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Conselho Nacional de Justiça

PROPOSTA DE REVISÃO Nº 200820000007325

RELATOR : CONSELHEIRO TÉCIO LINS E SILVA


REQUERENTE : CONSELHEIRO TÉCIO LINS E SILVA
REQUERIDO : CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA
ASSUNTO : PEDIDO DE REVOGAÇÃO DO ENUNCIADO
ADMINISTRATIVO Nº. 11 DO CNJ

ACÓRDÃO

EMENTA: REVISÃO DE ENUNCIADO


ADMINISTRATIVO. INFORMATIZAÇÃO DOS
PROCESSOS JUDICIAIS. LIMITAÇÃO DO
ACESSO AOS AUTOS APENAS ÀS PARTES E
ADVOGADOS CONSTITUÍDOS. LEI Nº.
11.419/2006. Desrespeitam o Estatuto da Advocacia
quaisquer normas que obstam o acesso dos Advogados
aos autos. É direito do advogado “examinar, em
qualquer órgão dos Poderes Judiciário e Legislativo, ou
da Administração Pública em geral, autos de processos
findos ou em andamento, mesmo sem procuração,
quando não estejam sujeitos a sigilo, assegurada a
obtenção de cópias, podendo tomar apontamentos”
(artigo 7º, inciso XIII, Lei nº 8.906/94). Norma geral –
que trata da informatização do processo judicial – não
tem o condão de revogar garantia prevista em norma
específica – Estatuto da Advocacia. Votação em Sessão
com quorum incompleto. Ausência do Presidente.
Negativa de vista a Conselheiro. Violação do art. 50 do
RICNJ. Pedido de Revisão deferido. Enunciado
Administrativo nº. 11 revogado por maioria de votos.

VISTOS, etc.

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Conselho Nacional de Justiça
ACORDAM os Conselheiros que compõem o Conselho Nacional de
Justiça, por maioria de votos, em julgar procedente o pedido, nos termos do voto
do Relator.
O Senhor Conselheiro Técio Lins e Silva:

Já no final da Sessão do dia 13 de maio último, quando o Presidente


Gilmar Mendes precisou ausentar-se, e o Conselheiro Joaquim Falcão também não
mais estava em Plenário, foi submetida a julgamento a Questão de Ordem no PCA
3932, tendo o Conselheiro Relator proposto a de minuta de Enunciado
Administrativo, no seguinte sentido:

“Nos processos digitais findos ou em curso perante o Conselho Nacional


de Justiça, o acesso à íntegra dos autos é limitado às partes e seus
advogados constituídos e ao Ministério Público (Lei nº 11.419/2006, art.
11, § 6º).” Questão de Ordem no PCA 200710000003932.

Tal proposta teria decorrido de decisão tomada na 59ª Sessão


Ordinária, em 25 de março de 2008, assim constante do sistema:

Inconformado com a proposta e entendendo que o assunto merecia


melhor análise, na forma do art. 59 do Regimento Interno do CNJ, pedi vista no
momento em que me foi solicitado o voto, sendo ela negada sob o fundamento de
que se tratava de Enunciado Administrativo, conforme a Certidão do Julgamento.

Inconformado com a decisão requeri a revisão do referido Enunciado,


sobretudo por que ele se refere a apenas UM precedente e a matéria, data vênia, não
foi suficientemente debatida nem contou com o consenso unânime para a sua
elaboração.

Trata-se de matéria sensível ao exercício da advocacia e, certamente,


a manutenção do Enunciado, tal qual aprovado, trará muito mais prejuízos do que

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vantagens, sobretudo por que estaremos impedindo, de maneira equivocada, que os
Advogados possam exercer o seu múnus na plenitude do que assegura o estado de
direito democrático.

As razões que instruíram o pedido de revisão são as que constam da


Declaração de Voto oferecidas nos seguintes termos:

“O Senhor Conselheiro Técio Lins e Silva:


Não obstante a aprovação do enunciado em referência, por maioria,
na 62ª Sessão do Plenário do Conselho Nacional de Justiça, ocorrida em 13/5/2008,
quero aqui consignar minha profunda irresignação com o teor ali explanado. E não
há aqui espaço para a justificativa de que o enunciado simplesmente repete aquilo
que foi dito pela lei federal.

Alto lá.

O enunciado não pode simplesmente repetir tamanho absurdo porque


está escrito na lei. Quantas leis sancionadas e publicadas não são julgadas
inconstitucionais ou abusivas ?

A lei de fato prescreve que “os documentos digitalizados juntados em


processo eletrônico somente estarão disponíveis para acesso por meio da rede
externa para suas respectivas partes processuais e para o Ministério Público,
respeitado o disposto em lei para as situações de sigilo e de segredo de justiça”,
mas isto não a isenta de ilegalidade. Registro desde já que a previsão em referência
também é passível de questionamento, mas o deixemos para outra oportunidade,
aqui tratemos do enunciado administrativo.

