno-
manifiestos-infrarrealistas1.pdf. Acesso em: 27.05.2014.
35
12
Pode-se pensar que, não foi à toa que Bolaño escolheu Hans Reiter como nome verdadeiro
de Benno von Archimboldi, pois esse nome é muito parecido e é quase uma referência direta
ao pintor e cineasta Hans Richter que transpôs para seus filmes a estética absurda e
37
experimental dos movimentos vanguardistas, entre elas a dadaísta, que reagiu aos
despropósitos da primeira guerra mundial.
38
13
Partido Revolucionário Liberal, um dos principais partidos do México.
40
14
Ver poema - Anexo III (p.219-222)
43
15
Ver poema de Mario Santiago – Anexo IV (p.223-226)
44
16
Programa Off The Record Cultural.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=qNhTTqu5Vsw Acesso em: 20.01.2017
45
E o segundo que define como ―el bando opuesto, es decir el del poder‖,
que segundo Fishelov é o grupo que traz as tendências críticas como a teoria
marxista (em particular Lukács, Trotsky, Fredric Jameson, Terry Eagleton).
Ainda que essas duas tendências, a da beleza e a do poder, são distintas entre
si, essa colocação serve para definir a partir de onde o cânone foi estruturado,
com uma predominância eurocêntrica, deixando de fora muitos autores que
têm uma proposta literária descentralizada, à margem do campo literário atual,
ou de autores, cuja produção literária mistura gêneros entendidos como
pertencentes à cultura de massa, como no caso desse estudo, o gênero
policial. Talvez o desenho dessa composição precise ser equânime, propondo
uma dissolução do que é denominado como literatura canônica e literatura de
massa, o que pode começar a desenhar uma nova proposta de cânone.
A construção, bem como a divulgação de um cânone literário, seja no
contexto das literaturas nacionais ou universais, ainda provoca, nos dias de
hoje, muitos debates, pois passa pelo entendimento de que representa algo
elitista, ligado ao mais exímio da literatura ou de uma cultura e da imortalidade
dos autores. Esses aspectos constituem o prestígio de um país como nação
cultural, dizendo que uma nação só tem cultura a partir de um cânone
estabelecido nas e pelas elites que a formam, deixando de lado os que estão e
configuram outros espaços.
Argumenta-se que o cânone, no âmbito das literaturas nacionais,
contribui ou serve para a construção das identidades nacionais e está
relacionado com aspectos de poder cultural institucional, que ajudam a definir
os valores de uma nação, de um continente ou de uma cultura determinada. Os
autores e as obras que incorporam o cânone formam a cúspide da cultura,
enquanto os que ficam excluídos fazem parte de um grupo de segunda
categoria, que não pode nem tentar chegar ao patamar de reconhecimento.
Os debates acirrados e todos os conceitos sobre cânone, levantados
por estudiosos, trataram sempre da construção de paradigmas e da imposição
de um determinado conceito de literatura, isto é, da canônica. O que deixa
transparecer que o cânone literário está ao mesmo tempo relacionado com as
diversas escolas literárias e estéticas (barroco, romantismo, realismo,
surrealismo, expressionismo, realismo mágico), e com as teorias literárias, tais
como o formalismo russo, o estruturalismo, a estética da recepção, etc.
49
meramente literário. A sua estética está marcada não só pela escrita, mas por
toda a metáfora de ruptura e alegoria que contém.
A tradição ou o cânone de Bolaño é produto de prazer, portanto
arbitrário, não parte do que está estabelecido, não equivale ao cânone geral,
dito como universal ou de todos, mas sim da sua biblioteca particular, singular
e única, trazendo também aqueles que negaram a tradição literária, embora,
hoje, façam parte dela. Bolaño revela de onde partem suas eleições e como se
consolida determinado cânone, no caso o argentino. O autor escreve no seu
ensaio Derivas de la pesada:
O autor acredita que existe uma lacuna, defendida por ele como um
pesadelo, uma rua sem saída, um cenário a ser montado. Diz que na literatura
argentina existem três linhas, mas que não se aproximam ao bloco de autores
da estirpe de Borges. Autores anti-borgenianos que representam um
retrocesso, pois, são conservadores. Entretanto, ele não nega a força e a boa
escrita desses autores.
Na primeira linha aparece Osvaldo Soriano; na segunda, Roberto Arlt e
Ricardo Piglia e na terceira, que ele denomina como secreta, aparecem
Osvaldo Lamborghini e Cesar Aria. Bolaño não os considera assim tão ruins,
escrevem livros de fácil acesso ao público e que até podem ganhar dinheiro
com isso, mas perdem em originalidade, nenhum deles é tão original quanto os
mencionados anteriormente. Faz uma crítica pesada a Lamborghini e afirma
que ―Piglia me parece un de los mejores narradores actuales de Latinoamérica.
Lo que pasa es que se me hace difícil soportar el desvarío gangsteril, de la
pesada- que Piglia teje alrededor de Arlt, probablemente lo único inocente en
este asunto.‖ (BOLAÑO, 2009, p. 27).
52
17
Aqui, estrutura = quadro definido de categorias; relações formais, estratégias, modelos,
sistema, características que não podiam ser modidificadas. Mas que em Bolaño, são
modificadas, pois de cada gênero narrativo ele traz a base, redefine e apresenta outro quadro
de categorias, outras relações, estratégia, modelo, sistema e características.
53
[…] era la única lectura posible para mí, la única lectura que me podía
distanciar efectivamente de una vida hasta entonces desmesurada, y
la única lectura que me podía hacer reflexionar, porque en la
naturaleza de la poesía borgeana hay inteligencia y también valentía
y desesperanza, es decir lo único que incita a la reflexión y que
mantiene vive a una poesía. (BOLAÑO, 2009, p. 185)
entre outros. Estas listas podem revelar como Bolaño percebia o cânone, não
só o latino-americano mas também o europeu, e o que esperava desses
autores, talvez uma literatura dentro da literatura, compartilhando um tema ou
uma forma comum de fazê-la. Especificamente, sobre Pedro Lemebel,
escreveu:
Pedro Lemebel, autor de vários livros, entre eles Tengo miedo Torero,
é um dos escritores que está inserido na abundante produção em torno da
ditadura militar, das violações dos direitos humanos. Sua produção, muitas
vezes pensada, durante os anos de 1990, quando o Chile vivia o momento de
democracia neoliberal. A geração dos anos de 1980, da qual Bolaño fazia parte
em termos etários e formativos, soube muito bem como processar as
demandas literárias, principalmente as que envolviam o dilema de enfrentar
uma continua exposição artística em torno das violações cometidas em relação
aos direitos humanos.
Bolaño tinha muito apreço pelas narrativas de Pedro Lemebel, segundo
ele, um dos escritores mais brilhantes, o melhor poeta da sua geração, ainda
que não escrevesse poesia. Lemebel foi dos poucos escritores que não
buscavam apenas respeitabilidade, mas a liberdade. Ninguém chegou mais
fundo que Lemebel no que se refere ao debate do papel social da arte.
Lemebel, tanto nas suas obras, como nas suas performances artísticas,
mostrava, ao mesmo tempo, doçura e uma sensação de fim de mundo, aliada a
um ressentimento feroz. Bolaño reconhecia em Lemebel o espírito indomável
de seu amigo, o poeta mexicano Mario Santiago Papasquiaro. Lemebel foi
valente e soube abrir os olhos na escuridão, dentro de territórios em que
ninguém se atreveu a entrar. Não foi o primeiro homossexual dentro do
Parnaso chileno, mas foi o primeiro travesti que apareceu no cenário, sozinho,
iluminado por todos os holofotes e que falou ante um público literalmente
estupefato:
57
Jorge Volpi afirmou em seu artigo Bolaño, epidemia (2008a) que todos
os escritores jovens latino-americanos, com 38 anos, tinham um ponto e um
vínculo em comum: todos se orgulhavam dele, todos o admiravam, todos eram
Bolaño. Para Bolaño pareceria estranha essa admiração, porque o mais
curioso era que quem tinha mais de 39 anos, com exceção de Fresán, Gamboa
e Paz Soldán, no geral, não admirava Bolaño ou o admirava com ressalvas.
Nesta época, onde as fronteiras geracionais não tem importância, que
desconfia das classificações dos livros, dos manuais acadêmicos, dos críticos
aduladores, que renega o cânone, resulta que os escritores com menos de 40
anos idolatram Bolaño. Diante de um fenômeno que se aproxima ao
paranormal e com inegáveis pinceladas de culto, cabe a pergunta, por quê?
Volpi respondeu dizendo que, para ele, Roberto Bolaño publicou três
―obras maestras‖: Estrella distante, Los detectives salvajes e Nocturno de Chile
que culminaram em seu romance póstumo, 2666. Nessas obras pode-se
encontrar o melhor que foi escrito sobre e na América Latina. Bolaño foi aquele
quem criou uma obra ampla, rica e variada, na qual cada escritor, crítico e leitor
podem encontrar algo novo, que estremeça, pois Bolaño escreveu em um estilo
cheio de acumulações, de polissíndetos, de orações coordenadas e
subordinadas caóticas, um estilo tão fácil de admirar e imitar e, ainda assim,
difícil.
Os amantes das histórias, os defensores da aventura, os que são
obsessivos pela trama, ficam fascinados pelos seus relatos circulares e um
tanto oníricos, cheios de detalhes imprevistos, de digressões e vivências em
outros mundos, de incursões paralelas, cheios, inclusive, de uma espécie de
suspense que ultrapassa a estrutura clássica do romance policial.
Uma parte reduzida e cada vez mais poderosa que faz parte da seita
de adoradores dos livros que falam sobre outros livros, os apreciadores da
literatura e da metaliteratura de Vila-Matas e Piglia, também encontram em
Bolaño uma boa dose de citações, de dissimuladas referências literárias, de
59
18
Ver Conto - Anexo V (p.227-234)
19
Ver fragmento do ensaio - Anexo VI (p.235-237)
20
Destaque meu a frase em itálico.
60
rejeição aos escritores que fizeram parte deste movimento literário. Bolaño
ratificou e esclareceu tal percepção dizendo que
Para que os leitores dessa tese não se sintam perdidos e que possam
entender melhor o que está sendo analisado, um breve resumo do livro é
necessário.
Pode-se dizer que 2666 além de ser, assim como toda obra escrita por
Bolaño, um complemento do Manifesto Infrarrealista Déjenlo todo, nuevamente,
é também um romance póstumo, com uma característica abismal, no sentido
de não terminar e de ser fragmentado, fugindo do aspecto tradicional do
romance, pois está dividido em cinco partes (que podem ser lidas como livros
autônomos) que se relacionam entre si. La parte de los críticos, La parte de
21
POBLETE ALDAY, Patricia. Bolaño: outra vuelta de tuerca. Santiago de Chile: Universidad
Academia de Humanismo Cristiano. 2010, p. 10
64
22
Artigo disponível em: : http://www.letraslibres.com/mexico/la-literatura-y-el-mal
Acesso em: 29.01.2017.
66
que esta, muitas vezes, se exibe precária e nada autêntica, essa tese segue e
entra no capítulo, onde serão discutidos e analisados os gêneros que surgem a
partir romance policial.
70
23
―Infra‖: o uso desse prefixo para compor a palavra infrapolicial, surgiu a partir de
ideias/conceitos apresentados por Roberto Bolaño, no seu Manifesto Infrarrealista: ―Vamos a
meternos de cabeza en todas las trabas humanas de modo tal que las cosas empiecen a
moverse dentro de uno mismo, una visión alucinante del hombre.[...] La muerte del cisne, […]
el último canto del cisne negro, NO ESTÀN en el Bolshoi sino en el dolor y la belleza
insoportables de las calles. Hacer aparecer las nuevas sensaciones – Subvertir la
cotidianeidad.‖ (BOLAÑO, 2013, p. 54, 61 e 62), Portanto, toda vez que aparecer o termo como
proposta de variante de gênero, foi pensado e analisado a partir do que foi exposto aqui,
entrar com tudo, uma caída vertical dentro dos esconderijos que o ser huamano traz consigo e
não são desvendados.
24
BOLAÑO, Roberto. La Universidade Desconocida. Barcelona: Editorial Anagrama S.A.,
Narrativas hispánicas, 2007, p. 340.
25
Fragmento do livro: DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Tradução: Estela dos
Santos Abreu. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997, p. 13.
