Você está na página 1de 13
internacional de historiadores: Jacques Le Goff Paris) ‘Claudio Magris (Trieste) Carlos Martinez Shaw (Barcelona) Elikia N’Bokolo (Paris) Jacques Revel (Paris) Rudolf Von Thadden (Gottingen) Toledo, séculos XII-XIII Musculmanos, cristaos e judeus: o saber e a tolerancia Organizado por Louis Cardaillac Tradugio: Lucy Magalhaes Revisao técnica: Francisco José Calazans Falcon ‘em colaboragio com Nelma Garcia de Medeiros Jorge Zahar Editor Rio de Janeiro O refluxo do Isla espanhol JEAN-PIERRE DEDIEU Poténcia regional dominante, a Castela de Afonso VI estende seu protetorado ao conjunto da Espanha ‘mugulmana e se apodera de Toledo emt 1085. Durante mais de um século, a cidade seré a fronteira da cristandade diante do Isla. O intercimbio cultural se faz entre castelhanos, francos misturados aos conquistadores e muculmanos remanescentes. Deseo seo mand etd dnt ase a uma fortaleza assediada. Politica, demografica e intelectualmente, en- cerrou-se em si mesmo. Por volta do ano 1000, inicia-se uma profunda renovacio e manifesta-se, em todos os campos, um dinamismo fora do comum: reorganizagio dos Estados, ascensio do papado e das ordens religiosas, renascimento intelectual na Itélia e na Franca. As fronteiras so progressivamente empurradas para norte, para a Europa central, , principalmente, para o sul eo leste mediterraneos, & procura do ouro, solicita e conquista, oscila entre a guerra e o intercambio. © contato entre os dois mundos é particularme: Espanha. E duradouro e no se reduz A guerra, mesmo polftico. A importéncia e ave soberanos mugulmanos das ‘A tomada de Toledo, apés um acordo ambiguo, que, entretanto, nao deixava de ser um acordo, efetuada num clima de respeito relativo, & dois mundos e a concorréncia que os opde: os muculmanos so pro- gressivamente expulsos da cidade; a reagdo almoravida, e depois a a Toledo, seculos XIEXAI alméada, separadas por um intervalo em que a convivéncia 6 retoma- da, bloqueiam o avanco cristio efazem de Toledo, durante mais de um século, uma fronteira, um lugar de passagem obrigatéria entre essas duas culturas. Conscientes desse fato, embriagados por sucess0s mili- fares que, isoladamente, foram impressi 08 reis de Castela se proclamaram imperadores. Em meados do século anos, perde Valé ocidental desmorona e, em alguns O reino de Granada 86 subsiste, Tariq, general berbere enviado por Mussa, que Norte em nome de Walid I, o longinquo califa de lesembarca em Algeciras, Dois meses argens do Guadalete, aniquila 0 exército de Rodrigo, 0 do, que trafra alguns dos seus. Tariq arremete contra I do reino, para saqueé-la. Apodera-se da cidade sem isa maior parte de sua populagio a abandonara. O butim €consideravel. Mussa, alertado, acorre com reforos. Em cinco anos;a Espanha inteira cai nas maos de um punhado de guerreiros mugulma- nos, que dominam cerca de dois milhées e meio de cristios. Pequenos grupos de refugiados resistem nas montanhas das Asturias e na Galt cia; existem bolsdes de resisténcia nos pafses bascos, nos altos vales dos Pireneus. Mas nada disso pesa realmente. 1050. Ja so mais de trezentos anos, e 0 pafs esta inteiramente transformado. A Espanha é muculmana; ou antes, 08 dois tergos meri- dionais da Espanha, ao sul de uma linha que vai de Lisboa a Navarra. Ao norte, a Espanha fria, timida, miserével, abandonada aos cristéos, que expedicées periddicas — operacées militares, polici ccercam nas montanhas; além de um vasto no man’s land quase vazi que garante a seguranca de al-Andalus, a Espanha meridional, rica, povoada e culta. Entre as duas, uma fronteira militar, pontuada por cidades fortificadas: Badajoz, Toledo, Saragoca; nha paralela que permite aos exércitos que sobem do Sul socorrer rapidamente qualquer ponto ameagado. Al-Andalus ¢ antes de tudo uma civilizacdo agricol rica, tecnicamente evolufda, em que a irrigagdo, ai ra Hagar, a capital, haa mercantil, Almeria, Granada, ‘A chegada dos cristaos % Valencia, Saragosa ¢ Toledo, reduzidaa um papel secundério, mas que faz-boa figura diante dos pobres burgos do pafs cristdo... Al-Andalus 0 comércio, com os francos, amantes do outo ¢ dos produtos de luxo, mas principalmente com Tiinis, com Alexandria. Al-Andalus, enfim, para os cristios do Norte, é a terra da prata e do ouro, onde circula 0 dinar, essa moeda que a Furopa quase esqueceut Mas nem tudo so flores na Espanha muculmana, a comecar pela sotiédade, que ndo tem homogencidade. O Isla ¢ tolerante, Nao forcou poder se manifestar no dominio puiblico, é ver juridico do cristdo 0 situa em estado de paga um imposto especial, ndo tem 0 muculmana, ¢, ao menor sinal, é declarado convertido, sem possibi- lidade de voltar atras. Com algumas excegSes, 08 postos de comando thes sto vetados. Assim sendo, as conversdes si0 numerosas, ¢ a comunidade crista se enfraquece a cada dia, Fsté proximo o tempo emi que os cristaos do Sul, presos entre o recrudescimento do fundamentalismo mugulmano e a investida de seus correligionarios do Norte que oschamam, talvez.com desprezo, de mosérabes, serio obrigados a renunciar a sua especifici- dade. Enquanto