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EXTRAPRENS| V SICCAL [GT1- COMUNICACAO, CULTURA E DIVERSIDADE ] Andrea Rosendo da Silva Programa de Pés-Graduagdo em Integragiio da América Latina (Protam - USP), Sao Paulo, SP Dennis de Oliveira Escola de Comunicagdes e Artes (ECA - USP), Sto Pe SP Rosendo da Sve ‘Andea Peupectvadecigaate pesados alpen 33 Dennis Olivera ports par anise denarratvas audiovsuas na Apri Latina [ RESUMO ABSTRACT RESUMEN ] Conte eet ea a ened Sasa epee ser ED Psa ote Mie ae oe ened BSS oor eee Relea eed dean epee cmon Ce tenance ce teed Pet Cee aren atea ie ee toe ote gt yaaa eT Giron een tint Soy geen ooo eee Concer rote og tk oe eee See ce ered easy nce et Connick eros at os crn ieee Maes eta Ey Peer iicLalaesc tira peers ceri Cu cy ee Veet Cigect creat ects SST e ewe tea cle eine Cec tte es Tenet Raa Voces ee Ee Zr Bei eeu Meee ire Me Caius tenes D eT Lento Palavras-chave: Perspectiva decolonial/anticolonial. Representaco. Cultura visual. Visualiades Mulheres indigenas eafro-latinas. DS Oe ea aT Sear aT Peo geo Me eB te a ree Cenk contributions of Latin American thinkers about coloniality of power, being, knowledge CU Se aU ena a Re ges Ciclo al ee ene ret be ra eae eatin cyte mec ed Tae RECS cmc Boe delish ni eta om CnC ECR Crp goue mE Rogie sc eT eco DO er See sua ee een eat eer emcee cer Rea eit Pe re ect ee aU ero Bc nae Re mel Amerindian women, as conceptualized by Lélia Gonzalez. Keywords: Decolonial/anticolonial perspective. Representation. Visual culture. Visualities. Indigenous and Afre-Latin wornen. Los estudios sobre las relaciones de género desde la perspectiva Decolonial / Anticolonial ees ee ra tesa Ea Call actrees ee eed de las mujeres latinoamericanas sobre la colonialidad del poder, el ser, el conocimiento y el género. Si partimos dea cuestin desi mismos, los estudios de avance de la representacin y larepresentacién en relacién con la discusién de otras formas de ver y mirar, a partir de las Ce oreo se Crue Suita does co Eek talc Rory Se et korn eee: cn en eee esc Reece Bere Le yunee cb esti g oat eur ane oe uch BMI Lod ott a TeCUN od Oe eas eee acuta pes es oe agar tee eec poe Su eae ed Pct oe Coons eT Len om Palabras clave: Perspectiva decolonial / anticolonial. Representaci6n, Cultura visual. Visualidades. Mujeresindigenasy afrolatinas. DOL htps/doLorg/10.1606/extraprensi2022194395 ‘xtraprenss, S50 Pale 15 n esp 232-250, mai 2022 [ EXTRAPRENSA ] Andres Rosendo da Siva ‘Dennis de Olivera 1. Pensamento de mulheres latino-americanas na Perspectiva Decolonial/Anticolonial sobre colonialidade Entende-se por contemporaneidade esse momento histérico dindmico no qual as sociabilidades diversas empurram para os centros de pesquisas académicos temas como diversidade, relacées raciais e de género, diferenca, identidade, resisténcia, entre outras questées proprias da atuali- dade, as quais demandam por epistemolo- gias plurais. Boaventura Santos (2009) fez a critica em relagdo a hegemonia episte- molégica do norte ao defender a nacdo da epistemologia como conhecimento valido independente de fronteiras. Para o tedrico portugués estamos num momento em que se principia o fim do império da versio eurocéntrica e hegem@nica da historia e dos povos nas ciéncias sociais, pois, para éle, inexiste fronteira para oconhecimento, ou, as epistemologias: Toda a experiéncia social produze repro- duz conhecimento e, ao fazé-lo, pres- supée uma ou varias epistemologias. Epistemologia é toda a nogio ou ideia, reflectida ou nao, sobre as condigées do que conta como conhecimento valido, E por via do conhecimento valido que uma dada experiéncia social se torna intencional e inteligivel. Néo ha, pois, conhecimento sem praticas ¢ actores sociais. E como umas ¢ outros no exis tem sendo no interior de relagdes sociais, diferentes tipos de relagdes sociais podem. dar origem a diferentes epistemologias. (.JNo seu sentido mais amplo, as rela- Ges sociais so sempre culturais (intra- -culturais ou inter-culturais) ¢ politicas xtraprenss, So Pale 15 n esp, p 232-250, ai 2022 Perspoctiva decolonial pensadoras tine americana aortes para anise de narratlvasaaovisualsna Armée Latina (representam distribuig6es desiguais de poder). Assim sendo,qualquer conheci- mento valido é sempre contextual, tanto em termosde diferenca cultural como er termos de diferenca politica, Para além de certos patamares de diferenca cultural e politica, as experiéncias sociais so cons- titufdas por varios conhecimentos, cada um com os seus critérios de validade, ou seja, so constituidas por conhecimentos rivais. (SANTOS, 2009, p10). O pensamento que atualiza a critica aocolonialismo foi adensado na década de 1990 por um grupo de intelectuais do Sul Global vinculadoa diferentes universidades da América Latina. © Grupo Modernidade/ Colonialidade (M/C), segundo Luciana Ballestrin (2013), um movimento episte- mol6gico, foi construide com o objetivo de promaver uma renovacio critica e utopica das ciéncias sociais na América Latina no século XXI. Os intelectuais procuram fazer uma ciéncia que dialogue com saberes e entenda oencontro de epistemologias e nio aisengio de conflitos entre elas. O inicio do Grupo M/C, foi paulatinamenteestruturado por varios seminarios, dialogos paralelos e publicaces; nas décadas seguintes, os estudiosos estruturam a Epistemologia Decolonial, uma perspectiva latino-ame- ricana que trava rupturas com as episte- mologias ocidentais, eurocéntricas, sem, contudo, suprimi-las ou negé-las. Ogrupo propée, entio, a radicalizacdo do argumento pés-colonial no continente por meio da nogdo de “giro decolonial’,a qual fornece uma ideia de mudanga, de revira- volta na tradicdo critica de pensamento latino-americano e promove releituras histéricas a0 mesmo tempo em que pro- blematiza velhas e novas questées para [ EXTRAPRENSA ] 234 Andres Rosendo da Siva ‘Dennis de Olivera ocontinente. A opcao decolonial fica, ento, alicercada como forma epistémica, tedrica e politica, a qual visa compreen- der e atuar em um mundo marcado pela permanéncia de uma colonialidade glo- bal, nos diferentes niveis da vida pessoal e coletiva, como argumenta Catherine Walsh (2007) Por lo tanto, el problema no descansa simplemente en abrir, impensar o rees- tructurar las ciencias sociales como algu- nos estudios sugieren, sino mas bien en poner en cuestidn sus propias bases. Es decir, refutar los supuestos que loca~ lizan