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Separacao entre fé e vida Ideia central 0 desejo.de conquistar aceitacéo, relevancia e influéncia na cultura pode levar a igreja a tirar seu foco de Cristo é torné-la cega até mesmo para as violagdes mais ostensivas ca mensagem cristé por seus membros de maior destaque. Nesse contexto, © verdadeiro discipulado se torna impossivel e até desnecessério. Para entender 0 texto Texto em contexto Uma mudanga substancial ocorre aqui. A discussio teolégica dos quatro primei- ros capitulos que trata do comportamento sectario da igreja, bem como de seu orgulho € apego & cultura secular, agora se move para uma confrontacao direta de questées especificas da comunidade. Nao devemos ignorar, contudo, a relagao entre os capi- tulos de 1 a 4 ¢ os capitulos 5 ¢ 6. Como a comunidade de cristdos em Corinto nao se parece em nada com uma verdadeira comunidade crista, sua visdo se tornow t&o distorcida que seus membros nao sao capazes de avaliar e julgar nem mesmo as questdes morais mais Sbvias e explicitas sob uma “6tica crista”. Quando uma igreja se assemelha a descrigdo nos quatro primeiros capitulos ¢ funciona como tal, é inevita- vel que o resultado seja o comportamento descrito nos dois capitulos seguintes. O tre- cho de 1Corintios 5.1-13 inicia essa seco com a questiio mais absurda que se possa imaginar. £ bem provavel que os membros da igreja houvessem se encantado de tal modo com a importancia da proeminéncia iCorintios 5.443 @4 a ponto de permitir que um membro rico, do qual se beneficiavam, colocasse de lado até mesmo as diretrizes morais mais basicas. Consideragées interpretativas 5.1 De fato, é relatado. Da discussio mais ampla nos capitulos de 1 a 4, Paulo agora passa a tratar de questdes especificas rela- tadas por uma fonte anénima.' A expresso indica choque e desalento2 imoralidade sexual. O termo grego porneia é uma palavra com significado amplo; se refere a qualquer tipo de rela~ cionamento sexual ilicito, contrario a lei ou nao sancionado. Como esse versiculo mostra claramente, 0 contexto revela a espécie de relacionamento em questo. O tipo de porneia mencionado aqui (toiaut?) est entre os piores, inimaginavel até no meio daqueles que nao tém compromisso algum com Deus.? que nem mesmo os pagaos toleram. Ethné (“pagaos”) geralmente é traduzido como “gentios” ou “nacées”, mas nesse contexto Paulo se refere, sem diivida, a so- ciedade corintia de modo geral, isto é, incré- dulos que nao fazem parte da comunidade de Cristo. E evidente que varios membros dessa comunidade de Cristo eram gentios. um bomem estd se deitando com a es- sa de seu pai. O tempo presente dessa pressio (“esta se deitando com”; lit., “estd tendo”) indica que é algo continuo. 2so fosse uma ocorréncia isolada, seria ne- cessério usar o tempo verbal aoristo. Tendo em vista o argumento de Paulo em 5.11-13 que a igreja deve julgar os “de dentro”, 08 “de fora”, o silencio de Paulo acerca mulher sugere claramente que ela nao é ista. E provavel que o mesmo se aplique © pai do individuo em questao.* 3.2 E vocés estéo orgulhosos! Como se sratava de um crime de proporgées consi- deraveis, € improvavel que a igreja fizesse slarde a seu respeito ou se vangloriasse dele =m piiblico como expresstio de liberdade sti.’ A arrogancia ¢ a vangl6ria prova- mente dizem respeito & proeminéncia posigao social do filho. Os corintios cgulhavam-se de té-lo como membro de 2a comunidade e, ao mesmo tempo, faziam istas grossas para seu comportamento. moral. Em vez de se mostrarem desejosos relacionar-se com esse filho proeminente, deviam hesitar em ter comunhao com tal adividuo imoral. A mengao por Paulo da Principais temas de 1Corintios 5.1-13 = Oreconhecimento da sociedade nao deve influenciar ‘© comportamento cristao. = Aimoralidade sexual é um dos muitos pecados que obscurecem a presenca de Cristo. * Orgulho e vangloria produzem arrogancia, e nao ver- dadeira relevancia crista. = A disciplina eclesidstica faz parte do discipulado na igreja. refeigao pascal (ceia do Senhor) em 5.6-8 argumenta claramente a esse favor. A co munhio & mesa era a expressao mais vigo- rosa de interacdo e aprovagao social; nas reunides de crist&os esta constitu‘a, além disso, o momento culminante do culto, pois este era 0 contexto em que se celebrava a ceia do Senhor. Seu afa em incluir esse filho arruinava a adoragao ao Filho de Deus (cf. 5.7,8). Eles haviam adotado as normas da comunidade corintia, em que regras diferen- tes se aplicavam aos que eram membros da elite e aos que nao eram e, com isso, haviam fracassado como comunidade de Cristo. 5.3 ndo estar presente fisicamente, estou com vocés em espirito. A linguagem de Paulo aqui nao sugere um contraste dualista entre corpo e espirito, como se parte dele estivesse presente, mas no sua totalidade. Sua de- claragao também nao deve ser reduzida a um comentario impertinente ou superficial.* ‘Antes, Paulo se considera parte importante do templo sagrado de Deus em Corinto, a comunidade criada pelo Espirito Santo, que agora esta em via de ser destruida. No poder Por causa do ensino das Escrituras e dos apéstolos acerca do comportamento sexual, certas praticas sexuais eram consideradas pecaminosas, e a comunidade crista era admoestada a evitar a imoralidade sexual. Ceramicas gregas e romanas retratavam, com frequéncia, cenas da promiscuidade sexual que fazia parte da cultura paga. A pintura nessa kylie (xicara) grega é mais sugestiva que explicita e mostra um convidado embriagado em um banquete com uma bela instrumentista (510 aC, Atica). ACorintios 5.443 _ do Espirito Santo de Deus, que capacita 0 ministério de Paulo e santifica a comuni- dade de Deus, 0 apéstolo ja pronunciou 0 veredito para esse filho incestuoso.” 