isso, sentem-se cada vez menos a vontade, e, quando podem, emigram para as terras cristis. Nao se poderia dizer 0 mesmo dos judeus. Sao numerosos, sobrevi- ventes das perseguigdes visigéticas, ou imigrantes, vindos de toda parte, atra(dos pela tolerancia que se tem por eles e pelo desenvol mento das cidades: Seu estatuto € proximo do dos cristaos e sea papel piramide social. De fato, para retomar o titulo de uma obra célebre, “os 4rabes realmente invadiram a Espanha”. Vieram em ntimero muito maior do que se supunha, da longinqua Ardbia e da Africa do Norte (faz-se ainda a distingdo entre drabes e berberes). Os convertidos de origem crist, que se situam em posi¢do inferior a dos mugulmanos de nascimento, fizeram o resto. O Isla é majoritério. Mais ainda; a cultura é muculmana: a organizacio social, 0s modelos familiares, os esque- mas de pensamento so mugulmanos, O drabe é a lingua das cigncias e das artes, Ciéncias e artes, desde o século X, brilham nas cortes e nas cidades, As artes plasticas, a arqui- Yetura desenvolveram-se e oferecem monumentos que entraram ‘Toledo, sculos Para o patrim6nio universal, como a grande mesquita de Cordova; a poesia, na mais pura tradi mento especulativo tem t e também, sob 0 grande a segunda metade do século X, uma magnifica bil méticas e a astronomia. XI, a bandeira seré retomada pela Toledo 80 al-Ma’mun (1045-1077), que acolhe artistas e sébios le Cérdova pelo desmoronamento do califado. Al-Anda- lus faz realmente parte de um conjunto imenso, que se estende até @ Indo, onde cireulam os homens, as idéias e os livros, onde nunca se perdew a lembranga das obras da Antiguidade e onde nunca se interrompeu a tradicdo da leitura. Nesse ponto, estamos a anos-luz da Europa crista. Acessa Europa cristé al-Andalus negligenciou durante muito tempo. Fora preciso fazer um esforco para repelir os exércitos de Carlos Magno, que desceram até Saragoca e Barcelona, mas foram finalmente bloqueados, e retomou-se 0 essencial do terreno perdido, Durante muito tempo, foram um pouco mais incémodos os grupos guerreizos das Astirias ¢ da Galfcia, que passaram progressivamente para 0 grande planalto do Norte. Ocupam Leso, sta capital, e Santiago de Compostela, onde afirmam ter achado 0 timulo do apéstole do mesmo. nome; mas, hé pouco, as incursées de Almanzor, 0 déspota de Cordova (981-1002), devastaram suas aldeias e cidades. Mas adquirem importancia, pois al-Andalus se divide. Curiosamen- te,essa regido sempre tivera dificuldades em adotar um regime estvel, Durante quase cingiienta anos, dependera de Damasco. Em 756, apresentou-se em Cordova um principe vindo do Oriente, o tiltimo dos omfadas, o tiltimo sobrevivente da fami massacradae destronada num golpe de Estado sangrento. Ele ali se instalara, tomara o titulo de califa, ¢, a partir de entio, a Espanha muculmana se tornou independente. Mal ou bem, de revoltas de governadores 4 intrigas palacianas, ela sempre encontrara um homem de pulso Para conservé-la unida, nem que fosse a custa de uma ditadura sanguindria. Mas pouco depois do ano 1000, 0 ano 1000 dos cristdos, aconteceu o sreparavel: al-Andalus se fracionow em taifas, em principados inde rendentes'e ri rmanentemente em conflito: Sevilha, Toledo, }aragoca, Valencia, Granada, Badajoz, para falar das mais importan. ‘es, sem mencionar os Estados mintisculos que eram Huelva, Moron, a A chegada dos crstaos Arcos, Rueda, Denia ou Lérida, cerca de vinte no total. Como nao solreria a alma dos verdadeiros crentes com essa escandalosa frag- 20. Também eles esta mno de Burgos, esses yo de Pamplona), os ios aproveitavam-se inos de Ledo, Castela (e ainda mais do que temiam os muculmanos. E estendiam-se cada vez mais depressa. ; | Efetivamente, 0 aparecimento das taifis constitufra para eles um prémio. Atraidos pelo ouro, eles que haviam praticamente abandona- do 0 seu uso, seus soberanos puseram seus exércitos a servico dos pequenos reis muculmanos. Eles tinham entiqi consideravel- mente, e pouco a pouco tornaram-se ousados. Agora, faziam exigén- cias. Nao se pedia mais a sua protesdo: eles a impunham. Cobravam verdadeiros tributos, as parias, que arruinavam os principes de al-Andalus e seus povos. Ai de quem ndo pagasse! Uma incursdo punitiva logo resolvia a questdo: al-Ma’mun em Toledo, al-Mukta- mid em Sevilha, o mais poderoso dos soberanos muculmanos, vive- ram essa experiéncia. Em contrapartia, os tistioe cumpriam a alavra e protegiam seus clientes contra quem quer que fosse: acon- teceu a seus exéreltosafrontaremvae a eervigo de dois principes mugulmanos rivais, ou até mesmo para proteger um muculmano dos assaltos de um cristdo. As terras do Isld so um campo aberto aos aventureiros. Entre estes, estava o célebre © Cid, Rodrigo Diaz de Bivar. Nobre castelhano, nascido em Burgos, a servigo de Afonso VI, estava em missio em Servilha para receber a paria, quando repelit os exércitos de Grana- da, que atacavam a cidade, icas, foi, com uma tropa talvez composta, pelo menos em parte, de vassalos seus, trabalhar para o rei mouro de Saragoca, a mando de quem derrotou (as ertnicas dizem que capturou) © conde de Barcelona. Dali, passou a Valéncia, onde vagueou durante anos, atacando uns, exigindo tributos de outros, protegendo Alcadir, 0 soberano da cidade, vassalo de Afonso, contra seus inimigos, tanto cristéos quanto mugulmanos. . ‘Quando o rei de Castela, seu senhor, quis se apoderar do reino, 0 Cid considerou que cle era seu e respondeu devastando as terras do seu soberano, 0 que provocou a retirada precipitada deste. Com a tomou o seu lugare reinou com justica sobre mouros smpletamente independente, Morreu em 1099, ¢ sua espo- assum sun sucesio, Fi expulas do seu reino em 1102 Estee doa eumaiavidae icanos, puritanos e Atiaves de miltiplos contatos, duas sociedades se interpenetraram. 