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DOSSIÊ PARA PROTEÇÃO DO CONJUNTO URBANO

BAIRROS LAGOINHA, BONFIM E CARLOS PRATES

DIRETORIA DE PATRIMÔNIO CULTURAL


FUNDAÇÃO MUNICIPAL DE CULTURA
DEZEMBRO / 2016
CARLOS PRATES
PREFEITO MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE COORDENAÇÃO GERAL
MARCIO ARAUJO LACERDA CARLOS HENRIQUE BICALHO

PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO MUNICIPAL DE CULTURA EQUIPE TÉCNICA PRINCIPAL

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LEÔNIDAS JOSÉ DE OLIVEIRA ANA CAROLINA CHAVES LEMOS

CONJUNTO URBANO LAGOINHA, BONFIM


BÁRBARA RABELO BECHELANE
DIRETOR DE PATRIMÔNIO CULTURAL BRUNA APARECIDA MENDES DE SÁ
CARLOS HENRIQUE BICALHO BRUNO LEITE CORTINA
TEODORO MAGNI
CHEFE DO DEPARTAMENTO DE GESTÃO E
MONITORAMENTO EQUIPE TÉCNICA COLABORADORA
MARIANA GUIMARAES BRANDAO CAROLINA PEREIRA SOARES
ISMAEL KRISHNA DE ANDRADE NEIVA
JAUDEMIR RIBEIRO DE CARVALHO
LUCIANA DE CARVALHO TEIXEIRA
MARIA HELENA DE REZENDE COSTA
MARIANA GUIMARAES BRANDAO

ESTAGIÁRIOS
DANIELLA CAMPOS ALVES PEREIRA
DIOGO CURVACHO MONTOTO
GABRIEL LEROY FREITAS
GIOVANNI ARAÚJO HELIODORO
GUILHERME ALBERTO DE OLIVEIRA 2
ISADORA LAGE BISTENE ---
MATEUS FELIPE NUNES AGOSTINHO
CARLOS PRATES
ÍNDICE

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS ........................................................................................................................ 4

2. EVOLUÇÃO DA PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL ....................................................................... 10

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3. REFERÊNCIA METODOLÓGICA ................................................................................................................ 28

4. HISTÓRICO DO CONJUNTO URBANO ....................................................................................................... 38

5. PERÍMETRO DO CONJUNTO URBANO ...................................................................................................... 74

6. CARACTERIZAÇÃO DO CONJUNTO URBANO ............................................................................................. 80

7. CRITÉRIOS PARA A PROTEÇÃO DOS BENS CULTURAIS IMÓVEIS ................................................................. 121

8. CRITÉRIOS PARA A DEFINIÇÃO DAS DIRETRIZES ALTIMÉTRICAS ................................................................ 130

9. DIRETRIZES ESPECIAIS DE PROJETO: .................................................................................................... 134

10. LISTAGEM DE GRAUS DE PROTEÇÃO.................................................................................................... 136

10.1. BENS CULTURAIS INDICADOS PARA TOMBAMENTO NESTE ESTUDO ................................................. 136

10.2. PRAÇAS INDICADAS PARA TOMBAMENTO NESTE ESTUDO .............................................................. 143 3


---
10.3. ÁRVORES INDICADAS PARA TOMBAMENTO NESTE ESTUDO ............................................................ 143

10.4. BENS CULTURAIS INDICADOS PARA REGISTRO ROCUMENTAL NESTE ESTUDO .................................. 143

10.5. BENS CULTURAIS TOMBADOS ..................................................................................................... 145

10.6. BENS CULTURAIS COM PROCESSO DE TOMBAMENTO ABERTO PELO CDPCM/BH ............................ 145

10.7. BENS CULTURAIS COM REGISTRO DOCUMENTAL CONCLUÍDO E APROVADO PELO CDPCM/BH ......... 148

10.8. BENS CULTURAIS COM REGISTRO DOCUMENTAL SOLICITADO PELO CDPCM/BH............................. 148

11. REFERÊNCIAS .................................................................................................................................. 150

12. ANEXOS ........................................................................................................................................... 152


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1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

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O bairro da Lagoinha tem sido objeto de interesse das políticas públicas voltadas à preservação

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patrimonial, e à promoção dos modos de vida, desde o início da década de 1990. De lá para cá, foram
realizados estudos e diagnósticos, mas que não chegaram a resultar ainda em uma regulamentação de
diretrizes para o local. As informações produzidas, porém, compõem um importante material de
referência para a compreensão do bairro, razão pela qual apresentamos, em linhas gerais a sua
cronologia.

Em dezembro de 1993, foi lançado pelo Departamento de Memória e Patrimônio Cultural da então
Secretaria Municipal de Cultura, o Inventário do Patrimônio Urbano e Cultural de Belo Horizonte -
IPUC-BH, nele incluído o Projeto Lagoinha. A partir de dezembro de 1994, o Projeto Lagoinha passou a
ser coordenado pela Comissão BH 100 Anos/PBH, adotando a perspectiva de Reabilitação Integrada,
levando em conta os seguintes trabalhos já realizados pela PBH: o IPUC-BH (no âmbito da então
Secretaria Municipal de Cultura - SMC), a Pesquisa das Atividades Econômicas da Lagoinha (no
âmbito da então Secretaria Municipal da Indústria e Comércio - SMIC) e a pesquisa “Cenários da
Lagoinha” (no âmbito da então Secretaria Municipal de Planejamento - SMPL). Em maio de 1995 foi
apresentada nova versão do Projeto Lagoinha por meio de documento contendo a caracterização do
bairro e especificando os programas propostos1. Foi lançado o Projeto Lagoinha como “O Projeto - 4
Síntese do Centenário”, no Minascentro, com a participação do então prefeito Patrus Ananias e do ---

presidente da Comissão de Revitalização da Lagoinha, José Maria de Oliveira Cançado2.

Em 1995 também foi encaminhado à SMC/DMPC o volume do IPUC-BH - Lagoinha, contendo os


resultados da pesquisa desenvolvida pela equipe contratada pela SMC/PBH com diferentes
abordagens: histórica, urbanístico-arquitetônica e sociológica. Elaborado pelas professoras Fernanda
Borges de Moraes e Maria de Lourdes Dolabela Pereira, a pesquisa, iniciada em 1994, propunha uma
visão holística sobre o bairro, contemplando diferentes escalas do tecido urbano.

1 Histórico do Bairro e do Processo (manuscrito datado de 2007).


2 Parecer Técnico sobre Conjunto Urbano Bairro Lagoinha (manuscrito datado de 2007).

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Em agosto de 1996 foram aprovadas as Leis Municipais nº 7.165 e 7.166 que em seu Capítulo VI, Art.
75, trata das Áreas de Diretrizes Especiais onde se insere, dentre outras, a região da Lagoinha. Em seu

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Artigo nº 88, a Lei nº 7166/96 estabelece:

Art. 88 - A ADE da Lagoinha, em função de sua localização estratégica e da importância cultural e


econômica da região, é destinada:
I - à proteção do patrimônio cultural e da paisagem urbana;
II - à requalificação de áreas degradadas ou estagnadas;
Inciso II com redação dada pela Lei nº 9.959, de 20/7/2010 (Art. 79)
III - ao incremento ao desenvolvimento econômico.
§ 1º - No que se refere ao incremento das atividades econômicas na ADE da Lagoinha, devem ser adotadas
políticas que contemplem:
I - a permanência das atividades econômicas tradicionais existentes na área;
II - o estímulo à implantação de novas atividades compatíveis com as lá existentes;
III - a implantação de incubadoras de empresas e de equipamentos indutores similares, visando a
modernizar os processos produtivos.
§ 2º - A permanência e a implantação das atividades econômicas referidas no parágrafo anterior podem ser
estimuladas por incentivos fiscais.
§ 3º - Os projetos de reurbanização necessários para as áreas degradadas ou subutilizadas podem ser
feitos por meio de operações urbanas.
§ 4º - Visando ao desenvolvimento socioeconômico, ambiental e cultural da região, a regulamentação da
ADE da Lagoinha deverá, entre outros aspectos:
I - estimular o desenvolvimento de novas vocações econômicas na região, por meio de projetos de
requalificação urbana;
II - estimular a permanência do uso residencial na ADE;
III - levantar os imóveis passíveis de inventário e tombamento.
§ 4º acrescentado pela Lei nº 9.959, de 20/7/2010 (Art. 79)

O documento definia assim o perímetro da ADE Lagoinha. 5


---

Fragmento de mapa anexo à Lei nº7166/96, com a delimitação do perímetro da ADE Lagoinha. Fonte: LPUOS-BH.

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Em 1997 iniciaram-se, no âmbito da então SMIC, as discussões para regulamentação da ADE-


Lagoinha. Cabe destacar que, até o momento, a mesma ADE ainda não foi regulamentada por lei

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específica.

O pedido de abertura de processo de tombamento do Bairro Lagoinha foi contemplado pelo Conselho
Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município de Belo Horizonte/CDPCM-BH em reunião ordinária
realizada em 09/09/1997, conforme respectiva ata publicada no DOM em 30/10/1997. Nesta ocasião,
foi apresentado aos conselheiros, e aprovado, o Projeto de Reabilitação Integrada do Bairro Lagoinha,
que gerou o documento intitulado “Projeto Lagoinha: Programas e Projetos”, sob a coordenação de
Fátima Mirra e a coordenação técnica do então conselheiro Leonardo Barci Castriota. Juntamente à
apresentação do projeto, foi solicitada a abertura do processo de tombamento do Bairro Lagoinha,
Processo nº 01.100.051.96.99, aprovado pelo Conselho.

Ainda em 1997, a então Secretaria Municipal de Indústria e Comércio - SMIC encaminhou ao CDPCM-
BH um material contendo cópias das fichas de inventário de 143 imóveis do bairro e uma listagem de
166 imóveis solicitando o tombamento de suas fachadas e volumes.3 Essa solicitação foi contemplada
pelo CDPCM-BH na reunião realizada em 08/09/1998, conforme ata publicada em 28/10/1998. Em
resposta à demanda de tombamento dos 166 imóveis, o Conselheiro-relator, Roberto Luiz de Melo
Monte-Mór, sugeriu que se procedesse ao início da elaboração do dossiê do Conjunto Urbano do 6
---
Bairro Lagoinha, o qual deveria ainda contemplar um levantamento mais minucioso sobre os imóveis
de interesse no bairro. A sugestão foi aprovada pelo Conselho, e a então diretora de Memória e
Patrimônio Cultural, Maria de Fátima Pereira Rossi, indicou a previsão de elaboração do referido dossiê
para o ano de 1999. Os trabalhos, porém, não puderam ser levados à termo.