la produccién de conocimiento tinicamente en la academia, entre aca- démicos y dentro del cientificismo, los canones y los paradigmas establecidos. Tambien refutar los conceptos de racio- nalidad que rigen el conocimiento mal Namado "experto" , negador y detrac- tor de las practicas, agentes y saberes que no caben dentro de la racionalidad hegeménica y dominante. Tal refutacion no implica descartar por completo esta racionalidad, sino hacer ver sus preten- siones coloniales e imperiales y disputar su posicionamiento como tinica, desta manera cuestionan también la supuesta universalidad del conocimiento cienti- fico que preside las ciencias sociales, en la medida en que no capta la diversidad yy riqueza de la experiencia social ni tam- poco las alternativas epistemologicas contra-hegeménicas y decoloniales que emergen de esta experiencia(WALSH, 2007, p.103} Accontribuigdo de Anibal Quijano (2005) para a concepcao de giro decolo- nial esta na campreensio de que o capita~ lismo colonial/moderno ¢ eurocentrado xtraprenss, So Pale 15 n esp, p 232-250, ai 2022 Perspoctiva decolonial pensadoras tine americana aortes para anise de narratlvasaaovisualsna Armée Latina se estabeleceu como um padrao de poder mundial e é 0 responsavel por uma per- manente colonialidade do poder. Assim, a nocao de colonialidade é problemati- zada a partir do paradigma Histérico Dialético (materialismo) para apreender as relagdes sociais nao apenas pelo viés da categoria classe, mas, também, com possibilidade de ser interseccionada por categorias, como raca e género. (..) Foi decisivo para o processo de modernidade que o centro hegeménico desse mundo estivesse localizado na zona centro-norte da Europa Ocidental. Isso ajuda a explicar por que o centro de elaboracao intelectual desse processo se localizara também ali, e por que essa versio foi a que ganhou a hegemonia mundial. Ajuda igualmente a expli- car por que a colonialidade do poder desempenhara um papel de primeira ordem nessa elaboracsoeurocéntrica da modernidade. Este tltimo nao é muito dificil de perceber se leva em conside- Tago 0 que ja foi demonstrado antes, ‘o modo como a colonialidade do poder esta vinculada com a concentracao na Europa do capital, dos assalariados, do mercado de capital, enfim, da sociedade eda cultura associadas a essas determi- nagées. Nesse sentido, a modernidade foi também colonial desde seu ponto de partida, Mas ajuda também a enten- der por que foi na Europa muito mais direto e imediato o impacto do processo mundial de modernizagao. (QUUANO, 2005). O intelectual peruano entende poder e lutas de poder articulam formas hetero- geéneas de existéncia social e sao “produzi- das em tempos histéricos diferentes e em [ EXTRAPRENSA ] 235 Andres Rosendo da Siva ‘Dennis de Olivera espacos distantes, aquilo que as junta e as estrutura em um mesmo mundo, em uma sociedade concreta, finalmente, em padrées de poder historicamente especificos e deter- minados" (Quijano, 2005, p. 14). O autor complementa o argumento afirmando que, em torno da ideia de raca, foram se redefinindo e se reconfigurando todas as formas e instancias prévias de dominacao. Pontua, ainda, sobre a existéncia da domi- nagéio sexual, mas ndo avanea na percepeao sobre as desigualdades entre os sexos. Assim, no modelo de ordem social, patriarcal, vertical e autoritaria, do qual 08 conquistadores ibéricos eram porta dores, todo homem era, por definicao, superior a toda mulher. Mas a partir da imposicao e legitimacdo da idéia de raca, toda mulher de raga superior tornou-se imediatamente superior, por definicao, a todo homem de raga inferior, Desse modo, a coloniatidade das relagies entre sexos se reconfigurou em dependéncia da colonialidade das relacdes entre ragas. E {sso se associou a producao de novasiden- tidades historicase geoculturais origins rias do novo padrao de poder: "brancos’, “indios’, "negros’, “mesticos’. (QUIIANO, 2005, p. 18). A intelectual argentina Maria Lugones (2008) tece criticas em relacao & Quijano. Na perspectiva decolonial, género ¢ teoria ferninista s4o formula- dos com fontes teoricas diversas visando impedir a reproducao da exclusao do ponto de vista feminista e da categoria género para analise socio-historica. A autora investiga a interseccionalidade entre raga, classe, género e sexualidade para entender e problematizar a indife- renga masculina sobre violéncias sofridas xtraprenss, So Pale 15 n esp, p 232-250, ai 2022 Perspoctiva decolonial pensadoras tine americana aortes para anise de narratlvasaaovisualsna Armée Latina por mulheres (negras, ndo negras indi- genas) na permanéncia colonial do poder (colonialidade do poder). Deste modo, a autora procura compreender como a colonialidade do género opera dentro da colonialidade do poder. Mantendo a concepgao de colonia- lidade a partir do trabalho de Quijano, Lugones (2008) reflete sobre raca e género © propde 0 conceito de colonialidade de género. Para a autora, houve um “esque- cimento” do papel desempenhado por homens no processo de dominagao néo somente de corpos masculinos negros indigenas, mas também de mulheres, ou seja, houve um uso colonial da nocio de género, a qual nao avancou para outras categorias de género além de heterosexual e patriareal. Anibal Quijano concibe la interseccién de raza y género en términos estructurales amplios. Para entender su concepcin de la interseccion de raza y género hay que entender su analisis del patron de poder capitalista Eurocentrado y global. ‘Tanto «razascomo género adquieren sig- nificado en este patrén(..) entiende que el poder esté estructurado en relaciones de dominacién, explotacién, y conflict entre actores sociales que se disputan el control de elos cuatro ambitos basicos de laexistencia humana: sexo, trabajo, auto- ridad colectiva y subjetividad/intersubje- tividad, sus recursos y productos»... Por Jo tanto, para Quijano, las luchas por el control del cacceso sexual, sus recursos y productos» definen el ambito del sexo/ géneroy, estan organizadas por losejesde la colonialidad y de la modernidad. Este andlisis de la construcci6n moderna/eolo- nial del género y su alcance es limitado. [ EXTRAPRENSA ] 236 Andres Rosendo da Siva ‘Dennis de Olivera La mirada de Quijano presupone una compresién patriarcal y heterosexual de las disputas por el control del sexo y sus recursos y productos. (LUGONES, 2008, p.78). Outra intelectual comprometida em nao negar