1s de nobres e de soldados cristdos vindos do Norte, amigos ou gos de acordo com as circunstancias, viajam e permanecem em muculmana, Aprendem a lingua do outro, observam seus es e seus gostos. E também amam: Zaida, nora do rei de se refugiaré, apés sua viuvez, junto a Afonso VI; 0 rei de 2° conguistndor de Toledo, a smart, ela o niregard a ele, terd por sua causa, e Ihe dard o Gnico filho que conseguiré ver-Ihe... cofino a Foi Afonso, alias, quem deu fim as faifis. Mais do que expulsar os ‘queria passar a frente dos outros reis cristaos, segundo a pura le Ledo, que governava, temporariamente unido a Castela, e ser 0 tinico sucessor dos visigodos. Tinha necessidade de sempre mais dinheiro, sempre mais parias. Quase todas as pagavam tribute, Sobretudo el era aliado de Akad, eto ledo, ameacado por seus colegas de Sevilha e Saragoca, que cavam seu teria, ¢eujofrone vaclava, abalado pelo descon- tos, oprimidos pelos impostose humi- . Uma revolta expulsara-o. Afonso s restabelecé-lo no trono, enquanto Alcadir prometia deixarlhe ‘Jo se 08 cristéos conquistassem para ele o reino de Valéncia. apenas sitiar a cidade e devastar o campo para submeter jmanos, conservavam os seus bens e sua seriam respeitadas; os impostos mantidos em i apoderava-se das possess6es do soberano ley m dono, A chegada dos crstaos a Rapidamente, a cidade, inclusive o8 mosérabes, sentitt que fora conquistada. Emigrantes vindos do Norte, muitas vezes de além-Pi- » ficaram no centro da cidade. A grande mesquita, por sua i transformada em catedral. Os mogérabes foram priva~ dos do direito de eleger seu patriarca: impuseram-Ihes um bispo frances, Bernardo de Cluny, e seu rito, 0 velho rito visigstico que, durante trés séculos e meio, catalisara a sua resisténcia, tratado ‘como “superstigdo toledana” pelos clérigos estrangeiros, fo do a seis igrejas, onde acabou desaparecendo. Bens consideraveis foram distributdos aos recém-chegados. Afastou-se 0 mosérabe Sis- nando, a quem Afonso confiara 0 governo da cidade. O rei entrega- Gara aos homens do Norte, Nao é certo que ele estivesse inteiramen- te de acordo, mas tinha suas razées. Na verdade, se os cristios da Espanha estavam levando a melhor sobre os muculmanos, eles o deviam em parte ao apoio que Ihes Sferecia uma Europa em plena renovasao. De fato, desde o século X, (as coisas se agitam além-Pireneus. Aqui e ali, 0s senhores reagrupam Se habitantes, até entdo dispersos em aldeias, em grupos mais compac- tos, mais faceis de controlar, mais faceis de organizar. Concentram suas Forgas, Instala-se a organizacéo paroquial, que serviré de estrutura para a vida quase até os dias atuais. © dominio do homem sobre 0 ferritério se faz mais forte. A floresta recua, a populacdo aumenta, ¢ também a producdo. © intercimbio, que nunca cessara totalmente, tetoma o seu vigor.O grande comércio renasce eas cidades reassumem 2 fungdo econdmica que quase haviam perdido no fim do império fomano. As frotas italianas disputam de novo aos mugulmanos © império dos mares. “A Igreja desperta. Os papas apresentam-se, pela primeira vez, como elementos éticos, aglutinadores e diretores do Ocidente, até acima dos imperadores. No ano da tomada de Toledo, morre Giégério VILo papa de Canossa, que humilhara o imperador. Em pouco tempo, Urbano TT (1088-1099) langara as cruzadas, 0 excedente das forcas vivas do Oci- dente, contra Jerusalém: 0 espirito de cruzada afirma a unidade da Europa crista. "A vida intelectual recomega. Na Ttélia, no norte monastérios, e depois nas escolas urbanas, grupos de dl ‘os textos que seus antecessores Ihes legaram, comparam-nos, detectam |guas divergéncias, tentam resolvé-las. Tém a impressao d: .eatar 0 fio |de uma tradigto interrompida, de encontrar, de assimilar de novo uma cultura esquecida: “Somos andes empoleirados nos ombros de gigan. tes", dizia um deles. Desse saber antigo, as bibliotecas da Europa sé eontém vestigios. O Ocidente cristdo esté sedento de livros: vai Toledo, culos XILXI dos pafses que conservaram a tradicio antiga, dos pafses cos, de Bizéncio, a matéria-prima in noma, praticamente afastado do mundo. Ali reinava ainda o 10 rito visigético e Roma no importava. Ja em 1063, entretanto, o papa dera indulgéncias a quem fosse & Espania combater os infiis: v-se nessa decisto o primeito exemplo de cruzada. Sancho Ramirez de Aragon respondera a essas propostas. Ele fizera