5.5 entreguem esse homem a Satands.O paralelo coma lei romana parece evidente (veja a secdo “Consideragdes adicionais” depois do comentario dessa passagem). Ele deve ser exilado da comunidade em que Cristo reina e despojado das posses, da cidadania e dos privilégios espiri- tuais concedidos aos membros dessa comunidade. destruigéio da carne. Parece improvavel, como muitos co- mentaristas sugerem, que, com essa expresso, Paulo tenha em vista a morte fi- sica. Antes, a luz da retérica paulina que faz um paralelo com um veredito de exilio da comunidade e de perda de cidadania, a destruicio da carne aqui é 0 relacio- namento incestuoso. Paulo antevé que 0 afastamento do individuo da presenca de Cristo, ou da esfera do poder do Espirito Santo, remover a pro- tecdo espiritual da qual ele desfrutava dentro da comunidade. Essa “pri- vacio” deixard o homem numa situagdo que o le- vara ao arrependimento.* para que seu espirito seja salvo no dia do Senbor. O texto nao deixa claro se, aqui, Paulo se refere ao homem, a igreja, ou a ambos. O apéstolo nao é dualista nem platonista. Ele nao su- gere que matar a carne do homem permi- tird que seu espirito desencarnado encontre salvacdo eterna por si mesmo. Sera, entao, que Paulo expressa preocupagao pela igreja _ ACorintios 5.1.13 Em 568, Paulo usa a imagem de fazer pSo."Fermento"é uma referéncia a levedura, pequenas porgdes de massa levedada que eram colocadas de lado antes de assar a massa para usar no pr6ximo pao. A estatueta mostra a massa de pao sendo sovada durante 0 processo de fazer pao Gentiga Medma, 490 aC), propriamente dita? Ele esta sugerindo que deixar a “levedura” no meio da comuni- dade (5.6; NIV: “fermento”) provocara, mais cedo ou mais tarde, a destruigao da co- munidade? Embora essa ideia seja possivel, é mais provavel que Paulo tenha em mente tanto o individuo quanto a igreja. Ao exilar o homem a Satands,a igreja sera fortalecida ao voltar 0 foco novamente para Cristo, seu verdadeiro benfeitor; ohomem, por sua vez, sera con- duzido ao arrependimento, seu relacionamento incestuoso sera destruido ¢ ele proprio seré res- taurado a comunidade, nao como benfeitor, mas como beneficidrio (servo) de Cristo. Desse modo, 0 espirito sera salvo; a comunidade inteira permaneceré forte e vibrante no dia do Senhor. 5.7,8 Livrem-se do fermento velho. Como Mitton ressalta, nessa passagem é proveitoso fazer dis- tingao entre fermento ¢ levedura. Enquanto 0 fermento € uma substancia distinta acrescentada 4 massa para fazé-la crescer, a levedura é um pedaco de massa que sobrou do preparo anterior de outros pies. Esse resto de massa leveda quando acrescentado 4 massa seguinte, faz com que ela cresca.!” Embora se trate de uma pratica efi- caz, no mundo antigo havia o risco de os pedacos de massa levedada ficarem cheios de doencas, sujeira e outros elementos desa- gradaveis e, quando acrescentados massa nova, podiam transmitir bactérias para cla. A metéfora de Paulo nesses versiculos diz respeito a pratica judaica de, uma vez por ano, interromper 0 processo ¢ recomecar com uma massa nova, nao levedada." Alids, Paulo reforca essa imagem ainda mais ao izer aos corintios que eles so massa nao levedada. A comunidade de Cristo é 0 pao sem levedura, apropriado para a festa em que 0 proprio Cristo é 0 cordeiro pascal. Uma vez que o Espirito Santo purificou a comunidade e a capacitou para tecomecar como pao sem levedura e sem as impurezas da massa levedada antiga, eles devem cele- brar como pessoas que foram purificadas da levedura velha (5.8)..A celebragao pascal 5 comeca depois que toda a levedura velha foi removida. 5.9-12 no devem associar-se com. O in- Snitivo grego synanamignysthai nao sugere ue os cristéos devem evitar todo contato com pessoas imorais; antes, devem fazer distingdo dentro da igreja, para o bem de sua identidade como comunidade de Cristo. Eles néo devem julgar os “de fora”, mas proteger seu testemunho coletivo como comunidade dirigida e definida pelo rela- ionamento com Cristo (5.12). Paulo nao neentiva o cristdo a se isolar do mundo, mas a se identificar com Cristo (5.10). Os membros da comunidade devem reconhe- cer que a identidade com Cristo nao thes permite se identificar com aqueles que pra- ticam imoralidade sexual, gandncia, ido- atria, caltinia, bebedeira ou roubo (5.11). Uma vez que as refeigdes conjuntas indicam proximidade social e amizades profundas, »u até participacao direta na comunidade, os cristos no devem sequer comer com essas pessoas (5.11). Consideragées teolégicas O companheiro mais proximo do pecado £0 orgulho. O pecado separa as pessoas de Deus; o orgulho precede a queda. De acordo com o ponto de vista teol6gico de Paulo, se o pecado corre solto, a igreja nao passa de reuniao social e nao se tornou Para ensinar o texto 7 uma comunidade capacitada e santificada por Cristo. 1.A primeira vista, a cena em Corinto pode parecer desprezivel para qualquer ser hu- mano, ecertamente 0 é para a sensibilidade crist considerada normal. No entanto, a questdo subjacente talvez seja muito bem conhecida nas igrejas de hoje. Tanto igre- jas maiores como menores sabem o que é conferir “direitos especiais” a membros proeminentes. Por vezes, membros da igreja (ou pastores) se orgulham pelo fato de esas pessoas ricas, ilustres ou reconhecidas pela cultura serem membros de sua igreja e aca- bam permitindo um estilo de vida que atra- palha, em vez de promover, o testemunho da igreja. Em outras ocasides, a igreja se coloca em uma relagao de dependéncia (fi- nanceira ou de outro tipo) da boa vontade dessas pessoas. A igreja de Corinto se en- contrava em situacio bem parecida, e Paulo insta seus membros a confiar em ninguém a nao ser Cristo. Como muitos exemplos de grande notoriedade nos iltimos anos mostram claramente, quando a igreja nio confia somente em Cristo, pode acabar por aceitar comportamentos tio detestaveis antiéticos que até mesmo a sociedade ao redor os considera crimes. 