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Ensaio Crítico TED-Iasmin Borges Vasconcelos
Ensaio Crítico TED-Iasmin Borges Vasconcelos
UBERLÂNDIA
2023
IASMIN BORGES VASCONCELOS
UBERLÂNDIA
2023
1. INTRODUÇÃO
Entende-se por autoritarismo o modelo de governo baseado na centralização de
poderes, com traços de hierarquia de posições, abuso de poder, oposição à liberdade
individual, exclusão de direitos e tentativa de alienação. Dessa forma, tal sistema político se
mostra oposto ao molde democrático ideal, que se baseia em uma forma de democracia
representativa e participativa, na qual os representantes devem garantir os direitos da
população e há também a soberania popular, que vai muito além do voto direto.
A partir disso, o presente ensaio crítico, relacionado ao tema geral Poder, Estado e
Democracia tem como objetivo principal analisar como o autoritarismo brasileiro influenciou
e influencia a atual democracia do país, com foco no período de 2018 a 2022. Para isso, é
necessário compreender o que foi o autoritarismo brasileiro e como esse modelo foi efetivado,
como ocorreu a transição até a democracia representativa estabelecida no Brasil e sobretudo,
de que modo os dois modelos de governo estão entrelaçados e de que maneira se apresentou
no período referenciado. Assim, busca-se evidenciar como questões evidentes no passado
nacional ainda estão diretamente ligadas com ações e modelos políticos da atualidade.
2. AUTORITARISMO BRASILEIRO
A consolidação do Estado nacional brasileiro é marcada por uma tendência de
valorização das relações sociais de poder, desigualdade e a dominação de classes. Para Lilia
Moritz Schwarcz, em seu livro “Sobre o autoritarismo brasileiro”, tais características se
fortaleceram desde o período escravocrata do país, no século XVI, como é evidenciado no
seguinte trecho:
No Brasil, o sistema escravocrata transformou-se num modelo tão enraizado que
acabou se convertendo numa linguagem, com graves consequências. Grassou por
aqui, do século XVI ao XIX, uma escandalosa injustiça amparada pela artimanha da
legalidade. Como não havia nada em nossa legislação que vetasse ou regulasse tal
sistema, ele se espraiou por todo o país, entrando firme nos “costumes da terra”.
Imperou no nosso território uma grande bastardia jurídica, a total falta de direitos de
alguns ante a imensa concentração de poderes nas mãos de outros. (SCHWARCZ,
Lilia, 2019, p.22)
Ademais, a Ditadura militar brasileira, imposta em 1964 foi outro marco para o
movimento autoritário no Brasil, de modo que se mostra fundamental analisar os antecedentes
do golpe civil-militar. “Os anos que antecederam o golpe civil-militar de 1964 foram anos de
grande efervescência política e cultural.” (ARAUJO, Maria; SILVA, Izabel; SANTOS,
Desirree, 2013, p. 11), com a renúncia de Jânio Quadros e a posse de João Goulart houveram
mudanças significativas no modelo político. Primeiramente, foi estabelecido um modelo
parlamentarista em 1961, entretanto dois anos depois foi restaurado o regime presidencialista,
favorecendo grupos esquerdistas e as camadas mais pobres, como explicitado a seguir:
A posse de Jango, marcada pela vitória da Campanha da Legalidade, conferiu ânimo
aos grupos nacionalistas e de esquerda que colocaram, na ordem do dia, a pauta das
reformas estruturais. Entre as principais reformas estavam as reformas fiscal,
administrativa, universitária e, principalmente, a reforma agrária. Do programa de
reformas faziam parte também políticas nacionalistas, como o controle sobre o
capital estrangeiro e o monopólio de setores estratégicos da economia. Entre todas
estas bandeiras, a reforma agrária era a mais contundente. No Nordeste rural, as
Ligas Camponesas, lideradas pelo advogado Francisco Julião, levantaram a bandeira
“Reforma agrária já! Reforma agrária na lei ou na marra”(ARAUJO, Maria; SILVA,
Izabel; SANTOS, Desirree, 2013, p. 12)
Após o golpe de 1964, o Brasil iniciou uma longa ditadura que perdurou até 1985.