perspectivas que problemati- zam 0 colonialism, mas questionadora da posicao elitista e androcéntrica no pensamento produzido por tedricos de epistemologias que procuram romper com um “certo eurocentrismo académico” éa afro-dominicana Ochy Curiel (2007). Ela lembra as feministas racializadas afro- descendentes e indigenas produtoras de conhecimentos desde os anos de 1970, inclusive com discussées sobre 0 poder patriarcal e capitalista e consideracées do entrelacamento de varios sistemas de dominacio - racismo, sexismo, hete- ronormatividade, classismo. Entretanto, reconhece que as vozes dessas pensadoras sao desconhecidas, pois, mesmo com a abertura dada por aquelas (es) que estu- dam subalternidade, ha posturas elitis~ tase visées masculinas e androcéntricas (CURIEL, 2007) Curiel (2007) pondera que as colo- nialidades de poder e género so denun- ciados ha anos por mulheres intelectuais e feministas que se debrugam sobre as relacées do poder colonial e as formas de violéncia sobre corpos femininos negros e indigenas. Para ela, as enunciagdes de suas producées teéricas alcancam outras camadas, pois, 0 entendimento do ser mulher em situagées de subalternidade, isto é, quando as mulheres so reduzidas aos papéis de escravizadas, amas de leite ou como objeto sexual dos seus senhores passa, também, pelas teorias do género. xtraprenss, So Pale 15 n esp, p 232-250, ai 2022 Perspoctiva decolonial pensadoras tine americana aortes para anise de narratlvasaaovisualsna Armée Latina Asrelacoes raciais eo sexismo tam- bém aparecem nos apontamentos tedricos do porto-riquenho Ramon Grosfoguel (2016). Segundo ele, a visto racista e sexista no pensamento epistémico é um dos problemas mais importantes do mundo contemporaneo. Sobre as relacoes de género, oautor faz o seguinte questio- namento: “como é que no século XXI, com tanta diversidade epistemica existente no mundo, estejamos ancorados “em estru- turas epistémicas tao provincianas camu- fladas de universais"? (GROSFOGUEL, 2016, p. 27). Grosfoguel (2016) se perguntao por- qué de a teoria social, histérica, filoséfica, econémica se basear na experiéncia sécio- -historicae na visio de mundo de homens oriundos do Norte Global ([télia, Franca, Inglaterra, Alemanha eos Estados Unidos) e ‘oporqué de se manter o pensamento cané- nico da 4rea de humanidades ou Ciéncias Sociais baseado na teoria desses mesmos homens. Na sequencia, versa sobre o privi- légio epistémico, uma das formas que pode marcar outra colonialidade, a colonialidade do saber: Oprivilégio epistémico dos homens oci- dentais sobre oconhecimento produzido por outros corpos politicos e geapoliti- cas do conhecimento tem gerado nao somente injustica cognitiva, senao que tem sido um dos mecanismos usados para privilegiar projetos imperiais/colo- niais/patriarcais no mundo. A inferio- rizagdo dos conhecimentos produzidos por homens e mulheres de todo 0 pla- neta (incluindo as mulheres ocidentais) tem dotado os homens ocidentais do privilégio epistémico de definir 0 que é verdade, o que é a realidade e 0 que € [ EXTRAPRENSA ] 237 Andres Rosendo da Siva ‘Dennis de Olivera melhor para os demais, Essa legitimidade e esse monopélio do conhecimento dos homensocidentais tem gerado estruturas e instituigdes que produzem o racismo/ sexismo epistémico, desqualificando outros conhecimentos e outras vozes criticas frente aos projetos imperiais/ coloniais/patriarcais que regem 0 siste- ma-mundo. (GROSFOGUEL, 2016, p.25). De acordo com Grosfoguel (2016), nas bases sobre as quais se constrdi o pri- vilegio epistémico estdo varios genoci- dios epistémicos praticados pela Europa Moderna durante “o longo século XVI". O autor traz a discussao de Enrique Dussel sobre os conceitos de Ego conquiro (con- quisto, logo existo) e Egocogito (penso, logo existo) e observa que, para além de con- quistar e conhecer 0 novo mundo, havia uma ‘légica” para o pensamento europeu estar assentado em ponto de vista racismo e sexista, que ¢ 0 Ego extermino, Para ele, 0 Ego extermino é a condicao sécio-histé- rica estrutural que faz possivel a conexdo entre 0 Ego coquiro ¢ 0 Ego cogito. Segundo o autor, ao usar a nociio de Ego Extermino, por exemplo, compreende-se 0 genocidio das mulheres que transmitiam, de geracio para geracio, oconhecimento indo-europeu nos territorios europeus na Idade Media - e séculos XVI e XVII - nos primérdios da modernidade, quando milhées de mulheres foram queimadas vivas, acusadas de bruxa- ria, onde a Inquisigao foi a vanguarda dos ataques, portanto, jd dentro das estruturas modernas, coloniais, capitalistas e patriar~ cais de poder. Essas mulheres dorninavam conhecimen- tos xamanicos de tempos ancestrais. O conhecimento que acumnulavam abrangia diferentes areas, tais como astronomia, xtraprenss, So Pale 15 n esp, p 232-250, ai 2022 Perspoctiva decolonial pensadoras tine americana aortes para anise de narratlvasaaovisualsna Armée Latina biologia, ética etc. Elas eram empodera- daspor resguardarem um conheciento ancestral eo seu principal papel dentro das comunidades era o de estabelecer formas comunais de organizacao da poli- tica eda economia. A perseguicao dessas mulheres comegou na Baixa Idade Média. Entretanto, intensificou-se nos séculos XVLe XVII, com o advento das estru- turas “modernas, coloniais, capitalistas e patriarcais" de poder. (GROSFOGUEL, 2016, p.at) A violencia contra as mulheres lati- no-americanas registrada nas estatisticas sobre o feminicidio na América Latina, somado a interdicio de teéricas afro-lati- nas € indigenas, sujeitas subalternizadas no proceso colonial de hierarquizacao de ragas, como fonte de conhecimento teo- rico nas universidades, como registrou Grosfoguel (2016), materializam, além da colonialidade de poder e do saber de forma mais explicita, a colonialidade de género. No documento Mulheres afrodescen- dentes em America Latina e Caribe, produ- zido pela CEPAL (Comision Economica para América Latina y el Caribe) & possivel perceber um crescente aumento de homicidios de mulheres negras e uma redugio de dados em relacao as mulheres ndo negras. Ha uma diferenca evidentemente racializada no que se refere a violéncia de género, Entre 2007 ¢ 2013, sio contabilizados os ntumeros tragicos de 17.818 homicidios de mulheres negras 10.844 homicidios de mulheres brancas - uma diferenga de quase 7.000 casos. “Entre estes, o ntimero de vitimascai 2,1% a partir de 2006 e até 2013, enquanto