2.0 texto trata de forma ampla da imo- ralidade sexual e, de modo mais especifico, da questio do incesto e do adultério. A ati- tude de Paulo é um pardmetro titil para o professor de Biblia ou pastor que se pre- para para lecionar acerca da ética sexual. (1) Paulo néo dissocia essa discussio do testemunho, nem da comunidade crista. Seu desejo é chamar a igreja de volta identidade com Cristo a fim de restaurar 0 testemunho tanto individual quanto cole- tivo da comunidade crista. Embora residam em Corinto, sua principal comunidade ¢ a 1Corintios 5.4.43 | Paulo diz aos cristéos de Corinto: "Mas agora estou les escrevendo para que no se associem com ‘qualquer que se diga irmao ou irma, mas que seja sexualmente imoral ou avarento, idélatra ou caluniador, beberrao ou ladréo. Nem sequer comam com essas pessoas" 5.11). Algumas das praticas | descritas aqui eram comuns aos que participavam do | culto a Baco, o deus romano do vinho, ou a Dionisio, seu equivalente grego. Nessas acasides os exageros levavam a orgias. A fotografia mostra um mosaico da cabeca de Dionisio numa casa de campo romana escavada em Corinto (segundo a terceiro século d.C). ACorintios 5.443 5 comunidade de Cristo, que deve ser guiada exclusivamente pelo compromisso com a mensagem de Cristo. A igreja é 0 conjunto de cristos que encorajame instruem uns aos outros em seu esforco conjunto para revelar Cristo. (2) Paulo ndo julga Corinto nem os corintios de modo geral. Fle est convencido de que as pessoas fora da esfera do poder do Espirito nao fazem parte da “jurisdigio” da igreja, embora sempre continuem a ser responsaveis diante de Deus. (3) Paulo nao destaca os pecados sexuais como as tinicas transgressdes que obscurecem a presenca de Cristo. A ganancia, a cahinia, 0 roubo 08 outros pecados sGo igualmente sérios também devem ser tratados (5.11.22 3. “O orgulho vem antes da ruina; 0 espirito altivo, antes da queda”, diz Provér- bios (16.18; cf. 11.25 16.5; 18.12; 29.23). O orgulho e a arrogancia cristos se mani- festam de varias maneiras, O problema em Corinto nao era, necessariamente, o fato de seus membros se vangloriarem —o préptio Paulo o faz em algumas ocasiées — mas, sim, aquilo de que se vangloriavam. Em vez de gloriar-se de sua indignidade e de sua dependéncia de Cristo, gloriavam-se de seu relacionamento com a elite social e de serem aceitos por essa elite. Faziam confusio entre importancia falsa e verdadeira e contavam vantagem de suas préprias realizacdes em vez. das realizagdes de Cristo e de seu re- lacionamento com ele. © orgulho produz arrogancia e autossuficiéncia, enquanto gloriar-se em Cristo produz humildade e dependéncia de Cristo. 4.A importancia do discipulado cristo e da disciplina eclesidstica fica evidente nesse texto. Especialmente nas sociedades oci- dentais, a disciplina eclesidstica conforme a instrugao biblica esta quase extinta. Po- demos apresentar varios motivos para isso, alguns um tanto ébvios. A énfase exagerada sobre 0 individualismo e sobre os direitos pessoais é um sério obstaculo para o exer- cicio da autoridade espiritual pela comu- nidade. Equivocos do passado, em que a disciplina eclesidstica se parecia mais com um exercicio de farisaismo por parte de uns poucos do que a busca pela semelhanga a Cristo por parte de muitos, tornow o pré- prio conceito de disciplina eclesiastica algo repugnante, Em outras situacées, ainda, a ideia de membresia na igreja desapareceu: a igreja é um lugar a ser frequentado e em que se recebe inspiracao espiritual, e nio uma comunidade que requer compromisso € pode exigir sério envolvimento espiritual.3 Como resultado, igrejas se tornaram acomo- dadas acerca da devogao crista ¢ do estilo de vida de seus membros. Nesse texto, Paulo admoesta a igreja a levar a sério seu teste- munho coletivo. Nao pode haver qualquer distincao real entre salvaco, testemunho ¢ discipulado, nem para o individuo, nem para acomunidade. A disciplina eclesistica é realizada de modo mais adequado por meio do discipulado na igreja. Cabe 4 co- munidade promover a semelhanca a Cristo orientar o testemunho que seus membros 250 pot meio de seu modo de viver, e cabe s membros fortalecer 0 testemunho co- vo da comunidade de Cristo. Para ilustrar o texto Ninguém esta acima da lei de Deus; weles que tém autoridade devem ‘eitar-se mais, e nao menos, aos adroes de Deus. Citacao: Theodore Roosevelt. Certa vez, Roosevelt afirmou: “Nenhum homem esta scima da lei, e nenhum homem esta abaixo dela; também nao pedimos um favor a somem algum quando solicitamos que a bedeca”. Em outras palavras, nem gran- éezae poder, nem fraqueza e pobreza remo- rovavel que a escolha do termo “irmAo” seja coincidéncia. Nenhum romano chamava alguém de fora de sua nhagem de “irmao”, exceto em casos de adogio formal."* E era impensavel processar um membro da propria familias. Alias, era cesponsabilidade do paterfamilias resolver ‘Ordias e contendas que surgissem entre rmaos. O uso do termo “irmao” reforga, portanto, a acusacdo. Quem poderia se- cuer imaginar um irm4o processando outro rmao? Sera que os membros da igreja nao consideravam mais uns aos outros irmaos Cristo? Nesse caso, sua identidade como familias crista se desintegrou. diante de descrentes! Aqueles aos quais Paulo se referiu anteriormente como “ini- guos” (6.1; NIV: “impios”) e “menospreza- s” pela igreja (6.4; NIV: “desprezados”) agora s4o caracterizados como “descren- . Essa mudanga visa agu¢ar 0 contraste «re irmAos (outros cristiios) e descrentes."