Nos anos de 2007 e 2008, a atual Diretoria de Patrimônio Cultural/DIPC, equipamento da Fundação
Municipal de Cultura/FMC, realizou um levantamento do bairro Lagoinha e uma caracterização prévia
de micro zoneamentos. Esse trabalho foi realizado com base na metodologia então inspirada nos
estudos desenvolvidos pelo Núcleo de Antropologia Urbana NAU/USP, coordenado pelo professor
doutor José Guilherme Cantor Magnani.

3
Histórico do Bairro e do Processo (manuscrito datado de 2007).

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Ao longo dos anos de 2010 e 2011, o bairro Lagoinha foi ainda contemplado num projeto de pesquisa
mais amplo, envolvendo a DIPC e o Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da PUC-Minas.

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O projeto, denominado “Bairros Históricos de Belo Horizonte: patrimônio cultural e modos de vida”,
contou com financiamento da Fundação de Amparo à pesquisa de Minas Gerais - FAPEMIG, e focou,
além da Lagoinha, os seguintes bairros da região pericentral de Belo Horizonte: Santa Tereza, Floresta,
Bonfim, Carlos Prates, Padre Eustáquio, Calafate, Prado, Concórdia, Pompéia e Esplanada. Buscou-se
compreender a relação entre o reconhecimento formal do patrimônio cultural existente naqueles bairros
(pelas políticas públicas de preservação) e o reconhecimento tácito dos seus residentes e
frequentadores. Essa pesquisa culminou na publicação, em 2012, do livro “Bairros pericentrais de Belo
Horizonte: patrimônio, territórios e modos de vida”, organizado pela professora do Programa de Pós-
graduação em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC-Minas,
Luciana Teixeira de Andrade, e pela então diretora da DIPC, Michele Abreu Arroyo.

Finalmente, na 247ª sessão ordinária do CDPCM-BH, realizada em 19/11/2014, foi aprovado o “Plano
de Inventário de Proteção do Patrimônio Cultural do Município de Belo Horizonte”, prevendo, dentre
outros, a conclusão dos estudos para a proteção definitiva do Conjunto Urbano da Lagoinha.

Nesse contexto, e reconhecendo a importância histórica e cultural da região da Lagoinha, incluindo


ainda, neste momento, partes dos bairros Bonfim e Carlos Prates, bem como do conjunto arquitetônico 7
---
e das particularidades que os distinguem no espaço geral da cidade, a equipe técnica da Diretoria de
Patrimônio Cultural apresenta ao CDPCM/BH o presente estudo para proteção do Conjunto Urbano
Bairros Lagoinha – Bonfim – Carlos Prates.

Este dossiê visa subsidiar a deliberação do CDPCM-BH acerca do perímetro de proteção do referido
conjunto urbano, além da deliberação acerca do grau de proteção dos bens culturais nele existentes e
elencados pela DIPC, bem quanto às diretrizes especiais de projeto em imóveis e áreas públicas dentro
do seu perímetro. Para atender ao objetivo de identificar os bens culturais passíveis de proteção e
deliberar acerca do grau de proteção de cada um, foram elaboradas fichas de inventários de imóveis
com indicação para tombamento e para Registro Documental.

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Este estudo pauta-se pelos princípios estabelecidos na ADE da Lagoinha com a Lei nº 7.165/96 no
âmbito da legislação urbanística municipal, bem como na proposta do Novo Plano Diretor de Belo

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Horizonte, objeto de discussão da IV Conferência Municipal de Política Urbana, que aconteceu entre
fevereiro e agosto de 2014. A análise proposta do presente Conjunto Urbano, observa também os
primeiros estudos e inventários dessa região, que buscaram cobrir lacunas da história da cidade e de
suas origens, as quais se confundem com as da própria Lagoinha e adjacências.4 Conforme o IPUC -
Lagoinha, desenvolvido em 1995, na região não houve parâmetros urbanísticos definidos no momento
da concepção da capital, mas muito da dinâmica que se desenvolveu em suas origens e crescimento,
própria das áreas suburbanas, resta ainda preservada até os dias de hoje, não obstante todas as
transformações que sofreu ao longo do tempo. Para as autoras do citado Inventário, MORAIS e
PEREIRA, o bairro:

(...) estabeleceu um padrão estético específico e manteve um crescimento diferenciado que se expressa em
suas ruas tortuosas e na arquitetura livre de restrições, onde convivem diferentes estilos arquitetônicos,
construções muito simples ao lado de algumas que apresentam um certo grau de sofisticação. Isso
demonstra, sem dúvida, um desvio do idealizado traçado da cidade, bem como de sua bem demarcada
distribuição sócio-espacial.”5
Como já ocorreu em outros Conjuntos Urbanos protegidos pelo CDPCM-BH, cuja definição do
perímetro de proteção partiu de vias ou espaços polarizadores (aqui entendidos como áreas
possuidoras de valor histórico, simbólico e referencial capazes de atribuir ao espaço urbano um 8
determinado grau de coesão), nos bairros Lagoinha, Bonfim e Carlos Prates também foram ---
identificados importantes elementos polarizadores que são apresentados neste dossiê.

Este dossiê propõe, assim, um olhar significativo para o passado, para o presente, e também para o
futuro da região no contexto histórico, social, cultural, político e econômico do município. Frente ao
exposto, este estudo tem por objetivo elucidar as características históricas, arquitetônicas e culturais
que identificam esses bairros como importante referência da formação da história da cidade.
Características estas que os tornam objeto de uma proposta específica de proteção de seu patrimônio,
oferecendo subsídios para que o CDPCM-BH delibere acerca dos graus de proteção dos bens culturais

4
Inventário do Patrimônio Urbano e Cultural de Belo Horizonte – Bairro da lagoinha, 1995, página 4.
5
Inventário, 1995, página 4.

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inseridos nos perímetros do Conjunto Urbano conformado pelo bairro da Lagoinha e partes do Bonfim e
do Carlos Prates estabelecendo as diretrizes gerais de proteção para a área.

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Pelo histórico aqui apresentado, por sua relevância atual, pelas inúmeras iniciativas e extensos estudos
já desenvolvidos, dado o interesse que a região desperta para a comunidade local e para o município
como um todo, este estudo não tem a pretensão de encerrar em si todo o objeto de trabalho a ser
explorado. Espera-se tão somente que este dossiê possa propiciar ao órgão deliberativo de proteção
do Patrimônio da cidade de Belo Horizonte atender a uma demanda social latente que é o ato de
proteção a coroar o reconhecimento que a região já possui. No futuro, novos estudos poderão e
deverão complementar o material ora apresentado.

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2. EVOLUÇÃO DA PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL

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A importância atribuída ao que hoje denominamos patrimônio cultural remonta há muitos séculos e

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esteve direcionada, inicialmente, a um objeto específico: a obra de arte. Os primeiros registros da
preocupação em preservar elementos portadores de significado cultural da destruição6, indicavam que
tal esforço estava circunscrito a objetos artísticos que, por sua excepcionalidade, caracterizavam de
forma elevada os ideais da civilização representada. Entretanto, a expressividade contida em
esculturas, templos e monumentos não era necessariamente contemplada por cada civilização que as
produzia, de acordo com suas próprias crenças e formas particulares de organização. O valor de
refinamento artístico direcionava-se, sobretudo, aos objetos da Grécia antiga, moldados de acordo com
os ideais de beleza e de perfeição do pensamento helênico.

Dois traços – étnico e cronológico – marcam sua diferença em relação aos monumentos e ao
patrimônio histórico ocidental. Todos os objetos que encantam os atálidas, depois dos romanos, são de
origem grega. Com exceção de algumas obras do começo do século VI, eles pertencem exclusivamente
aos períodos clássico e helenístico. Seu valor não se prende à sua relação com uma história à qual
conferissem autenticidade ou permitissem datar, nem à sua antiguidade: dão a conhecer as realizações
de uma civilização superior. São modelos, servem para suscitar uma arte de viver e um refinamento que
só os gregos tinham. (CHOAY, F. 2006, p. 34).
Tal reconhecimento constituía certo prestígio para as civilizações que se apropriavam tanto das obras
de arte quanto de fragmentos dos materiais trabalhados pertencentes aos monumentos gregos. O
10
espólio capturado pelos conquistadores que se impunham pela guerra adquiriam novos significados à ---
medida que era incorporado às recentes construções, utilizado como elemento de decoração ou
mesmo como objeto de uso cotidiano. Em grande medida, mesmo a fruição estética de tais obras se
modificava a partir dos diferentes contextos de inserção e logo despertava o interesse de
colecionadores, que extrapolavam o critério artístico e reforçavam o sentido de lucro e de dominação.

6 Para caracterizar os diferentes significados que o termo patrimônio adquiriu desde a Antiguidade até a época moderna,
utilizamos como base o estudo realizado por Françoise Choay em seu livro A Alegoria do Patrimônio. Apesar da autora se
concentrar principalmente nos desdobramentos que esse tema teve na Europa, consideramos que a falta de referências a
outras civilizações também complexas situadas em outros continentes, como África, América e Ásia, não destitui o mérito do
estudo em apresentar as diferentes nuances que o conceito de patrimônio assumiu ao longo dos séculos. Tal debate, pelo
contrário, fornece um extenso volume de elementos fundamentais para entender a trajetória do tema e, por consequência, a
maneira como ele se apresenta atualmente.

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A ênfase nas obras de arte gregas, no entanto, passa a ganhar um novo enfoque durante a Idade
Média. Apesar da admiração da estética clássica, tanto as grandes construções quanto os mais

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variados objetos reverenciados até então, são gradativamente incorporados à tarefa de executar
funções mais imediatas, como complemento do material usado para novas edificações. De fato, esse
período é responsável pela destruição de um grande número de monumentos, descaracterizados ou
até mesmo completamente demolidos devido a razões práticas da crise que dizimou um número
significativo da população europeia. Diversas construções são reocupadas como habitações, oficinas e
depósitos e outras simplesmente demolidas para servir de matéria prima para diferentes usos.