aumentou em 35% entre as mulheres negras nesse mesmo periodo” (CEPAL, 2018), [ EXTRAPRENSA ] 238 Andres Rosendo da Siva ‘Dennis de Olivera Para este artigo, alémdeevidenciara colonialidade do poder por meio de dados sobre violencia contra as mulheres, inte- ressa pontuar as evidéncias de calonialida- des na producdo audiovisual, mas, antes, 6 preciso conhecer as estereotipias nos estudos sobre representatividade e matriz. colonial de poder e pensar alternativas para refuta-las. 2. Representacao, estereotipias e rupturas empreendidas por mulheres afro-latinas contra imagens de controle Vinculado aos estudos pés-coloniais, 0 indiano Homi Bhabha (2013) dedica tempo sobre o tema doesterestipo, repre- sentagio e alteridade. © autor mostra estereotipo como uma forma de conhe- cimento e identificacao que vacila entre 0 que esta sempre "no lugar’, {4 conhe- cido, e algo que deve ser ansiosamente repetido (BHABHA, 2013, p 117). Ao dis- correr sobre estereétipo, discriminacio e discurso colonial, diz nao ser preciso a desconstrucao do discurso colonial, mas questionar 0 modo de representacio da alteridade (do sujeito da diferenga racial e cultural). Nao pretendo desconstruir o discurso colonial para revelar seus equivocos ou repressoes ideolbgicas, para exultar diante de sua auto-reflexividade ou tole- rar seu excesso liberatorio, Para compre- ender a produtividade do poder colonial é crucial construir o seu regime de verdade enaosubmeter suas representagéesa um xtraprenss, So Pale 15 n esp, p 232-250, ai 2022 Perspoctiva decolonial pensadoras tine americana aortes para anise de narratlvasaaovisualsna Armée Latina julgamento normatizante, So entao se torna possivel compreender aambivalén- cia produtiva do objeto do discurso colo- nial - aquela alteridade que ¢ ao mesrno tempo objeto de desejo ¢ escarnio, uma articulacao da diferenca contida dentro da fantasia da origem e da identidade. (BHABHA, 2013, p. 118). Oautor reflete que é impossivel falar em representacao sem desconsiderar as nuances dos estereétipos. Bhabha (2013) entende que o esteredtipo é um modo de Tepresentagao complexo, ambivalente ¢ contraditério. Para tanto, propée uma leitura do esterestipo em termos de feti- chismo, afirmando que o fetiche ou estered- tipo dé acesso a uma “identidade’ baseada tanto na dominacdoe no prazer quanto na ansiedade e na defesa, pois é uma forma de crenca miiltipla econtraditéria no reconhe- cimento e recusa da diferenea. "Esse contflito entre prazer/desprazer, dominagio/defesa, conhecimento/recusa, auséncia/presenca. ‘Tem uma significagSo fundamental para o discurso colonial” (BHABHA, 2013, p 118). Patricia Hill Collins (2016), quando defende a importancia de uma epistemo- logia do feminismno negro, 0 faz no sentido de propor uma ruptura com interpretagées masculina e branca do mundo, mas, ainda que nao incorpore a perspectiva decolonial na sua produgao teérica, interessa a ela se contrapor @ essas racionalidades dominan- tes e ou hegemdnicas, inanifestas desde o perfodo colonial. A autora estadunidense realiza estudos do conhecimento subju- gado e centra o olhar para as experiéncias de mulheres negras norte-americanas afrodescendentes, procurando colocar as experiéncias das mesmas na esfera trans- nacional, reconhecendo o papel da mulher [ EXTRAPRENSA ] 239 Andres Rosendo da Siva ‘Dennis de Olivera negra e intelectual como a da produtora de fatos e teorias sobre a experiéncia de mulheres negras e suas praticas sociais. Deste modo, ela elabora eelenca trés temas chaves que permeiam opensamento feminista negro: auto-definigao e auto-a- valiacdo, interligacao. Alem destes, inclui na suas reflexdes tericas, a interseccio- nalidade com as categorias de raca, género e classe e a cultura de mulheres negras, para pensar as representacées daquelas, mulheres. Neste artigo, propde-se odialogo entre Collins (2016) e Bhabha (2013) como ponto de fusio sobre formas de capturasa Tespeito das imagens das mulheres. Collins (2016) apresenta a nocdo de auto-definicaio como forma de substituicdo de imagens externamente definidas e controladoras, sobre mulheres negras. De acordo com a autora, estas imagens controladas historica- mente produzem estereotipias da condigéo feminina afroamericana, ao argumentar que "mutheres negras tém sido atacadas com uma variedade de imagens externa- mente definidas, projetadas para controlar seu comportamento assertivo” (COLLINS, 2016, p 103). A insisténcia quanto a autodefinicao das mulheres negras remodela o dialogo inteiro. Saimos de um dialogo que tenta determinar a precisao técnica de uma imagem para outra que ressalta a dina- mica do poder que fundamenta proprio proceso de definicgo em si, Feministas negrastém questionado ndoapenaso que tem sido dito sobre mulheres negras, mas também a credibilidade ¢ as intengdes daqueles que detém o poder de definir. Quando mulheres negras definem a si proprias, claramente rejeitam a suposigao irrefletida de que aqueles que esto em xtraprenss, So Pale 15 n esp, p 232-250, ai 2022 Perspoctiva decolonial pensadoras tine americana aortes para anise de narratlvasaaovisualsna Armée Latina posicées de se arrogarem a autoridade dedescrevereme analisarema realidade tem odireito de estarem nessas posigies. Independentemente do conteuido de fato das autodefinigdes de mulheres negras, © ato de insistir na autodefinicao des- sas mulheres valida o poder de mulhe- res negras enquanto sujeitos hurnanos. (COLLINS, 2016, p. 104). Lélia Gonzalez, intelectual interes- sada em analisar o capitalismo a brasi- leira analisando as relacées raciais pelo paradigma do materialism historico, mas inchuindo género e raca nas suas elabora- Ges tedricas, busca elementos em varias Areas de conhecimentos para construir ‘0 seu pensamento sobre as assimetrias raciais e as marcas deixadas pelo colo- nialismo. A psicanalise foi uma delas tornou-se um instrumento para com- preender as subjetividades das pessoas negras. Lélia critica o privilégio racial, denunciando que o sistema capitalista construido sob formas de hierarquizacées raciais, se beneficiou e se beneficia com a exploracdo da mao de obra negra. E sustenta que sujeitos brancos, possuidor ou nao de propriedades ou meios de pro- duc, obtiveram beneficios econémnicos (recompensas materiais) e sociais (recom- pensas simbélicas). Ainda no campo simbélico e fazendo correlacdo com os papéis das mulheres negras ao longo da historia, Lélia