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A Atuação Do Psicólogo No Contexto Do SUS
A Atuação Do Psicólogo No Contexto Do SUS
Resumo
O artigo problematiza a atuação do psicólogo no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). A partir do
entendimento de princípios norteadores do SUS e das práticas integrativas da Política Nacional de Humanização,
considera-se suscitar a interação do saber acadêmico a saberes e práticas locais. Argumenta-se que a procura por
soluções conectadas às distintas realidades encontradas no SUS deve tomar parte da prática do psicólogo,
orientada para a transformação social. O tema é tratado sob uma perspectiva crítica, mobilizando visões teóricas
com vistas ao rendimento analítico.
Abstract
The article problematizes the performance of the psychologist within the scope of the Unified Health System
(SUS). Based on the understanding of guiding principles of the SUS and the integrative practices of the National
Humanization Policy, it is considered to raise the interaction of academic knowledge with local knowledge and
practices. It is argued that the search for solutions connected to the different realities found in SUS should be
part of the psychologist’s practice, oriented toward social transformation. The subject is treated from a critical
perspective, mobilizing theoretical views with a intent to analytical performance.
Resumen
El artículo problematiza la actuación del psicólogo en el ámbito del Sistema Único de Salud (SUS). A partir del
entendimiento de principios orientadores del SUS y de las prácticas integrativas de la Política Nacional de
Humanización, se considera suscitar la interacción del saber académico a saberes y prácticas locales. Se
argumenta que la búsqueda de soluciones conectadas a las distintas realidades encontradas en el SUS debe tomar
parte de la práctica del psicólogo, orientada a la transformación social. El tema es tratado desde una perspectiva
crítica, movilizando perspectivas teóricas con vistas al rendimiento analítico.
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Graduanda no curso de Psicologia no Centro Universitário Tiradentes (Unit-AL).
Pesquisas e Práticas Psicossociais, 16(1), São João del-Rei, janeiro-março de 2021. e-2905
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atendiam apenas poucas famílias (Aguiar, compulsória, o que viria a gerar mais tarde
2015). a Revolta da Vacina.2 A partir de 1920,
A organização da Sociedade de tem início a Previdência Social para
Medicina do Rio de Janeiro, em 1829, determinadas categorias de trabalhadores,
torna-se um marco para a Medicina Social tais como ferroviários e portuários. O
no Brasil, iniciando um extenso programa segmento da população que não contribuía
que inclui ações educacionais e para o sistema previdenciário era atendido
reguladoras, tais como Educação Física por hospitais filantrópicos ou pelos
para crianças, assim como procura também curandeiros populares (Aguiar, 2015).
normatizar farmácias e a assistência Segundo Paim (2009), o nascimento do
prestada em hospitais (Nunes, 2000). As sistema público de saúde ocorreu por três
ideias da referida Sociedade contribuíram vias, sendo elas a saúde pública, a
para um ordenamento social, uma vez que Medicina Previdenciária e a Medicina do
atentavam para os aspectos ambientais e Trabalho, que, como subsistemas, além de
sociais que geravam e perpetuavam atender a diferentes demandas, eram
doenças na população. Da mesma forma, buscados em paralelo com os sistemas
contribuíram para a naturalização o liberal e popular.
discurso médico sobre a cidade,
diagnosticando e buscando soluções para A organização dos serviços de saúde no
os males da cidade, tal como se fosse um Brasil antes do SUS vivia em mundos
separados: de um lado, as ações voltadas
organismo adoecido. para a prevenção, o ambiente e a
coletividade, conhecidas como saúde
Os médicos, depois de espacializar a doença, pública; de outro, a saúde do trabalhador,
depois de localizar os ambientes insalubres inserida no Ministério do Trabalho; e, ainda,
(hospitais, prisões, matadouros, cemitérios, as ações curativas e individuais, integrando a
quartéis, barcos, instalações portuárias, casa medicina previdenciária e as modalidades de
do pobre etc.), isolam no sistema urbano as assistência médica liberal, filantrópica e,
regiões a “medicalizar” de urgência e que progressivamente, empresarial. (Paim, 2009,
devem constituir pontos de aplicação de um p. 31).
exercício do poder médico. Elaboram
também medidas de tipo higiênico-social
que possam contribuir para a melhoria da
O acesso à saúde, mesmo garantido a
saúde e das condições de existência da determinado segmento do operariado, por
população. Propõem o ordenamento do meio dos fundos previdenciários, ainda
espaço urbano e a intervenção no meio tinha a contribuição previdenciária como
doentio. Ou seja, fazem propostas de condicionante para sua utilização,
“medicalização” da cidade. Medicalizar a
cidade, higienizar, significa controlar,
excluindo de sua tutela grande parte da
intervir nos ambientes suscetíveis de população. A noção de saúde pública, por
prejudicar a saúde. (Costa, 2002, p. 68).