Os monumentos antigos não são, contudo, apenas „reciclados‟; eles também são, com a mesma
simplicidade e desenvoltura, cortados em partes e pedaços, incorporados em seguida a
construções novas, para embelezá-las e decorá-las. (...) Colunas, capitéis, estátuas, friso
esculpidos são, desse modo, retirados dos edifícios que faziam a glória das cidades antigas.
(CHOAY, F. 2006, p. 40)

Simultaneamente às depredações praticadas em nome dessa necessidade de uso, mantém-se uma


admiração pelo requinte das obras de arte antigas, como a riqueza de detalhes de suas construções e
os traços meticulosamente entalhados das esculturas, reveladores de uma proeza a qual apenas a
civilização clássica estava à altura. O deslocamento e as adaptações desses elementos que cumpriram
a dupla função de uso e de fruição incentivou um olhar novo em relação a sua origem e, com isso, deu
11
início a uma abordagem que os colocava na perspectiva histórica de sua produção. Paralelo aos ---
esforços da igreja em atribuir um caráter identitário e de situar os monumentos de Roma no contexto de
seu espaço histórico, ganhou força um movimento que adicionava o elemento do tempo às obras de
arte, para além dos critérios estéticos. Nessa nova “camada” interpretativa, os textos da Antiguidade
assumem grande relevância, pois contribuem para analisar a época em que os monumentos surgiram.

No quadro da revolução do saber que a Itália vive então [durante o séc. XV], essa mesma imagem
arruinada de uma Antiguidade que se acabara de descobrir à luz resplandecente dos textos quase
obriga o olhar a dar aos monumentos romanos uma dimensão histórica. É nesse contexto mental,
nesses lugares e sob a designação genérica de „antiguidades‟ que é preciso situar o nascimento
do monumento histórico. Seriam necessários mais três séculos para que ganhasse seu nome
definitivo. (CHOAY, F. 2006, p. 44)

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Na esteira da ampliação desse entendimento de arte, história e patrimônio, surge, em diversas cidades
estado – sobretudo no território da atual Itália –, um movimento humanista que elege os ideais da

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Grécia antiga como modelo, porém não mais centrado exclusivamente em uma apropriação do
passado, mas como um parâmetro a ser seguido na produção artística do presente. A distinção entre a
valorização histórica do monumento – com seu refinamento, que revela o domínio técnico alcançado
pela tradição de uma civilização superior – e a valorização da própria arte – que, apesar de se orientar
por critérios da Antiguidade, também é reconhecida nas obras contemporâneas – marca de forma
significativa o surgimento de uma compreensão nova sobre o patrimônio. Apesar de excluir os períodos
intermediários, tal perspectiva insere sua própria época no horizonte da produção artística e,
consequentemente, incentiva a ampliação dos trabalhos de eruditos e de artistas. Tais obras,
admiradas por príncipes, que logo se transformam em mecenas que investem tanto em desconhecidos
quanto em renomados artistas para abastecer suas coleções privadas, passam a se juntar aos objetos
da Antiguidade destinados a um público bastante restrito.

Além dos territórios onde surgiram os monumentos da Antiguidade, como Roma e Grécia, iniciou-se a
busca por referências de épocas passadas em regiões expoentes da arte renascentista, como forma de
legitimar o pertencimento à tradição estética que se pretendia. Essas ruínas, agora portadoras também
de um componente histórico, passam a carregar o significado de seu próprio lugar, ou seja, ao invés de
12
remeterem exclusivamente aos territórios da Antiguidade, tais elementos são considerados em seu ---
próprio contexto geográfico para valorizá-los como conquista e como tradição de sua própria
civilização. Aliada à produção renascentista, a conservação dos monumentos se mostra um importante
desafio devido à necessidade da presença real do objeto e, ainda que isso muitas vezes seja feito por
meio de restaurações, digamos, bastante livres, que remodelam as partes perdidas dos edifícios, tal
preocupação abre caminho para institucionalizar uma conservação mais sistemática dessas
construções.

A disposição em criar mecanismos de guarda e estratégias de restauração desses monumentos, em


conjunto ao crescente número de obras de arte que decoravam os museus particulares, desenvolveu-
se sem grandes saltos até o fim do século XVIII, quando o advento da Revolução Francesa impôs uma
ruptura na relação que se estabelecia com o patrimônio. Os levantes revolucionários obrigaram uma

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abordagem diferente aos monumentos e obras de arte reverenciadas até então. O propósito de
erradicar qualquer conotação ao ancien régime acarretou na destruição de inúmeros artefatos

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independentemente de referência explícita ou não com a monarquia deposta, já que, para os
insurgentes, cada um desses marcos deveria dar lugar a uma ordem social completamente nova, sem
vínculos com a ordem anterior. Isso incluía tanto as construções quanto as obras de arte. No entanto,
após um período de extrema violência e destruição, ganha força um entendimento que situa esses
monumentos não mais como pertencentes à corte, mas à própria sociedade. Com isso, a nova
organização político administrativa em formação dá início às primeiras preocupações em como dar
acesso a esses “bens” comuns, e particularmente, como conservá-los para o contínuo usufruto da
população. Nesse movimento, o Estado passa a se tornar responsável pela guarda de tais obras e
monumentos e as primeiras medidas de proteção das mesmas têm início no plano jurídico.

O papel instaurador, como vimos, coubera à Itália. Depois, na época clássica, os antiquários
deram unidade aos estudos sobre as antiguidades: de um país a outro, os museus iconográficos
diferiam apenas pelo estilo de suas representações. A inovação promovida pelos comitês
revolucionários é, em contrapartida, radical. Além disso, pela mediação dessa diferença, eles
criavam uma estrutura de conservação centralizada que haveria de se tornar, até a recente
descentralização dos poderes do Estado em nível regional, a característica da gestão francesa dos
monumentos históricos. (CHOAY, F. 2006, p. 119)

O esforço em instaurar um ordenamento que coordene a identificação e a preservação de um 13


patrimônio, que agora assume a representação de sua própria sociedade com um cunho ---

marcadamente nacionalista, suscita debates a respeito da melhor maneira de como proceder. Entre
defesas favoráveis à conservação integral das ruínas sem qualquer tipo de intervenção e posturas
contrárias, orientadas pela recuperação dos monumentos antigos via execução de trabalhos que
interfiram em seu objeto para garantir sua valorização e inserção de fato no tempo presente, o arquiteto
italiano Camillo Boito se destaca com uma contribuição importante. Diferentemente da inflexibilidade de
propostas favoráveis ou contrárias à intervenção nos monumentos, Boito – assim como, anos mais
tarde, Gustavo Giovannoni também proporia – extrai elementos complementares de ambas posturas. À
John Ruskin e William Morris deve sua concepção da conservação com base na noção de
autenticidade, isto é, os monumentos devem ser preservados tal como se apresentam, inclusive com a
singularidade de seus sucessivos acréscimos. De Èugene Viollet-le-Duc absorve o postulado da

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prioridade do presente em relação ao passado, na qual os monumentos devem estar inseridos no


contexto das necessidades do presente. Na perspectiva de Boito, a intervenção não é rechaçada, mas

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só deve ser praticada quando todos os outros meios tiverem fracassado e, ainda assim, os elementos
reconstruídos devem ser marcados de forma a identificar o trabalho.

Mesmo com a intensa disputa de ideias e o importante incremento nas formas de proteção, Aloïs Riegl
alcança um entendimento determinante na interpretação de patrimônio, tão marcante que estende sua
influência até hoje. Historiador da arte, Riegl propõe em seu livro O Culto Moderno dos Monumentos,
de 1903, uma leitura que problematiza a noção de monumento histórico vigente e, ao invés de se
apoiar exclusivamente em uma perspectiva técnica, passa a investigar os sentidos atribuídos pela
sociedade. Para ele, todo monumento tem uma dimensão histórica e uma dimensão estética. Histórica,
porque toda expressão artística é determinada pelo acúmulo de influências anteriores; estética, porque
todo monumento carrega a evolução da fabricação de seu material, alcançada por meio de técnicas
vinculadas a elementos estéticos. Como, no entanto, todo resquício do passado contém um valor
histórico, todo monumento artístico deve ser compreendido como representante de um momento
histórico. Por isso, Riegl defende que não deveríamos mais tratar os monumentos como históricos e
artísticos, mas apenas como históricos. Enquanto tal, não é mais possível fazer distinção entre as
épocas. Se, com vimos, no Renascimento já ocorre a distinção entre tempo histórico – no qual apenas
14
a antiguidade grega era valorizada – e composição estética – que aceita a produção contemporânea a ---
partir de critérios helênicos –, Riegl sugere uma compreensão que amplia o significado de evolução
histórica e supera a ideia de cânone, ao considerar que todo período histórico tem valor específico.
Com isso, todo lugar de qualquer época é merecedor de interesse, “todas as realizações, por menores
que sejam, de todos os povos, quaisquer que sejam as diferenças que as separem de nós; um
interesse pela história da humanidade em geral, aparecendo cada um de seus membros como parte
integrante de nós mesmos” (Riegl, A. apud Fonseca, M. C. L. 2005, p. 66). Inserida em um conjunto de
formulações do final do século XIX que inaugura novas linhas de abordagem no campo da filosofia, da
sociologia e da nascente antropologia, tal perspectiva será fundamental para uma compreensão mais
refinada de patrimônio, que se estende até a atualidade.

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Riegl, contudo, vai além. Dentre as categorias de “rememoração” – ligada ao passado, ao período
histórico que o monumento foi produzido – e “contemporaneidade” – referente ao significado e à

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apropriação do monumento no presente –, destacam-se dois conceitos que atribuem uma nova
abordagem ao caráter histórico dos bens culturais: o “valor de ancianidade” e o “valor de novidade”. O
primeiro consiste no reconhecimento de que, com frequência, os monumentos não nos remetem a fatos
históricos, pessoas notáveis ou eventos marcantes; na verdade a condição material do monumento
evoca um tempo passado, encerra um tempo transcorrido desde sua criação, ou seja, nos lembra a
passagem do tempo. Essa percepção, que é alcançada de forma intuitiva, facilita a apropriação de
valor de um monumento por parte da população, constituindo-se como predominante durante boa parte
do século XX. Já o “valor de novidade” refere-se à tendência humana de atualizar, criar algo novo,
remodelar como forma de superar tudo aquilo que é atrasado, disfuncional, feio. Nas palavras do
próprio autor “apenas o que é novo e intacto é belo”. Seria esse o motivo pelo qual sentimos
necessidade em modernizar cidades antigas, recriar antigas construções, soterrando elementos antigos
sob os ideais estéticos do presente.