71
negro, que será tratado como novela negra, nomenclatura usada na América
Latina, e a recente categoria: romance criminal que nesse estudo será
denominado como neopolicial latino-americano, uma variante que será
analisada e pensada como fronteira. Embora essa última categoria tenha
recebido várias denominações, essa foi a escolhida, pois abarca vários
conceitos que culminarão na proposta final desta tese, a de apresentar o
romance infrapolicial como sendo mais uma categoria do gênero, pensada
nessa tese, como a que pode dar conta de aspectos complexos que giram em
torno das questões relativas ao homem, da política e da economia, além das
discussões literárias, entre elas, as propostas que despontam a partir da escrita
de Roberto Bolaño.
Os conceitos, pensamentos e reflexões, que serão utilizados neste
capítulo, são resultado do trabalho teórico de estudiosos que analisam a
sociedade atual, como Guy Debord, Edgar Morin, Siegfried Kracauer, entre
outros, que ajudarão a pensar parte da obra 2666. Além dos autores já
mencionados, que abordam temas como a cultura de massa, o espetáculo, a
cotidianidade, também se realizará o diálogo com pensadores que escreveram
sobre o romance polical; nesse rol encontram-se Tzvetan Todorov, Mempo
Giardinelli, Enrique Rodrigues-Moura e Walter Benjamin.
Antes de apresentar o gênero em si e suas variante, faz-se necessário
uma reflexão introdutória que servirá para que seja entendia a sociedade que
está sendo abordada pelo autor.
A partir das últimas décadas do século XX, por várias razões e com
variações de país para país, o período de relativa ―calmaria‖ vai-se
extinguindo [...] a criminalidade ―ordinária‖, sem motivação política ou
religiosa direta, vai-se intensificando nas cidades de vários países, a
ponto de um novo vocabulário começar a dar o tom dos novos
tempos ―banalização da morte‖, cultura da violência. (SOUZA, 2008,
p. 39)
[...] se antes se situavam fora, como turbas que ameaçavam com sua
barbárie a ―sociedade‖, as massas se encontram agora dentro:
dissolvendo o tecido das relações de poder, erodindo a cultura,
dissolvendo a velha ordem. Estão se transformando de horda
gregária e informe em multidão urbana. (TOCQUEVILLE apud
MARTÍN-BARBERO, 2008, p.53)
26
Resposta concedida a Mónica Maristain, quando perguntado sobre o que seria se não fosse
escritor. In: BRAITHWAITE, Andrés. Bolaño por sí mismo: entrevistas escogidas. Chile:
Ediciones Universidad Diego Portales, 2006, p. 80.
83
27
Disponível em: https://pt.scribd.com/doc/178254087/Teoria-Da-Literatura-Aguiar-e-Silva
Acesso em: 20.09.2016
84
28
Revista de péssima qualidade, impressão com muitos defeitos, erros e uma apresentação
sensacionalista, de baixo custo que consegue, por todas essas características, ser distribuída
por todo pais e é lida por um considerável número de leitores. O leitor não precisa pensar, pois
ela foi elaborada com a intenção de ser apenas um entretenimento, se distanciando assim, do
que é considerado cânone. (HERRERA, 2008, p.61-74). Para saber mais sobre as revistas
pulps de todos os gêneros só acessar o link Disponível em:
https://get.google.com/albumarchive/115487903311841341778?source=pwa.
Acesso em: 09.10.16. Mais sobre o assunto – Anexo VII (p.238-245)
29
Programa transmitido pela Radio Nacional do Rio de Janeiro. O link que segue traz uma
história interessante. O detetive da história, Inspetor Santos, surge nesse episódio como um
detetive que aparece nos programas de rádio e que os personagens ouvem um determinado
momento um desses personagens diz ao inspetor encarregado (no caso ele mesmo) que
deveriam convidar o Inspetor Santos para desvendar o crime.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=24IyLmQl6x4. Acesso em 09.10.2016
86
Neste ponto, existe uma diferença no romance escrito por Bolaño, que
está preocupado em mostrar a cumplicidade estabelecida entre território e
crime, onde aparece um cruzamento de informações e indícios que são
comuns dentro de uma sociedade anômica envolta pela nuvem capitalista.
Poderia dizer que esta é uma das características do romance infrapolicial, que
será visto mais adiante. Roberto Bolaño não conta uma segunda história,
sempre conta a primeira e a reforça quando apresenta múltiplos casos de
mulheres assassinadas. Dentro dessa estrutura, a história ausente (a dos
crimes) é ou foi entendida como real e a segunda, no caso as segundas (que
não passam nem de perto pela investigação) têm um peso ora menor, ora
equivalente, poderia dizer, dependendo do relato, mais ou menos significantes.
Ora a presença, ora a ausência explicam a existência das duas na
continuidade do relato. Um relato incompleto, pois a memória do texto está
dentro de um emaranhado, dentro de vários nós de dados impossíveis e
improváveis que não se desfazem.
Em La parte de los crímenes, a ausência, as descrições dos crimes,
estão presentes nos territórios periféricos, nos desertos, nos lixões, nos
terrenos baldios e também servem como um aspecto a mais na composição
estrutural do relato infrapolicial, pois existe uma explicação do narrador sobre o
fato acontecido, que se dá através de descrições e jogos temporais, e o teor
88
das informações que chegam é determinado pelo modo de como os fatos são
apresentados, nesse caso, uma apresentação fria, crua, cruel e muito violenta,
na qual somente sobrevive a narração como força dinâmica em movimento
com a finalidade de denúncia. Transcreve-se para exemplificar essa
característica:
30
Os trechos em negrito destacados por mim para enfatizar o argumento apresentado
90
Neste capítulo aparece uma jornalista, (que substitui outro que tinha sido
assassinado, supostamente Sergio González Rodríguez) que vai entrevistar o
suposto assassino das mulheres, Klaus Haas.
Quando existe essa divisão entre crimes que podem ser contados e
outros não, conferindo à palavra o poder de narrar, essa já é uma pista para o
leitor, que encontrará no capítulo seguinte, as centenas de mulheres
assassinadas na cidade de Santa Teresa. Estes assassinatos, quando
contados, apresentados através da palavra, narrados à exaustão, são
colocados assim de modo proposital, como uma forma de denunciar a violência
que já vem desde séculos anteriores e que apenas se repete e aparece cada
vez mais descrita, porque os corpos das mortas, no caso da obra, resolvem
ultrapassar a fronteira física e simbólica dos extramuros da sociedade e são
despejados em lugares inóspitos, mostrando que o cemitério atual não é mais
um lugar privado, mas a própria cidade.
sobre o caso que está investigando. Para conseguir levar isso tudo adiante ele
faz uso de técnicas científicas como a física, a química, geologia, etc.
O método dedutivo parte do geral para o particular, do macro para o
micro, utilizando os princípios percebidos como verdadeiros e indiscutíveis,
permitindo a quem investiga chegar a uma conclusão puramente formal e
lógica (a lógica, para Aristóteles é a mãe da dedução). O método dedutivo
também aparece no pensamento racional dos enciclopedistas.
Geralmente, os detetives são celibatários, solitários, sem tempo para
romances; aliás, esse tema, o do amor, as intrigas amorosas envolvendo
detetives, não aparece nesse tipo de romance, para não desviar a atenção do
leitor da questão principal, o enigma que deve ser desvendado. O enigma se
encontra em uma esfera intelectual e o amor desviaria o foco do detetive que
não pode misturar razão com emoção. A fala de Watson, no livro, As aventuras
de Sherlock Holmes, ilustra a impossibilidade de um detetive ter um
relacionamento amoroso:
31
Fragmento retirado do livro virtual: Sherlock Holmes: edição completa do maior detetive de
todos os tempos. Disponível em:
http://cabana-on.com/Ler/wp-content/uploads/2013/07/Sherlock-Holmes-Arthur-Conan-Doyle-
Obra-Completa.pdf. Acesso em: 18.10.2016
32
RIEDEL, Dirce Côrtes. Reflexões sobre o romance policial. Revista Matraga, nº4-5. UFRJ,
1988, p.16. Disponível em:
http://www.pgletras.uerj.br/matraga/matraga04_05/matraga4e5a02.pdf
Acesso: 20.09.2016
92
brutal que acontece em torno dos fatos. Em uma conversa sua com Watson,
Holmes revela:
34
Fragmento retirado do livro virtual: Sherlock Holmes: edição completa do maior detetive de
todos os tempos.
Disponível em: http://cabana-on.com/Ler/wp-content/uploads/2013/07/Sherlock-Holmes-Arthur-
Conan-Doyle-Obra-Completa.pdf.
Acesso em: 18.10.2016
94
35
Latin American Detective Fiction Writers: A Bio-bibliographical Sourcebook. Darrel B.
Lockhart, editor. Prólogo/Introducción por Mempo Giardinelli. La novela negra en La America
Hispana.
Disponível em: http://pt.scribd.com/doc/153934394/La-Novela-Negra-en-La-America-Hispana.
Acesso em: 15.06.2014
99
havia textos com valor literário. Essas colocações são sempre feitas em
comparação ao que era entendido e definido como literatura pelos críticos.
De acordo com sua origem temporal e espacial, no seu inicio, a novela
negra costuma trazer como protagonistas gângster e detetives que se situavam
no contexto da Grande Depressão Americana e da lei seca, os quais
transitavam por um ambiente urbano, geralmente obscuro e sórdido, onde
reinava a violência.
A novela negra é uma espécie de continuidade do gênero western que
traz uma transformação, usa bases dos romances policiais clássicos, mas
deixando de ser apenas uma narrativa de entretenimento mediante enigmas
dentro de um espaço fechado e salta para uma novelística que transcende e
chega ao mundo externo, às ruas das cidades, ao mundo onde se vive mais
perto do real, cuja violência já não está separada do sistema, pois as relações
humanas, em si, já conformam uma forma de violência, uma expressão de
poder e submissão que implicam em violência. Portanto a cidade, nesse tipo
de romance, aparece mais sombria e também mais violenta, além de constituir
um espaço importante para a trama.
Os primeiros trechos de Cosecha Roja apresentam uma cidade que já
tem um apelido, Poisonville, que ajuda a entender como era o clima que
envolvia a cidade, a vila do veneno, algo lúgubre, sem identidade, povoada de
personagens com aparência degradante:
Fui al hotel Great Western, dejé allí las maletas, y me fui a dar un
vistazo a la ciudad. La encontré fea. Los edificios hacían gala de una
arquitectura afectada. Quizá había conocido tiempos mejores. Los
altos hornos, con sus chimeneas de ladrillo levantadas al sur frente a
una sombría montaña, habían impregnado la antigua pomposidad de
una capa de suciedad ocre y de un humo espeso. En consecuencia,
sus cuarenta mil habitantes vivían en una ciudad fea, hundida en un
valle limitado por dos insípidos montes; las minas contribuían en gran
manera a la fealdad general. Perdido entre las nubes negras que
salían de las chimeneas de los altos hornos, se veía el cielo. El primer
guardia que vi llevaba varios días sin afeitarse. El segundo había
perdido dos botones de su poco limpio uniforme. El tercero ordenaba
el tráfico en el cruce más importante de la ciudad, el de Broadway y
Union Street, con un cigarrillo en la boca. En ese momento dejé de
36
preocuparme por ellos. (HAMMETT, p.3)
36
Trecho retirado do livro digital. HAMMETT, Dashiell. Cosecha Roja. Disponível em:
http://www.edu.mec.gub.uy/biblioteca_digital/libros/h/Hammett,%20Dashiell%20-
%20Cosecha%20Roja.pdf. Acesso em: 11.10.2016
101
Es fácil abusar del estilo realista: por prisa, por falta de conciencia,
por incapacidad para franquear el abismo que se abre entre lo que a
un escritor le gustaría poder decir y lo que en verdad sabe decir. Es
fácil falsificarlo; la brutalidad no es fuerza, la ligereza no es ingenio, y
esa manera de escribir nerviosa, al-borde-de-la-silla, puede resultar
tan aburrida como la manera vulgar; los enredos con las rubias
promiscuas pueden ser muy fatigosos cuando los describe un joven
gotoso que no tiene en la cabeza otro objetivo que describir un
enredo con rubias promiscuas. Y se ha hecho tanto de esto, que
cuando un personaje de una narración de detectives dice Yeah, el
37
autor es automáticamente un imitador de Hammett.