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A Revolta da Vacina foi uma reação popular
Ao longo da assim chamada ocorrida no período de 10 a 16 de novembro de
República Velha (1889-1930), a situação 1904 na cidade do Rio de Janeiro, motivada pela
da saúde pública teve poucos avanços; as regulamentação da lei que decretava
obrigatoriedade de vacinação contra a varíola em
condições de saneamento básico ainda todo o território brasileiro. A população, já
eram deficientes e as medidas tomadas insatisfeita com as desapropriações e demolições
visavam a evitar que a produtividade dos de moradias, além das ações das brigadas
setores da economia agrária e a política de sanitaristas, como remoção de doentes e inspeção
imigração fossem afetadas. Foi adotada residenciais com apoio da força policial, se
manifestou contra as medidas, o que resultou num
como medida de combate às epidemias conflito reprimido com forte ação da polícia.
urbanas e rurais a campanha sanitária, a Depois do episódio, a vacinação passou a ser
qual foi inspirada em um modelo militar opcional (Aguiar, 2015; Carvalho apud Paim,
que impunha ações como a vacinação 2006).
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permitir ser flexível o suficiente para se cuidado sem discutir a gestão desse
reinventar em resposta às demandas que cuidado (Benevides, 2005).
surgem diariamente, sem com isso perder Em relação ao significado do
sua identidade profissional. Como afirma compromisso social, a percepção dos
Benevides (2005, p. 23), “o processo de profissionais está muito ligada ao
inventar-se é imediatamente invenção do cumprimento de regras e aos atendimentos
mundo e vice-versa”. É no processo de individuais, aos moldes do modelo clínico.
interação com o mundo que nos Ater-se à psicoterapia expressa uma
constituímos como atores e construímos estratégia de conferir identidade ao
nossas percepções acerca de nós mesmos e trabalho do psicólogo, que também faz
do universo que nos cerca. parte de uma certa disputa de poder com os
No processo constante de construção psiquiatras, uma vez que eles utilizam a
e desconstrução de ideias, de escuta para a prescrição farmacológica
conhecimento e de afirmação de si e do (Dimenstein, 2001). A escolha de uma
outro, surgem possibilidades de atuação, atividade clássica da Psicologia, ao que
seus limites e espaços do campo ainda não parece, está também vinculada a interesses
explorados. É um contínuo refazer, não de de uma categoria de afirmar-se perante os
forma aleatória e responsiva, mas orientada outros profissionais de saúde, demarcando
pelo desejo genuíno de afirmação da seu lugar nesse campo, mesmo que se
existência, a fim de possibilitar uma ação fechando em suas próprias práticas.
humanizada e humanizante. Ocorre Essa atitude perde de vista o
também o desejo de rompimento com uma princípio da transversalidade, assim como
relação sujeito-objeto, mecanizada e o da integralidade. Ao não buscar a
repetitiva, que não se adequa às interação com outros campos de saber, não
especificidades da população atendida. Isso só deixa de haver intervenções que melhor
igualmente serve para a relação da atendam à população, mas perde-se
Psicologia com outros campos de saber, também a oportunidade de cada vez mais
como será discutido adiante. construir-se como um campo de saber. Da
mesma forma, é uma demarcação de seu
Considerações finais lugar hierárquico em relação ao usuário do
SUS, uma vez que também diz respeito ao
A questão da identidade do reconhecimento da sociedade, do seu lugar
profissional de Psicologia na saúde pública como profissional da área de saúde. Cabe
é algo que parece perpassar toda a questionar o tipo de cuidado que se produz
discussão acerca do seu posicionamento na nessa relação.
construção do atendimento prestado à A postura acrítica dos psicólogos em
população e mesmo do SUS. Ao relação a si e aos papéis que desempenham
reconhecer sua identidade – e, portanto, (e podem desempenhar) oferece apenas,
seu lugar no sistema –, posicionar-se em se tratando especificamente aqui do
profissionalmente implica em reconhecer serviço de saúde pública, velhas práticas
também a própria responsabilidade pela para novos contextos e, ainda, defasadas
cogestão do SUS e, assim, um formas de se pensar uma realidade
posicionamento político diante da dinâmica, a qual se tenta encaixar em
realidade. Percebe-se, assim, que a prática modelos teóricos que não dão conta de
do psicólogo orientada para a compreendê-la. Dessa forma, a Psicologia
transformação da realidade se articula opta por ser um instrumento que tenta
fortemente com a atuação política quando explicar uma realidade sem se comunicar
apresenta o princípio ético da de fato com ela, limitando sua visão e,
inseparabilidade: não há como se falar em consequentemente, as possibilidades de
criar em conjunto com a população a que
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