Observe-se que o enunciado, ao tolher o direito de acesso aos autos


pelo advogado não constituído, foi mais rígido e específico que a própria lei que o

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inspirou. A regra que assegura ao Advogado a vista dos autos sem procuração é
prerrogativa que se concede ao cidadão, do qual o Advogado é mandatário, para
assegurar o direito de defesa. Quantas vezes o Advogado – sobretudo o que trabalha
com a prova, como no âmbito criminal ou na advocacia de família – necessita colher
prova emprestada para instruir a causa de seu cliente.

Além disso, no cotidiano da advocacia, o Advogado muitas vezes


antes de assumir a causa necessita conhecê-la para dizer se a aceita, estabelecer
condições de trabalho, enfim, formalizar o vínculo profissional. Não tem sentido que
para tanto o Advogado necessite de procuração, que pressupõe a relação formal já
estabelecida. Não é conveniente que a procuração seja concedida para quem ainda
não é o Advogado da causa!

Não se diga que aqui a situação é diversa, pois se trata de processo


virtual. Ora, isto não muda absolutamente nada, pois não existe um Estatuto da
Advocacia Virtual. Os direitos e prerrogativas da profissão estão destinados à
advocacia em geral e não ao modelo de processo.

A forma virtual que os autos eventualmente assumem não pode, data


vênia, servir de pretexto para limitar o exercício da advocacia e impor limites que
não existem no Estatuto da Advocacia e da OAB e na própria Constituição do Brasil,
onde, expressamente, reconhece que “o advogado é indispensável à administração
da justiça” (art. 133).

Acrescento, finalmente, o fato de que a decisão expressa na Certidão


de Julgamento do PCA 2007.10.00000393-2 não determina os termos do Enunciado,
como pode ser observado:

“O Conselho, por unanimidade, após questão de ordem levantada


pelo Conselheiro Relator, propôs a elaboração de Enunciado
Administrativo, a ser aprovado oportunamente, quanto à

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uniformização e publicidade no que se refere ao acesso aos
advogados aos documentos dos autos eletrônicos. Ante a ausência
justificada da Conselheira Ministra Ellen Gracie (...)”

Por coincidência, também nessa Sessão, não estava presente a


Presidente do CNJ.

Temos que ter cuidado com o enunciado aprovado. Sua validade e


eficácia no âmbito virtual é um precedente perigosíssimo para a legalização dos
correntes impedimentos havidos em processos físicos que tramitam nos tribunais
deste país.

Ressalto mais uma vez que consentir com o sucesso do enunciado é


engessar qualquer manifestação posterior desta Corte no sentido de coibir os abusos
praticados pelos Órgãos do Poder Judiciário. E tramitam neste Conselho diversos
procedimentos em que esses atos são questionados.

Se mantido o enunciado nos termos que aprovado, com que


autonomia o Conselho poderá analisar e se manifestar sobre os temas afetos ao
direito de o advogado ter vista dos autos, mesmo sem procuração? A vista dos autos
pelo advogado é garantia expressamente prevista no seu Estatuto, Estatuto este
estabelecido por lei específica que não se curva aos comandos da norma geral.

Frise-se, o Estatuto da Advocacia – Lei nº. 8.906/1994 – é norma


federal que regulamenta o exercício de uma profissão, portanto, norma específica
que não se curva aos comandos de norma geral – Lei nº. 11.419/2006 –
posteriormente editada e restritiva de direitos naquela previstos.

Ante o exposto, estou fazendo esta Declaração de Voto para todos os


efeitos e, baseado nos seus termos, requerendo ao Plenário a sua revisão. Um único
precedente não justifica um enunciado nem deve ser decidido como o foi, na

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verdade, no final da Sessão, sem discussão, com o quorum incompleto, sem a
presença do Presidente do CNJ e, além disso, impedindo a vista requerida por um
Conselheiro, em desrespeito ao art. 59 do RICNJ.

Esta Declaração de Voto deve fazer parte integrante do Acórdão da


decisão, para todos os efeitos legais. Sala das Sessões, 13 de maio de 2008.
Conselheiro TÉCIO LINS E SILVA – Relator.”

Assim sendo, antes de sua publicação, foi requerida a revogação


desse Enunciado, em 26 de maio último, pelo convencimento de que será a melhor
decisão para preservar a autoridade do Conselho Nacional de Justiça e sua exata
compostura em relação aos Advogados e às partes que eles representam.

O Conselho Nacional de Justiça acolheu as razões do Conselheiro


Relator, por maioria de votos, e revogou o seu Enunciado Administrativo nº. 11.

Publique-se. Arquive-se.

Sala de Sessões, 09 de setembro de 2008.

Técio Lins e Silva


Conselheiro

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