Além disso, ele afirmava que a novela negra não era um mero jogo de
dedução, mas uma maneira crua, brutal de contemplar a sociedade e seu
37
Trecho retirado do fragmento digital: CHANDLER, Raymond. El simple arte de matar.
Disponível em:
http://mimosa.pntic.mec.es/~sferna18/EJERCICIOS/2010-11/El_simple_arte_de_matar.pdf
Acesso em: 17.10.2016
102
38
Ver apontamentos – Anexo VIII (p.246-250)
103
[...] las narrativas ponen las armas detectoras del Estado moderno a
servicio del desvelamiento de la propia criminalidad de ese mismo
Estado y/o de aquellos más beneficiados y respetados por él: político,
hombres de negocios, respetables profesionales, etc. El resultado es
una experiencia lectora muy rica, pues en su fruición se aúnan en
primer término la satisfacción de un deseo de saber que se inaugura
con el planteamiento del misterio –a diferencia de la realidad en la
que pocas veces conocemos las respuestas a nuestras preguntas,
sobre todos si son de naturaleza social o política- ; en segundo
término, una trama de acción y aventura abierta al consumo masivo
[…] la narrativa negra […] en sintonía con un público, que además de
entretenerse, busca claves críticas para navegar una sociedad
conducida del desencanto al paro y a la euforia consumista, sin
detenerse nunca para efectuar una reflexión crítica. (BALIBREA,
2002, p. 117).
O detetive remunerado
39
Site da Semana de La Novela Negra de Gijón: http://www.semananegra.org/index.html
Acesso em:13.10.2016
105
40
Trecho retirado do fragmento digital: CHANDLER, Raymond. El simple arte de matar.
Disponível em:
http://mimosa.pntic.mec.es/~sferna18/EJERCICIOS/2010-11/El_simple_arte_de_matar.pdf
Acesso em: 17.10.2016
106
[...] y no solo del género negro. Hoy puede asegurar que no hay
escritor latinoamericano contemporáneo que, en su juventud, no haya
sido fanático o frecuentador habitual de esta literatura. Y eso ha
dejado su huella más allá de que cada uno/una luego se haya
inclinado hacia otros géneros. Lo indudable es que buena parte de la
formación literaria de casi todos los autores de boom y de los que
vinieron luego fue la novela negra norteamericana. (GIARDINELLI,
2013, p.220)
Este novo modelo de gênero trata o crime sob outro prisma, pois se
depara com a dialética: crime versus lei. Além disso, apresenta um criminoso,
cujo papel é o de perturbar a ordem estabelecida e denunciar, mesmo que de
uma maneira nada convencional, as imperfeições da sociedade que cada vez
se torna mais abismal, aumentando a fenda que há entre as classes sociais.
A proximidade, cada vez maior, dessa variante do romance ao
jornalismo acontece porque, atualmente, o jornalismo investigativo contribui
para que se possa entender o romance neopolicial latino-americano como um
espaço de denúncia, ultrapassando o lugar de entretenimento. A sociedade
precisa de respostas imediatas para as questões que envolvam a
precariedade, a violência, o abandono, o descrédito, a corrupção, etc., mas,
nem sempre, o jornalismo de investigação apresenta todas as respostas
necessárias, até porque sofre censura, e é nessa lacuna que crescem os
romances e os autores neopoliciais, que já contam com um público fiel.
Esse público consumidor, além de ter necessidade de conhecer o que
acontece, aposta nessa leitura, porque ela traz algumas características
relevantes para serem lidas dentro de uma sociedade dinâmica, que não pode
perder tempo que são: síntese; clareza; concisão; rapidez; foco; linguagem
acessível, entre outras, se assemelhando às crônicas jornalistas criminais. Um
fragmento do romance Consejos de un discípulo de Morrison a um fanático de
Joyce, de Roberto Bolaño, cujo foco narrativo é desde a perspectiva do
criminoso, serve como ilustração:
113
um mundo, em que cada vez parece mais difícil delimitar aquilo que se escreve
com o plano de experiência do individuo), chegando à geração dos escritores
do boom latino-americano. Influências à parte, seu projeto pode ser lido e/ou
analisado como original, na medida em que aparece como escrita de final de
ciclo, uma ponte entre dois séculos.
A obra de Bolaño fecha o século XX e abre o século XXI, já que a
maioria de seus livros foi escrita nesse período. Mas por que Bolaño e não
outro, já que havia outros no cenário e com muito mais visibilidade? Talvez a
resposta a essa pergunta esteja no fato de Bolaño, não só criar um grandioso
projeto literário, mas o de apresentar aos leitores uma nova vertente do
romance policial, o romance infrapolicial.
O romance infrapolicial como uma variante do gênero, ajuda a instaurar
uma paranoia de sentido que caracteriza a época atual, considerando o
comportamento, os gestos, as posturas corporais, as palavras pronunciadas,
as que ainda não foram ditas e as que se apresentam inseridas na trama
cotidiana como parte da paranoia. Se os romances neopoliciais latino-
americanos, dos últimos tempos, tratam o crime dentro de um ambiente de
ausência ou degradação da lei, como se o conjunto de leis não fosse mais
capaz de criminalizar o réu, os romances infrapoliciais extrapolam, ultrapassam
o ambiente da degradação social coletiva e da deterioração do individuo,
apresentando o que está nas camadas mais infras tanto dentro da sociedade,
assim como dento do abismo mais interno do ser humano ou ainda dentro da
transcendência do entendimento do que é ser humano.
Bolaño escreveu um texto, no qual uma das funções é o intercambio
fluido entre tradição e renovação que pode dar conta de algumas questões
polêmicas do cenário global. O autor constrói, de modo proposital, uma
narrativa da ficção sobre a ficção ou que oscila entre realidade e ficção
assumida de maneira infrarrealista (visceral) como realidade, onde coloca em
cheque, todo o tempo, o conceito de ética. Usa de uma estética ―absurda‖ (no
sentido de não ter regra, ou destituída de racionalidade) para denunciar a falta
de ética que assola a sociedade atual, principalmente a que vive na fronteira do
norte do México. Outra função é lançar mão da palavra e, a partir dela, propor
uma nova forma de narrativa, com o intuito de mergulhar no mais profundo do
116
42
Do verbo sublimar: que pode ser captado pela mente sem que se tenha consciência.
120
mesmo, olha para si, trazendo à tona essa proposta inovadora do autor, de
montar um romance com aspectos originais. Embora alguns outros autores
tenham ousado no modo de narrar, tais como: Julio Cortázar e Jorge Luís
Borges, Bolaño desconstrói e reorganiza, readapta, reestrutura, repagina a
partir das leituras desses autores e cria sua maneira, tentando ser diferente.
Uns dos aspectos que ele tenta inovar são os relacionados à criação de
personagens/narradores inválidos, incapazes de levar até o leitor informações
necessárias para resolução do mistério (no caso, os crimes).
A ordem de estrutura do romance infrapolicial traz o que é mais
inconsciente e que pode parecer inconsistente dentro de uma sociedade, cujo
principal sentido da vida é sobreviver, ainda que seja para denunciar a
violência corriqueira que já não cabe mais dentro de cada um, dentro de cada
cidade e dentro de cada composição que serve para construir um novo gênero
ou revisitar algum que já exista, mas que precisa ser renovado.
A estratégia proposta pelo autor, e muito bem utilizada pelo narrador da
trama, é a de desorientar os leitores, o encaminhando para um nível de leitura
e entendimento infratextual da narrativa, onde aparecem vários investigadores
que acentuam os aspectos mais profundos da estrutura do texto associado aos
aspectos mais profundos da estrutura social e econômica do lugar (onde
passam os fatos) e, por conseguinte, também integrados à estrutura emocional
de cada personagem que transita pelos espaços da trama.
Diante da variante infrapolicial, narrador e leitor entram em uma
espécie de inferno, de derrota, de buraco negro, de sordidez e já não
conseguem fazer a viagem de volta sem tremer, sem suar frio, sem temer e
sem ficar indiferente ao que acontece diante dos seus olhos emoldurados pelo
terror da existência, momento em que
O infradetetive
43
Parte em negrito destacada por mim.
124
noche, conducido por el ayudante del jefe de policía de Santa Teresa, el agente
Epifanio Galindo, com resuldos óptimos [...]‖ (Idem, p. 445).
Existe uma hierarquia entre esses policiais/investigadores, mas a
investigação e o interrogatório podem ser realizados por qualquer um,
independente da sua posição dentro da instituição policial. Durante toda trama
aparecem outros investigadores: Ángel Fernández; Juan de Dios Martínez;
José Márquez; Olegario Cura Expósito, mais conhecido como Lalo Cura (esse
é o que tem o perfil mais próximo de um detetive clássico); Ernesto Ortiz
Rebolledo; Efraín Bustelo; Noe Velasco; Francisco Alvarez; Carlos Marin; Juna
Carlos Reues; Lino Rivera; Élmer Donoso (esse policial nem chega a ficar em
cena, pois durante a sua primeira investigação escorrega e quebra as duas
pernas) e os norte-americanos Harry Magaña e Albert Kessler (ex-agente do
FBI), o segundo convidado para dar um curso de capacitação profissional para
um grupo seleto de alguns dos melhores policiais, o que causou certo
desconforto, pois os outros policiais da instituição mexicana achavam que ele
tinha ido cumprir o que fora determinado, dado o fracasso da capacidade dos
agentes mexicanos em resolver os casos dos assassinatos das mulheres de
Santa Teresa.
No final do capítulo, em uma conversa com o jornalista Sergio
González Rodríguez, aparece a figura do detetive particular contratado pela
deputada Azucena Esquivel Plata para descobrir o paradeiro de sua amiga,
Kelly Rivera Parker (nome adotado por Luz María) que havia desaparecido:
os casos das mulheres mortas: ―El caso le fue encargado al judicial Luis
Villaseñor, recién llegado de Hermosillo, quien tras uma semana de
interrogatorios llegó a la conclusión de que el asesino no era el esposo huido
sino el novio de María Elena, un tal Augusto o Tito Escobar [...]‖ (idem, p. 758-
759)
Esses investigadores, chefes de policia, se revezam nos inúmeros
casos que vão aparecendo, não só os das mulheres assassinadas, como
outros casos que envolvem narcotraficantes e um profanador de igrejas.
Outra característica que foge a do policial clássico é a do envolvimento
emocional dos investigadores. O tema do amor ou do envolvimento
sentimental, no romance policial clássico não aparecia ou pelo menos, não era
declarado explicitament; aliás, é uma das características desse tipo de
romance, a ausência do amor como tema, ou a possibilidade de envolvendo
amoroso dos detetives. Além de celibatários, o amor atrapalha o raciocínio
lógico, amar tira o foco da investigação. No romance infrapolicial além do tema
ser tratado, aparece o envolvimento de um dos investigadores, Juan de Dios
Martínez, com a diretora do centro psiquiátrico, Elvira Campos (mulher mais
velha e independente). Um relacionamento confuso e muito diferente, pois
quem termina se apaixonando é ele; para ela os encontros não passam de
sexuais e nada mais que isso, já para ele se dá em outro plano, ele quer ter
uma relação sólida e de convivência diária com ela, mas isso não acontece.
Assim ficou estabelecido no encontro entre eles:
Pocos días antes que apareciera Sergio González por Santa teresa,
Juan de Dios Martínez y Elvira Campos se fueron a la cama. Esto no
es nada serio, le advirtió la directora al judicial, no quiero que te
hagas una falsa idea de nuestra relación. Juna de dios Martínez le
aseguró que sería ella la que pusiera los límites y que él se limitaría a
respetar sus decisiones. Para la directora el primer encuentro sexual
fue satisfactorio. […] Era cuando ella lo llamaba cuando concertaban
las citas, siempre en casa de Elvira, […] Después, in preámbulos, se
iban al dormitorio y se dedicaban a hacer el amor durante tres horas.
[…] Después ella le recordaba, como si se lo hubiera pedido él, que
tenía que marcharse y el judicial decía es cierto o miraba inútilmente
la hora en su reloj y acto seguido se iba. Al cabo de quince días
volvían a encontrarse y todo transcurría idéntico a la última vez.