° Eles deixam que os de fora da familias jul- em os de dentro da familias. Até mesmo esnormas de etiqueta da sociedade romana ciziam: “Repreenda seus amigos em parti- ar e louve-os em puiblico”.1® Consideragdes teoldgicas tema central da fé crista é a disposigao Cristo de ser sentenciado injustamente = morto na cruz. Logo, os cristdos devem = consciéncia de que é mais semelhante Havia diversos tribunais na antiga Corinto, A Basilica da Estrada de Lequeu, a Basflca Juliana €.a Basilica do Sul provavelmente eram locals em que causas litigiosas eram apresentadas para serem resolvidas pelos magistrados locais. a Cristo aceitar ser injusticado do que buscar retaliagao. Para ensinar o texto cy 1.A preocupacao geral de Paulo nesses ver- siculos é com a identidade crista da igreja. Quando a igreja usa os mesmos meios que as comunidades nfo cristas para resolver seus desentendimentos, nao ha diferenga real entre ela e qualquer outro grupo de interesse. A situagdo em Corinto é exa- cerbada pelo fato de a igreja aceitar um sistema no qual é permitido que beneficios politicos e financeiros influenciem as deci- ses. Em vez de buscar em Cristo a direcdo para resolver um desentendimento, 0s cris- tdos corintios se voltaram para advogados de fora da igreja, cujo objetivo é conferir a seus clientes 0 maximo de vantagem pes- soal, nao importa as consequéncias do ve- redito para a outra parte ou o testemunho que isso traz para o mundo. Paulo diz ao cristo individual que é preferivel, ¢ mais semelhante a Cristo, ser injustigado do que sacrificar o préprio testemunho. Paulo diz a igreja que, quando sens membros procuram ACorintios 6.1.6 ACorintios 6.46 resolver conflitos por meios que violam sua identidade cristA, fica evidente que a igreja, como comunidade, perdeu sua autoridade espiritual. Todos eles precisam renovar o compromisso com uma caminhada crista mais profunda para que o poder do Espirito volte a ser visivel em seu meio. 2. Os cristaos modernos devem entrar com processos judiciais uns contra os ou- tros? A resposta a essa pergunta nao é sim- plesmente “sim” ou “no”, e sim, “depende”. Sem diivida, a situac3o em Corinto nao se aplica de modo direto aos sistemas legais contemporaneos. Os tribunais em Corinto eram corruptos até o mago e dificultavam aquilo que considerariamos um julgamento justo. Queremos crer que os tribunais atuais no Ocidente sao melhores (embora as pes- soas que tém os bolsos mais fundos talvez, encontrem “justiga” com mais facilidade). Ademais, dificilmente houve uma sociedade ao longo da historia mais propensa a liti- gios que a nossa [EUA]. Os cristiios nao so excecao, e até mesmo diferengas denomi- nacionais so hoje resolvidas em tribunais seculares. O ensino de Paulo parece definir os seguintes critérios para nortear a decisiio de entrar na justica contra alguém ou nao: ‘A. Existe alguma forma dea questo ser mediada fora do sistema judicidrio? Pode ser prudente a igrejas e denomi- nagGes estudarem maneiras alterna- tivas de resolver desentendimentos e buscar aplicagdes para essa aborda- gem adequadas ao contexto cristao. . Determinado processo legal prejudi- cara o testemunho cristao? Os “de fora” concluirdo que esse é 0 “modo cristo” de abordar essas questdes? Ou chegaro & conclusao de que Cristo nio faz diferenca alguma na vida das partes litigantes (cf. 6.9,10)? . O objetivo é ser pessoalmente vin- dicado ou resolver uma questio mais ampla a fim de promover paz.e 76 unidade? Arrogar direitos individuais é um tema to comum na atualidade que a énfase de Paulo em abrir mao desses direitos (ser injusticado e de- fraudado) parece quase ingénua, sendo tola, Ainda assim, essa éa atitude que as Escrituras requerem. 3. Uma igreja ou denominacao crista deve esconder seu crime ao manté-lo no Ambito interno? £ biblico afirmar que as autoridades legais do pais nao devem in- terferir em questao eclesidstica alguma? A resposta que 1Corintios 6 nos da é cla- ramente negativa! Um exemplo é a ques- tio da pedofilia que continua a denigrir algumas igrejas e denominaces. A preo- cupaco de Paulo é com causas civis, e ndo criminais. 0 apéstolo ainda confia que as autoridades legais do governo devem determinar as leis criminais e as punicées por sua transgressao (Rm 13.1-7). Dito isso, a igreja deve ser mais vigilante no cuidado e na disciplina de sua lideranca e de seus membros (cf. 1Co 5.1,2). Para ilustrar o texto E melhor perder uma discussao do que perder o testemunho. Histérias pessoais: Caso voce esteja dis- posto a confessar, relate uma ocasiao em que uma controvérsia, um desentendi- mento, uma discusséo ou uma contenda entre vocé € outro cristéo confundiu ou desencorajou um nao cristao ou um cristo recém-convertido. Talvez tenha sido uma longa e complicada discussio teolégica no restaurante que deixou 0 garcom sem graca, ou talvez. vocé tenha procurado explicar um desentendimento dentro da igreja para um membro espiritualmente mais fraco da familia e essa pessoa tenha ficado amargu- rada ou desanimada. (Certifique-se de nao entrar em detalhes a ponto de desanimar ouvintes e aumentar a transgressio!) Mostre que a questao nao é quem estava erto ou errado na discussao; 0 fato é que océ olha para trds e lamenta 0 que acon- — teria sido preferivel perder a dis- so ou ser injusticado na contenda a dar clara impresséo para um observador de ue 08 cristdos so mesquinhos e obtusos. Os cristéos devem demonstrar maneiras sauddveis de resolver conflitos = usar os tribunais civis apenas de modo excepcional. Biblia: Mateus 18.15-20. Essa é uma exce- ente oportunidade de destacar a preciosi- ade dessa passagem de Mateus sobre como + 0 pecado na igreja e apresenté-la como modelo que nos ajuda a demonstrar es ao nosso redor sobre como resolver conflitos de modo atraente, eficaz e imitavel. Ensine que o processo se refere a questdes de -cado, e no a meras diferencas de ponto vista ou de opinido; nao devemos des- dicar tempo € energia uns dos outros 4iscutindo preferéncias, Chame a atencao para a sabedoria absoluta de Jesus ao orde- 2© que usdssemos essa forma de confrontar comega de modo discreto e direto, sem spaco para fofocas, sem arrastar outros dentro do problema de modo prema- muro e sem exacerbar mal-entendidos. Ha 2 gradaco ascendente que envolve as munhas ea igreja apenas quando nao © arrependimento nos estégios iniciais. 