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13/03/2023, 22:25 Kenzaburo Oe levou o Nobel com literatura em defesa da paz - 13/03/2023 - Ilustrada - Folha

ANÁLISE LIVROS (HTTPS://WWW1.FOLHA.UOL.COM.BR/ILUSTRADA/LIVROS/)

Kenzaburo Oe devotou sua literatura


nobelizada à paz e ao humanismo
Escritor, que morreu este mês, costurou tragédias íntimas e sociais do Japão em
enfrentamento direto à violência

13.mar.2023 às 19h01

Andrei Cunha
Professor de literatura japonesa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul

PORTO ALEGRE Kenzaburo (https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2022/05/a-substituicao-e-um-romance-tatico-


sobre-caso-de-agressao-sexual.shtml)Oe (https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2022/05/a-substituicao-e-um-romance-

tatico-sobre-caso-de-agressao-sexual.shtml), Nobel de Literatura que teve a morte divulgada

nesta segunda-feira (https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2023/03/morre-aos-88-anos-o-nobel-de-literatura-


japones-kenzaburo-oe.shtml), produziu seus primeiros ensaios e poemas quando estava no

ensino médio. Ainda como estudante universitário no Japão, escreveu algumas


peças teatrais e, em 1957, começou a publicar contos.

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O escritor japonês Kenzaburo Oe em 1995, um ano depois de vencer o prêmio Nobel de Literatura
- AFP

O primeiro deles, "Tarefa Insólita", ganhou elogios da crítica e, no ano seguinte,


o conto "Animal de Cria" ganhou o prêmio Akutagawa, o mais prestigioso de
seu país.

Nessas narrativas iniciais, já encontramos o autor partindo de suas


experiências de infância durante a Guerra do Pacífico para discutir questões
como a alienação e a vida em uma sociedade ultranacionalista.

Em 1958, lançou seu primeiro livro de contos —publicado no Brasil em 1995


com o título "Contos de Oe Kenzaburo"— e seu primeiro romance, "Me Mushiri
ko Uchi", ou arranquem os brotos e atirem nas crianças, inédito no Brasil. Este
último narra o que acontece a um grupo de meninos que foge de um
reformatório e vai parar em um vilarejo isolado.

Em 1963, seu filho Hikari foi diagnosticado com uma hérnia cerebral ao nascer
(https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrada/217769-montagem-fala-sobre-rejeicao-e-afeto-de-maneira-precisa-e-

delicada.shtml). Uma cirurgia era necessária e, mesmo que o bebê fosse salvo,

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sofreria de graves sequelas. Incapaz de se decidir, Oe partiu para Hiroshima,


com o intento de fazer uma reportagem sobre os grandes protestos
internacionais pelo fim das armas nucleares.

O livro resultante, "Hiroshima Nôto", ou notas de Hiroshima, faz uma reflexão


sobre o significado histórico e humano da tragédia, a partir dos relatos dos
sobreviventes.

Ao retornar a Tóquio, ele e a mulher optaram pela cirurgia e se


comprometeram a cuidar de Hikari. Em 1964, publica "Aghwii, o Monstro
Celeste", incluído na coletânea "14 Contos de Kenzaburo Oe"
(https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrada/17877-nobel-japones-subverte-o-real-em-narrativas.shtml), e o romance
"Uma Questão Pessoal".

Este último se opõe a "Notas de Hiroshima", uma questão social. É a história de


Bird, um professor de inglês cujo filho nasce com uma hérnia cerebral. A
jornada da personagem dialoga com temas do existencialismo e a obra de Jean-
Paul Sartre —tema de tese de Oe na faculdade de letras da Universidade de
Tóquio.

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Ao longo dos anos 1970, continuou ativo em diversos gêneros, com destaque
para "Notas de Okinawa", com ensaios sobre a situação da ilha japonesa no pós-
guerra e a sua ocupação pelas forças militares dos EUA, assim como para o
romance "Dôjidai geemu", o jogo da contemporaneidade.

No ano de 1983, lança o livro "Jovens de um Novo Tempo, Despertai!"


(https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq1706200617.htm), com sete narrativas. O Nobel de

Literatura (https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2022/10/nobel-de-literatura-premia-a-francesa-annie-ernaux.shtml)
viria em 1994, o segundo para um escritor japonês, depois de Yasunari
Kawabata.

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Ao receber o prêmio, seu discurso "O Japão Ambíguo e Eu" era uma clara crítica
ao discurso de 1968 de Kawabata, "O Belo Japão e Eu". Já nos anos 2000,
publica o romance "A Substituição ou As Regras do Tagame", o primeiro de uma
série centrada no personagem Kogito Choko, um alter ego de Oe, seguido de
"Adeus, Meu Livro!", que acaba de sair no Brasil, e de "Morte na Água".

Sua obra de maturidade demonstra o domínio da técnica, fazendo uso de uma


cornucópia de referências à literatura do mundo, de "Dom Quixote" a William
Blake, abarcando a poesia e as narrativas clássicas de seu país.

Há um esforço para dar significado a grandes questões sociais e pessoais —uma


das quais, o suposto suicídio de seu cunhado, o cineasta Itami Juzo, ainda é
causa de polêmica na sociedade japonesa.

Muitos japoneses da geração de Oe se tornaram pacifistas e se declaram contra


o uso de materiais radioativos. Para grande preocupação do autor, no entanto,
as gerações nascidas após o milagre japonês não pareciam tão investidas no
ideal antimilitarista.

A trajetória de Oe é muitas vezes apresentada em contraste com a de seu


conterrâneo, o escritor de extrema direita Yukio Mishima
(https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2020/06/conto-japones-revela-a-voltagem-erotica-de-um-pacto-de-morte.shtml),

que nutria convicções políticas diametralmente opostas às suas.

Se Mishima revela o mais profundo niilismo e conservadorismo —ao contrário


de Oe, um humanista que devotou a vida à causa da paz—, os dois japoneses
têm em comum uma visão romântica e rebelde frente à violência da vida.

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