Lideranças políticas e sindicais foram presas, parlamentares cassados, militantes
políticos exilados. A ditadura fechou os partidos políticos existentes e criou dois
novos: Aliança Renovadora Nacional (ARENA) e Movimento Democrático
Brasileiro (MDB) — um partido de situação e outro de “oposição consentida”. O
novo governo editou Atos Institucionais com os quais criava condições excepcionais
de funcionamento “legal” para atos ilegais e arbitrários. (ARAUJO, Maria; SILVA,
Izabel; SANTOS, Desirree, 2013, p. 12)
Dessa forma, a partir do que foi apresentado, conclui-se que desde a formação do
Brasil e explicitamente em determinados períodos, como o Estado Novo e a Ditadura Militar,
traços e movimentos autoritários compuseram a história do país. Sendo assim, destaca-se a
importância de analisar como o autoritarismo se funde na sociedade brasileira.
3. DO AUTORITARISMO À DEMOCRACIA
Pode se dizer que a fase democrática brasileira é recente, isso porque o século XX foi
marcado por moldes de governos autoritários e de centralização do poder. O primeiro passo
para a redemocratização do país aconteceu pelo fracasso da abertura da ditadura, que ocorreu
nas eleições de 1974, no governo de Ernesto Geisel.
Nessa eleição, os militares foram derrotados e começou um intenso processo de
reivindicações por um governo verdadeiramente democratico. Como consequências, tem se a
revogação do AI-5, a lei de anistia, que permitiu que exilados políticos retornassem ao país, e
o restabelecimento do pluripartidarismo, que possibilitou a eleição para governadores em
1982.
Uma importante ação popular para a revigoração da democracia foram as Diretas já,
que exigiam eleições diretas em 1985, com a aprovação da Emenda Dante de Oliveira. “As
Diretas, como ficaram conhecidas as jornadas de luta democrática de 1984,foram a maior
mobilização política de massas da história do Brasil nos últimos trinta anos.”(ARCARY,
Valerio, 2014, p.237). Entretanto, mesmo com a grande repercussão, as diretas já não foram
aprovadas e em 1985, de forma indireta, Tancredo Neves foi eleito presidente por um colégio
eleitoral. Porém, não conseguiu assumir, e seu vice, José Sarney foi nomeado presidente.
Durante o governo Sarney foi feita uma Assembleia Constituinte com o intuito de
elaborar uma nova Constituição, visto que a anterior não possuía um viés democratico e
estava desatualizada. Dessa forma, foi elaborada a Constituição brasileira de 1988, que tinha
como principal característica ser cidadã, ou seja, garantia direitos fundamentais, liberdade de
expressão, voto livre e principalmente, a liberdade de voto. Assim, foi estabelecida
novamente a democracia no Brasil, de forma que, todos os seguintes governos enquadraram
se como “democráticos”.
A partir dessa perspectiva, pode-se citar que desde 2016 o país sofreu diversas
mudanças no cenário político. Isso aconteceu principalmente com o chamado Golpe de 2016,
que culminou no impeachment da então presidente Dilma rousseff, durante esse período
ocorreram inúmeros manifestações de direita com cunho liberal. A principal justificativa para
o movimento era um possível avanço comunista no país, a questão da corrupção e da
economia. Nessa lógica, Maria do Socorro Sousa de Araújo e Alba Maria Pinho de Carvalho
no artigo “Autoritarismo no Brasil do presente: bolsonarismo nos circuitos do
ultraliberalismo, militarismo e reacionarismo” definem:
A rigor, o ano de 2016 consubstancia uma nova época histórica na vida brasileira,
instaurando um tempo de autoritarismo, em meio às configurações formais da
democracia representativa, na República Brasileira. Trata-se de um ataque frontal à
democracia no Brasil, atingindo as instituições e permeando a própria cultura
política.(ARAÚJO, Maria; CARVALHO, Alba, 2021)
Tal movimento, pode ser considerado elaborado para a posterior eleição de 2018, na
qual é eleito Jair Messias Bolsonaro como presidente do Brasil. A partir de 2018 é observado
o aumento do autoritarismo no país e como o próprio presidente apoiou e proferiu tal situação.