2 reserva 0 rompimento da comunhio no iiltimo recurso ¢ apenas ejeta 0 pe- dor quando ele rejeita a admoestacao da parte injustigada, de uma testemunha > propria igreja. Mesmo no final, ha -anga de que a separacao conduzira & =srauragio, jd que tratar o individuo como >eblicano ou pecador nao impede a igreja >rocurar alcangé-lo novamente por meio 4 evangelismo e da graca — ela simples- ate protege o testemunho pibblico da igreja e guarda o pecador do autoengano resultante de hipocrisia ostensiva e incon- tida. Desafie seus ouvintes a lancar mao de Mateus 18.15-20 para abordar uns aos outros e esclarega o que “testemunhas” “conte a igreja” significam dentro de sua tradigdo e sistema eclesistico especificos. Paulo trata de causas civis, nao de causas criminais. Governo eclesiastico: f de suma impor- tancia esclarecer essa questo, em especial tendo em vista vitimas de abuso que talvez estejam presentes em sua igreja. E essen- cial que elas entendam como funcionam as diretrizes ¢ 0s procedimentos da igreja em telagio a questées criminais e qual é seu compromisso, bem como de sua dire- toria e de sua denominacao, em relagdo a prevencao do abuso. E essencial enfatizar a diferenca entre as situagdes das quais Paulo trata (desavengas de ordem civil e fiscal, como uma briga pela demarcagéo de uma propriedade ou de indenizagdes por ocasiaio de uma demissio) ¢ o tipo de perigo que o abuso representa (dirigir al- coolizado, violéncia e abuso sexual, trifico de drogas, violéncia entre gangues ¢ assim por diante), situagdes em que vocé e os lideres de sua igreja darao pleno apoio aos membros € os incentivarao a procurar as autoridades civis para evitar qualquer dano. Também é apropriado esclarecer de modo breve politicas especificas da igreja acerca da confidencialidade pastoral ao tratar de questées criminais (privilégios entre sacer- dote e confessor) ¢ leis que talvez exijam que determinados individuos que trabalham na igreja denunciem suspeitas de abuso infan- til. Essa pode nao ser a ilustracdo mais facil de fornecer, mas até mesmo a apresentacao dessas distingdes interpretativas pode evi- denciar distorgdes claras das Escrituras que mantiveram pessoas vitimadas de sua igreja presas a falsa culpa e sem acesso a ajuda. Woriitios 6.1.6 Destacando a transformacdo de atitude e de acao que Cristo produz Ideia central Quando os que afirmam fazer parte da comunidade de Cristo vivem como os que nao herdarao 0 reino de Deus, a igreja precisa ser lembrada de sua identidade e estar disposta a proteger seu testemunho como comunidade capacitada por Cristo. Para entender o texto Texto em contexto Depois de mostrar que a maneira em que a comunidade de Cristo resolve questées litigiosas revela sua identidade, agora Paulo leva a discussao a seu ponto culminante. © modo em que a igreja ¢ os membros individualmente abordaram essa ques- tio nao oferece indicagéo alguma de sua identidade como seguidores de Cristo. Antes, torna-os semelhantes aqueles que nao herdarao o reino de Deus. Em outras palavras, em vez de ser beneficidrios de Cristo, agem como se seguissem o mesmo benfeitor que os malfeitores, cujas agdes revelam claramente uma identidade que nao tem relacao alguma com os seguidores de Cristo (6.9b,10). Ao que parece, a mudanga que deveria ter ocor- rido nao se concretizou (6.11). Consideragées interpretativas 6.7 vocés jd foram completamente derrota- dos. As palavras enérgicas de Paulo ressal- tam, como Conzelmann comenta, que até mesmo “um tribunal cristao de arbitragem é apenas uma concessao”." Se cada um houvesse considerado 0 outro superior a si mesmo (Fp 2.1-4) e, | Em vez de exigir seus | diteitos e levar causas ltigiosas aos tribunais, cristéos corintios deve ter sequido 0 exemplo listo. Ele foi privacio db seus direitos e tratado modo injusto. As estatue de marmore do século 1 dC. na fotografia retrate Cristo sendo acoitado como Cristo, houvesse aceitado ser tratado de modo injusto (adiked) e até mesmo ser defraudado (apostered), nao teria havido necessidade de qualquer tipo de arbitrage. 6.8 Em vez disso [...] fazem tais coisas a seus irméos ea suas irmas. A conjungao de contraste “mas” (alla; NIV: “em vez disso”) enfatiza como 0 comportamento deles con- asta nitidamente com o de Cristo. Ele acei- rou ser tratado de modo injusto e privado de seus direitos; os cristos corintios, nao. Em vez disso, thes pareceu normal cometer ativamente contra outros 0 mesmo tipo de maldade cometida contra Cristo, até contra membros de sua prépria familia da £6 (adelpboi). 6.9-11amalfeitores no herdario o reino de Deus. O argumento de Paulo chega a seu ponto culminante com clareza inques- tionavel. Os membros da igreja que se propuseram a apresentar essa causa diante dos impios (adikoi; NIV: “malfeitores”) se cornaram, eles préprios, adikoi. Todos os dikoi tem em comum o fato de que nao herdarao o reino de Deus. Sem diivida, ‘aulo nao argumenta que a adesio (ou falta da mesma) a um conjunto especifico de requisitos morais ou leis garantiré (ou mpedira) 0 ingresso no reino de Deus. res, a prova de que alguém se tornou suidor de Cristo € transformagao, pelo ensino de Cristo, de seu sistema de valores de seu modo de enxergar 0 propésito da da. Paulo espera submiss4o voluntéria & recdo do Espirito, e nao perfei¢’o impe- cavel. O comportamento desses “cristaos” corintios mostra uma desconsideragao os- ssiva por aquilo que significa imitar a sto € ser membro de sua comunidade. go, eles se colocaram entre os adikoi >varam que nao sao diferentes deles. Como que para remover qualquer di- de que os adikoi (“malfeitores”) tém identidade ou um conjunto de valores snte dos cristos, Paulo relaciona uma Principais temas de 1Corin 1s 6.7-14 © No tribunal do Espirito, 6 melhor ser derrotado que cometer injustiga contra um irmao na fé. * Cometer injustica contra um irmao na fé por meios seculares constitui uma rejeigéo do envolvimento de Deus na vida dos cristéos. = Certas ages e atitudes nao tém lugar no reino de Deus. * Avida do cristo verdadeiro deve dar provas da obra transformadora de Cristo. série de praticas condendveis que caracte- rizam seu modo de viver (veja 0 quadro acima). A lista nao é exaustiva nem visa a relacionar apenas os “pecados corintios” (cf. G1 5.19-21; Rm 1.29-31; 1Tm 1.9-11). Listas de praticas condendveis eram comuns e usadas também pelas sinagogas da Dids- pora para fazer distinco entre o judaismo helenistico e a sociedade gentia ao seu redor. De acordo com Sabedoria de Salomao, o estilo de vida imoral é resultante da idola- tria (Sb 14.22-26). Paulo parece seguir essa linha de raciocinio (cf. C1 3.5). Ainda assim, a lista de Paulo aqui é precisa o suficiente para ele referir-se a ela como uma relagio de exemplos de estilo de vida que alguns dos corintios seguiam antes de tornar-se parte da comunidade de Cristo (6.1 1a). A lista serve para lembr-los de que, embora suas aces tenham mudado em algumas Areas, seu presente comportamento ao resolver contendas mostra que sua identidade como seguidores de Cristo ainda nao est4 nem um pouco clara. 