expde © projeto da construcdo de uma imagem folclorizada dessas mulheres num suposto sistema brasileiro de representagdes que atribuiu a elas papéis fixos. Ela apresenta trésimagensa respeitoda mulher negra pre- sentes no imaginario brasileiro: a mae preta (aquela que é responsavel pela educagaodos [ EXTRAPRENSA ] 240 Andres Rosendo da Siva ‘Dennis de Olivera filhos dos senhores brancos), a empregada doméstica, outrora chamada de mucama, ea mulata. No entanto, de um modo par- ticular e “desobediente’, a autora assinala para ressignificagdes de tais imagens, pois ha nuances da cultura da populacio negra descartadas por intérpretes da historia do Brasil, Estes nao investiram tempo nas inte- ragées sociais mais profundas entre pessoas com distintas posicées sociais (os préprios negros € negros e brancos) na engenharia da convivéncia colonial. Um dos argumen- tos sobre outra possivel interpretacdo da mae preta, por exemplo, € 0 da pessoa que seria responsivel pela construcao de uma resisténcia passiva, como recontam Marcia Lima e Flavia Rios (2020), autoras do livro Por um feminismo afro-latino-americano, ao selecionar os escritos de Lelia Gonzalez sobre o tema, Deacordo com opinides meio apressadas, a"maepreta’ representaria otipo acabado da negra acomodada, que passivamente aceitou a escravidao e a ela correspon- deu da maneira mais crista, oferecendo a face ao inimigo. Acho que nao da para aceitar isso como verdadeiro, sobretudo quando se leva em conta que sua reali- dade foi vivida com muita dor e humi- Inacio. E justamente por isso nao se pode deixar de considerar que a "mae preta” também desenvolveu as suas formas de resistencia: a resistencia passiva, cuja dinamica deve ser encarada com mais profundidade. (..) Conscientemente ou nao, ela passou para 0 brasileiro branco as categorias das culturas negro-africanas de que era representante. Foi por ai que ela africanizou 0 portugués falado no Brasil (transformando-o.em "pretugués’) @,consequentemente, a cultura brasileira. (LIMA; RIOS, 2020, p:180). xtraprenss, So Pale 15 n esp, p 232-250, ai 2022 Perspoctiva decolonial pensadoras tine americana aortes para anise de narratlvasaaovisualsna Armée Latina Apontada a defesa de Lelia pela reconsideracdo do papel da mae preta € retomando as contribuigées de Collins (2016) sobre repensar sistemas de repre- sentacdo das imagens das mulheres negras, uma forma eficiente que esta tiltima propée para obstruir a fungao da imagem dentro de uma dinamica de poder que desumaniza e controla os corpos negros, éa autodefinicao, pois esta desafia o proceso de validacaio do conhecimento politico que resultou na producio de “imagens estereotipadas exter- namente definidas da condigao ferninina afro-americana’, (COLLINS, 2016, p 102). Isto é, o contetido de fato dessas autodefi- nigdes desafia o contetido de imagens con- troladoras definidas por outros sujeitos que nao sejam mulheres negras, O tema relacionado da autoavaliagao de mulheres negras poe todo esse processo ‘um passo adiante. Enquantoa autodefi- nico de mulheres negras dialoga com a dinamica do poder envolvida noato de se definir imagens do self e da comunidade, o tema da autoavaliagao das mulheres negras trata do contetido de fato des- sas autodefinigées. Muitosdos atributos existentes nos estereétipos relaciona- dos a mulheres negras so, em verdade, versbes distorcidas de aspectos do com- portamento das mulheres negras vistos comoos mais ameagadores ao patriarcado branco (Gilkes, 1961; White, 1985, apud COLLINS, 2016, p. 104), Collins (2016) também entra neste campo psicologico e subjetivo ao defender aautodefinigao e autoavaliacao como pro- cessos fundamentais para que mulheres afro-americanas rejeitem opressao psico- légica internalizada, pois, pelo controle internalizado, danifica a autoestima dessas [ EXTRAPRENSA ] 241 Andres Rosendo da Siva ‘Dennis de Olivera mulheres, como exemplifica nesta decla- racdo. “vocé sabe que nenhurna mulher é cachorro ou mula, mas se as pessoas continuarem fazendo vocé se sentir dessa forma, se vocé nao tiver autonomia de pen- samento, vocé pode comecar a deixar que te digam 0 que vocé é. "(Gwaltney, 1980: 152, apud COLLINS, 2016, p. 106). Noentendimento da autora, redefinir imagens distorcidas é desmitificar os mitos de Sapphire (negra raivosa) e da mammy (escrava de casa que era “quase da farni- lia’), estere6tipos capturados pelo discurso dos que se colocam superiores quando da construgao das hierarquias das racas para dominacao de outros povos nao brancos. E por isso queao fazer uma sintese dasnogdes que apresenta destaca a importancia da lei- tura doponto de vista de pensadoras negras para investigacdes tedricas sociolégicas. Consideradosem conjunto, ostréstemas chaves no pensamento feminista negro - 0 significado de autodefinigao e de autoavaliagao, a natureza interligada da opressao e a importancia de redefinicao da cultura - tém contribufdo significa~ tivamente na tarefa de elucidar o ponto de vista das e para as mulheres negras. Embora essa conquista seja importante em epara si mesma, o pensamento ferni- nista negro tem contribuigdes potenciais para oferecer as diversas disciplinas que abrigam os seus praticantes. COLLINS, 2016, p 115). Romper coma logica écriar condicio de resisténcia a desumanizagao imposta e essencial aos sisternas de dorninagio. Como diz a autora, mulheres negras que se forta- lecem na cultura das mulheres negras, que reconhecem os valores da autodefinigao xtraprenss, So Pale 15 n esp, p 232-250, ai 2022 Perspoctiva decolonial pensadoras tine americana aortes para anise de narratlvasaaovisualsna Armée Latina autoavaliacao, podem estar mais aptas a tomarem uma postura critica em andlises sociol6gicas. Neste sentido, é possivel afir- mar que podem estar propensas a obser- varem a manifestagao de colonialidades na industria cultural, como é 0 casodo cinema e das produgées audiovisuais. 3. Direito ao olhar e materializacao de colonialidade de género: ‘cinemicidio feminino’ e contravisualidades na producao audiovisual Em artigo que discute o enegreci- mento do cinema brasileiro nos tltimos 30 anos, Joel Zito Aratijo (2019) apre- senta dados que apontam mudangas no audiovisual do pais. © autor apresenta a pesquisa A cara do Cinema Nacional, do Grupo de Estudos Multidisciplinar da Acao Afirmativa (Gemaa), 'e 0 estudo da Agéncia Nacional de Cinema (Ancine) sobre diversidade de género e raca no mercado audiovisual. Ambos os estudos dernonstram o interesse pela investigacdo com recorte racial, entretanto, ambos também reve- lam a auséncia de negrase negras no setor audiovisual brasileiro. 