Essas propostas influenciaram fortemente as formulações sobre conservação de monumentos. Aliada


ao contínuo processo de ocupação e de transformação dos centros urbanos, agora já epicentro de um
processo industrial estabelecido e em franco desenvolvimento, a atenção se voltou para os
15
monumentos situados nesse espaço urbano e na forma como eles se relacionavam nesse contexto de ---
transformação. Talvez o exemplo mais significativo dessa preocupação surja com as reformas
desenvolvidas pelo barão de Hausmann na malha urbana de Paris, por volta de 1870. Com o intuito de
atender às necessidades da cidade industrial moderna, diversas partes da cidade foram demolidas
para dar lugar a novos edifícios, largas avenidas, reformulação do sistema de saneamento e de
transporte que atendesse às necessidades de circulação de trabalhadores e de mercadorias, em suma,
para fazer desaparecer a Paris antiga. Naturalmente tais transformações preocuparam-se com
elementos estéticos da época em sua composição para enfatizar a implantação do “novo” e, justamente
o desaparecimento de espaços até então consolidados nos hábitos, nas memórias e na identidade dos
moradores, suscitou diversos questionamentos a respeito dos limites das transformações nas cidades
antigas e contemporâneas.

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A conversão da cidade material em objeto de conhecimento histórico foi motivada pela


transformação do espaço urbano que se seguiu à revolução industrial: perturbação traumática do

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meio tradicional, emergência de outras escalas viárias e parcelares. (...) Quer o urbanismo se

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empenhasse em destruir os conjuntos urbanos antigos, quer procurasse preservá-los, foi
justamente tornando-se um obstáculo ao livre desdobramento de novas modalidades de
organização do espaço urbano que as formações antigas adquiriram sua identidade conceitual. A
noção de patrimônio urbano histórico constituiu-se na contramão do processo de urbanização
dominante. Ela é o resultado de uma dialética da história e da historicidade que se processa em
três figuras (ou abordagens) sucessivas da cidade antiga. (CHOAY, F. 2006, p. 179)

Como resposta às demandas que se faziam cada vez mais urgentes, frente, ao mesmo tempo, à
destruição e à importância dos monumentos, o trabalho de Gustavo Gionvannoni se destaca como um
dos precursores na preservação de conjuntos urbanos. Em sua obra Vecchie città ed edilizia nuova, de
1931, o arquiteto e engenheiro italiano formula uma concepção geral da organização do território
urbano como forma de conservar elementos antigos e característicos das cidades frente à força das
pressões e das reformulações da cidade industrial. O “patrimônio urbano”, como nomeia pela primeira
vez o próprio autor, deve ser interpretado como partícipe da malha urbana na qual se insere e não
apenas como elemento isolado. Dessa forma, o adensamento das cidades e consequente impacto em
sua composição espacial, não deveria ser combatido, mas integrado aos núcleos de interesse de
preservação. A tendência de fragmentação das grandes cidades, no lugar da concentração e do
adensamento característico das cidades antigas, estaria rearticulando seus espaços. Reforçado pela 16
inovação do transporte e da comunicação, Giovannoni enxergava nessas redes que se formavam a ---

possibilidade de articular pequenas unidades espaciais e, em tais núcleos, a ação de preservação


poderia ser empreendida de forma extensiva sem, contudo, impedir mudanças no conjunto da cidade.

Entre seus princípios de conservação, Giovannoni postulava que todo fragmento urbano antigo deve
ser integrado a um plano diretor em âmbito local, regional e territorial. Os monumentos históricos não
podem ser vistos de forma isolada, sendo necessário inseri-los no contexto das construções no qual se
insere. Os procedimentos de preservação e de restauração de núcleos urbanos devem respeitar a
escala, a morfologia e as relações originais de mobilidade. Assim, as intervenções se limitariam ao
ambiente e à materialidade das configurações espaciais na qual se inserem. Observadas essas
condições, os procedimentos de restauração seriam análogos àqueles definidos por Boito para os
monumentos, isto é, apenas depois de esgotado todos os esforços de conservação seriam autorizadas

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intervenções, e mesmo assim, desde que identificadas. Dessa forma, Giovanonni não condena
reconstituições, porém de forma limitada e com respeito ao caráter histórico dos lugares.

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A contribuição teórica e prática do esforço empreendido por Giovanonni, particularmente nos trabalhos
de identificação e de restauro de conjuntos urbanos – além da elaboração de legislação específica – na
Itália, foi de grande relevância para a ampliação do conceito de patrimônio cultural. Se nos séculos
anteriores a valorização do patrimônio ficara restrita à ideia de monumento como elemento isolado, na
primeira metade do século XX o tema ganha relevância e passa a ser objeto de preocupação por parte
de especialistas envolvidos no estudo de soluções para a expansão das cidades. Um dos primeiros
documentos feito por um grupo de pesquisadores, que condensa formulações gerais para a
conservação e o restauro de monumentos é a Carta de Atenas, de 1931. Elaborado no 1º Congresso
Internacional de Arquitetos e Técnicos de Monumentos Históricos, esse documento procura salientar a
precedência do direito coletivo sobre o direito individual, no trato do patrimônio histórico. Dividida em
sete seções, que tratam da valorização e da deterioração dos monumentos, materiais de restauração,
técnicas de conservação e de colaboração internacional, a publicação tem como princípios gerais “que
se mantenha uma utilização dos monumentos, que assegure a continuidade de sua vida, destinando-os
sempre a finalidade de seu caráter histórico ou artístico.” (Carta de Atenas). Apesar do entendimento
de patrimônio estar associado aos valores excepcionais dos bens, a Carta reconhece a importância em
17
preservar o entorno, “o caráter e a fisionomia das cidades, sobretudo na vizinhança de monumentos ---
antigos”, de forma a manter inclusive certas “características particularmente pitorescas”. Condena-se a
remoção de obras de seu local de origem e a reconstituição integral dos bens. Em oposição deve-se
realizar previamente a “análise escrupulosa das moléstias” dos monumentos e, caso seja necessário a
intervenção, que “os materiais novos necessários a esse trabalho deverão ser sempre reconhecíveis”.
Tais deliberações, portanto, vão ao encontro dos parâmetros propostos por Giovanonni e não só
reconhece a relevância dessa perspectiva como salienta a importância que o tema do patrimônio
assume naquele momento.

Pouco tempo mais tarde, em 1933, uma nova publicação referente a outro Congresso, o CIAM –
Congresso Internacional de Arquitetura Moderna, traz novos aspectos para o debate sobre patrimônio,
em que questiona a relevância de formas de conservação mais ostensivas dos conjuntos urbanos.

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Esse documento, conhecido também por Carta de Atenas, foi redigido em um momento de intenso
debate acerca do movimento modernista na arquitetura, partícipe das reflexões do urbanismo

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funcionalista. Inserida em um contexto de intensas transformações e de rápido incremento tecnológico,
podemos destacar, de forma bastante sintética, que essa perspectiva pautava-se por uma suposta
neutralidade de suas propostas, atrelada à racionalidade que o conhecimento técnico científico lhe
conferia. Propostas como a divisão da cidade em zonas a partir do tipo de uso e a verticalização de
edifícios conjugados em amplas áreas verdes de forma a otimizar a ocupação do solo, estavam
embasadas na defesa de um racionalismo que, segundo esse grupo, seriam aplicáveis a todos os
lugares e deveriam inapelavelmente orientar a ocupação das cidades. Diferentemente e, em certos
sentidos, até em oposição aos princípios e às propostas contidas na Carta de Atenas, de 1931, sobre
patrimônio histórico, o documento do CIAM interpreta a preservação do passado quase como uma
concessão à herança relegada pela história. Reconhece a importância de fatos e de monumentos
históricos, mas de forma muito mais seletiva. Apesar de a Carta apontar a importância que os
“testemunhos preciosos do passado” possuem e que “aqueles que os detêm são encarregados por sua
proteção”, limita a preservação dos monumentos, pois “nem tudo que é passado tem, por definição,
direito à perenidade; convém escolher com sabedoria o que deve ser respeitado”. Segundo o
documento, dentre o patrimônio alguns já não têm mais vida e, nessa condição, “se os interesses da
18
cidade são lesados pela persistência de determinadas presenças insignes, majestosas, de uma era já ---
encerrada, será procurada a solução capaz de conciliar dois pontos de vista opostos: nos casos em
que se esteja diante de construções repetidas em numerosos exemplares, algumas serão conservadas
a título de documentário, as outras demolidas; em outros casos poderá ser isolada a única parte que
constitua uma lembrança ou um valor real; o resto será modificado de maneira útil”. A sobreposição do
valor utilitário sobre o valor histórico, defendido por essa vertente modernista, inaugura uma
abordagem que coloca em segundo plano o patrimônio cultural e confere ao planejamento urbano um
caráter de substituição à composição urbana antiga. Ao contrário da proposta defendida por
Giovanonni, de integrar conjuntos urbanos antigos com a implementação de reformas estruturais para a
expansão das cidades, para o CIAM o novo é identificado como superior e a moderna cidade industrial
não pode ser limitada pelos inconvenientes de edificações arcaicas.

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Espíritos mais ciosos do estetismo do que da solidariedade militam a favor da conservação de


certos velhos bairros pitorescos, sem se preocupar com a miséria, a promiscuidade e a doença

E
que elas abrigam. É assumir uma grave responsabilidade. O problema deve ser estudado e pode

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às vezes ser resolvido por uma solução engenhosa; mas, em nenhum caso, o culto do pitoresco e
da história deve ter primazia sobre a salubridade da moradia da qual dependem tão estreitamente
o bem-estar e a [sic] saúde moral do indivíduo. (Carta de Atenas, 1933)

As propostas feitas pelo CIAM, no entanto, não consolidaram uma abordagem unificada ao tema. A
medida que avançava a influência da perspectiva modernista na arquitetura e no planejamento urbano,
também crescia o interesse pela preservação do conjunto de edificações reconhecidos como
monumentos. O processo de reconstrução da Europa no pós-guerra, as alterações viárias e a
expansão das grandes metrópoles mundiais, as alterações e substituições de edificações em
perímetros urbanos tradicionais, toda mudança sofrida pelas cidades em nome do progresso trouxe
consigo o risco do desmantelamento de uma forma de relação e de convivência com tais espaços,
anteriormente típicos. A relevância de tais problemas se impôs como um elemento significativo não só
para o reconhecimento de identidade local, mas também para avaliar o impacto das mudanças na
ocupação do território. Como reflexo da importância que o tema assumia, o Escritório Internacional de
Museus, em 1962, durante a conferência da ONU, produziu uma Recomendação aos Estados
membros, na qual salientou a importância da preservação dos monumentos históricos, mas com uma
abordagem mais abrangente. Segundo o documento, “em todas as épocas o homem, algumas vezes, 19
---
submeteu a beleza e o caráter das paisagens e dos sítios que fazem parte do quadro natural de sua
vida a atentados que empobrecem o patrimônio cultural, estético e, até mesmo, vital de regiões
inteiras”. Ao contrário, porém, do ritmo relativamente lento de tais processos, “as civilizações
modernas” aceleraram esse fenômeno “ao cultivar novas terras, desenvolver por vezes
desordenadamente os centros urbanos, executar grandes obras e realizar vastos planejamentos físicos
e territoriais e instalações de equipamento industrial e comercial”. Essa perspectiva, assim como já
apresentava a Carta de Atenas de 1931, reconhecia o impacto perverso que as demolições e/ou a
substituição por novas edificações causava no entorno dos monumentos históricos; mas agora
adicionava outra perspectiva na defesa do patrimônio: a ideia de paisagem.