a viagem a Roma e se declarara vaesalo da Santa Sé (1068), acetarao rita romano: er una mania dove protege dasambigse vizinka Navarra elegitimara independéncia queacabava de adqui Fir por suas prépriasforgas, Logo se seguiram outros, Castela apostara em Cluny, essa grande abadia da Borgonha, cujo peso na cristandade era entao Colossal. Assim, ligarse familia ducal dle Borgonka, da qual varios membros se estabeleceram na Espartha. Um deles estara na origem de Portugal, e Constancia, esposa de Afonso Viv era natural da regio, Os monges de Cluny eriaram monastérios, forneceram bispos, impuseram, em 1080, passagem para rito roma- no. Divulgaram o caminho de afo Tiago, que percorri todo o norte do reino ecuja fama dava tanto prestigio ao rei de Ledo; empurraram para 4 Espanha a multidso de imigrantes que povoavam, tanto quanto 08 mocirabes vindos do Sul, a terras conquistadas. A esclha de Bernat, dio de Cluny como bispo de Toledo nao era surpreendente. Como ambém nZo 0 era a proclamagdo, por Roma, alguns anos depots de como arcebispado primaz da Espanha.. pois da 1212. Um grande exército retine-se em Toledo, Primeiro, no infcio da 1u, da Gasconha, da Proven- linada, avida de butim, dot mente, percorriam 0 sul da rei de Aragio, Pedro II (1196-1213), e seus homens; Vil de Navarra, apelidado u (1158-1214), enfim, dequem le reuniu-os para o grande embate, que supSe ‘A chegada dos crstaos “ vo, contra An-Nasir, o Alméada, rei de Marrakech. A preparasio ga. Foi preciso fazer com Aragio acordos sobre a partilha das eventuais conquistas. A este tiltimo cabem Valencia e as Baleares; 0 resto, a Castela, Foi preciso entrar em entendimentos com Leo, ainda independente, para obter pelo menos a sua neutralidade benevolente. Foi preciso que o papa insistisse, proclamasse a cruzada. Nao se deve imaginar um impulso unanime da Espanha ctistd, precipitando-se sem hesitar sobre os infidis. entusiasmo foi talvez maior do queem muitas outras ocasies, mas isso ndo impediu outras reflexes, mais realistas. esar de tudo, o resultado estava ali: um grande exército se ‘um século, a linha de frente da Reconquista est bloqueada dinnte de Toledo: Mas, apésa tomada da cidade, os castelhanostinham avangado rapidamente para o Sul. Entretanto, os reis das taifas, nao vendo mais safda e pressionados por seus stidites, cuja £6 estava radicalizada pelo petigo, decidiram-se a apelar para os almordvidas, fundamentalistas, que acabavam de tomar o poder no Marrocos. Eles i i ifas. Esmagaram os exércitos cristios em Sagreja, 1086; em Consuegra, em 1097; em Uclés, enfim, quase as portas de Toledo, onde morrera o filho do imperador Afonso ¢ de Zaida. Derrubados os almoravidas, os alméadas 0s sucederam, ainda mais inflextveis, ainda mais decididos a rechacar os infiéis ea salvar al-Andaluz. Durante mais de um século, Toledo fora assediada, seus campos devastados. ‘A cidade resistira, baluarte da Espanha crista, protegida pelo estrei to talude entre ela e a Andaluzia, pelos cavaleiros das ordens tares de Sao Tiago e Calatrava, fundadas precisamente nos pri ros anos do sécuilo XII para lutar contra essa onda africana. Toledo empobrecera-se; 0 campesinato dos atredores, arruinado, vendera suas terras para 03 monastérios e as igrejas: a civilizacdo mosarabe, por isso, morrera; a populacdo muculmana se convertera ou fugira. ‘A cidade se tornara mais militar: suas muralhas foram reforsadas, 0 de San Servando, na outra margem do Tejo, tornava mais il um assalto. Para Toledo, comegava a campanha pela libertacio. Ainda em 1195, os exércitos cristdos sofreram uma sangrenta derrota em Alarcos. Havia apenas um ano que um exército almdada, conduzido por An- Nasir em pessoa, subira até Madri. Foi a tltima vez. A travessia dos cespacos semidesérticos da Mancha |. Depois, foi necessario forcar as gargantas da Sierra Morena. Entdo, os franceses desanima~ ram. Tinham a impressio de ter caido em outro mundo; esperavam 0 saque e o massacre, e eis que se negociava com as guarnicées mucul- Toledo, séculos XII manas que se encontravam na estrada, eis que estas tinham permissio de partir, levando armas e bagagens! Continuou-se sem eles. A 16 de julho, exéreito de coalizao dos cristdos se chocava, no cume das gargantas,em Las Navas de Tolosa, com as tropas alméadas. A luta foi feroz: a resistén- cia da guarda pessoal do soberano mugulmano tomou-se lendaria. Um. habil emprego das recervas fez fracassar a titica de envolvimento que 0 emir tentou aplicar mais uma vez, Sua derrota foi completa, e o butim apreendido no seu campo, enorme. Bruscamente, a fronteira foi levada duzentos quilémetros para o sul; Toledo, enfim, conhecia a paz. 1248. A 23 de novembro, Sevilha capitula diante dos exércitos de Fernando III de Castela, 0 Santo. A conquista da Andaluzia nao foi facil. A batalha de Las Navas, se destruiu a capacidade ofensiva dos muculmanos, ndo entregou aos cristdos 0 coragio de al-Andalus. Mais ainda, 08 reinos cristéos também tinham outros problemas. Assim, Pedro II de Aragio, um dos vencedores de Las Navas, morreu em Muret, nos arredores de Toulouse, lutando contra