1 OGEMAA é um nucleo de pesquisa sediado no Institutade Estudos Sociaise Politicosda Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP-UERJ, criado em 2008, com o objetivo de produzir estudos multidis- ciplinares de agSo afirmativa, incluindo os tipos de participacao de grupos raciais em representagées da industria cultural, os quais tém dominado as pesqui- sas do grupo na atualidade. [ EXTRAPRENSA ] 242 Andres Rosendo da Siva ‘Dennis de Olivera Segundo Aratijo (2019), a pesquisa do Gemaa buscou avaliar o contetido dos fil- mes mais vistos (por ano), noperiodo entre 2002 e 2014. O intuito foi mapear a diver- sidade de género e raga e compreender 0 papel assumido pela diversidade nos filmes. Os resultados evidenciam a materialidade da colonialidade de género, pois, quando comparadas com a presenca masculina, as mulheres ficaram estatisticamente em desvantagem: - Dos 919 atores e atrizes mapeados na pesquisa 71% eram do género masculino, contra 28% do género feminino ¢1% de ‘pessoas trans; ~ uma ‘desproporgio similar de partici- pacdo se verifica quanto & cor das perso- nagenss: branca (65%), preta (18%), parda (14%), ndo identificada (2%) ou indigena/ amarela (1%)" - também por tras das cameras a desi- gualdade ¢ evidente. Dentre as obras de Jonga-metragem lancadas no periodo, 80% tam como realizadores homens brancos, 14% mulheres brancas, 2% homens negros e 0% mulheres negras. (ARAUJO, 2019). Ao apontar 0 estudo realizado pela Superintendéncia de Anilise de Mercado, érgao vinculado a Ancine, intitulada Diversidade de Géneroe Raga nos Langamentos Brasileiros de 2016, Araujo (2019) demonstra semelhanca com os dados do Gemaa. Os resultados obtidos apés andlise de 142 longas-me- tragens brasileiros (97 obras de ficco, 44, documentarios e uma animacao), que foram lancados comercialmente em salas de exibi¢éo no ano de 2016, xtraprenss, So Pale 15 n esp, p 232-250, ai 2022 Perspoctiva decolonial pensadoras tine americana aortes para anise de narratlvasaaovisualsna Armée Latina também revelam desigualdades de raca e genero. Os longas lancados naquele ano foram dirigidos, em sua grande maioria, por pessoas brancas. Um dado que eviden- cia a total invisibilidade da mulher negra na produgio audiovisual fomentada pelo Estado por meio da Ancine diz respeito ao roteiro edirecao: nenhuma mulher negra dirigiu ou roteirizou filmes em 2016. Pode se dizer que esse “cinemicidio feminino afro-latino é uma forma de epistemicidio visual, uma vez que impede a representa~ cdo de conhecimentos, saberes, culturas, interagGes sociais, modos de vidas, praticas sociais, entre outros elementos da cultura e cultura visual negra - Os homens brancos assinarama dirego de 107 destes filmes, que corresponde a 75.4% do total; ~ As mulheres brancas dirigiram 28, igual a 19.7%; os homens negros somente 3, ficando na percentagem infima de 2.1% ~cem nenhum deles foi dirigido ou rotei- rizado por uma mulher negra ~"aandliseapontou o dominio de homens brancos nao apenas na direcdo, mas nas principais fungoes de lideranga no cinema, o que evidencia que as historias exibidas nas telas do pais, produzidas por brasileiros, tém sido contadas majorita~ riamente do ponto de vista dos homens: 68% deles assinam o roteiro dos filmes de fico, 63,6% dos documentarios, €100% das animacées brasileiras de 2016. Os homens dominam também as fungdes de diregao de fotografia (85%) e direcao de arte (59%) [ EXTRAPRENSA ] 243 Andres Rosendo da Siva ‘Dennis de Olivera ~ ‘a participagao nos elencos das obras também mostra a sub-representacdo da populacio negra. [..]o percentual de negros ¢ pardos no elenco dos 97 filmes brasileiros de ficgao langados em 2016 foi de apenas 13,4%"(ARAUJO, 2019), Essa invisibilidade da presenca de mulheres negras na diregao de cinema infere ndo apenas sobre a manifestacdioda colonialidade do poder e do género devido A manutencio da estrutura do racista e patriarcal vigente no pais, mas também nega 0 ‘direito de olhar” para um pouco mais da metade da populacdo do pais; a populacdio negra somam 54,9% do total de uma populacéo de 205 milhées de habitan- tes*, masa representacdo da sua participa- cao tanto no mercado como na producéo audiovisual € profundamente desigual. O direito a se olhar no cinema é arbitraria~ mente negado a este grupo. Para 0 estudioso estadunidense de Cultura Visual, Nicholas Mirzoeff (2016), este direito esta relacionado com o direito a liberdade e, por conseguinte, ao direito a existéncia. Para este autor, o direito a olhar é muito mais que uma questo de visio. Trata-se de um direito ao real, a wm olhar que "reivindica autonomia, nao indi- vidualismo ou voyerisino, mas aquele que pleiteia uma subjetividade e coletividade politicas, que permite o encontro: \Vooé, ou seu grupo, permite que um outro te encontre, ¢ a0 fazé-lo, vooé encontra tanto 0 outro quanto a si mesmo. Isso 2 Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicilios (PNAD} de 2016, elaborada pelo d Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (BGE) xtraprenss, So Pale 15 n esp, p 232-250, ai 2022 Perspoctiva decolonial pensadoras tine americana aortes para anise de narratlvasaaovisualsna Armée Latina significa requisitar o reconhecimento do outro a fim de ter um ponto de partida para reivindicar um direito e determi nar o que é certo. E a reivindicagao a uma subjetividade que tem autonomia para organizar as relacdes do visivel e do dizivel. (..) © oposto do direitoa olhar nao éa censura, entao, masa visualidade, aquela autoridade que nos manda chispar e que supde aquela reivindicagao exclu- siva da capacidade de ver. Visualidade 6 uma palavra antiga para um projeto antigo. Nao é um vocabulo tedrico da moda significando a totalidade de todas as imagens e dispositivos visuais, mas ¢ na verdade um termo do inicio do século XIX que faz referencia a visualizacso da histéria, (MIRZOEFF, 2016), Mirzoeff (2016) assinala que épreciso compreender que as imagens fazem parte de um tempo e espaco histéricos cultural- mente construidos, como também argu- menta a sociéloga boliviana Silvia Rivera Cusicanqui (2010). Segundo a autora, as imagens mais que as palavras -erum con- texto de um devir histérico que hierarqui- zou 0 textual em