(BOLAÑO, 2013, p.480-481)
Para fechar esse capítulo, fica uma contribuição na parte dos anexos,
um quadro comparativo entre as variações dos gêneros do romance policial. 44
O próximo capítulo da tese apresentará a forma e como Roberto
Bolaño constrói o seu romance infrapolicial, onde, apesar de uma estrutura
bem montada, o conteúdo e denuncia a sobrepõe e acabam sendo mais
importante. O autor cria uma estrutura que é desafiadora e ao mesmo tempo
rápida, sem deixar de ser complexa e de apresentar elementos do romance
policial clássico, da novela negra e do romance neopolicial, mas de uma
maneira mais ampliada que desemboca no infrapolicial.
44
Quadro comparativo, elaborado por mim – Anexo IX (p.251-252)
127
45
Parte da entrevista concedida a Antonio Lozano para a Revista Qué Leer, Barcelona, enero
de 2001. In: BRAITHWAITE, Andrés. Bolaño por sí mismo: entrevistas escogidas. Chile:
Ediciones Universidad Diego Portales, 2006, p. 122-123)
46
GONZÁLEZ RODRÍGUEZ, Sergio. Huesos en el desierto. Barcelona: Editorial Anagrama,
2002.
47
O vocábulo ―Hipercapitalismo‖ entendido além do capitalismo selvagem, um capitalismo
exacerbado que coloca a dignidade do ser humano em cheque. Um capitalismo que
incrementa cada vez mais as diferenças entre as pessoas, mesmo aquelas que fazem parte de
uma mesma classe político-socio-econômica, dentro de uma época neoliberal de servidão
financeira e capitalismo globalizado, apontados por Carlos Nelson Coutinho na apresentação
do livro Hegemonia às avessas. Junta-se a essas ideias a influência recebida a partir da leitura
do livro Primeiro como tragédia, depois como farsa, de Slavoj Žižek, quando ele diz: ―o
capitalismo é que é propriamente revolucionário; ele mudou toda nossa paisagem nas últimas
décadas, da tecnologia à ideologia [...] De outro lado, principalmente no domínio das relações
socioeconômicas, nossa época se percebe como uma época de maturidade, em que, com o
colapso dos Estados comunistas, a humanidade abandonou os antigos sonhos utópicos
milenaristas e aceitou as restrições da realidade (leia-se: a realidade socioeconomia capitalista)
com todas as suas possibilidades: VOCÊ NÃO PODE... participar de grandes atos coletivos
(que acabam necessariamente em terror totalitário), agarrar-se ao antigo Estado de bem-estar
social (torna as pessoas pouco competitivas e leva à crise econômica), isolar-se do mercado
global etc.etc. [...] A razão é que vivemos numa época pós-política de naturalização da
economia: em regra, as decisões políticas são apresentadas como questões de pura
128
48
Entende-se enciclopédico a partir da explicação dada pelo semiólogo italiano Omar
Calabrese, no seu livro, La era neobarroca: ―La enciclopedia se pensó no como lista de
ingresos finitas, ni como bloque cerrado de temas, sino como geografía de nudos temáticos,
cada uno representado por una condensación de argumentos entrelazados entre ellos y
colocable en el sistema global de manera centrada. Cada entrada, por tanto, hace referencia a
un nudo y el pasaje entre las voces constituye un laberinto. Nudo y laberinto se vuelven así en
la imagen estructural del saber mismo: un saber abierto, interdisciplinario, en movimiento,
continuamente sujeto al riesgo de la pérdida de orientación.‖ (1999, p. 152-153)
49
Este termo surge da junção de outros dois termos: infrarrealismo e postapocalipsis.
―Infra‖ remete ao já que foi apontado no capítulo dois e ―Apocalíptico‖ surge da ideia/conceito
postapocalipsis proposto por Carlos Monsiváis, citado por Juan Villoro em seu artigo El vértigo
horizontal. La ciudad de México como texto: “Nada lo define mejor que la noción de
137
postapocalipsis, a la que se ha referido Carlos Monsiváis. […] Nuestra mejor forma de combatir
el drama consiste en replegarlo a un pasado en el que ya ocurrió. Este peculiar engaño
colectivo permite pensar que estamos más allá del apocalipsis: somos el resultado y no la
causa de los males. Los signos de peligro nos rodean pero no son para nosotros porque ya
sobrevivimos de milagro. Imposible rastrear la radiación nuclear, el seísmo de diez grados o la
epidemia que nos dejó así. Lo decisivo es que estamos del otro lado de la desgracia. Diferir la
tragedia hacia un impreciso pasado es nuestra habitual terapia.‖ Portanto, infrapocalíptico
significará, a partir das duas ideias apontadas, um mergulho, uma incursão profunda, uma
subversão na/da realidade que já ultrapassou o horror, o caos, o colapso, a catástrofe cósmica,
o fim dos tempos, não só no âmbito humano, mas também no social, político e econômico,
onde não existe mais nenhuma possibilidade de utopia, deixando brotar novas sensações
obscuras e alegóricas.
50
O que é apontado como ―intergenericidade‖ – também conhecida como ―intertextualidade
intergêneros‖ ou somente ―intergênero‖ - é um diálogo entre gêneros diferentes, que trocam
informações e características e provoca, a partir dessa conversa, uma hibridização, momento
em que o texto passa a ter elementos variados pertencentes a vários gêneros, formando uma
espécie de quebra-cabeças.
138
51
Na obra, há uma passagem que explica o que venha ser sacrofobia: ―es el miedo o la
aversión a lo sagrado, a los objetos sagrados, particularmente a los de tu propia religión, dijo
Elvira Campos‖.(BOLAÑO, 2013, p. 475)
139
Florita Almada llegó muy mal y así nadie en La ciudad La vio, aunque el
programa al que ella estaba invitada, Una hora con Reinaldo, era uno de
los más populares de la televisión sonorense. Le tocó hablar después de
un ventrílocuo de Guaymas, […] Cerró los ojos. Abrió la boca. Su lengua
empezó a trabajar. Repitió la que ya había dicho: un desierto muy
grande, una ciudad muy grande, en el norte del estado, niñas
asesinadas, mujeres asesinadas. ¿Qué ciudad es ésa?, se preguntó. A
ver, ¿qué ciudad es ésa? Yo quiero saber cómo se llama esa ciudad del
demonio. […] ¡Es Santa Teresa! ¡Es Santa Teresa! Lo estoy viendo
clarito. Allí matan a las mujeres. Matan a mis hijas. (BOLAÑO, 2013, p.
544-547)
Tanto este caso como el anterior fueron cerrados al cabo de tres días
de investigaciones más bien desganadas. Las navidades en Santa
Teresa se celebraron de la forma usual. Se hicieron posadas, se
rompieron piñatas, se bebió tequila y cerveza. Hasta en las calles
142
3.3 – Feminicídio52
52
Para entender o termo feminicídio, uso a Lei 13.104/15. Feminicídio é o homicídio qualificado
quando o crime for praticado por razões da condição de sexo feminino. O § 2º-A foi
acrescentado como norma explicativa do termo "razões da condição de sexo feminino",
esclarecendo que ocorrerá em duas hipóteses: a) violência doméstica e familiar; b)
menosprezo ou discriminação à condição de mulher, com alteração da pena para cada caso.
Por fim, a lei alterou o art. 1º da Lei 8072/90 (Lei de crimes hediondos) para incluir a
alteração, deixando claro que o feminicídio é nova modalidade de homic ídio qualificado,
entrando, portanto, no rol dos crimes hediondos.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/lei/L13104.htm
Acesso em:15.01.2017
143
53
A palavra tranquila usada no sentido de ser normal, de não causar nenhuma surpresa, nem
espanto, já que faz parte da vida das pessoas e visto como normal.
144
54
Dados presentes no Segundo Informe de Gestión. Comisión para Prevenir y Erradicar la
Violencia contra las Mujeres en Ciudad Juárez. México, 2004. Disponível em:
http://www3.diputados.gob.mx/camara/content/download/208364/510442/file/Segundo%20Infor
me%20de%20gestion.pdf. Acesso em: 07.06.2016
147
O perfil das mulheres que são encontradas sem vida, apresenta traços
comuns: mulheres jovens com um tipo definido, trabalhadoras, com pouco grau
de instrução, ou jovens estudantes (muitas são adolescentes) egressas das
cidades interioranas de outros estados mexicanos, contratadas como mão de
obra barata e que devem produzir em larga escala, portanto, permitindo o
controle e a disciplina que servem ao hipercapitalismo. As mulheres são
sequestradas, privadas de sua liberdade por alguns dias, sofrem tortura,
mutilações, são estranguladas e assassinadas e encontradas próximas às
maquiladoras ou aos parques industriais, lugares que são fonte de trabalho da
maioria delas, mas as pistas e evidências dos crimes são desconsideradas,
extraviadas, advogados e jornalista são ameaçados e, por parte das
instituições, há uma pressão para que não se descubra o culpado.
O capítulo começa e termina com a descrição detalhada das mulheres
sem vida, destratadas, humilhadas, exibidas como nada e usadas como e para
promover o espetáculo. As vítimas passam a ser vistas como as criminosas
delas mesmas, como se tivessem provocado a própria destruição, como se sua
morte fosse merecida e logo caem no esquecimento, pois aquelas vidas não
têm nenhuma função dentro da sociedade. O simples fato de ser mulher já é
um delito. As vítimas deixam de ter um nome e até mesmo um corpo, passam
a ser refugo, resíduo que deve ser descartado imediatamente.
Nessa parte, são narrados mais de cem casos de feminicídio. Como
Bolaño se baseou nos documentos e acontecimentos reais apresentados pelo
jornalista Sergio González Rodríguez, dentro da sua narrativa ficcional, ele
também abordará diferentes tipos de feminicídios: os causados por motivos
sexuais, os sexistas e os cometidos por causa da condição de dependência
química do agressor e pelo narcotráfico. As quantidades desses tipos de
crimes assinalam o descaso, a indiferença, a pseudo-incompetência e/ou a
cumplicidade entre autoridades policiais, a justiça e o próprio Estado, já que os
crimes se repetem e não são desvendados e, diante de tal silêncio dos órgãos
competentes, todos acabam perdendo a batalha.
Ao interromper e voltar a narrar com detalhes os assassinatos das
mulheres, talvez a intenção do narrador seja mostrar que a repetição exaustiva
sirva como um mecanismo que dê conta de denunciar o caos, o horror, a
barbárie, o inferno. Colocar o leitor frente a esse mundo infrapocalíptico seria
149
dizer e assinalar que todos são responsáveis pela morte dessas mulheres, pois
se calam diante da tal monstruosidade, tornando-a ordinária e fútil. Na
verdade, tornar-se fútil deveria ser incômodo e não uma aceitação. Portanto,
repetir o horror seria uma maneira de tirar o ser humano da passividade na
qual se encontra e da qual parece não querer despertar. Por isso, essas
narrativas interrompidas de Bolaño mostram que nada é simples, sempre
existirá um sentido oculto, uma intenção, que talvez seja a de esfregar na cara
da humanidade sua inércia diante de alguns assuntos polêmicos.
Bolaño chama a atenção e faz sua denúncia sobre a desvantagem do
sexo feminino e sua submissão, quando seleciona os papéis dos personagens
que compõe o capítulo, dizendo que o status de poder se encontra no sexo
masculino, pois esses são os policiais, os investigadores, o prefeito, o chefe de
policia, o médico legista, o profanador, os narcotraficantes, os jornalistas, os
integrantes das gangues, o cineasta, o agente do FBI, os assassinos, como se
todos eles fizessem parte de uma rede maior, ligada à corrupção e à
ilegalidade, até mesmo pelo fato do serial killer (o bode expiatório) ser um
estrangeiro, revelando que os homens do lugar, daquela cidade, têm um pacto
implícito, de não delatarem uns aos outro. Segue uma passagem do capítulo
como exemplo da formação da rede de cumplicidade:
3.4 – Anomia
55
Fragmento do livro: CANCLINI, Néstor García. Imaginarios urbanos. Buenos Aires: Editorial
Universitaria de Buenos Aires, 1999, p. 72.
152
os tipos de pessoas, aquelas que estão atrás das oportunidades sejam elas
legais ou não. Uma cidade que possibilita a organização de cartéis, fazendo
com que as atividades ilícitas cresçam e se expandam, interagindo com o
cotidiano urbano, aumentando a violência e desenhando uma arquitetura
entendida como territorialidade móvel, deslocada entre os países fronteiriços,
entre a rua e a prisão.