Simo de Monfort, também um cruzado, enviado pelo papa para reprimir a heresia dos albigenses. Ele deixou a Catalunha exangue. Os problemas internos com a dificil sucesso de Afonso, a seca, as epidemias nao facilitaram . Foi preciso esperar a decomposicéo interna do império alméada, acompanhada da revolta dos governadores mugulmanos da Espanha que, um apés outro, se proclamaram independentes. Jé em 1224, eles apelaram aos cristdos para decidir suas querelas e protege- los contra uma posstvel nova ofensiva dos africanos, Fala-se, a esse respeito, de “segundas tifas”. A partir de entao, 0 avango recomesa imediatamente; sucedem-se tratados de alianga, submissdes voluntérias, expedigdes militares, cercos e capitulagées freqiientemente voluntarias, Os mercadores ¢ ‘a nobreza da Catalunha dao ao rei Jaime I, de Aragdo, que sera chamado 0 Conquistador, os meios para se apoderar de Maiorca, um tas que atrapalha o coméi terra e por mar, osc do rei de Valéncia, privado de qualquer esperanca de ajuda exterior. Numa manobra desesperada, apela ao papa, promete converter-se, reconhecer-se como vassalo da Santa Sé. A’mediacio dos Pontificais fracassa; em setembro de 1238, Valéncia mente ocupada. O resto do reino cai nos anos seguintes. Aragio, a partir daf, completou a conquista das regiées que os tratados feitos com Castela Ihe atribufam. Portugal avanca quase tao depressa: jé em 1238, seus exércitos chegaram até as costas meridionais do pats. ‘A chegada dos crstaos “a Castela e Lexo devem fazer um esforgo maior. Em 1230, a Extrema- dura cai em suas maos: isso era urgente, para deter a expansdo portu- guesa para o leste. No mesmo ano, Fernando Ill une definitivamente 608 dois reinos. Os acontecimentos aceleram-se. Cordova, atacada pelo norte, cai em 1236, Jaén, em 1246, Sevilha, enfim, e depois a baixa Andaluzia, até o mar. : Jando é mais necessério preocupar-se com os mosérabes: a emigra- Ho para o norte, a absorcio forcada por uma sociedade mugulmana cada vez mais rfgida praticamente os fizeram desaparecer. Para 08 conquistadores, entretanto, os muculmanos ndo sao inimigos a exter- minar. A coexisténcia continua posstvel. No reino de Valéncia, 03 aragoneses, em pequeno niimero para explorar o pats, fazem tudo para que eles permanesam. Eles até fazem parte dos seus exércitos, como quando da conquista do oul de Aragio propriamente dito. Nessas regides, importantes comunidades muculmanas, os mudéjares, sub- sistirdo por muito tempo, sob a protecdo de seus senhores cristios. Sera necessério esperar a década de 1520 para que o cristianismo Ihes seja imposto, e Francisco I, prisioneiro de Carlos V depois da batalha de Pavia (1525), ainda ouviré o grito dos muezins chamando PMA tradigio castelhana nio 6 diferente, Em algumas regiSes onde no houve capitulacio, expulsa-se a populagéo muculmana; mas, na maioria das vezes, esta permanece, com o essencial de suas terras € de seus bens. Essa populagdo é amplamente majoritéria nas terras recém-conquistadas. Em outros lugares, os cristdos sdo apenas uma fnfima minoria Em 1264, acontece a revolta. Os vencidos nao suportam mais invasio dos cristios, a exploracdo a que os seus novos senhores os submetem. De Sevilha a Miircia, a Andaluzia esta em chamas, estimulada pelos governadores de Granada, onde o rei de Castela ainda no penetrou. Castela estd em situagao diftcl, seus exércitos, insuficientes, no sabem mais o que fazer; é preciso que o rei de Aragao pacifique o reino de Marcia, antes de restitut-lo, sem entusiasmo. Entretanto, pouco a pou- Co, cistioe oe refazem. Resolvem fazer tbua rast: os pacton de capitulacdo fo considerados rompidos: Os muculmanos fogem ou so txpulacs, Amontoarse aoe mlhaes nas montanhas de Granada. O vale do Guadalquivir 6 repartido em lotes imensos, de varios milhares de quilémetros quadrados, entre as principais cidades, povoadas de recém-chegados, ¢ 0s membros da aristocracia. A densidade demogra- fica diminui muito, A agricultura intensiva andaluza, baseada na “ Toledo, séculos: irigacdo, é substituida pela pecuaria extensiva, pelo trigo, e,namelhor . Dezenas de milhares deimigrantes descem atrafdos pela abundancia de terras e pela esperanca de ganho facil. £ uma solugao de brutalidade, raramente praticada ante- riormente, e marca uma mudanca. Entretanto, a Reconquista se detém, por falta de meios, poupando Granada. Castela, desde a década de 1260, vive uma crise grave. Faltam-Ihe homens para repovoar as suas conquistas. Ao norte, a partida dos emigrantes desorganiza a producio. Acrescenta-se a isso uma crise politica, Afonso X, 0 Sabio, rei erudito, poeta e miisico, mas politico medfocre (1252-1284), € obrigado a enfrentar revolias dos nobres. Ele tem, principalmente, um terrivel problema de sucesso: seu filho mais velho, Fernando de la Cerda, morre em 1275. Quem herdaré lhos de Fernando, ou Sancho, filho mais novo do rei? Os a0 contrério, reagrupados em algumas dezenas de mi- Ihates de quilémetros quadrados, chefiados por homens de pulso {como Muhammad II de Granada), reforgados por tropas vindas da Africa do Norte, resistem cada vez