detrimento das culturas visuais - permitem captar os sentidos blo- queados e esquecidos pela lingua oficial. Por meio do registro visual é possivel descobrir as formas pretéritas operadas pelo colo- nialismo, pois apresentam potencialidade de interpretacdio, desmistificacdo e con- traponto das culturas letradas, (RIVERA CUSICANQUI, 2010). Rivera Cusicanqui(2010)defende que ha, no tempo presente dos paises latino-a- merieanos, uma continuidade de colonia- lismo. Nesse sentido, ela recorre as imagens para melhor entender 0 passacio e os aspec- tos das realidades sociais na regio. Paraa [ EXTRAPRENSA ] 244 Andres Rosendo da Siva ‘Dennis de Olivera intelectual boliviana, imagens do passado podem servir para contar outras narrativas, ever contexto histérico, subverter o texto colonial e colocar 0 ponto de vista do sujeito colonizado, subalternizado. Desde hace tiempo he venido trabajando sobre la idea de que en el presente de nuestros paises contintia en vigencia una situacion decolonialismo interno. Y esen este marco que voy a hablar ahora sobre Jo que llamo la sociologia de la imagen, la forma como las culturas visuales, en tanto pueden aportar a la comprension de lo social, se han desarrollado con una trayectoria propia, que a la vez revela y reactualiza muchos aspectos noconscien- tes del mundo social. Nuestra sociedad tiene elementos y caracteristicas propias de una confrontacién cultural y civiliza- toria, que se inicié en nuestro espacio a partir de 1532, Hay en elcolonialismo una funcion muy peculiar para las palabras: las palabras no designan, sino encubren, yesto es particularmente evidente en la fase republicana, cuandose tuvieron que adoptar ideologias igualitarias y al mismo tiempo escamotear los derechos ciuda- danosa una mayoria de la poblacién. De este modo, las palabras se convirtieron enun registro ficcional, plagado de eufe- mismos que velan la realidad en lugar de designarla. (RIVERA CUSICANQUI, 2010, p.9). Oargumento ocorre porque noenten- dimento dela, as imagens séo construcées culturais. Deste modo, ¢ possivel dizer que visualidades produzidas por um suposto “saber cientifico colonial’, poderiam se tornar invisiveis ao olhar daqueles que nao produzem ou nao produziram ima- gem, dos alheios ao saber técnico. E assim xtraprenss, So Pale 15 n esp, p 232-250, ai 2022 Perspoctiva decolonial pensadoras tine americana aortes para anise de narratlvasaaovisualsna Armée Latina permaneciam sem informagao por nao serem, aquelas pessoas, também, detento- ras de conhecimento que os permitissem compreendé-las. Para Rivera Cusicanqui (2010), regis- tros visuais possibilitam descobrir formas sobre como 0 colonialismo pode ser com- batido e subvertido, pois entende que o sistema colonial encobriu praticas sociais de sujeitos historicamente subalterniza- dos. Entretanto, também afirma que o processo de descolonizagao nao pode ser “apenas um pensamento ou uma retorica, porque as palavras tendem a ignorar as praticas" (RIVERA CUSICANQUI, 2010). Este procedimiento de problematiza- cién visual es entonces doblemente filoso, en tanto nos habla de una his- toria viva, que pugna constantemente por irrumpir, sometida a un juego de fuerzas que la actualiza y, ademas, nos conecta con las culturas visuales como potencias de interpretacion, desmiti- ficacion y contrapunto de las culturas letradas. (RIVERA CUSICANQUI, 2010, pé). De acordo com Rivera Cusicanqui (2010), para o mundo indigena, por exem- plo, a histéria ndo¢ linear porque passado e futuro estao contido no presente, ou seja, a experiéncia da contemporaneidade faz. com indigenas, desde Bolivia, se com- prometerem com o presente que, por sua vez, ‘contém em si sementes do futuro que brotam do fundo do pasado’. Ou seja, “la regresién ola progresion, la repeticién ola superacién del pasado estan en juego en cada coyuntura y dependen de nues- tros actos mas que de nuestras palabras’ (RIVERA CUSICANQUI, 2010). [ EXTRAPRENSA ] 245 Andres Rosendo da Siva ‘Dennis de Olivera Ao dizer que o presente serve para derrotar 0 colonialismo, pois, mais do que palavras, é preciso ago, a autora parece convacar os subalternizados do continente - negros e indigenas - a res~ significarem o passado ea se colocarem como agentes em disputas por narrati- vas outras: "é preciso derrotar aqueles que insistem em preservar 0 passado com todo o seu lastro de privilégios mal obtidos” (RIVERA CUSICANQUI, 2010). Ea mesma recomendacdo de Mirzoeff (2016) Esse sentido alargado do real, 0 realista, e realismo(s) est em jogo no conflito entre a visualidade ¢ a contravisualidade. O “realismo” da contravisualidade é 0 meio pelo qual se tenta dar sentido a irrealidade criada pela autoridade da visuali- dade enquanto, ao mesmo tempo, propée uma alternativa real. Nao se trata de modo algum de uma repre- sentacdo simples ou mimética da experiéncia vivida, mas de retra- tar realidades existentes e as con- trapée com um realismo diferente. (MIRZOEFF, 2016) Mirzoeff (2016) sugere que criar contravisualidades ¢ um mecanismo adequado para suprimir a invisibi- lidade de sujeitos negros e negras e sujeitos indigenas da visualidade nor- mativa. E uma sugestao muito préxima da que foi exposta no pensamento de Collins (2016), ou seja, assumir pos- sibilidades de redefinir imagens dis- torcidas e abracar oportunidades de romper esterestipos hierarquizantes Recomendacao do também o cineasta brasileiro Aratijo (2019): xtraprenss, So Pale 15 n esp, p 232-250, ai 2022 Perspoctiva decolonial pensadoras tine americana aortes para anise de narratlvasaaovisualsna Armée Latina Chegamos a um ponto de mutagao, a ‘um limite, ern que o mundo do cinema nao pode mais ignorar que 90% da producao cinematografica atual continua sendo feita por brancos e brancas, com preferéncia por atores e atrizes brancas. Por isso, tratar da escravidao, um perfodo da historia do Brasil que marca nossas vidas até hoje, somente com um olhar a par- tir da Casa Grande, ¢ que continua sendo um verdadeiro equivoco. O lugar de fala, o lugar da construcao narrativa do cinema brasileiro, vai continuar sendo cimplice do nosso racismo cotidiano se expressar ape- nas 0 ponto de vista do brasileiro branco gilberto freyriano. E conti- nuaremos nos comportando como vira-latas ¢ colonizados se 0s negros continuarem sendo tratados como uma minoria, como a ralé indesejada que nao sabe o seu lugar e/ou como perturbadores da marcha irreversivel