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Ainda que o “rápido desenvolvimento do progresso técnico” seja interpretado como um elemento
positivo na sociedade moderna, a Recomendação de Paris destaca que tais avanços não podem se dar

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às custas da destruição de paisagens e de sítios que, “por sua beleza e caráter”, são necessários “à
vida do homem, para quem são um poderoso regenerador físico, moral e espiritual e por contribuírem
para a vida artística e cultural dos povos”. Entre as contribuições que o documento trouxe, a inclusão
da paisagem como espaço portador de valor cultural – seja por seu aspecto ambiental, seja pela
característica que as construções ali edificadas lhe atribuem – abre uma nova forma de interpretar o
patrimônio, menos circunscrito aos monumentos e seu entorno isolado e muito mais inclusivo ao
considerar o próprio território como depositário das representações e das relações constituídas por
uma sociedade ao longo do tempo. Dessa forma, o documento atesta entre seus princípios que, “os
estudos e as medidas a serem adotadas para a salvaguarda das paisagens e dos sítios dever-se-iam
estender-se a todo território do Estado e não se limitar a algumas paisagens ou sítios determinados”.
Nesse sentido, são propostas medidas de caráter preventivo e corretivo no controle de atividades
susceptíveis de causar danos, tais como a construção de novas edificações, construção de estradas,
de linhas de eletricidade, de cartazes publicitários, desmatamento, poluição, exploração de minas, etc.
Para tanto, a salvaguarda da paisagem e dos sítios deveria ser assegurada por meio de restrições nos
planos de urbanização, proteção legal por zonas, proteção legal por sítios isolados e criação e
20
manutenção de reservas e parques naturais. Além disso, como forma de “desenvolver o respeito ---
público”, recomenda-se, de forma sistemática, uma “ação educativa” por parte do Estado, como uma
medida de prevenção e de proteção do território empreendida pela própria sociedade.

As diretrizes contidas na Recomendação de Paris, em 1962, respondem às demandas postas pelas


profundas transformações que os territórios sofreram, em particular as grandes cidades, ao longo do
século XX. O sentido proposto na Recomendação condensa algumas das reivindicações que estavam
em ebulição na época, pelo reconhecimento e pela valorização de um patrimônio que fugia dos
cânones tradicionais. Tais esforços, no entanto, se refletiriam de forma mais contundente nas
discussões do II Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos dos Monumentos Históricos –
ICOMOS, em 1964, que culminaria na elaboração da Carta de Veneza. Talvez uma das contribuições
mais significativas desse documento seja o reconhecimento explícito da importância em valorizar

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diferentes elementos portadores de significado cultural, sem restringir a definição de patrimônio apenas
às obras “do mais alto grau de intensidade do gênio humano”, como definia o CIAM na Carta de Atenas

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de 1933. Conforme aponta a própria Carta de Veneza,

A noção de monumento histórico compreende a criação arquitetônica isolada, bem como o sítio
urbano ou rural que dá testemunho de uma civilização particular, de uma evolução significativa ou
de um acontecimento histórico. Estende-se não só às grandes criações, mas também às obras
modestas, que tenham adquirido, como o tempo, uma significação cultural.

O sentido ampliado na valorização do “monumento histórico” proposto pela Carta, extrapola a defesa
do patrimônio para além dos monumentos excepcionais do ponto de vista formal e, em grande medida,
democratiza o significado de valor cultural, ao incluir as “obras modestas” como possíveis detentoras
daquilo que no preâmbulo é denominado por “mensagem espiritual do passado”. A partir dessa
perspectiva que acolhe os objetos mais diversos, construções mais simples, sítios mais singelos,
podemos interpretar a finalidade de “salvaguardar tanto a obra de arte quanto o testemunho histórico”
que descreve o documento. Tal viés se estende inclusive aos critérios sugeridos de conservação e de
restauração, ao reconhecer que “as contribuições válidas de todas as épocas para a edificação do
monumento devem ser respeitadas, visto que a unidade de estilo não é a finalidade a ser alcançada no
curso de uma restauração”7. Tais critérios de conservação e de restauro, aliás, reforçam muitas das
recomendações contidas na Carta de Atenas, do Escritório Internacional de Museus. Não é por acaso 21
---
que, em seu preâmbulo, a Carta de Veneza faça referência à conferência de 1931 e da importância que
esta teve nas atividades do ICOM e da UNESCO, mas, como expressa o próprio congresso de Veneza,
“agora é chegado o momento de reexaminar os princípios da Carta [de Atenas, de 1931] para
aprofundá-las e dotá-las de um alcance maior em um novo documento”. Em grande medida, esse
aprofundamento foi alcançado justamente por essa interpretação inovadora de patrimônio, muito mais
abrangente, que dava visibilidade a lugares e a construções que anteriormente eram relegados ao
esquecimento por não se enquadrarem em uma expressão cultural pré-estabelecida.

7 É evidente que tal proposição faz referência às formulações de C. Boito, A. Riegl e G. Giovanonni, que desde o final do
século XIX já preconizavam pelo respeito às adições e transformações dos monumentos ao longo do tempo. Entendemos,
apenas, que a escolha desta perspectiva também reforça a valorização que a Carta de Veneza atribui à ampliação do
significado de cultura.

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A atenção prestada a lugares e a construções heterogêneas, que possuem uma significação cultural
particular para a comunidade na qual estão inseridas, se deu em um contexto de fortalecimento dos

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órgãos internacionais. O esforço por criar instâncias com a participação de representantes de diversos
países e a preocupação em garantir o cumprimento de acordos multilaterais, motivou esse novo olhar a
respeito do patrimônio constituído em cada país. Tal atenção teve um efeito importante na defesa da
preservação e chamou a atenção para um grande contingente de bens em vias de destruição. O
processo de crescimento das áreas urbanas continuava a colocar em risco edificações portadoras de
sentido para a formação da identidade local, muitas vezes modificando laços e formas de relações
sociais entre os moradores de cidades, de bairros, ou mesmo de assentamentos rurais. No intuito de
responder a essas pressões e de respaldar a salvaguarda de espaços representativos das criações
culturais do contexto no qual se insere, a Conferência Geral da Organização das Nações Unidas,
reunida em Nairobi, em 1976, produziu o documento conhecido como Carta de Nairobi. Esse texto,
construído com o objetivo de “complementar e ampliar o alcance das normas e dos princípios
formulados” pelos instrumentos internacionais anteriores, propõe uma abordagem do patrimônio a partir
da definição de “conjunto histórico ou tradicional”. Como estabelece o documento,

Considera-se conjunto histórico ou tradicional todo agrupamento de construções e de espaços,


inclusive os sítios arqueológicos e paleontológicos, que constituam um assentamento humano,
tanto no meio urbano quanto no rural e cuja coesão e valor são reconhecidos do ponto de vista 22
arqueológico, arquitetônico, pré-histórico, históricos, estético ou sócio-cultural. Entre esse ---
„conjuntos‟, que são muito variados, podem-se distinguir especialmente os sítios pré-históricos, as
cidades históricas, os bairros urbanos antigos, as aldeias e lugarejos, assim como os conjunto
monumentais homogêneos, ficando entendido que estes últimos deverão, em regra, ser
conservados em sua integridade.

Tal definição inaugura uma perspectiva de patrimônio que o caracteriza mais pela representatividade
do próprio espaço ou, ao menos, pela ambiência que os monumentos formam em seu entorno, do que
pela particularidade do objeto isolado. Essa interpretação assemelha-se à proposta contida na Carta de
Veneza de estender o reconhecimento de valor cultural para além dos grandes monumentos, incluindo
as construções mais modestas, mas dela se distingue pela maior ênfase dada ao território como um
elemento indispensável para compreender o sentido histórico e cultural das relações que ali se
estabelecem.

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Cada conjunto histórico ou tradicional e sua ambiência deveria ser considerado em sua
globalidade, como um todo coerente cujo equilíbrio e caráter específico dependem da síntese dos

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elementos que o compõem e que compreendem tanto as atividades humanas como as

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construções, a estrutura espacial e as zonas circundantes. Dessa maneira, todos os elementos
válidos, incluídas as atividades humanas, desde as mais modestas, têm, em relação ao conjunto,
uma significação que é preciso respeitar.

Para tanto, a Carta de Nairobi sugere que cada autoridade nacional deva formular uma política
nacional, regional e local, com medidas jurídicas, técnicas, econômicas e sociais para salvaguardar os
conjuntos históricos e adequá-los às exigências da vida contemporânea. Tais critérios comporiam um
planejamento territorial integrado com o objetivo de garantir a continuidade da ambiência característica
dos lugares de interesse cultural, orientando de forma controlada a expansão e a modificação das
áreas rurais e centros urbanos. Nessa sentido, o documento destaca a importância de realizar “um
inventário dos espaços abertos, públicos e privados, assim como sua vegetação”, para produzir a
relação dos conjuntos históricos e, por consequência, as medidas de proteção de cada tipo. Além de
um estudo arquitetônico minucioso de imóveis a serem rigorosamente protegidos, seria necessário o
levantamento de dados sociais, culturais e econômicos do contexto territorial, constantemente
atualizados. Inclusive as novas construções deveriam ser objeto de controle, como altura, forma,
material, cor, etc, para assegurar que sua implantação se enquadre harmoniosamente nas estruturas
espaciais dos conjuntos históricos. Ou seja, a atenção dada pela Carta de Nairobi ao patrimônio tem 23
---
como condição uma abordagem sistêmica do espaço como um todo, pois o considera suporte material
de reprodução de práticas e de representações que caracterizam determinada comunidade.