6.11b Mas vocés foram lavados, foram santificados, foram justificados. Nao se deve criar argumentacio teoldgica alguma em torno da sequéncia desses trés verbos. Paulo considera que a vida crista envolve os trés —nenhum deles existe sem os outros. A organizaciio dessas ages por tedlogos sistemdticos posteriores vai além do que “Sexualmente imorais" (pornoi) se refere a qualquer atividade sexual ilicita, embora seja assoclada, com frequéncia, a0 sexo antes do casamento. “Id6latras" é um termo amplo que explica a razio bor trés da natureza desenfreada da imoralidade.* “Addtteros” (moicho!) geralmente se refere aqueles que tém relagdes extraconjugais. “Homens que fazem sexo com homens” traduz dois ‘termos gregos: (1) Malakoi significa “efeminados” ou “delicados” e geralmente se refere a homens 0 meninos sodomizados por outros homens (os. arceiros passivos nas relagdes homossexuais). (2) Arsenokoitai se refere aos parceiros ativos na relagaio homossexual (cf. Lv 18.22; 20.13; LX usa arsenos).” “Lares” eram um problema sério no mundo antigo, fato que permitiu aos autores do Novo Testamento usélos em vérias ilustragdes vividas.° Os “gananciosos" querem tomar para si mais do que Ihes 6 devido. “Beberrdes”, junto com os gananciosos, aparecem com frequéncia nas listas de préticas perversas. “Caluniadores” (loidoroi) se refere geraimente a quem pratica abuso verbal. “Trapaceiros” (hapages) comunica a ideia de lobos vorazes (p. €x., Gn 49.27; Mt 7.15) para o Ambito do crime humano violento (roubo). E associado a ganan- ia (of. Lo 14.39; Hb 10.34), ‘Rois o culto aos fdolos inominavels 6 0 principio, a cause e o fim de todo mal” ($0 14.27). “Pere mais informacbes sobre parcotos ativos © passives no mundo ‘ec0-omano, veja Halperin, “Homosexuality”, p. 720-1 ‘Pex., Mateus 6:19; 24.43; Lucas 12.33,39; JoRo 10.1,8,10; 12.6; ‘Tesselonicenses 5.2-4; Pedro 4.15; 2Pedro 3.10; Anocalipse 3.3; 16.15. interessa ao apéstolo nesse texto (cf. a se- quéncia que ele apresenta em 1.30). O fato de Paulo escolher 0 termo “lavados” em vez de “batizados” prova- velmente indica que ele se refere A obra Os bebertes estdo na lista apresentaca por Paulo em 69,10 daqueles que nao herdarso, (© reino de Deus, Um dos temas artisticos das cerdmicas gregas € 0 simpésio grego ou festa da bebida. A xicara na fotografia é de 490-480 aC, e mostra convidados de um banquete relaxando e saboreando seu vinho, ACorintios 6.7.44 transformadora e capacitadora do Espi- tito na vida do cristo, e nao ao ato do batismo, embora seja bem possivel que o pensamento paulino incluisse o batismo como o ponto de partida da aco do Es- pirito2 “Santificados” é a sequéncia na- tural nesta lista curta. Quando o Espirito de Deus preenche de forma purificadors a vida do individuo, seu relacionamento com Deus muda e ele deixa de fazer parte da comunidade dos adikoi e passa a fazer parte da comunidade do Deus santo, os hagioi. Fala-se muito de “santificagao™ como um termo que expressa separagao (ser santo é “ser separado”; veja o quadro “Santidade e santificaco” no comentario sobre 1.1-3). Essa énfase € equivocada tem criado muita confusao quanto ao cara- ter da santificacdo.} Os corintios sao santos porque pertencem a Deus, ¢ no porque foram separados de Corinto. Separagao € a realidade secundaria que flui do fato de pertencer exclusivamente a Deus.* A én- fase de Paulo é sobre o relacionamento deles com Deus por meio de seu Filho. Jesus Cristo. Eles agora pertencem a umz comunidade diferente ¢, uma vez que se relacionam com Deus de forma diferente, também devem relacionar-se uns com os outros de modo diferente. A énfase passiva de edikaidthete (“voces foram feitos justos”; NIV: “foram justifica- dos”) transmite a mesma t6nica relacional. Oconceito paulino de justiga é relacional,< no estritamente moral. Os corintios foram justificados pela fé em Cristo, e nao por rar os itens da lista apresentada por Jo no versiculo anterior. O relaciona- ento entre aquele que dé e aqueles que cebem a dédiva, estabelecido por meio ocupa o cerne do pensamento pau- no. A mudanga de comportamento moral é decorrente da mudanga relacional. Seu ‘0 (e salvagao) é viver para agradar a s Cristo, seu verdadeiro benfeitor. Seu ortamento atual é uma violagao direta seu novo relacionamento — eles agem como beneficiarios que se recusam a levar consideragao os desejos de seu benfeitor. no nome do Senhor Jesus Cristo. Sua vacao (ser lavado, santificado, justificado) rantida com base na autoridade de seu syrios (“Senhor”), Jesus Cristo. O proprio. ¢ deles nao tem autoridade alguma com speito a salvacdo. A fim de obter acesso 20 reino de Deus, precisam ser capazes de esentar-se como beneficidrios (membros omunidade) do benfeitor (kyrios), Jesus isto. pelo Espirito de nosso Deus. O agente confere poder a lavagem, santificagio e tificagao deles é 0 Espirito de Deus. O Es- to que comunica a presenca de Deus, apenas revela seu carter, mas capacita unio crista (p. ex., 12.7).! mas eu no serei dominado por nada. zulo vira do avesso 0 argumento da li- dade. Por meio de um trocadilho com eas palavras gregas (exestin € exousiazd), lo afirma que a verdadeira liberdade provém da permissao para fazer qual- uer coisa, mas de ndo ser escravo de coisa =/guma. Ceder aos desejos da carne (gluto- ia) na verdade restringe a liberdade em =z de aumenté-la.? Como Paulo argumenta em Romanos 8.13, somente o poder do Espirito de Cristo é capaz de vencer 0 poder scravizador da carne humana. Em vez de indicar seus direitos como individuos intios, eles deveriam concentrar-se na- szilo que é proveitoso (sympherei, “que s- cionar sexualmente com uma prostitute — mesmo como parte amplamente acei das atividades de uma experiéncia usual ¢ um banquete, talvez até enquanto outros crist&os esto presentes na refeigao, e talvez até na casa de um benfeitor cristao — n! é uma questdo irrelevante (cf. 0 quadr lateral “Alimento e sexo”). Quem pratic= isso se torna “um com ela em corpo” e nd ser diferente dela no dia da ressurreicac ‘Aqueles que pertencem a Cristo fazem parte de seu corpo e se tornaram “um com ele em espirito”. Sao duas esferas opostas = mutuamente exclusivas de pertencimento. 