mais; os tiltimos anos do reino de ‘Afonso so perturbados por uma série de derrotas, que por um mo- mento fazem periclitar a ocupacio de Sevilha. Finalmente, 0 perigo é contido. Mas, durante dois séculos ainda, a Andaluzia ser zona mili- tar: incursdes e represilias ali se sucederdo, sem que as fronteiras sofram alteracdes sens{veis. A Espanha cristd, alids, afasta-se do mundo muculmano e se volta para a Europa. Ao passo que Tiago II de Aragio renunciara a toda tividade além-Pireneus, para se devotar guerra contra o Isla, seu 10 Pedro IIT (1276-1291) passa a maior parte do seu reinado guer- reando contra a Franga pelo controle da Quanto a Afonso X de Castela, filho de uma Hohenstaufen, alimentou, durante todo seu reinado, a va idéia de ser eleito imperador do Sacro Império Romano Germénico, como Ihe propuseram os pisanos, ou, pelo menos, de que Ihe fosse atribuida a Sudbia, na Alemanha... Nada conseguiu, eviden- temente. Mas essas pretensSes mostram até que ponto os reinos da Espanha se integraram, naquela data, ao concerto das grandes nacSes européias. Era uma bela promogio para os descendentes dos chefes dos bandos que, quinhentos anos antes, tinham empunhado armas contra os infiis. Restava Granada, Ela foi tomada em 1492, pelos Reis Catélicos. Sua. va o fim da existéncia politica do Isla na Europa, néo de cia religiosa. A capitulagdo concedida aos habitantes, na ‘mbra estranhamente as condicdes impostas a Toledo qua- os... Logo se péde ver como os tempos mudaram: jé A ehegada dos cristdos 6 em 1501, 08 acordos estavam abertamente rompidos eo cristianismo imposto a forca A populagio. Em 1568, uma revolta resultava na deportacao em massa dos habitantes de Granada e sua dispersio pelo resto da Espanha, Enfim, em 1610, 0s mouriscos, como se chamavam_ entdo os descedentes dos mouros da Espanha, granadinos, aragoneses ow valencianos, foram expulsos do reino em condigdes terriveis: 160.000 pessoas tomaram 0 caminho do exilio. Com elas termina © refluxo do Isla espanhol. 4 reconquista cristé “Toledo, séeulos XIEXIIL Fronteira entre dois estados cristios Limite entre ferritsrios crist2os e muculmanos O sonho imperial JULIAN MONTEMAYOR Toledo, reconquistada, logo incitard seus soberanos @ assumirem o titulo de imperadores. Cont 0 apoio do papa, ‘Afonso VII se afirmard acima dos reis cristios € mugulmanos, e prosseguird seu sonho até a coroa enquanto Fernando III serd “rei das trés ss”. Mais tarde, Afonso X concretizard esse i colaboracio intelectual das trés culturas. Cornapan cinpedréo cat gana mtn domant no Ocidente medieval. Na Espanha crist’, durante muito tempo & margem da Europa, a idéia de império se tornou um meio de reunir as energias contra os muculmanos. O reino das Asturias, e depois o de ‘Leo, por sua situacao central, logo propagou essa idéia. A diversi- dade das culturas, dos galegos aos bascos, e dos territérios reunidos sob a mesma autoridade assim o exigia. Afonso III é o primeiro de uma série de monarcas a se intitular imperador. A autoridade do soberano cerca-se de uma série de simbolos particulares: coroa, cetro, manto encarnado. Durante esses anos, a ideologia imperial se refina e se fortalece. ‘A tomada de Toledo dé uma nova dimensio a esse sonho. A apropriacdo da grande cidade e do seu pasado de capital politica e religiosa confere um outro estatuto ao monarca castelhano. Basea- dos nisso, quatro soberanos levario o velho sonho imperial tao Tonge quanto possivel. Cada um o interpreta num sentido, mas de qualquer forma Toledo & sempre uma peca importante nese em- preendimento. + Bncontra-se tanto a expressfo “rei das ts religioes” quanto “imperador das tds eeligides” € soberano das ts reigises”. (NRT) ” Um passeio pela Toledo medieval JULIO PORRES DE MATEO DOLORES DE PAZ ESCRIBANO Seja qual for o camtinho que se tome para entrar na cidade, chega-se @ praca do Zocodover. De origem muculmana, seu nome vem do érabe, Suq-al-dawab, “mercado de animais". Lé funcionava tradicionalmente a feira, mercado semanal em que se confraternizavam todas as classes sociais, ticas das cidades muculmanas de al-Andalus. O tecido urbano, de tipo medieval, tinha forte sabor islimico, no emaranhado de suas ruelas, que aparentava aos velhos bairros de Granada e Cérdova ou da: cidades da Africa do Norte. Durante muito tempo, Toledo fora uma cidade romana; foi até sede da monarquia visigética, continuadora do Império. Essa época deixou. poucos vestigios: os grandes blocos de cimento do Circo e do Aquedu- to, despojados de seu antigo revestimento de granito; fragmentos de cornijas.e de cantaria, reutilizados nas paredes de edificios posteriores; ea ponte de Alcantara, a maior obra ainda de pé. Quanto aos visigodos, ¢ ainda pior: nenhuma construgéo lembra a sua passagem pela cidade. Conservaram-se muitas pilastras, colunas, baixos-relevos decorados com motivos t{picos de sua cultura, mas nem ‘embora se saiba que eles incia real de Toledo, o palacio de Galiana, mo muitos monastérios e outras igrejas paroquiais. Uma parte has com as quais cercaram a cidade continua intacta, 0 Muro da dos muculmanos, drabes e