Essa interpretação de patrimônio que reconhece o território como objeto próprio de valorização e,
consequentemente, de preservação, possibilita novas formas de abordar as constantes mudanças nas
cidades. Como vimos, fundamentalmente com a Revolução Industrial, os centros urbanos sofreram
profundas transformações em suas estruturas físicas que desencadearam alterações nas relações de
seus moradores com o lugar e entre si. Se, durante um longo período, o esforço por salvar o patrimônio
dessas cidades da destruição circunscreveu-se à conservação de alguns poucos monumentos e seu
entorno, principalmente a partir da segunda metade do século XX ganhou força uma perspectiva que
trata o patrimônio de forma mais sistêmica, incluindo as mais diversas formas de expressão e

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defendendo a relevância da preservação do espaço como um todo. Nesse contexto, o Conselho


Internacional de Museus e Sítios – ICOMOS, reunido em 1986, na cidade de Washington, publica a

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Carta Internacional para Salvaguarda de Cidades Históricas, conhecida como Carta de Washington,
que “define os princípios e os objetivos, os métodos e os instrumentos de ação apropriados a
salvaguardar a qualidade das cidades históricas, a favorecer a harmonia da vida individual e social e a
perpetuar o conjunto de bens que, mesmo modestos, constituem a memória da humanidade”. Como
aponta o próprio documento, suas propostas procuram complementar as orientações da Carta de
Veneza, a partir das definições de salvaguarda de cidades históricas contidas na Carta de Nairobi.
Percebe-se, portanto, que os objetivos propostos pela Carta de Washington vale-se da interpretação de
patrimônio dada pelos outros instrumentos internacionais aqui citados, distinguindo-se por aprofundar
propostas na forma de preservação para cidades e centros históricos em particular.

O documento destaca entre seus princípios que “não se deve jamais esquecer que a salvaguarda das
cidades e bairros históricos diz respeito primeiramente a seus habitantes”. Assim, defende que, para
ser eficaz, a salvaguarda “deve ser parte essencial de uma política coerente de desenvolvimento
econômico e social, e ser considerada no planejamento físico territorial e nos planos urbanos em todos
os seus níveis”. Entre os elementos materiais que caracterizam a “imagem” da cidade e representam,
portanto, os valores passíveis de proteção, a Carta de Washington destaca a relevância da
24
preservação do traçado urbano, da relação entre seus diversos espaços, a forma e o aspecto das ---
edificações, a relação da cidade com seu entorno natural e as diversas vocações que a cidade adquiriu
ao longo do tempo. Para tanto, assim como aponta a Carta de Nairobi, são fundamentais estudos
multidisciplinares de dados arqueológicos, históricos, arquitetônicos, sociológicos, econômicos,
jurídicos, administrativos e financeiros para elaborar um planejamento de salvaguarda que articule as
edificações que devam ser particularmente protegidas, os bairros históricos e o conjunto da cidade.
Ainda segundo o documento, as ações de conservação devem pautar-se pela observância dos
métodos descritos na Carta de Veneza, garantindo uma manutenção permanente das áreas edificadas.
A melhoria do “habitat” urbano e sua adaptação às necessidades da vida contemporânea são
reconhecidos como uma demanda legítima que, muitas vezes, requerem intervenções; mas,

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justamente por tais necessidades, as novas transformações devem ter o cuidado de orientar-se pelo
caráter, pela vocação e pela estrutura das cidades históricas.

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A relevância desse documento se dá pelo reconhecimento da cidade como um espaço que oferece um
testemunho da ação humana e, enquanto tal, deve ser entendido em sua integralidade, estabelecendo
critérios de preservação do lugar como um todo, conjugando formas de planejamento que orientem
suas transformações de acordo com os elementos existentes que caracterizam suas particularidades e
vicissitudes. Esse ponto de vista que aborda o espaço da cidade, a paisagem do lugar, como o próprio
objeto de investigação, suscitou novos desafios e debates e, entre seus desdobramentos, podemos
citar o documento produzido pelo Comitê de Ministros que compuseram o Conselho da Europa, em
1995. Intitulado Recomendação Europa, esse texto sistematizou propostas de conservação integrada
das áreas de paisagens culturais referente aos Estados signatários da Convenção Européia. Dentre
seus princípios, o documento reconhece “a necessidade de serem desenvolvidas estratégias para
integrar a evolução orientada da paisagem e a preservação das áreas de paisagem cultural como parte
de uma política que abranja a totalidade da paisagem e que estabeleça a proteção unificada de
interesses culturais, estéticos, ecológicos e sociais do respectivo território”. Tal fundamentação dá
destaque a um termo que irá definir o patrimônio ao longo de todo documento, o conceito de paisagem
cultural. Como define a própria Recomendação Europa:
25
Paisagem – expressão formal dos numeroso relacionados existentes em determinado período
---
entre o indivíduo ou uma sociedade e um território topograficamente definido, cuja aparência é
resultado de ação ou cuidados especiais, de fatores naturais e humanos e de uma combinação de
ambos.
Paisagem é considerada em um triplo significado cultural, porquanto, é definida e caracterizada da
maneira pela qual determinado território é percebido por um individuo ou por uma comunidade; dá
testemunho ao passado e ao presente do relacionamento existente entre os indivíduos e seu meio
ambiente; ajuda a especificar culturas e locais, sensibilidades, práticas, crenças e tradições.

Essa caracterização inova ao tratar cada território como um repositório de traços culturais, históricos,
ecológicos, estéticos, econômicos e sociais de forma sobreposta, entrelaçada e indissociável. Em
grande medida, retoma a globalidade dos conjuntos tradicionais definidos na Carta de Nairobi e as
formas de proteção das cidades históricas adotada na Carta de Washington, mas amplia sua
abordagem ao reconhecer “a inseparável natureza dos componentes cultural e natural da paisagem

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européia”, sendo necessário “providenciar meios de identificação, avaliação e intervenção capazes de


abarcar todos os aspectos das áreas de paisagem cultural e da paisagem cultura e da paisagem como

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um todo”. O espaço natural, sob essa perspectiva, deve ser interpretado da mesma forma que a
paisagem construída, pois o manejo do território também revela criações e costumes das comunidades
que lá residem ou residiram. O uso sustentável dos recursos naturais, as adaptações decorrentes da
produção econômica e as transformações da paisagem natural como um todo, tornam-se elementos
necessários para compor um plano de preservação, segundo essa proposta. Nesse sentido, a
paisagem nas grandes, médias e pequenas cidades, na área rural, nas reservas florestais, enfim em
todo o território, contém um legado transmitido; a identificação e a implementação de políticas de
preservação da paisagem garantiriam o reconhecimento e a possibilidade da continuidade dessa
herança.

Para o alcance dos objetivos propostos, a Recomendação Europa indica procedimentos necessários
para compor a montagem da documentação capaz de organizar as medidas a serem tomadas. Entre
eles, destaca que cada Estado deve determinar níveis (local, regional, nacional) de identificação. Cada
ação deve ser conduzida por especialistas em diferentes matérias como arquitetura, paisagismo,
geografia, planejamento urbano, história, antropologia, agronomia, economia, sociologia, ecologia, etc.
A participação de profissionais ligados às atividade sócio-econômica das áreas pertinentes é
26
fundamental, bem como a participação de moradores e de associações da comunidade local. Já a ---
avaliação das paisagens deve “considerar as condições históricas em que a paisagem foi configurada e
incluir um estudo detalhado dos atributos culturais e naturais de cada unidade da paisagem”; “delimitar
zonas autorizadas para a implementação da conservação legal e/ou procedimentos de controle do
solo”; “constituir-se em um instrumento fácil de ser utilizado em diferentes situações culturais ou
geográficas”; “representar um referencial comum para todas as modalidades de intervenção que
possam vir a ser empregadas”; “assegurar a participação efetiva da população nos processos de
avaliação e de manejo da paisagem”.

A multiplicidade e a multidisciplinaridade dos agentes envolvidos no levantamento e na sistematização


dos diversos aspectos que cada território é portador, revela uma abordagem que considera o próprio
lugar como seu objeto. Fruto de intensas disputas e controvérsias, essa interpretação mostra-se mais

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sofisticada do que aqueles primeiros esforços circunscritos à preservação de poucos monumentos,


reconhecidos sobretudo por seu valor estético. Inserido nos desdobramentos das ações de defesa do

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patrimônio propostas por diversos instrumentos internacionais, alguns inclusive conflitantes, o conceito
de paisagem cultural alcança uma compreensão mais representativa da heterogeneidade das relações
humanas ao considerar a relevância das mais diferentes formas que as comunidades estabelecem com
o espaço em que vivem e, por extensão, entre si. Em última instância, a perspectiva proposta pela
paisagem cultural é em incorporar o patrimônio como elemento do planejamento territorial, seja na
cidade, na área rural ou em reservas naturais; ao invés de segmentá-lo e tratar o patrimônio como um
empecilho para a montagem do ordenamento espacial, o próprio lugar é representado como
patrimônio, portanto planejar o território já significa uma ação de preservação patrimonial.

Como vimos, atualmente alcançamos uma interpretação de patrimônio cultural que ultrapassa o
sentido estético inicialmente atribuído como critério único de reconhecimento àquilo que merece ser
preservado. No Brasil e no âmbito internacional, as políticas públicas de valorização dos traços
culturais identitários de grandes nações ou pequenas comunidades se veem envoltas em um esforço
de criar mecanismos que permitam apontar os diferentes significados que distintos símbolos assumem
na sociedade local. Se, como define o conceito de paisagem cultural, o próprio território é portador de
marcas culturais que caracterizam um modo de vida de um grupo social, a identificação desses
27
elementos e a consequente preservação da memória local depende da forma como se terá acesso a ---
essas informações. No município de Belo Horizonte tais desafios não são diferentes.