6.18 quem peca sexualmente, peca con- tra seu proprio corpo. Como varios comen- taristas destacam, a expresso “todos os outros pecados que alguém comete, for= do corpo os comete” é um ditado corin- tio baseado em sua antropologia dualis que tornava o corpo moralmente irrele- vante.* Paulo rejeita essas ideias de mod inequivoco e, em resposta, enfatiza: “Quem peca sexualmente, peca contra seu propr' corpo”.’ Seu objetivo nao é expressar um2 visao negativa do sexo, como Nictzsche ‘outros 0 acusaram de fazer, mas ressal que é impossivel separar 0 corpo do re cionamento da pessoa com Deus. Corpo espirito nao sao separaveis. O que acontecs = corpo exerce impacto sobre o espitito, © corpo e a alma ice-versa. No primeiro século d.C., 0 ensino de erposto entre os versiculos 17 € 19,0 Plbtaojedeiea dalseparactia de corpo culo 18 interliga o espirito e o corpo e alma (corpo mortal, alma eterna) =a adorag&o a Cristo e na experiéncia dos havia se transformado em uma ética “stZos como comunidade de Cristo. Nao antropoldgica que conferia a elite um = sabe ao certo quanto conhecimento os argumento filoséfico em favor da en- cintios tinham da literatura profética do Tega hedonista’ aos prezeres 0s sofistas (veja “Retorica e verdade ‘em Corinto” na Introdugao) argumentavam que, pelo fato Antigo Testamento, mas é provavel que a ativa pactual de Oseias e Gomer seja 0 ‘to dessa passagem, ao menos na mente de 0 corpo ser a habitagao da As prdticas hedonistas 4 ‘lo. Aquele que peca sexualmente nao lines, ofa dever des'Seres hu: — : oa pecs contra a prostituta, mas contra seu pr6- mmanos\tuidar. dalé-tie modo: anaes pmo corpo. A imoralidade sexual torna 0 extravagante. Eles pergunta- filosoficamente gracas ©orpo impuro e, portanto, impréprio para vam: “Acaso os olhos, os ouvi- ao ensino de Plato = templo do Espirito de Deus. dose este conjunto de outros acerca da separacio 6.19 0 corpo de vocés é templo do Es- sentidos nao so, por assim —entre corpo ealma. A to Santo. Em contraste gritante com a dizer, guarda-costas emensa —_fotogra most um erpretagio platGnica dualista da antro- «os da.abma?".*Em auvas, | Dee EL Se oes . a palavras, como os sentidos hu- o segundo século dC). ~ologia, Paulo confere intensidade progres- i manos existem apenas para sua discussio ao afirmar como ponto esta vida, s40 concedidos pela sesilar do conhecimento cristdo (“Voces natureza para ser explorados com o objetivo de obter “29 sabem?”) que 0 corpo nao é, de modo © maior prazer possivel. 0 bordao “tudo permitido” » 2am, moralmente irrelevante; pelo con- expressava essa percepcdo de modo claro e sucinto. u a sede da presenca de Deus. Em- Os sentidos humanos eram “amigos", concedidos para nesse contexto Paulo obviamente se © perfodo em que a alma se encontrava abrigada no ~5:2 a0 corpo (ou carne) do individuo, seu corpo. 0 propésito da vide humane era que as pessoas de pronomes no plural e substantivos se tornassem philautoi, “amantes de si mesmas”. gular neste versiculo (corpo, tem- ‘of. tagdo am Winter, After Poul p- 78 ontrastar com “corpos” em 6.15;Rm 211)S também torna sua argumentacio re- re paraacomunidade. A preocupacio _e, portanto, de que “todas as coisas [hes] Paulo ndo éapenascom oindividuo,mas _s0 permitidas” ndo se aplica aos seguidores = 0 impacto desse comportamento dos _de Cristo. Eles nao pertencem a si mesmos; 0s (mele) sobre todo o corpo (sdma).” antes, so servos de Cristo, comprados por dentidade de seu corpo como residéncia/ um preco. A ldgica de Paulo é inequivoca. -=plo do Espirito de Deus esta em jogo. —_Escravos, individuos comprados por um omo templos pagaos revelam seus _preco, nao podem ser “amantes de si mes- por meio de imagens para todos que mos”; espera-se que sejam “amantes das 2m nos respectivos santudrios,o corpo _virtudes” que honram seu benfeitor. Uma Cristo precisa evidenciar Deus por meio _vez que o corpo cristo (individual e coleti- “+ oresenga de seu Espirito Santo. vamente) é santuario de Deus, seu benfeitor, 6.20 vocés foram comprados por um _ a ordem de Paulo é clara: “Honrem a Deus A assercao dos membros da elite de com seu corpo”. O corpo nao é moralmente = singuém tem direito algum sobre eles _irrelevante; é o Iugar de adoracao. a7 ACorintios 6.1220 Consideragées teoldgicas Deus criow os seres humanosa sua imagem como seres integrais cujo propésito é adord- -lo. Nao se pode fazer separagao alguma entre corpo e alma que sugira que uma parte émenos relevante para a adoracio. Tudo o que o ser humano faz, com qualquer parte de seu ser, é uma expresso de adoragéo (ow a auséncia dela). Para ensinar 0 texto 1. Embora nesse texto Paulo trate da ques- to especifica da imoralidade sexual, ele 0 faz.do ponto de vista mais amplo da iden- tidade crista. Com isso, torna impossivel até a ideia de que a fé pode ser reduzida, de algum modo, & aquiescéncia mental. A graca demonstrada por Deus, 0 ben- feitor supremo dos seguidores de Cristo, transforma sua identidade. Eles ja nao per- tencem mais a benfeitores humanos, no dependem deles, nem encontram neles ins- trugio para a vida. Foram transferidos da comunidade do mundo para a comunidade de Cristo. No entanto, ja que identidade e relacionamento coma comunidade andam lado a lado (como qualquer um que tenha viajado um pouco sabe), 0 estilo de vida, as preferéncias, os gostos e outros aspec- tos de uma pessoa revelam sua verdadeira identidade. A fé é a resposta humana de lealdade diante da graca demonstrada a essa pessoa pelo benfeitor.!