norte-africanos mudou radi- aspecto de Madina Tulaytula (Cidade de Toledo). Além das as 108a8, as novidades se manifestam no uso de aA BEA IEE ‘Uma capital cultural a materiais como argamassa, gesso, tijolo, pedra e madeira e segundo técnicas de construgdo e decoracio préprias, que o o “mudéjar toledano”, a cidade que Afonso VI zestituiu ao mundo politico cristo povoada. As grandes familias nobres, ricase guerreiras abando hha, mas permaneceram nela excelentes agricultores e artesdos m manos, ou mudéjares. Entre estes, pedreiros e construtores que dot navam técnicas especificas e que, durante toda a Idade Méd remodelaram velhos imporio durante século: chegardo a Toledo, Esse modelo mudéjar se imps com tanta forca 208, nobres e aos reis que foi exportado: o monastério de Las Huelgas de Burgos, no coragdo da Castela crista, é uma das obras-primas dos mestres pedreiros toledanos do século XII ‘Quando se vé Toledo a partir do norte, compreende-se por que a cidade nunca foi invadida. Solidas muralhas fortificadas defendem a elevagio sobre a qual se ergue a cidade na tinica protegida pelo Tejo. Nos séculos XII e XIII, as muralhas pareciam ainda mais impressionantes, p: século XII, 0s soberanos cristdo: da cidade, para enfrentar as tents ravam retomé-la. "Ao norte, a Porta de Bisagra constituia a sua principal entrada — eua reforma, no século XVI, recobriu a porta arabe —, mas também se podia passar pela Posta de Afonso VI, pela Porta do Cambrén ou pela de Almofala (“o vau", em arabe), ot ainda pela porta que se Abria para a Ponte de Alcantara, A muralha envolvia inteiramente a8 zonas habitadas. Era mais vulnerdvel nos setores defendidos elo rio, Pe jtravessada a Porta de Bisagra, penetrava-se no Artabal, subdirbio igem muculmana fortificado no século XI por Afonso VI. S igreja, dedicada ao apéstolo sdo Tiago, construida nos sé XII, é um dos mais belos exemplos de arquitetura mudéjar. Tal tenha ocupado o lugar de uma antiga mesquita, como parece indicar 0 seu campandrio, independente da igreja, que apresenta caracterfsticas proprias aos minaretes muculmanos. Outras igrejas da mesma époc in, Santa Leocadia, San Yuste, Santo Tomé, a Magdale San Roman, elevam-se em diversos pontos da cidade, também cons: truidas de tijolos e alvenaria, decoradas com arcos duplos e ent radura divider seu interior em trés naves, por absides semicirculares e cobertas por tetos de madeira com pain ricamente decorados. Toledo, séculos XI A rua principal leva ao Muro de Azor, nico vestigio das muralhas inigstions, que se aravensa pelas Portas de Valmardn e Alarcon, st a hoje eclipsada pela magnifica Pe construfda no gia i ipsada pela magnifica Porta do Sol, construfda ‘Ao lado da Porta de Valmardén encontra-se a mais preciosa jéia da rte califal em Toledo, a mesquita do Cristo de la Luz. Erigida em 999, © exemplo mais antigo de utilizacio de tijolos em relevo na fachada, ara formar uma decoracdo de arcos entrecruzados. Encontra-sealium axto comemorativo de sua construgio, em caracteres cificos, também .etijolos. No interior, nove abébadas com nervuras chamama atencio; fo todas diferentes, a exemplo do mihrab da mesquita de Cordova, istlanizoute a mesquita no século XU, acrescentando-Ihe uma absi- i dacorada com arco mudéjarea no exterior pinturasromanteatno Assim como os muculmanos tomaram para seu uso as j oan um rocesso de cristianizacio afetou, na mesma época, muitas mesquitas. Yas 11 que se conhecem, nove foram recuperadas pelos cristios: a atedral Santa Maria, as igrejas de San Salvador, San Andrés, San ebastién, a capela de Belém, o Cristo de la Luz e trés outras, hoje ‘esaparecidas, San Lorenzd, San Crist6bal e San Ginés. : ja qual for o caminho que se tome para entrar na cidade, chega-se A Sear ae ea tuq-al-dawab, “mercado de animais”. La funcionava tradicionalmente mercado semanal em que se confraternizavam todas as classes ‘A muralha de Alficén (al-hizam, a cercadura) a fechava de um iana, assim chamado porque dominava os acessos & p ntara, passag gatoria na estrada das Galias (ad Gallas), ‘onstitufa o principal conjunto de edificios nobres da cidade. E14 que e situa uma das cancdes de gesta do ciclo de rlos Magno, em que 0 1 do rei mouro Gala- tede Toledo Foi no Acer que Afonso Vi instlouo convento de anta Fé, que compreendia a capela de Belém, antigo oratério do rei ‘A praca do Zocodover faz parte de uma ampla 20 ere sna comercial, que « prolongaatéa atedral, Compreendeo air doe Prancos em torno ia praca da Madalena e da rua dos Torneiros, onde se instalaram os nigtantes além-Pireneus, que chegaram depois de Afonso VI, quando 1a reconquista da cidade. Depois, vinha o mercado da seda (Alcaice- ‘Uma capital cultural m ra), onde se fazia 0 comércio dos produtos mais ricos, e que atraiu o» ‘comerciantes judeus para o bairro da rua dos Mercadores (Alcana), em torno da praca das Quatro Ruas e da rua da Sinagoga. Na rua dos Torneiros, elevava-se, no comeco do século XII, a tiltima mesquita construlda pelos muculmanos, a partir do modelo simy Cristo de la Luz, e que, segundo toda probabilidade, uti alicerces as fundacdes