É muito difícil estabelecer qual o domínio territorial das cidades que se
encontram nas fronteiras, qual o lado a ser seguido, qual processo político-
econômico-legal que impera? As relações, nesse espaço, se dão de maneira
distinta, talvez seja na junção ou no intercâmbio entre os territórios que
aconteça o processo. A cidade de Santa Teresa vive em torno da economia
gerada pelas maquiladoras, o que acaba desenvolvendo uma população com
baixos salários, onde vivem pessoas em condições precárias para as quais
viver se torna uma aventura complexa. Essa fonte de renda, ainda que pouca,
atrai muita gente à fronteira, principalmente as mulheres jovens, de origem
humilde, exato perfil das que serão assassinadas durante a narrativa. As
relações que se formam nessa cidade, acontecem de maneira conturbada,
caótica e acabam sendo uma fotografia da própria condição de fronteira, que
pode ser ultrapassada a qualquer momento, vivida como líquida e passageira.
As ações, os crimes e a vida, dentro do romance, acontecem do lado
mexicano da fronteira, o lado pobre, sombrio, desumano e ―bárbaro‖. A
fronteira, a todo momento, desperta a vontade da travessia para o lado dos
Estados Unidos, onde se vislumbra a possibilidade de uma vida melhor, o lado
desenvolvido, rico, humano e ―civilizado‖.
A divisão da cidade de Santa Teresa como um lugar onde ocorrem os
crimes, zona residencial e polo industrial, não diz quase nada se não forem
analisados os índices de violência em comparação aos indicadores de
infraestrutura, migração e ingressos. Dentro da narrativa o autor deixa claro
que existe uma deficiência de infraestrutura urbana, pois as mulheres
assassinadas moram em zonas que carecem de serviços básicos, como água,
esgoto e eletricidade e são nessas áreas residenciais onde vive o maior
número de trabalhadoras das maquiladoras.
Diante desse cenário urbano, La parte de los crímines tem como
topografia a cidade de Santa Teresa, local para onde se direcionam todas as
153
outras cinco partes do romance, todos os caminhos levam a ela. Levar todas as
partes do romance para esta cidade é umas das saídas, que o autor encontra,
para romper e desarticular com o rigor estrutural e narrativo apresentados nas
primeiras produções do gênero policial.
Santa Teresa é uma cidade que reproduz as condições do estado de
exceção, um pedaço de território fora da ordem judicial, onde todos os
acontecimentos são possíveis, onde os seus habitantes perderam os seus
direitos como cidadãos e podem ser aniquilados com total impunidade, local
em que o ser humano está abandonado e excluído; o ser humano é visto e
tratado como resíduo. (JARA, 2011)
Esse território, onde ocorrem os crimes, mostra aspectos importantes
que estão relacionados com as camadas sociais; nesse caso, as com menos
recurso econômico. Entre esses aspectos figuram a quebra de hierarquia de
categoria dos personagens que transitam pelo lugar, eles não são nem
protagonistas, nem secundários, se misturam e se revezam nos papéis,
rompendo outra fronteira, no caso a literária. Não existe um personagem
principal; há hibridez na sua construção, os personagens não são nem bons,
nem maus, culpados ou inocentes e as vítimas aparecem como mais uma na
estatística de morte, pois não possuem visibilidade social para que se cumpra a
lei. Portanto, não fará diferença no cotidiano da cidade quem morreu e quem
matou, basta uma resposta à população, mesmo que o culpado dos crimes
seja um inocente. O acesso a esta parte do romance promove uma tensão
entre o que se entende por modernidade periférica e fronteiras no mundo
latino-americano.
A tensão está no fato da cidade ficcional de Santa Teresa ser a
correspondente de Ciudad Juárez que se encontra na fronteira com os Estados
Unidos, sendo a cidade aonde todos os personagens e histórias narradas, em
2666, chegam, se encontram, transitam ou vivem. Poderia ser pensada como
protagonista dentro da obra, mas, na realidade, Santa Teresa é um posto
alfandegário, um posto de cruzamento entre La Ciudad del Paso y Ciudad
Juárez, uma zona de livre comércio, onde foram instaladas várias indústrias
maquiladoras de automóveis, de dispositivos elétricos e eletrônicos e quase
todas são de capital estrangeiro. Esta cidade de fronteira é um espaço de
limite, de extremidade, de ruptura, de interdição e, ao mesmo tempo, de fluxo,
154
esgotaram, ou devem ser pensadas como fronteira, como interrupção que não
perturbam a fluidez da narativa.
A fronteira também pode apresentar-se como um espaço de tensões
dialéticas tais como ação/reação ou inércia, lugar e não lugar, diálogo e
imposição, disputa e aceitação, uma linha imaginária (ou não) que divide duas
realidades diferentes. A ideia de fronteira (até onde se deve ir) também
acontece na violência e no desespero, nos amores desenfreados e impossíveis
e nas buscas descabidas. Ultrapassa o limite que divide os territórios,
passando pelas formas de ser, agir, buscar, sendo percebida como algo que se
deve cruzar∕atravessar, passar de um lugar a outro, de uma etapa a outra. No
caso de Roberto Bolaño, passar de um tipo de escritura a outro, mudar o modo
de narrar, até mesmo inovar a estrutura de um gênero.
Não existem fronteiras, as quais não se deseja cruzar, ver o que está
do outro lado, a possibilidade de ser ou fazer diferente, escrever ou reescrever
de um modo onde barreiras devem ser transpostas, ações intrínsecas ao ser
humano que sempre teve a curiosidade de ver aquilo que é diferente, o que
está do outro lado da página, da vida, da cidade, dos afetos e dos crimes.
A partir do ponto de vista de García Canclini, as fronteiras, assim como
algumas cidades, são imaginadas por aqueles que desejam atravessá-las,
portanto a escrita de Bolaño, especialmente em La parte de los crímines, pode
ser vista, lida e analisada com um potencial que tanto bebe da realidade
imediata assim como do imaginário que a cidade traz em si. Também pode ser
considerada através de seus múltiplos discursos, gerando a possibilidade de
serem verdadeiros, embora carregados de heterogeneidade. As palavras de
Canclini ratificam tal percepção:
existe uma manifestação de poder, ainda que o poder esteja no fato de eliminar
vidas. Nesta parte do romance, as autoridades tentam apontar indivíduos
delinquentes ou imigrantes como culpados dos crimes, não assumindo sua
parte. Em Santa Teresa os grandes violadores das leis, como narcotraficantes
e mafiosos, se protegem ocultados pelas maquiladoras e pelo próprio Estado
que, junto com as autoridades, ajudam para que esse território continue sem
regras e para que os crimes continuem sem solução. Afinal quem mata? Dentro
da narrativa, também existe esta pergunta:
[…] creo que Roberto desde muy pronto, incluso antes de publicar y
desde luego antes de ser famoso, proyectó, como todo gran escritor,
su propio lugar en el mapa literario. Y como todo gran escritor se
propuso hacer ciertos desplazamientos y reordenar el canon. No
159
A concepção de Link:
Hablar de género policial es, por lo tanto, hablar bastante más que de
literatura: por lo pronto de películas y series de TV, de crónicas
policiales, de noticieros, y de historietas: lo policial es una categoría
que atraviesa todos esos géneros. Pero también es hablar del Estado
y relación con el crimen, de la verdad y sus regímenes de aparición
de la política y su relación con la moral, de la Ley y sus regímenes de
coacción. (2003, p. 11)
56
Revista Qué Leer (p. 118)
160
57
Não há referência sobre a página, pois essa citação de Ruy Braga foi retirada do livro em
formato de e-book da Kindle.
161
cruel, a classe precária fica em desvantagem e serve, cada vez mais, para
aumentar o capital para quem já é o dono do capital. As maquiladoras estão
localizadas nas regiões certas e possuem a mão de obra certa para aumentar
seu poder de dominar os espaços de ganho e controle social. A passagem
seguinte ilustra a associação das mortes com a condição precária e a tentativa
da mulher assalariada de ter voz:
Afinal, até que ponto faz sentido analisar esse capítulo, ou parte dele,
apresentado as narrativas interrompidas e sua relação com o feminicídio, com
a fronteira e o precariado? Havendo um sentindo, qual seria o interesse de
Bolaño? Por que ele propõe esse tipo de escrita interrompida? Poderia
responder dizendo que, por causa da sua saúde frágil – ele próprio estava
prestes a cruzar a fronteira da vida em direção à morte – sabia que tinha pouco
tempo, teve pressa de deixar essa obra como reflexão profunda da sociedade,
conscientizando o leitor sobre assuntos densos, pouco falados. Por causa
dessa urgência em dizer, não teve tempo de apresentar tudo que desejava (a
verdadeira face do poder e a possibilidade de enfrentá-lo) dentro de uma
estrutura literária mais trabalhada; usou a narrativa episódica, os pequenos
flashes, a interdição do fluxo da narração, a lógica das interrupções
concentradas, justapostas e alternadas como aliados, juntou todos os seus
apontamentos e tudo que já tinha elaborado para escrever 2666, fez sua
colagem ficcional, um tipo de álbum de figurinhas, já que tinha que escrever,
sob um estado de urgência, sobre o tempo do caos, da violência, da crueldade,
da banalidade, do espetáculo, escrevendo tudo isso com sua condição
precária, para ser consumido e como forma de moldar a percepção do ser
humano diante do momento infrapocalíptico.
164
Considerações finais
58
Palavra pensada a partir dos gregos, hedonistas, que utilizavam a palavra póiesis com o
significado inicial de criação, ação, confecção, fabricação e, posteriormente, arte da poesia e
faculdade poética.
168
indicam, ao leitor, todo o caos do final do século que será, querendo ou não,
vivenciado por todos.
Ao longo do capítulo estudado, Bolaño aponta para as crueldades da
sociedade, falando de violência, das maquiladoras; da exploração das
mulheres como mão de obra barata, da complexidade das relações nas
cidades de fronteira, fazendo, de maneira simultânea, uma análise mordaz
sobre a crítica literária inócua, apresentando, em contrapartida, argumentos
que sustentam a ideia de que a literatura transcende à academia, o lugar
instituído como o das elites, e que o processo de criação literária tem tamanha
importância que ultrapassa os quinze minutos de fama, a venda de livros, a
cultura do entretenimento, pois ela é, para quase todos os escritores, sinônimo
de existência.
Por isso, Bolaño recria uma estrutura para o gênero narrativo romance
policial, o dotando de características infrarrealistas, que servirão como lugar
para tratar de todas, ou quase todas, as complexidades humanas e sociais da
América Latina; deste modo, para expor tal complexidade se faz necessário o
uso de um gênero mais elaborado. No final, todos os breves relatos que
compõem a história maior de 2666, ficam suspensos, abertos, sem solução,
pois não existe uma resposta que desvende o enigma. Tal como a vida, o texto
literário, escrito por ele, é uma porta de entrada para descobertas que ninguém
prevê ou espera.
Nesse intento de refletir sobre os nexos (ou a falta deles) entre
violência e arte e a tentativa de buscar características que possam compor o
perfil do romance infrapolicial, Bolaño transforma a figura do detetive, que deixa
de ser uno e central e passa a serem muitos e de vários tipos, pois a sua
finalidade dentro da trama, além de desvendar os crimes é a de buscar pistas,
indícios que contenham claras implicações éticas, fazendo uma analogia com a
literatura atual que, se não for comprometida com o papel de causar espanto e
desconforto, sucumbe junto com as grandes utopias, onde o compromisso ético
do escritor/detetive, dos personagens/detetives e dos leitores/detetives consiste
em procurar, nos tempos atuais, indícios e pistas de sua infradestruição. Cada
pista ou indício encontrado se subtraem, se diluem em uma ausência
insuportável que nunca termina, mesmo que sejam sentidos como presença.
170
59
Poema: El gusano (BOLAÑO, 2007, p.361-363) – Ver Anexo X (p.253-255)
60
Conto: El gusano (BOLAÑO, 2011, p. 71-83) – Ver Anexo XI (p.256-262)
171
61
Ver Anexo XII (p.263)
172
Referências Bibliográficas
______. Déjenlo todo, nuevamente. In: Nada utópico nos es ajeno. México:
Tsunun, 2013b, p.51-62.
Disponível em: https://tsunun.files.wordpress.com/2013/05/nada-utc3b3pico-
nos-es-ajeno-manifiestos-infrarrealistas1.pdf. Acesso em: 27.05.2014.