° Tanto graca quanto 6 so expressdes relacionais. O que est em jogo, portanto, quando cristéos reduzem a fé A aquiescéncia mental e se consideram livres para viver de maneira que ofende o proprio cardter de Cristo € a destruigio é= sua identidade como cristios. 2. Diante da consideragao anterior, s: gue-se que a ética crista flui do carater do ensino de Cristo. Gragas ao impac histérico do cristianismo e a prolifera de igrejas, especialmente no mundo oc dental, é quase natural para um individe considerar suas preferéncias e padres ce turais mais ou menos semelhantes ao c portamento cristao. Algumas coisas taly sejam questionaveis, mas se todo mundo = faz, é impossivel que sejam “inteiramens: erradas”. Hoje em dia, a imoralidade xual que ocorria nos banquetes habite: da elite em Corinto seria considerada v: tanto repulsiva pela maioria das pesso: cristés ou nao. No entanto, em razao ¢ contexto de suas praticas culturais, do e= sino de seus filésofos e politicos, e de sv viséo da antropologia, os corintios n3 tinham dificuldade em encontrar espac para essas praticas lado a lado com a *= crist&. Logo, os cristdos e as igrejas de he devem, constantemente, questionar de c maneira suas ages se alinham com 0 mo- delo apresentado por Cristo, nao apenas = tocante a imoralidade sexual, mas em tod= as questées de relacionamento human Também aqui, a fé consiste na resposta lealdade ao cardter e ao ensino de Crist 3. A natureza contracultural do ensi de Paulo é decorrente de sua recusa ¢ separar a maneira crista de pensar do mod de vida cristo. Para 0 apéstolo, a teo! gia molda a vida do cristao. Nossa atitud contemporanea de “répido, me diga com nos levou a evitar a reflexao ¢ a transfor mar a leitura da Biblia em uma busca p. Paulo escreve: "Por seu poder, Deus ressuscitou dos mortos o Senhor @ também nos ressuscitard" (6.14). Os autores dos Evangelhos relatam que 0 corpo de Jesus foi colocado numa sepulturae que sua entrada foi fechada com uma pedra. Trés dias depois, Jesus ressuscitou. A fotografia mostra um tumulo do primeiro século dC. rna baixa Galileia cuja entrada é fechada com uma peda ACorintios 612-20 =ssiculos de poder para a vida didria (ins- 30 pura) ou por declaracées correti- specificas (instrugao dircta). Quando » a inspiragdo quanto a instrugao sao pretadas a luz da cultura contempo- elas podem facilmente recomendar, ez de questionar, 0 comportamento sal. Nessas circunstncias, questdes que so tratadas de modo especifico no parecem nao estar relacionadas a fé Com a ajuda de 1Corintios 6.12- 2). vemos como 0s corintios usaram seu ~cendimento contemporaneo (separacao = corpo e alma) para concluir que nao relagdo entre fé crista ¢ imoralidade |. Diante dessa situagio, Paulo os a refletir sobre sua fé e, entao, che- conclusio de que suas acées preci- == mudar. Duas realidades teolégicas ou szropol6gicas devem guiar seu modo de sar a esse respeito. (1) Quando Deus —ou os seres humanos, nao fez separacio. =ama entre corpo e alma; a relagao sexual une (cria uniao entre) os parceiros >.16). (2) O corpo tem relevancia eterna. a ressurreigao do corpo, garantida 2 ressureigao de Cristo, é 0 ponto culmi- ante da esperanga crista (6.14). Os cristaos aprender a pensar teolégica e cristo- camente e assim encontrar orientagao iver como verdadeiros seguidores de nsto. Quando nao o fazem, a cultura, e 20 Cristo, se torna seu benfeitor de fato. Para ilustrar o texto vez de ler a Biblia com a lente cultura, leia a cultura com a lente da avra de Deus. Lic3o pratica: Traga um mapa topogréfico = de trilhas e explique como uma pessoa se iza e escolhe a melhor rota durante uma nhada em regiées pouco conhecidas. aque algumas caracteristicas do mapa, somo arvores, declives, riachos e a trilha propriamente dita, Em seguida, pergunte se a melhor maneira de se localizar no mapa é interpreta-lo de acordo com 0 seu entorno ou interpretar o seu em torno de acordo com 0 mapa. Para esclarecer, coloque as duas opgées em pratica: primeiro, localize- -se ao relacionar marcos do seu em torno com o mapa e, depois, ao simplesmente virar © mapa e apontar na direcdio para a qual voce ja esta indo. A Biblia é semelhante no que diz respeito a nosso contexto cultural. Muitas pessoas pensam: “Jé estou indo por esse caminho mesmo, seguindo o fluxo da cultura, logo, permita-me torcer e distor- cer a Biblia até que ela confirme meu rumo atual”, Em vez disso, devemos parar ¢ ob- servar de que maneira os diversos marcos de nossa cultura (ideias, valores, cosmovisdes € compromissos) se alinham com o cenério da Biblia, e depois, nos arrepender e fazer os ajustes necessdrios até estarmos seguros no caminho que Jesus definiu para nos. A sexualidade 6 inseparavel da espiritualidade, pols expressa-se em nosso corpo, o templo do Espirito Santo. ‘Metéforas humanas: Pergunte o que acon teceria se uma pessoa entrasse na igreja fe comecasse a injetar-se com heroina no altar, afogasse um inimigo no batistério ou pichasse obscenidades no piilpito. Se, diante do horror e da indignac4o dos membros, a pessoa afirmasse: “Esta € minha igreja e 0 que faco dentro dela nao é da conta de ninguém”, qual seria a reacao dos lideres? Eles diriam que o prédio é um espago que pertence a Deus, separado para adord-lo e compartilhado com outros que também participam de sua conservacao e pureza. Nessa passagem, Paulo esta dizendo que de- vemos considerar o que fazemos com nosso corpo sob a mesma 6tica: ele é separado para a adorago a Deus. pode ser compar- tilhado com o cénjuge, que também tem interesse especial em nossa satide e pureza.

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