de um reservatério de Agua romano. Perto da rua dos Mercadores, comegou-se a construir, a partir de 1226, 0 maior edificio g6tico de Toledo, a catedral Santa Maria. Subs- tituiaa Grande Mesquita dos mugulmanos,convertida em igreja pouco depois da conquista, sem quase nenhuma transformacio. Em meados do aéculo XIII, jé se podia perceber a magnificéncia da construsao,com seu duplo deambulatério, projetado por mestre Martin, que retomava, aperfeigoando-o, o modelo da catedral de Le Mans. No fim do século, podia-se desfrutar a beleza das esculturas da Porta do Rel ‘A catedral gética é, por exceléncia, 0 templo dos a ‘outros cristdos, os mogdrabes, também recons- las apresentam 0 mais antigo estilo mudéjar de Toledo: Santa Eulalia, San Lucas, Santas Justa y Rufina eSan Sebastian, ‘esta diltima sem abside, heranca talvez do seu passado como mesquita Segundo as mesmas técnicas, construiu-se a igreja latina de San Ro- min, que se distingue por sua decoracio interna com pinturas roma- nnicas representando 08 santos cristdos com vestes musulmanas, obra, fem parte, do pintor anénimo que decorow a abside e o core do Cristo dela Luz. Perto da igreja de San Roman, a oeste da cidade, se encontrava a Juderia Mayor, cercada por suas proprias muralhas desde a época mugulmana. Depois da conquista cristd, a imigracéo dos judeus de al-Andalus, expulsos pela intransigencia de seus novos senhores nor- te-africanos, almordvidas e alméadas, aumentou a sua populagio. O bairro pareceu-se com o resto da cidade, com suas ruas tortuosas ¢ muitas ruelas. As sinagogas, seus principais monumentos — co! cem-se pelo menos onze — eram construfdas no estilo dominan! mudgjar. A mais bela, sem diivida, Santa Marfa la Blanca, ¢ obra de pedreiros mudjares eapresenta tacos caracterfsticos da arte alméada. Notam-se principalmente a originalidade de seus capitéis decorados com pinhas sobre pilares octogonais, assim como a pureza ea perfeicko de seus painéis decorativos. ‘A Juderia abrigava varios estabelecimentos para os banhos como o da rua do Anjo, e aquele em que habitava, no sécul Samuel Levi, hoje Casa-Museu de El Greco. Esses balnedrios se pars iam muito com os banhos muculmanos que estio dispersos 192 Toledo, séculos XIEXIIL ‘Vana capital cultural [tinerério da Toledo dos séculos XII e XIII 14 Toledo, séculos XI-XIIL dade, como os do Cenizar ou de Yaix, 0s de Caballel ou os da Bajada del Pozo Amargo. Todos tém trés ou quatro salas abobadadas, de temperaturas diferentes. ‘A Juderia Mayor tinha em seu seio duas fortalezas, uma da época muculmana, outra da época cristd, chamadas no século XIII castelos Velho e Novo, separadas por uma rua. Erguiam-se na extremidade noroeste do bairro, onde as suas préprias muralhas se aproximavam. até quase tocé-la através de uma das principais portas da cidade, a Porta dos Judeus, Bab-al-Yahud, que se tornou mais tarde a Porta do Cambrén, Perto dela se encontrava a ponte de barcos da Cava. E: margem por uma grande torre que se abria para o Rio por meio de duas portas, de alturas diferentes: fixava-se a passarela em uma ou oulra, em fungao do nivel do rio. No leito deste, dois pilares de cimento ajudavam as barcacas a resistir a corrente. Entretan larmente destrufdos por ocasizo das cheias, e foi preciso reconstruf-los te 05 séculos XII e XIII. A fragilidade dessa obra lades, no século XIV, da ponte de San © curso do rio se alarga e 3, crislaos e até algumas noras, as vastas huertas A escola de tradutores DANIELLE JACQUART Meio século apés sua reconquista, a cidade pode se orgulhar de possuir um centro de tradutores excepcional. A presenga de mocdrabes e judeus que conheciam o drabe, conjugada aos numerosos manuscritos dispontoeis, atraiu muitos eruditos. Entre estes, Gerardo de Cremona traduziu para o latim tratados de filosofia, matemética e medicina. Con anos apés a reconquista da cidade pelos cristios, Tole- do tornou-se um centro de tradugées, cuja atividade nao pode ser comparada a de nenhum outro na Idade Média A presenca de mosérabes e judeus que conheciam o arabe, a possi mao muitos manuscritos, atrairam eruditos de diferentes Europa. Mesmo que a denomi po utilizada, ndo pareca apropriada, houve, em Toledo, verdadeiras equipes de tradutores, que poderiam ser qualificados de “profissio- Desde 1133-42, Jodo de Sevilha, provavelmente um mogérabe, tra- duziu do arabe para o latim varios tratados cientificos: ele dedica a0 Na segunda metade do século XII, instala-se em Toledo 0 mais prolifico dos tradutores medievais: Gerardo de Cremo- na, que, possivelmente com a ajuda de colaboradores, traduz para o latim um ntimero impressionante de obras referentes a filosofia, & astronomia, as matematicas, as ciéncias ocultas, & medicina. Como o arcediago Dominicus Gundissalvi, que colaborou na traducdo da filo- sofia de Avicena, Gerardo de Cremona manteve laos estreitos com 0 capitulo e 0 arcebispo Joo. No comeso do século XIII, Toledo conti- nuou a sero porto de encontro dos tradutores. Entre os mais ilustr deve-se citar o futuro sabio da corte de Frederico Il, Miguel Scot, autor

Você também pode gostar