174
AYALA, Matías. Notas sobre la poesía de Roberto Bolaño. In: PAZ SOLDÁN,
E; FAVERÓN PATRIAU, G. Bolaño Salvaje. 6ª ed. España: Editorial Candaya,
2008, 91-101.
CALVO, José Huerta. Entre el enigma y la leyenda. Revista Leer, nº210, marzo
de 2010, p.7-31.
______. ―Roberto Bolaño: un territorio por amar!‖. In: MANZONI, Celina (org.)
Roberto Bolaño: la escritura como tauromaquia. Argentina: Ediciones
Corregidor. 2002, p. 130).
MADARIAGA CARO, Montserrat. Bolaño Infra 1975 – 1977: los años que
inspiraron Los detectives salvajes. Santiago: RIL editores, 2010.
VILLORO, Juan. La batalla futura. In: Bolaño Salvaje. 6ª ed. España: Editorial
Candaya, 2008.p.73-89.
KERR Sarah. The Triumph of Roberto Bolaño. The New York Review of Books.
Disponível em: http://www.nybooks.com/articles/archives/2008/dec/18/the-
triumph-of-roberto-bolano/. Acesso em: 23.07.2014.
MÉNDEZ ESTRADA, Ramón. Como veo hoy, una mirada interna del
Movimiento Infrarrealista. El Interpretador. nº31, julio de 2007. Disponível em:
http://www.elinterpretador.com.ar/31RamonMendezEstrada-ComoVeoDoy.html.
Acesso em: 27.04.2014.
PINO, Mirian. Bolaño y las relecturas de la novela negra: La pista de hielo. In.
Literatura y Linguística 17, p.117-128.
Disponível em: http://www.redalyc.org/pdf/352/35201708.pdf.
Acesso em: 15.12.2014.
VILLORO, Juan. Pasado y futuro del infrarrealismo. In: Nada utópico nos es
ajeno. México: Tsunun, 2013, p.65-68.
184
WALKER, Carlos. El tono del horror: 2666 de Roberto Bolaño. Taller de Letras.
N° 46: 2010, p. 99-112. Disponível em:
http://www7.uc.cl/letras/html/6_publicaciones/pdf_revistas/taller/tl46_7.pdf.
Acesso em 30.03.2014.
Geral
BARTHES, Roland. Ensayos críticos. Trad. Carlos Pujol. Buenos Aires: Seix
Barral, 2003.
______. Origem do drama trágico alemão. Tradução João Barrento. 2ª ed. Belo
Horizonte: Autêntica editora, 2013.
______. Policial y Verdad. In: LINK, Daniel (org.) El juego de los cautos.
Literatura policial: de Edgar A. Poe a P.D. James. Buenos Aires: La marca.
2003.
CALVINO, Ítalo. Seis propostas para o próximo milênio. Tradução. Ivo Barroso.
São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
COSTA LIMA, Luiz (org.). Teoria da cultura de massa. 8ªed. São Paulo: Paz e
Terra, 2011.
DURING, Simon, org. The Cultural Studies Reader. Oxford: Blackwell, 1994.
FIORI, José Luís. Formação, Expansão e Limites do Poder Global. In: FIORI,
José Luís (org.). O Poder Americano. 2ªed. Rio de Janeiro: Editora Vozes,
2004.
______. O Poder Global dos Estados Unidos: formação, expansão e limites. In:
FIORI, José Luís (org.). O Poder Americano. 2ªed. Rio de Janeiro: Editora
Vozes, 2004.
HOBSBAWN, Eric. Era dos extemos: breve século XX: 1914-1991. Tradução
Marcos Santarrita. 2ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
LINK, Daniel (org.) El juego de los cautos. Literatura policial: de Edgar A. Poe a
P.D. James. Buenos Aires: La marca. 2003.
______. Para onde vai o mundo? Tradução Francisco Morás. 2ªed. Petrópolis:
Vozes, 2010.
TAIBO II, Paco Ignacio. Días de combate. México: Editorial Planeta, 2004.
TODOROV, Tzvetan. Tipologia del relato policial. In: LINK, Daniel (org). Juegos
de los Cautos. Literatura policial: de Edgar A. Poe a P.D. James. Buenos Aires:
La marca. 2003.
ŽIŽEK, Slavoj. Primeiro como tragédia, depois como farsa. Tradução Maria
Beatriz de Medina. São Paulo: Boitempo, 2011.
ANAYA, José Vicente. Por un arte de vitalidad sin límites. In: Nada utópico nos
es ajeno. México: Tsunun, 2013, p.43-49.
Disponível em: https://tsunun.files.wordpress.com/2013/05/nada-utc3b3pico-
nos-es-ajeno-manifiestos-infrarrealistas1.pdf. Acesso em: 27.05.2014.
ANEXO I
aparece una niña con los puños embarrados contra los muslos
repitiendo 1, 2, 3 veces:
Yo no soy un objeto sexual, no lo soy robots,
estoy viva / como un bosque de eucaliptos
Aquí donde la norma es ser implacablemente amables los unos
con los otros
& este es el mal menor
¡Qué luna!
como uña cortada
-como un gajo de esperma
suspendido
sobre el lomo negro de la noche
cuando se escucha
un crujir de nueces aplastadas -crac-
el zumbido el lloriqueo de una ambulancia
que otra vez no llega a tiempo
Sin embargo uno aún camina por aquí como gorrión feliz
como Chaplin el día en que besó por primera vez a Mary Pickford
alguien pasea con un radio de transistores que parece su segunda oreja
ANEXO II
62
Disponível em: https://cuentoshistoriasdelmundo.blogspot.com.br/2014/11/la-infra-del-dragon-
georgij-gurevic.html. Acesso em:19.01.2017
203
Sirio y Proción. También podríamos contar siete soles, porque, a excepción del
nuestro, los demás son estrellas dobles.
Pero en el mismo espacio se observan también una decena de
estrellas poco luminosas: enanas rojas, subenanas, enanas blancas. Son
estrellas próximas, casi todas invisibles a simple vista, cuya existencia sólo
hemos conocido en el siglo XX.
Por lo tanto, a simple vista se ven unas pocas, y con el telescopio,
algunas decenas. ¿No existen en el espacio centenares de cuerpos celestes
invisibles incluso con telescopio? Entre los miles de millones de estrellas poco
luminosas conocidas por nosotros, es difícil localizar un centenar de ellas más
pequeñas y cercanas.
También las temperaturas sugieren la misma conclusión.
En el mundo de las estrellas rige esta regla: cuanto mayor es la
estrella, tanto más caliente será; cuanto más pequeña, tanto más fría. Las
enanas rojas son unas diez veces más pequeñas que el Sol, tienen una
temperatura de 2 a 3.000 grados. Supongamos que existan cuerpos diez veces
más pequeños que las enanas rojas. ¿Cuál será su temperatura?
Probablemente, 1.000, 600, 300, 100 grados. Las mayores tendrán una
luminosidad insignificante; las otras, cero. A una temperatura inferior a los 600
grados, los cuerpos emiten únicamente rayos infrarrojos; es decir, invisibles.
Soles invisibles, negros como el carbón... Y nos interesarían aquellos que
tuviesen una temperatura en la superficie de treinta grados sobre cero,
planetas oscuros pero calientes, calentados desde dentro.
¿Por qué no los hemos descubierto aún? En parte, porque no los
hemos buscado; en parte, porque es difícil encontrarlos. Desde la Tierra es
absolutamente imposible verlos. En efecto, la Tierra emite también una luz
infrarroja, vivimos en medio de llamas infrarrojas. ¿Es acaso posible, estando
entre llamas, ver la luz de pequeñas estrellas lejanas?
Expuse con excitación todas estas consideraciones a Pavel
Aleksandrovic. Por el rabillo del ojo vi pasearse por sus labios una sonrisa
condescendiente, mientras fruncía las espesas cejas. ¡Y yo que pensaba haber
razonado con lógica! Conseguí terminar y esperé la sentencia.
—Es curioso, Radij —murmuró Carusin—. Un planeta calentado desde
su interior sería un mundo al revés. No puede ser como el nuestro. ¿Cree que
208
a él y a mí... A él, por su avanzada edad, y a mí, por ser demasiado joven e
inexperto.
Los primeros días de vuelo se asemejaron en todos sus detalles a una
primera excursión a Moscú. Fueron interesantes, pero conocíamos ya hasta los
más mínimos detalles, cien veces leídos, cien veces vistos en el cine.
La Tierra apareció desde lo alto como un globo gigantesco que cubría
el cielo. Gravedad cuadruplicada; luego, el milagro de lo imponderable. La
Luna, un mundo blanco y negro con la cara picada de viruelas. Los saltos
enormes del moderador, las sombras netas y negrísimas, los barrancos, el
polvo secular. Todo cuanto había leído y me había imaginado, pero al verlo me
quedé asombrado.
Después transcurrieron los días que los escritores no describen. Una
cabina de tres metros por tres, literas, una mesita, un armario. Una puerta, la
sala de mando con un telescopio, el cuadro de mandos, instrumentos,
máquinas calculadoras. Más allá, los depósitos, la sala de máquinas y medio
kilómetro de tanques llenos de combustible. Podíamos pasear a lo largo de los
depósitos, o bien ponernos la escafandra y lanzarnos al espacio. Luego, otra
vez la litera, la mesita, el armario. En resumen: una prisión.
Treinta años de absoluta segregación.
Tinieblas y estrellas, estrellas y tinieblas. El reloj de veinticuatro horas
se detuvo, pues de otro modo nos confundiríamos. Ninguna diferencia entre el
día y la noche. Afuera, estrellas, de día y de noche. Silencio. Calma. En
realidad, volamos en estado de movimiento uniforme y rectilíneo. En una hora,
cerca de un millón y medio de kilómetros; en un día, treinta y cinco millones. En
el diario consignamos: «23 de mayo. Recorridos mil millones de kilómetros.—
1ero. de junio. Hemos pasado la órbita de Saturno.» Para celebrarlo, comida de
gala. Canciones. Alegría. En realidad resulta algo convencional porque, tanto
antes como después de la órbita, sólo existe el vacío. Veíamos a Saturno como
desde la Tierra: como un pequeño punto luminoso.
Y Pavel Aleksandrovic, que inventa distracciones de todo género. Es
un maestro para llenar las horas. Incluso así, en el cohete, nunca tenía
bastante tiempo. Después del sueño, carga cósmica, por lo menos durante una
hora. Es indispensable, de otro modo los músculos se atrofian por falta de peso
constante. Paseo obligatorio en el espacio, control de las partes externas del
210
abría un océano helado; hielos, nieve, glaciares. Espesor del hielo: decenas y
centenares de kilómetros. Lo supimos gracias a las explosiones.
No valía la pena viajar catorce años para ver una vulgar noche ártica...
El Abuelo estaba completamente abatido. ¡La última tentativa,
fracasada! ¡El sueño de toda una vida no se había realizado!
Decidimos visitar luego la infra B.
A primera vista parecía la cosa más natural del mundo. Estábamos allí,
¿por qué no hacerlo? Pero el cosmos tiene sus leyes. Allí todo depende del
combustible. En la Tierra, la duración del viaje, los kilómetros recorridos,
dependen del combustible; en el cosmos, sólo la velocidad. No se consume
siempre, sino sólo en la salida y la llegada. Ir a la segunda infra significaba
retrasar el regreso en tres o cuatro años. No deseábamos invertir más tiempo
en el viaje, pero cuando se queman treinta años de vida, tres más, tres menos,
tienen un valor relativo. Ninguno de nosotros quería dar media vuelta dejando
un mundo inexplorado.
Durante cerca de un año navegamos hacia la infra B. Vimos otra vez
cómo la pequeña mancha crecía y se transformaba en un círculo negro como el
carbón. Nuevamente frenamos, adoptamos una órbita circular y enviamos al
explorador automático a las tinieblas. La oscuridad no era esta vez completa,
sino surcada por relámpagos, probablemente debidos a temporales. Sobre la
pantalla eran visibles los contornos de las nubes. Por radio, el explorador
automático comunicó: temperatura del aire, + 23°. Quizá éste era el motivo del
error de nuestros astrónomos. Los rayos emitidos por los dos cuerpos, la infra
A y la infra B, se confundían en el espacio: la medida resultaba alrededor de +
10% próxima a la realidad.