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3. REFERÊNCIA METODOLÓGICA

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A partir do breve panorama apresentado no item anterior, pudemos identificar que a preservação do

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patrimônio cultural não é um tema isento de controvérsias e de disputas. Pelo contrário, desde as
primeiras ações empreendidas no esforço da conservação de monumentos, as diferentes
interpretações do conceito de patrimônio ao longo do tempo, a criação de marcos legislativos com a
previsão de instrumentos de proteção específica até o presente momento, já com edificações e
conjuntos urbanos tombados reconhecidos, inclusive por parte da sociedade, as ações protetivas
sempre estiveram envoltas em confrontos dentro de um acirrado campo de forças. Diferentemente da
forma como outras áreas de políticas públicas ganharam importância e implementaram avanços, a
valorização do patrimônio cultural enfrenta até hoje resistência no próprio objeto de sua ação, isto é, no
reconhecimento do valor cultural de construções, conjuntos urbanos e práticas sociais passíveis de
proteção. Em grande medida, isso se deve ao fato de que os esforços e as intervenções realizadas
nessa área implicam a escolha de símbolos portadores de um significado que atenda ao conceito de
patrimônio. Como tal representação de valor simbólico assume diferentes nuances de acordo com
quem lhe atribui sentido, a delimitação do que deve ser preservado e como abre inúmeras
possiblidades, todas dependentes do ponto de vista de quem determina o significado do que é
patrimônio. Por si só, o próprio debate de como os símbolos contêm significados diferentes
28
dependendo dos critérios daquele que os nomeia já se apresenta como um importante desafio para ---
estabelecer parâmetros do que pode ser considerado merecedor de proteção ou não. Entretanto,
adicionam-se a esse esforço elementos complexos e em constante transformação, como os conceitos
de memória, de tradição e de identidade, que obrigam um cuidado ainda mais atento na delimitação
dos critérios que definem se, por exemplo, um elemento construtivo atende aos valores culturais
passíveis de preservação de uma dada sociedade.

Diante de tais desafios, um trabalho como este que pretende identificar e propor maneiras de preservar
certos traços culturais inseridos em determinado perímetro urbano está envolto em inúmeras
perguntas. Como poderíamos realizar o estudo de edificações e de práticas culturais de forma objetiva?
De que forma seria possível abordar um objeto identificado como portador de valor cultural sem impor
um ponto de vista unilateral? Ao mesmo tempo, como poderíamos evitar abordá-lo por critérios

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demasiadamente subjetivos, adjacentes à mera intuição do observador ou do observado? Em última


instância, em que medida é relevante a preservação de construções e de certas características físicas

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de determinado lugar? No intuito de responder a essas questões e propor instrumentos que possam
orientar de forma adequada o presente trabalho, destacamos três referencias teóricos que irão nortear
a condução de nossa pesquisa: o conceito de paisagem cultural, as ferramentas metodológicas
utilizadas por Kevin Lynch em sua pesquisa a respeito da imagem da cidade e as categorias
desenvolvidas por José Guilherme Cantor Magnani em seus trabalhos sobre a sociabilidade nas
cidades.

A primeira referência assume a função de conceituação daquilo que será interpretado como patrimônio.
Conforme já previamente apontado no item anterior, a construção da ideia de paisagem cultural
ocorreu por meio de um esforço conjunto de diferentes grupos representantes de vários países, em um
contexto de fortalecimento de debates e de acordos multilaterais, que ampliou o significado de
patrimônio cultural para toda forma de expressão humana característica de grupos sociais. Ao contrário
de uma hierarquização que classificava grandes construções passíveis de valorização geralmente a
partir de critérios estéticos, a paisagem cultural apresenta uma perspectiva que expande o conceito de
cultura, atribuindo relevância não só a edificações mais modestas, de qualquer época, como também
às ações imateriais de manifestações culturais, incluindo o próprio terreno natural como elemento
29
portador de significado. Mesmo em uma pesquisa que se restringe a um perímetro urbano, como a ---
nossa, o conceito de paisagem cultural nos permite observar que elementos físicos, como, por
exemplo, a topografia do terreno, são relevantes tanto na forma de composição construtiva de um
lugar, quanto na especificidade das relações que ali se estabelecem.

Com isso, esse conceito parece oferecer uma rica perspectiva quando aplicada também às ideias
tradicionais do campo da preservação, podendo servir para ampliar a perspectiva de visada sobre os
próprios centros históricos, permitindo leituras que compreendem justamente as interações entre os
aspectos natural e cultural, material e imaterial desses conjuntos, muitas vezes ignoradas.
(CASTRIOTA, 2013, p. 1)

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O uso do conceito de paisagem cultural, portanto, tem como propósito delimitar o viés de patrimônio
cultural neste trabalho, ou seja, sob qual perspectiva interpretamos os elementos descritos como

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portadores de reconhecimento, memória e identidade do local analisado. Tal definição tem como foco
uma interpretação integrada dos aspectos materiais e imateriais do lugar, a partir da infraestrutura e do
ambiente construído, específicos de um determinado local que represente práticas, valores e tradições
de uma comunidade.

No entanto, a coleta e a interpretação de informações que indiquem quais são os elementos


polarizadores do local em estudo não é uma tarefa fácil. O uso de mapas e de dados quantitativos são
ferramentas significativas para a compreensão da composição do perímetro destacado, mas podem
deixar de revelar aspectos fundamentais do sentido atribuído aos locais, às edificações, aos costumes
e às práticas características de uma comunidade. Sendo assim, de que forma seria possível
reconhecer objetos portadores do significado de “tradição local”, como definir quais são as
particularidades comuns a um espaço e que constitui sua “identidade local”? Para nos auxiliar nesse
desafio utilizamos a segunda referência, as ferramentas metodológicas propostas por Kevin Lynch.

Em seu livro A imagem da Cidade, Lynch se dispõe a investigar como é percebido o espaço da cidade.
De acordo com sua descrição, todo lugar é interpretado de diferentes formas ao longo do tempo,
remetendo-nos a lembranças e experiências passadas, criando constantemente significados. Seu 30
---
intuito é de “examinar a qualidade visual da cidade norte-americana”, com foco na “clareza” e na
“legibilidade aparente da paisagem das cidades”. A hipótese de seu trabalho é tentar responder como
uma cidade pode ser visualmente apreendida a partir de símbolos identificáveis, tornando-a
reconhecível e característica.

Um de seus fundamentos é que não podemos considerar a cidade como coisa em si, mas que
devemos abordá-la a partir do modo como as pessoas a percebem. A imagem que cada um faz da
cidade determina em grande medida a singularidade atribuída ao lugar. Nesse sentido, mais do que
simplesmente reconhecer a disposição, os contornos e as características físicas dos espaços urbanos,
é necessário entender a forma como esses elementos são percebidos. Tais informações, entretanto,
também sofrem a influência de marcos, de associações e de símbolos impregnados de lembranças do

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passado que compõem a forma como os elementos físicos, mesmo que permanentes, sejam
reconhecidos. Assim, dependendo da forma como uma cidade é visualmente organizada, ela pode

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assumir um significado emocionalmente expressivo aos seus habitantes, pois “uma boa imagem
ambiental oferece a seu possuidor um importante sentimento de segurança emocional. (...) Na verdade,
um ambiente característico e legível não oferece apenas segurança, mas também reforça a
profundidade e a intensidade potenciais da experiência humana”. (Lynch, K. 2010, p. 5)

Dessa forma, o autor destaca a relevância em analisar a cidade a partir três aspectos iniciais: a
identidade dos elementos físicos, aquilo que os caracteriza; a estrutura, a relação espacial do espaço
físico com o observador e com outros espaços; e o significado, a maneira como o observador interpreta
o objeto. Como a proposta do autor tem como objetivo concentrar-se na clareza física da imagem, sua
pesquisa aprofunda-se de forma mais detalhada nos componentes de identidade e de estrutura da
cidade e, à medida que o faz, o autor destaca um conceito que irá considerar fundamental para
compreender o que determina que um lugar seja interpretado como tal: o conceito de “imaginabilidade”.
Como ele próprio define, essa categoria é

a característica, num objeto físico, que lhe confere uma alta probabilidade de evocar uma imagem
forte em qualquer observador dado. É aquela forma, cor ou disposição que facilita a criação de
imagens mentais claramente identificadas, poderosamente estruturadas e extremamente úteis do
ambiente. Também poderíamos chamá-la de legibilidade ou, talvez, de visibilidade num sentido 31
mais profundo, em que os objetos não são apenas passíveis de serem vistos, mas também nítida
---
e intensamente presentes aos sentidos. (LYNCH, K. 2010, p. 11)
Devido ao caráter complexo e mutável das cidades, muitos lugares são reformulados e reorganizados.
Contudo, objetos que possuem uma alta “imaginabilidade” parecem reforçar e reafirmar o valor
simbólico atribuído pelo indivíduo, mesmo na contínua reconstrução desse processo. De acordo com o
autor, a “imaginabilidade” de um lugar tem forte impacto não apenas na orientação espacial dos
indivíduos, mas também desempenha uma função emocional, inclusive na formação de uma identidade
local. A partir do reconhecimento do dinamismo que determinados objetos físicos podem imprimir na
percepção da cidade, Lynch procura delimitar quais formas podem reforçar ou enfraquecer um conjunto
de significado que caracterize um determinado espaço. Como resposta, o autor propõe então cinco
elementos polarizadores que se articulam na composição da forma física das cidades:

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Vias: “são os canais de circulação ao longo dos quais o observador se locomove de


modo habitual, ocasional ou potencial. (...) Os habitantes de uma cidade observam-na

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à medida que se locomovem por ela, e, ao longo dessas vias, os outros elementos
ambientais se organizam e se relacionam”.
Limites: “são os elementos lineares não usados ou entendidos como vias pelo
observador. São as fronteiras entre duas fases, quebras de continuidade lineares. (...)
Ainda que possam não ser tão dominantes quanto o sistema viário, para muitos esses
elementos limítrofes são importantes características organizacionais, sobretudo devido
ao seu papel de conferir unidade a áreas diferentes, como no contorno de uma cidade
por água ou parede”.
Bairros: “são regiões médias ou grandes de uma cidade, concebidos como dotados de
extensão bidimensional. (...) Sempre identificáveis a partir do lado interno, são também
usados para referência externa quando visíveis de fora”.
Pontos nodais: “são pontos, lugares estratégicos de uma cidade através dos quais o
observador pode entrar, são os focos intensivos para os quais ou a partir dos quais ele
se locomove. (...) Alguns desses pontos nodais de concentração são o foco e a síntese
de um bairro, sobre o qual sua influência se irradia e do qual são um símbolo. Podem
ser chamados de núcleos. Muitos pontos nodais, sem dúvida, têm a natureza tanto de
conexões como de concentrações”.
Marcos: “os marcos são outro tipo de referência, mas, nesse caso, o observador não 32
entra neles: são externos. Em geral, são um objeto físico definido de maneira muito ---
simples. (...) Alguns marcos são distantes, tipicamente vistos de muitos ângulos e
distâncias, acima do ponto mais alto de elementos menores e usados como
referências radiais. Podem estar dentro da cidade ou a uma distância tal que, para
todos os fins práticos, simbolizam uma direção constante. (...) Outros marcos são
basicamente locais, sendo visíveis apenas em lugares restritos e a partir de uma certa
proximidade. (...) São geralmente usados como indicadores de identidade, ou até de
estrutura, e parecem tornar-se mais confiáveis à medida que um trajeto vai ficando
cada vez mais conhecido”. (Lynch, 2010, p. 52-53)
Tais categorias, segundo o autor, podem ser interpretadas de diferentes formas. Um pedestre, por
exemplo, pode considerar o mesmo objeto que um motorista, mas classificá-lo de formas distintas.
Assim, nenhuma das categorias especificadas existe de forma isolada em situação concreta. Ainda que