do branqueamento. (ARAUJO, 2019). Para Mirzoeff (2016) uma “neo- visualidade” deverd ser criada como uma estratégia, isto é, uma contravi- sualidade que poderd ser utilizada para se opor as diferentes formas de colo- nialidade, aos regimes necropoliticos de separacda, novos autoritarismos. Embora tenha mais questionamento que respostas, o autor reafirma odireito ao olhar: como um desdobramento pos- sivel da contemporaneidade: diversos desdobramentos parecem possiveis: um novo autoritarismo, uma crise perpé- tua, ou, quicd, um tempo no qual minha reivindicagio ao direito a olhar aleance seu desejo de ser visto. E eu retribua’, Mirzoeff (2016). [ EXTRAPRENSA ] 246 Andres Rosendo da Siva ‘Dennis de Olivera No entanto, para que 0 direito a olhar seja direito de fato, é necessa- rio repensar a estrutura colonial de poder ainda presente nas instituicées. Propostas de mudangas nas politicas publicas culturais, nas leis de formento a producao audiovisual brasileira tam- bém se somam ao conjunto de acées que garantiria as contravisualida- des. Mirzoeff (2016), Araujo (2019) e Collins (2016) nao procuram dar solugéo 4 colonialidade do poder e do género evidenciadas nas duas pesquisas cita- das no inicio do capitulo, pois nao sao tedricos vinculados a epistemologias decoloniais, as contribuigées teéricas deles, incluindo a da boliviana Rivera Cusicanqui (2010), acenam para um tempo de descolonizacdo do olhar e, por extensao, a descolonizagao da imagem dos sujeitos subalternizados 4. Consideracées finais O artigo buscou oferecer refle- xdes em torno das nogées de colonia- lidades, representacdo e visualidades, conceitos que podem ser empreendidos em investigacées cientificas relaciona- das a representacdo de mulheres latino- -americanas em produtos da industria cultural, mas também para se com- preender mecanismos do mercado de produces cinematograficas e audiovi- suais neste ambiente contemporaneo. Trouxe, ainda, aportes que orien- tam ocampo da visdo para as assimetrias, de género e outras formas de violéncias xtraprenss, So Pale 15 n esp, p 232-250, ai 2022 Perspoctiva decolonial pensadoras tine americana aortes para anise de narratlvasaaovisualsna Armée Latina = fisicas, simbélicas e materiais. As epis- temologias decoloniais e anticoloniais, além de fundamentar os estudos daque- les que buscam uma perspectiva teorica nao eurocentrada, servem também para observar, de modo sécio-historico-tem- poral, a agdo das mulheres subalterniza- das. E importante enfatizar que nao se trata da negacdo de produgées teéricas de outras orientacées epistémicas, mas de propor didlogo e incentivar a desco- berta de pensadoras (es) desde América Latina e Caribe, que fornecem reflexes teoricas para investigagdes cientificas que envolvam populacées subalterniza- das do mundo todo. Discutir colonialida- des do poder e colonialidade de géneroe verificar suias possiveis materializacdes pode contribuir, ainda, para entender © porqué de mulheres negras e indige- nas serem invisibilizadas e excluidas historicamente dos espagos de poder e representacao. Ainda que tenham dificuldades imposta pelo racismo e sexismo a0 aces- sar os instrumentos para a producao de filmes longa-metragem, andlises filii- cas em processo na elaboracao da tese de doutorado mostram que represen- tacdes nas producées cinematografi- cas ¢ audiovisuais de mulheres latino americanas, sobretudo afro-latinas e indigenas, incorporam nogées de auto- definicao, autoavaliacao, opressées interseccionadas, interculturalidade, colonialidades; as narrativas também imprimem diversas formas de existir e estratégias de resisténcia Este trabalho nao se encerra aqui, pois se representatividade importa, contra-visualidades também. Estas si0 [ EXTRAPRENSA ] 247 Andres Rosendo da Siva ‘Dennis de Olivera importantes para modificar as relagdes de raca e género construidas hierarqui- camente e para promover maior debate sobre ressignificacdo na representacao, principalmente de corpos femininos indigenas e afro-latinos.= xtraprenss, So Pale 15 n esp, p 232-250, ai 2022 Perspoctiva decolonial pensadoras tine americana aortes para anise de narratlvasaaovisualsna Armée Latina [ ANDREA ROSENDO DA SILVA ] Jornalista, doutoranda pelo Programa de Pos- Graduagao em Integragao da América Latina a Universidade de Sao Paulo (Prolam/USP, ‘Mestre em Comunicacao pelo Programa de P6s-Graduagao.em Comunicacéo Social da Universidade Federal do Parana (PPGCOM/UFPR), bbacharel em Comunicagao Social - Jornalismo. Pesquisadora nas areas de Comunicacioe Cultura, comenfoque em cinemae producao audiovisual. ‘Tematicas de interesse: colonialidade, imagem e representacio, Estado, politicas publicas, diversidade cultural, interculturalidade critica, visualidades, interseccionalidades, estudos de género, mulheres na América Latina e mulheres afro-atinase caribenhas. E-mail: dearosendo@gmailcom [ DENNIS DE OLIVEIRA ] Professor livre-docente em Jornalismo, Informacéo Sociedade pela ECA/USP. Possui graduac4o.em, (Comunicagao Social Habilitagao Em Jornalismo pela. Universidade de Sao Paulo (1986), mestree doutor em Ciéncias da Comunicacdo pela Universidade de Sao Paulo (1992; 1998) Tem experiéncia na drea de Comunica¢ao, com énfase em Comunicacao Popular atuando principalmente nos seguintes ‘temas: comunicagio e cultura, processos medisticos eculturais, comunicacao e recepcao, processos ‘mediaticos e jornalismo, midia eracismo, ¢ integragéona América Latina. E coordenador do CELACC (Centro de Estudos Latino Americanosde Cultura e Cormunicagio). E-mail: dennisol@usp.br [ EXTRAPRENSA ] ‘Anda Rosondo da Siva Perspoctiva decolonial pensadoras tine americana Dennis de Olvera aortes para anise de narratlvasaaovisualsna Armée Latina Referéncias ARAUJO, Joel Zito. O tenso enegrecimento do cinema brasileiro nos ultimos 30 anos, Cinémasd'Amérique latine [En lignel. 26 | 2018, misen ligne le 24 juillet 2019. DOLhttps: doi.org/10.4000/cinelatino.4185. Disponivel em: . Acesso em 01 dez. 2020. BALLESTRIN, Luciana, América Latina ¢ 0 giro decolonial. In: Revista Brasileira de Ciencia Politica (11). Brasilia, 2013. BHABHA, Homi K. O local da cultura. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2013, CEPAL (Comisién Econémica para América Latina y el Caribe). (2018). Mulheres afrodescendentes em America Latina e Caribe, Santiago, julho. COLLINS, Patricia Hill. 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