Em estudos realizados pelo Centro de Análise da Liberdade e do Autoritarismo (LAUT), os
relatórios demonstraram que no período de 2018 a 2021 houveram quedas na democracia,
liberdade e no estado de Direito. Além disso, foi constatado temor da população para se
expressarem quanto a temas específicos, como gênero e sexualidade, e 1692 atos autoritários
durante o governo Bolsonaro (entre janeiro de 2019 e dezembro de 2021). (Brito A. S.;
Mendes C. H.; Sales F. R.; Amaral M.C.S.; Barreto M.S. 2022, p.16)
Bolsonaro, antes e durante seu governo propagou e defendeu ideias autoritárias como
a ineficiências das urnas eletrônicas e seus resultados, criticou abertamente as mídias,
espalhou diversas fakes news, principalmente em relação a pandemia de covid-19, aclamou a
ditadura militar, apresentou falas racistas e sexistas, entre outras ações. Como dados, tem se
os resultados do estudo “Ódio e fake news como estratégia política no discurso de Bolsonaro
nas redes sociais digitais” feito por Denis Augusto Carneiro Lobo1 e Desirèe Luíse Lopes
Conceição, que em análises buscando discurso de ódio e fake news no twitter de Bolsonaro
concluíram:
Chegou-se ao resultado de que houve FDs com incitação ao ódio em 6% de todas as
publicações realizadas, bem como 2% de menção ao termo fake news ou notícia
falsa. Se segmentado por categoria, nota-se que as FDs com incitação ao ódio, em
seus diferentes tipos11 , estão atreladas principalmente aos conteúdos
Ideológico/Partidário (60%) e em segundo lugar à Promocional/Comunicação
(16%). Já a presença do termo fake news ou semelhante foram localizadas
principalmente nas comunicações do presidente sobre a Mídia (81%) enquanto
aconteceu com bem menos frequência em Promocional/Comunicação (13%),
ocupando o segundo lugar. (LOBOL, Denis; CONCEIÇÃO, Desirèe, 2019, p. 7)
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante o exposto, conclui-se que a formação do Brasil está configurada em bases do
autoritarismo e em diversos momentos históricos, ações e medidas autoritárias estiveram
presente, sejam de forma explícita ou implícita, forte ou fraca. Isso se comprova a partir dos
dados apresentados.
Além disso, é importante destacar como movimentos populares anti-autoritarismo têm
um papel fundamental para a dissolução de regimes de cunho autoritário. Ainda, deve-se dar
ênfase para a necessidade de mudança na atualidade do país, para que não haja a permanência
dessa forma de violência e para que sejam garantidos os direitos fundamentais dos cidadãos.
Por fim, percebe-se de forma clara como não é possível analisar o presente sem
averiguar o passado. De forma que, os acontecimentos atuais são fonte de momentos
históricos com situações políticas semelhantes. Assim, mesmo que o Brasil seja dito como
democratico e de soberania popular, observa-se traços autoritários que tendem a desvalorizar
os direitos, gerar desigualdades e visam apenas benefícios à elite brasileira.
REFERÊNCIAS
SCHWARCZ, Lilia Moritz. Sobre o autoritarismo brasileiro. São Paulo, 2019. Companhia
das Letras. Disponível em:
https://www.mprj.mp.br/documents/20184/1330165/Sobre_o_autoritarismo_brasileiro.pdf.
Acesso em: 1 jun. 2023.
DUFFES. Gabriel Lopes. Da Revolução de 1930 ao Golpe de 1937 (Estado Novo). In:
Revista Digital Simonsen; Rio de Janeiro, novembro de 2020. Disponível em:
http://www.simonsen.br/revista-digital/wp-content/uploads/2020/12/13.-REVISTA-n-13.pdf#
page=133. Acesso em: 2 jun. 2023.
Brito A. S.; Mendes C. H.; Sales F. R.; Amaral M.C.S.; Barreto M.S. (2022). São Paulo. O
caminho da autocracia - Estratégias atuais de erosão democrática. Centro de Análise da
Liberdade e do Autoritarismo (LAUT)
LOBO, Denis; CONCEIÇÃO, Desirèe. Ódio e fake news como estratégia política no
discurso de Bolsonaro nas redes sociais digitais. 43º Encontro Anual da Anpocs, 2019.
Disponível
em:file:///C:/Users/DELL/Documents/Documentos%20ufu/2019_lobo_odio_fake_news.pdf.
Acesso em: 3 jun. 2023.
OLIVEIRA, Antonio. NO OLHO DO FURACÃO: A CIRCULAÇÃO DAS FAKE NEWS
DO GOVERNO JAIR BOLSONARO NAS PLATAFORMAS DURANTE A
PANDEMIA DA COVID-19. Tese (Mestre em Comunicação)- Universidade Federal de
Santa Maria. Santa Maria, 2021. Disponível em:
https://repositorio.ufsm.br/bitstream/handle/1/25696/DIS_PPGCOMUNICA%c3%87%c3%8
3O_2021_OLIVEIRA_ANTONIO.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 3 jun. 2023.