Tampoco nuestros cálculos debían ser completos, porque el cohete
explorador cayó y se hundió. En el último instante vimos en la pantalla del
televisor una superficie líquida con profundas olas oblicuas. Enviamos un
segundo cohete, que dio varias vueltas alrededor de la infra. Vimos nubes;
vimos lluvia, perpendicular y no oblicua, como suele ser la de la Tierra, con
gotas más pesadas. Vimos de nuevo las olas, mares por todas partes, sólo
mar, ni siquiera una isla. Océano en el ecuador y océano en los polos. Era
lógico, porque la infra posee calor interno y el clima es igual en todas partes;
los polos no están fríos.
214
ANEXO III
Una línea recta, dije. ¿Qué otra cosa podría ver, muchachos? ¿Y qué te
sugiere una línea recta, Amadeo? El horizonte, dije. El horizonte de una mesa,
dije. ¿Tranquilidad?, dijo uno de ellos. Sí, tranquilidad, calma. Bien: horizonte y
calma. Ahora veamos el segundo corte del poema:
¿Qué ves, Amadeo? Pues una línea ondulada, ¿qué otra cosa podría
ver? Bien, Amadeo, dijeron, ahora ves una línea ondulada, antes veías una
línea recta que te sugería calma y ahora ves una línea ondulada. ¿Te sigue
sugiriendo calma? Pues no, dije comprendiendo de golpe por dónde iban, hacia
dónde querían llevarme. ¿Qué te sugiere la línea ondulada? ¿Un horizonte de
colinas? ¿El mar, olas? Puede ser, puede ser. ¿Una premonición de que la
calma se altera? ¿Movimiento, ruptura? Un horizonte de colinas, dije. Tal vez
olas. Ahora veamos el tercer corte del poema:
ANEXO IV
YA LEJOS DE LA CARRETERA63
A la memoria de Infraín
Somos poetas
Tám-Táms del negro sol
que nos imanta
63
Disponível em: https://www.poeticous.com/mario-santiago-papasquiaro/ya-lejos-de-la-
carretera?locale=es. Acesso em: 19.01.2017.
224
Ni lúmpenes ni proletarios
El pequeñodios cobrasalarios
ni la pluma rompe en los abismos nuestros
Las auroras infras en la Casa de Usher de la araña:
Juega al balero el dulce clítoris / se embarca como a las 5 montañas en
dos cuatros
a galope tierno & crines sueltas
Rubayat ama
a
Ramayana
Gris es la teoría...
Rojo el vellón de la Cannabis / la Inhalámbrica
El infrarrealismo no es l vocablo-lija
Nos han antologado nuestras noches
Cada textículo en su sitio / que bien puede ser nuestro milagro nómada
10
Poesía endecasilabóiler
hermanita de Édgar Allan & Black Sabbath
caradiajos & chintreras
qué de arrastres
labrados en la entraña de la entraña
11
Toco viento
: azar turgente :
Nuestra raíz está hablando
/ no el enjuague del Poder & sus taquillas
sus tarifas, sus castigos, muecas cínicas, su estertor de vanidades /
12
Bien lo dice:
La Poesía mexicana se divide en 2
La puesía mexicana & el infrarrealismo
/ Río Tula a remover /
227
ANEXO V
CARNET DE BAILE64
64
BOLAÑO, Roberto. Putas asesinas. 9ª ed. Barcelona: Editorial Anagrama S.A., Colección
Compactos, 2011, p. 207-216)
228
tarde, no sé por qué, nos pusimos a hablar de poesía chilena. El dijo que el
más grande era Nicanor Parra. Acto seguido, se puso a recitar un poema de
Nicanor, y luego otro, y luego finalmente otro. Jodorowski recitaba bien, pero
los poemas no me impresionaron. Yo era por entonces un joven hipersensible,
además de ridículo y muy orgulloso, y afirmé que el mejor poeta de Chile, sin
duda alguna, era Pablo Neruda. Los demás, añadí, son unos enanos. La
discusión debió de durar media hora. Jodorowski esgrimió argumentos de
Gurdjieff, Krishnamurti y Madame Blavatski, luego habló de Kierkegaard y
Wittgenstein, luego de Topor, Arrabal y él mismo. Recuerdo que dijo que
Nicanor, de paso para alguna parte, se había alojado en su casa. En esa
afirmación entreví un orgullo pueril que desde entonces nunca he dejado de
percibir en la mayoría de los escritores. 18. En alguno de sus escritos Bataille
dice que las lágrimas son la última forma de comunicación. Yo me puse a llorar,
pero no de una manera normal y formal, es decir dejando que mis lágrimas se
deslizaran suavemente por las mejillas, sino de una manera salvaje, a
borbotones, más o menos como llora Alicia en el País de las Maravillas,
inundándolo todo. 19. Cuando salí de casa de Jodorowski supe que nunca más
iba a volver allí y eso me dolió tanto como sus palabras y seguí llorando por la
calle. También supe, pero esto de una forma más oscura, que no volvería a
tener un maestro tan simpático, un ladrón de guante blanco, el estafador
perfecto. 20. Pero lo que más me extrañó de mi actitud fue la defensa más bien
miserable y poco argumentada, pero defensa al fin y al cabo, que hice de Pablo
Neruda, de quien sólo había leído los Veinte poemas de amor (que por
entonces me parecían involuntariamente humorísticos) y el Crepusculario, cuyo
poema «Farewell» encarnaba el colmo de los colmos de la cursilería, pero por
el cual siento una inquebrantable fidelidad. 21. En 1971 leí a Vallejo, a
Huidobro, a Martín Adán, a Borges, a Oquendo de Amat, a Pablo de Rokha, a
Gilberto Owen, a López Velarde, a Oliverio Girondo. Incluso leí a Nicanor
Parra. ¡Incluso leí a Pablo Neruda! 22. Los poetas mexicanos de entonces que
eran mis amigos y con quienes compartía la bohemia y las lecturas, se dividían
básicamente entre vallejianos y nerudianos. Yo era parriano en el vacío, sin la
menor duda. 23. Pero hay que matar a los padres, el poeta es un huérfano
nato. 24. En 1973 volví a Chile en un largo viaje por tierra y por mar que se
dilató al arbitrio de la hospitalidad. Conocí a revolucionarios de distinto pelaje.
230
como temía, ni siquiera me robaron. Pero tampoco me dieron nada para comer
ni para taparme por las noches, por lo que tuve que vivir de la buena voluntad
de los presos que compartían su comida conmigo. De madrugada escuchaba
cómo torturaban a otros, sin poder dormir, sin nada que leer, salvo una revista
en inglés que alguien había olvidado allí y en la que lo único interesante era un
artículo sobre una casa que en otro tiempo perteneció al poeta Dylan Thomas.
34. Me sacaron del atolladero dos detectives, ex compañeros míos en el Liceo
de Hombres de Los Ángeles, y mi amigo Fernando Fernández, que tenía un
año más que yo, veintiuno, pero cuya sangre fría era sin duda equiparable a la
imagen ideal del inglés que los chilenos desesperada y vanamente intentaron
tener de sí mismos. 35. En enero de 1974 me marché de Chile. Nunca más he
vuelto. 36. ¿Fueron valientes los chilenos de mi generación? Sí, fueron
valientes. 37. En México me contaron la historia de una muchacha del MIR a la
que torturaron introduciéndole ratas vivas por la vagina. Esta muchacha pudo
exiliarse y llegó al DF. Vivía allí, pero cada día estaba más triste y un día se
murió de tanta tristeza. Eso me dijeron. Yo no la conocí personalmente. 38. No
es una historia extraordinaria. Sabemos de campesinas guatemaltecas
sometidas a vejaciones sin nombre. Lo increíble de esta historia es su
ubicuidad. En París me contaron que una vez llegó allí una chilena a la que
habían torturado de la misma manera. Esta chilena también era del MIR, tenía
la misma edad que la chilena de México y había muerto, como aquélla, de
tristeza. 39. Tiempo después supe la historia de una chilena de Estocolmo,
joven y militante del MIR o ex militante del MIR, torturada en noviembre de
1973 con el sistema de las ratas y que había muerto, para asombro de los
médicos que la cuidaban, de tristeza, de morbus melancholicus. 40. ¿Se puede
morir de tristeza? Sí, se puede morir de tristeza, se puede morir de hambre
(aunque es doloroso), se puede morir incluso de spleen. 41. ¿Esta chilena
desconocida, reincidente en la tortura y en la muerte, era la misma o se trataba
de tres mujeres distintas, si bien correligionarias en el mismo partido y de una
belleza similar? Según un amigo, se trataba de la misma mujer que, como en el
poema de Vallejo «Masa», al morir se iba multiplicando sin dejar por ello de
morir. (En realidad, en el poema de Vallejo el muerto no se multiplica, quienes
se multiplican son los suplicantes, los que no quieren que muera.) 42. Hubo
una vez una poeta belga llamada Sophie Podolski. Nació en 1953 y se suicidó
232
ANEXO VI
65
BOLAÑO, Roberto. El gaucho insufrible. Barcelona: Editorial Anagrama S.A., Narrativas
hispánicas, 2006. Este fragmento consta de uma edição online do livro
236
ANEXO VII
Pulps Magazines
As revistas populares, pulps magazines, explodiram na virada do
século XIV para o XX. Esse meio de divulgar uma literatura, que estavam
sendo escritas para atingir uma gama maior da população, principalmente as
que precisavam de algum entretenimento, agrupava alguns tipos de histórias:
western, horror, fantasia, detetive, ficção científica, relatos eróticos, que depois
se tornaram gêneros literários, em si mesmos, transportados para os livros,
permanecendo até os dias atuais, embora reescritos para atender as
demandas do mundo contemporâneo. As revistas eram divididas por tipo:
Weird Tales relatavam histórias de horror e fantasia; Amazing Stories narravam
os contos de ficção científica; Black Mask apresentavam as histórias de
detetive e assim por diante. Entre os países que consumiam mais esse tipo de
revista estavam Estados Unidos, Inglaterra, França, Canadá e outros.
As revistas eram impressas em um papel barato, aqui no Brasil
conhecido como papel jornal, depois passou por uma repaginada e essas
revistas deixaram de ser chamadas de pulps somente por causa do custo
barato, mas também sinônimo de dinamismo narrativo, com personagens com
perfis bem delineados, onde apareciam heróis, vilões, ação, drama, aventura,
erotismo e exotismo. Essas revistas tiveram um tempo de duração, até o
período do pós-guerra e foram substituídas pelos livros de bolso, que
republicou várias séries e romances das revistas pulps, até chegarem, com o
seu nome de registro nas telas de cinema com o filme de Quentin Tarantino,
Pulp Fiction. Hoje, muitas dessas revistas fazem parte de acervo de muitos
colecionadores.
No Brasil, as narrativas que povoavam esse tipo de revista chegam em
forma de folhetim e a partir de 1950 em forma de livro de bolso vem baratos
para poderem ser adquiridos pela população mais precária. Seguem algumas
capas das revistas.
239
240
241
242
ANEXO VIII
1. Debe ser una novela con credibilidad, tanto en sus situaciones como en
el desenlace; con acciones, personajes y circunstancias plausibles (no
se valen los finales tramposos ni las manidas historias de ―círculos
cerrados‖. Nada de elaborar escenarios tan sofisticados como los de
Agatha Christie en el tren a Calais);
2. Debe ser técnicamente solvente, sólida, tanto en el método de asesinar
como en el de detección. Nada de venenos fantásticos ni efectos falsos.
Si el detective es un policía, debe proceder como si lo fuera y tener la
mentalidad y el físico de uno de ellos. Conan Doyle y Poe fueron
primitivos en este arte. Ellos hicieron cosas que hoy no pueden admitirse
(también las policías era rudimentarias en sus tiempos). Conan Doyle
mostró que no sabía todo acerca de Scotland Yard y sus hombres.
Christie comete la misma estupidez;
3. Hay que ser muy honesto con el lector, algo que siempre se dice pero no
siempre se hace. Los hechos importantes no solo no hay que ocultarlos;
tampoco hay que distorsionarlos con falsos énfasis. Y los hechos no
importantes no deben ser proyectados como si lo fueran para engañar al
lector. Este debe tener todos los elementos para resolver el problema ;
tampoco crear tramas que exijan conocimientos especiales en los
lectores;
4. Debe ser realista, tanto en los personajes, como en escenarios y
atmósferas. Debe tratarse de gente real en un mundo real;
5. Debe haber una historia convincente y sólida , aparte de los elementos
policiacos. La investigación en si misma debe ser una aventura digna de
ser leída;
66
GIARDINELLI, Mempo. El género negro: orígenes y evolución de la literatura policial y su
influencia en Latinoamérica. 1ªed. Buenos Aires: Capital Intelectual, 2013, p. 111-113.
247
ANEXO IX
Quadro comparativo entre as variantes do gênero narrativo:
romance policial clássico; novela negra; romance criminal e romance
infrapolicial
252
253
ANEXO X
EL GUSANO
Demos gracias por nuestra pobreza, dijo el tipo vestido con harapos.
Lo vi con este ojo: vagaba por un pueblo de casas chatas,
hechas de cemento y ladrillo, entre México y Estados Unidos.
demos gracias por nuestra violencia, dijo, aunque sea estéril
como un fantasma, aunque a nada nos conduzca,
tampoco estos caminos conducen a ninguna parte.
Lo vi con este ojo: gesticulaba sobre un fondo rosado
que se resistía al negro, ah, los atardeceres de la frontera,
leídos y perdidos para siempre.
Los atardeceres que envolvieron al padre de Lisa
a principios de los cincuenta.
Los atardeceres que vieron pasar a Mario Santiago,
arriba y abajo, aterido de frío, en el asiento trasero
del coche de un contrabandista. Los atardeceres
del infinito blanco y del infinito negro.
en la Mente desalojada
Parecían las caminatas a altas horas de la noche
de Mario Santiago
En la Menta desalojada
En los espejos encantados
En el huracán del D.F.
Los dedos cortados renacían
con velocidad sorprendente
Dedos cortados, quebrados, esparcidos
en el aire del D.F.
256
ANEXO XI
EL GUSANO
era como si el mar se hubiera abierto y pudiera ahora ver el fondo marino. La
Alameda vacía era el fondo marino y el Gusano su joya más preciada. Lo
saludé, seguramente hice alguna observación banal, se puso a diluviar,
abandonamos juntos la Alameda en dirección a la avenida Hidalgo y luego
caminamos por Lázaro Cárdenas hasta Perú.
Lo que sucedió después es borroso, como visto a través de la lluvia
que barría las calles, y al mismo tiempo de una naturalidad extrema. El bar se
llamaba Las Camelias y estaba lleno de mariachis y vicetiples. Yo pedí
enchiladas y una TKT, el Gusano una Coca- Cola y más tarde (pero no debió
de ser mucho más tarde) le compró a un vendedor ambulante tres huevos de
caguama. Quería hablar de Jaqueline Andere. No tardé en comprender,
maravillado, que el Gusano no sabía que aquella mujer era una actriz de cine.
Le hice notar que precisamente estaba filmando una película, pero el Gusano
simplemente no recordaba a los técnicos ni los aparejos desplegados para la
filmación. La presencia de Jaqueline en el sendero en donde se hallaba su
banco había borrado todo lo demás. Cuando dejó de llover el Gusano sacó un
fajo de billetes del bolsillo trasero, pagó y se fue.
Al día siguiente nos volvimos a ver. Por la expresión que puso al verme
pensé que no me reconocía o que no quería saludarme. De todos modos me
acerqué. Parecía dormido aunque tenía los ojos abiertos. Era flaco, pero sus
carnes, excepto los brazos y las piernas, se adivinaban blandas, incluso fofas,
como las de los deportistas que ya no hacen ejercicios. Su flaccidez, pese a
todo, era más de orden moral que físico. Sus huesos eran pequeños y fuertes.
Pronto supe que era del norte o que había vivido mucho tiempo en el norte, que
para el caso es lo mismo. Soy de Sonora, dijo. Me pareció curioso, pues mi
abuelo también era de allí. Eso interesó al Gusano y quiso saber de qué parte
de Sonora. De Santa Teresa, dije. Yo de Villaviciosa, dijo el Gusano. Una
noche le pregunté a mi padre si conocía Villaviciosa. Claro que la conozco, dijo
mi padre, está a pocos kilómetros de Santa Teresa. Le pedí que me la
describiera. Es un pueblo muy pequeño, dijo mi padre, no debe tener más de
mil habitantes (después supe que no llegaban a quinientos), bastante pobre,
con pocos medios de subsistencia, sin una sola industria. Está destinado a
desaparecer, dijo mi padre. ¿Desaparecer cómo?, le pregunté. Por la
emigración, dijo mi padre, la gente se va a ciudades como Santa Teresa o
Hermosillo o a Estados Unidos. Cuando se lo dije al Gusano éste no estuvo de
acuerdo, aunque en realidad la frase «estar de acuerdo» o «estar en
desacuerdo» para él no tenían ningún significado. El Gusano no discutía
nunca, tampoco expresaba opiniones, no era un dechado de respeto por los
demás, simplemente escuchaba y almacenaba, o tal vez sólo escuchaba y
después olvidaba, atrapado en una órbita distinta a la de la otra gente. Su voz
era suave y monocorde aunque a veces subía el tono y entonces parecía un
loco que imitara a un loco y yo nunca supe si lo hacía a propósito, como parte
de un juego que sólo él comprendía, o si no lo podía evitar y aquellas salidas
de tono eran parte del infierno. Cifraba su seguridad en la pervivencia de
Villaviciosa en la antigüedad del pueblo; también, pero eso lo comprendí más
tarde, en la precariedad que lo rodeaba y lo carcomía, aquello que según mi
padre amenazaba su misma existencia.
No era un tipo curioso aunque pocas cosas se le pasaban por alto. Una
vez miró los libros que yo llevaba, uno por uno, como si le costara leer o como
si no supiera. Después nunca más volvió a interesarse por mis libros aunque
260
cada mañana yo aparecía con uno nuevo. A veces, tal vez porque de alguna
manera me consideraba un paisano, hablábamos de Sonora, que yo apenas
conocía: sólo había ido una vez, para el funeral de mi abuelo. Nombraba
pueblos como Nacozari, Bacoache, Fronteras, Villa Hidalgo, Bacerac, Bavispe,
Agua Prieta, Naco, que para mí tenían las mismas cualidades del oro.
Nombraba aldeas perdidas en los departamentos de Nacori Chico y
Bacadéhuachi, cerca de la frontera con el estado de Chihuahua, y entonces, no
sé por qué, se tapaba la boca como si fuera a estornudar o a bostezar. Parecía
haber caminado y dormido en todas las sierras: la de Las Palomas y La
Cieneguita, la sierra Guijas y la sierra La Madera, la sierra San Antonio y la
sierra Cibuta, la sierra Tumacacori y la sierra Sierrita bien entrado en el
territorio de Arizona, la sierra Cuevas y la sierra Ochitahueca en el noreste
junto a Chihuahua, la sierra La Pola y la sierra Las Tablas en el sur, camino de
Sinaloa, la sierra La Gloría y la sierra El Pinacate en dirección noroeste, como
quien va a Baja California. Conocía toda Sonora, desde Huatabampo y
Empalme, en la costa del Golfo de California, hasta los villorrios perdidos en el
desierto. Sabía hablar la lengua yaqui y la pápago (que circulaba libremente
entre los lindes de Sonora y Arizona) y podía entender la seri, la pima, la mayo
y la inglesa. Su español era seco, en ocasiones con un ligero aire impostado
que sus ojos contradecían. He dado vueltas por las tierras de tu abuelo, que en
paz descanse, como una sombra sin asidero, me dijo una vez.
Cada mañana nos encontrábamos. A veces intentaba hacerme el
distraído, tal vez reanudar mis paseos solitarios, mis sesiones de cine
matinales, pero él siempre estaba allí, sentado en el mismo banco de la
Alameda, muy quieto, con el Bali colgándole de los labios y el sombrero de paja
tapándole la mitad de la frente (su frente de gusano blanco) y era inevitable que
yo, sumergido entre las estanterías de la Librería de Cristal, lo viera, me
quedara un rato contemplándolo y al final acudiera a sentarme a su lado.
No tardé en descubrir que iba siempre armado. Al principio pensé que
tal vez fuera policía o que lo perseguía alguien, pero resultaba evidente que no
era policía (o que al menos ya no lo era) y pocas veces he visto a nadie con
una actitud más despreocupada con respecto a la gente: nunca miraba hacia
atrás, nunca miraba hacia los lados, raras veces miraba el suelo. Cuando le
pregunté por qué iba armado el Gusano me contestó que por costumbre y yo le
creí de inmediato. Llevaba el arma en la espalda, entre el espinazo y el
pantalón. ¿La has usado muchas veces?, le pregunté. Sí, muchas veces, dijo
como en sueños. Durante algunos días el arma del Gusano me obsesionó. A
veces la sacaba, le quitaba el cargador y me la pasaba para que la examinara.
Parecía vieja y pesada. Generalmente yo se la devolvía al cabo de pocos
segundos, rogándole que la guardara. A veces me daba reparo estar sentado
en un banco de la Alameda conversando (o monologando) con un hombre
armado, no por lo que él pudiera hacerme pues desde el primer instante supe
que el Gusano y yo siempre seríamos amigos, sino por temor a que nos viera
la policía del D.F., por miedo a que nos cachearan y descubrieran el arma del
Gusano y termináramos los dos en algún oscuro calabozo.
Una mañana se enfermó y me habló de Villaviciosa. Lo vi desde la
Librería de Cristal y me pareció igual que siempre, pero al acercarme a él
observé que la camisa estaba arrugada, como si hubiera dormido con ella
puesta. Al sentarme a su lado noté que temblaba. Poco después los temblores
fueron en aumento. Tienes fiebre, dije, tienes que meterte en la cama. Lo
261
billetes y dijo algo acerca de las molestias que yo había tenido el día anterior.
Era mucho dinero. Le dije que no me debía nada, que hubiera hecho lo mismo
por cualquier amigo. El Gusano insistió en que cogiera el dinero. Así podrás
comprar algunos libros, dijo. Tengo muchos, contesté. Así dejarás de robar
libros por algún tiempo, dijo. Al final le quité el dinero de las manos. Ha pasado
mucho tiempo, ya no recuerdo la cifra exacta, el peso mexicano se ha
devaluado muchas veces, sólo sé que me sirvió para comprarme veinte libros y
dos discos de los Doors y que para mí esa cantidad era una fortuna. Al Gusano
no le faltaba el dinero.
Nunca más me volvió a hablar de Villaviciosa. Durante un mes y medio,
tal vez dos meses, nos vimos cada mañana y nos despedimos cada mediodía,
cuando llegaba la hora de comer y yo volvía en el camión de la Villa o en un
pesero rumbo a mi casa. Alguna vez lo invité al cine, pero el Gusano nunca
quiso ir. Le gustaba hablar conmigo sentados en su banco de la Alameda o
paseando por las calles de los alrededores y de vez en cuando condescendía a
entrar en un bar en donde siempre buscaba al vendedor ambulante de huevos
de caguama. Nunca lo vi probar alcohol. Pocos días antes de que
desapareciera para siempre le dio por hacerme hablar de Jaqueline Andere.
Comprendí que era su manera de recordarla. Yo hablaba de su pelo rubio
ceniza y lo comparaba favorable o desfavorablemente con el pelo rubio
amielado que lucía en sus películas y el Gusano asentía levemente, la vista
clavada al frente, como si tuviera a Jaqueline Andere en la retina o como si la
viera por primera vez. Una vez le pregunté qué clase de mujeres le gustaban.
Era una pregunta estúpida, hecha por un adolescente que sólo quería matar el
tiempo. Pero el Gusano se la tomó al pie de la letra y durante mucho rato
estuvo cavilando la respuesta. Al final dijo: tranquilas. Y después añadió: pero
sólo los muertos están tranquilos. Y al cabo de un rato: ni los muertos, bien
pensado.
Una mañana me regaló una navaja. En el mango de hueso se podía
leer la palabra «Caborca» escrita en finas letras de alpaca. Recuerdo que le di
las gracias efusivamente y que aquella mañana, mientras platicábamos en la
Alameda o mientras paseábamos por las concurridas calles del centro, estuve
abriendo y cerrando la hoja, admirando la empuñadura, tentando su peso en la
palma de mi mano, maravillado de sus proporciones tan justas. Por lo demás,
aquel día fue idéntico a todos los otros. A la mañana siguiente el Gusano ya no
estaba.
Dos días después lo fui a buscar a su pensión y me dijeron que se
había marchado al norte. Nunca más lo volví a ver
263
ANEXO XII
Capa do livro 2666