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a inter-relação de tais elementos propicie uma imagem global, na qual cada uma dessas categorias
ganha significações novas, o autor destaca a importância de entender cada um dos elementos em sua

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particularidade. Segundo a pesquisa, por exemplo, os bairros, muitas vezes, são estruturados por meio
de pontos nodais, definidos por limites, atravessados por vias e portadores de marcos. A
sobreposição desses elementos ocorre regularmente, portanto é necessário interpretá-los de forma
adequada para, a partir da diferenciação de cada categoria, integrar seus significados e obter
efetivamente uma leitura completa. O autor, no entanto, alerta que tais categorizações, mesmo que
coexistam enquanto marcadores da imagem urbana, tanto podem reforçar uns aos outros quanto entrar
em choque.

Apesar de a pesquisa empreendida por Lynch ter como orientação a fisionomia das cidades e de que
forma seu design tem importância para torná-la mais atraente, harmoniosa e agradável às pessoas,
consideramos que as formulações sobre o espaço urbano e, sobretudo, as ferramentas propostas na
análise apresentam-se como um relevante método de pesquisa para a identificação de signos
portadores de traços culturais característicos de um determinado local. Como sabemos, o ambiente
físico carrega consigo referências, mesmo enquanto vestígios, que marcam a identidade de uma
comunidade, um modo de vida. Conforme aponta o autor, “a paisagem também desempenha um papel
social. O ambiente conhecido por seus nomes e familiar a todos oferece material para as lembranças e
33
símbolos comuns que unem o grupo e permitem que seus membros se comuniquem entre si”. (Lynch, ---
2010. p. 143) Descobrir quais são esses elementos e como eles são percebidos por seus membros
depende de um olhar atento do pesquisador. Nesse sentido, propomos utilizar os instrumentos
formulados por Kevin Lynch para identificar os símbolos que exprimem os laços tradicionais do
perímetro em estudo e, consequentemente, formular diretrizes de proteção que contribuam para a
preservação da memória local. As categorias de vias, limite, bairro, pontos nodais e marcos serão
usadas, portanto, para ler o espaço em estudo assim como o autor as define. Distinguir-nos-emos da
proposta do autor apenas no enfoque ao procurar reconhecer em que medida tais símbolos
representam as memórias coletivas e as identidades locais do nosso objeto de estudo.

A inter-relação dessas categorias tem como propósito ajudar-nos a compreender a dinâmica que o
espaço estabelece com seus moradores a partir dos elementos que constituem seu patrimônio.

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Contudo, não nos revela como os indivíduos pertencentes a esse lugar relacionam-se entre si. Afinal de
contas, os hábitos e os costumes de um grupo podem atribuir-lhe particularidades muito distintas, mas

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esse processo nem sempre é estático. Formas de sociabilidade podem ser atividades fundamentais de
coesão social, porém, mesmo que perenes, a maneira como são realizadas pode sofrer modificações.
Tipos de lazer de um grupo, por exemplo, podem assumir uma função importante de integração ao
longo de gerações, mas as atividades realizadas para esse propósito podem variar com o tempo.
Nesse sentido, um mesmo espaço pode ser palco de múltiplos encontros, inclusive distintos entre si.
Uma rua ou uma praça, eventualmente, pode ter uma determinada característica durante o dia, mas à
noite constituir-se em um local completamente diferente. Para nos ajudar na investigação de como os
indivíduos relacionam-se entre si ao longo do espaço, utilizaremos nossa terceira referência, as
categorias interpretativas desenvolvidas por José Guilherme Cantor Magnani.

A partir da pesquisa em bairros da periferia da cidade de São Paulo e posterior ampliação do estudo,
formado pelo Núcleo de Antropologia Urbana (NAU) da USP no projeto “Os pedaços da cidade”,
Magnani propôs investigar o ambiente público da rua, as formas de relação que os habitantes têm com
o espaço e com equipamentos urbanos, critérios de convivência entre grupos semelhantes e diferentes,
em resumo, a multiplicidade de usos e de olhares que molda o espaço público. Sua intenção não é
definir a rua a partir de suas funções circulatórias ou classificações oficiais, mas a partir de suas
34
referências culturais, formas de ocupação e de modos de uso do espaço da cidade. Nesse sentido ---
busca interpretar o espaço por sistemas de relação e não de classificação. Seu foco não é na
materialidade da rua, mas a experiência vivenciada nela. O autor busca observar o espaço urbano
como suporte de sociabilidade, as variações dos padrões culturais em função de faixa etária, horários
do dia, tipo de estabelecimento, cada um contrapondo-se e coexistindo na cidade.

Sua forma de análise faz uso de referências metodológicas próprias da antropologia, em particular, da
etnografia. Segundo o autor, a escolha desse campo do conhecimento oferece uma perspectiva
interessante na abordagem do objeto, pois não se restringe a uma mera descrição de dados coletados.
Conforme descreve em seu embasamento teórico, ao propor estudar sociedades distintas, as
pesquisas antropológicas, em suas mais variadas correntes, puderam explorar a delicada relação de
observação e criar métodos para abordar seu objeto. Tal prática, portanto, reconhece que “o que se

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observa e a forma como se ordenam as primeiras observações constituem já parte integrante do


processo de interpretação”. (Magnani, s/d, p.5) Nesse sentido, é fundamental que o pesquisador

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procure escapar da armadilha do senso comum e questione aquilo que já é aparentemente conhecido
para, de fato, investigar as dinâmicas sociais envolvidas em um determinado espaço urbano. Com isso,
ampliam-se as possibilidades de reconhecimento de uma complexa malha de relações que caracteriza
a dinâmica de um determinado espaço, sem restringi-la a um significado simplista atrelado aos pré-
conceitos do observador.

A partir de tais cuidados, o autor propõe um método para identificar comportamentos humanos
adjacentes a certos espaços da cidade, no intuito de “perceber regularidades, padrões e significados lá
onde muitas vezes o senso comum não vê senão o resultado de escolhas feitas de forma individual e
aleatória”. (Magnani, s/d, p.5) Nesse sentido, tal ferramenta de pesquisa nos oferece uma oportunidade
de identificar não apenas lugares tradicionais e suficientemente demarcados, como aqueles
constituídos por laços estreitos entre os moradores de uma vizinhança, mas também reconhecer
símbolos, orientações e hábitos particulares de regiões heterogêneas formadas, em alguns casos, mais
por frequentadores transitórios do que por moradores fixos. Descobrir códigos compartilhados e
condutas típicas de um lugar, quem faz parte ou não “do pedaço”, revela formas determinantes de sua
ocupação.
35
---
Para tanto, o autor destaca cinco categorias que auxiliam no reconhecimento dos símbolos contidos
nos espaços estudados e, por consequência, que permitem compreender a maneira como esses
elementos se estruturam e se relacionam entre si. São eles: mancha, pedaço, trajetos, pórtico e
circuito8.

Manchas: Áreas contíguas do espaço urbano, dotadas de equipamentos que marcam


seus limites e viabilizam, competindo ou complementando-se, uma atividade ou prática
predominante. (...) As atividades que oferece e as práticas que propicia são o resultado
de uma multiplicidade de relações entre seus equipamentos, edificações e vias de

8Como fonte de referência para a descrição e definição das categorias utilizamos o artigo: MAGNANI, J. G. C. Quando o
campo é a cidade: fazendo antropologia na metrópole. In: MAGNANI, J. G. C. & TORRES, L. L. (Orgs). Na Metrópole –
Textos de Antropologia Urbana. São Paulo: Edusp, 1996.

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acesso – o que garante uma maior continuidade, transformando-a, assim, em ponto de


referência físico, visível e público para um número mais amplo de usuários.

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Pedaço: O termo na realidade designa aquele espaço intermediário entre o privado (a
casa) e o público, onde se desenvolve uma sociabilidade básica, mais ampla que a
fundada nos laços familiares, porém mais densa, significativa e estável que as relações
formais e individualizadas impostas pela sociedade. (...) Dessa forma, o „pedaço‟ é ao
mesmo tempo resultado de práticas coletivas (entre as quais as de lazer) e a condição
para seu exercício e fruição.
Trajeto: O termo trajeto surgiu da necessidade de categorizar uma forma de uso do
espaço que se diferencia, em primeiro lugar, daquele descrito pela categoria pedaço.
Enquanto esta última, como foi visto, remete a um território que funciona como ponto
de referência – e, no caso da vida no bairro, evoca a permanência de laços de família,
de vizinhança, origem e outros – trajeto aplica-se a fluxos no espaço mais abrangente
da cidade e no interior das manchas urbanas. (...) Assim, a ideia de trajeto permite
pensar tanto uma possibilidade de escolhas no interior das manchas como a abertura
dessas manchas e pedaços em direção a outros pontos no espaço urbano e, por
consequência, a outras lógicas. (...) É a noção de trajeto que abre o pedaço pra fora,
para o espaço e âmbito do público.
Pórtico: Trata-se de espaços, marcos e vazios na paisagem urbana que configuram
passagens. Lugares que já não pertencem ao pedaço ou mancha de cá, mas ainda 36
não se situam nos de lá; escapam aos sistemas de classificação de um e outra e, ---
como tal, apresentam a „maldição dos vazios fronteiriços‟. Terra de ninguém, lugar
perigoso, preferido por figuras liminares e para a realização de rituais mágicos – muitas
vezes lugares sombrios que é preciso cruzar rapidamente, sem olhar para os lados.
Circuito: Une estabelecimentos, espaços e equipamentos caracterizados pelo exercício
de determinada prática ou oferta de determinado serviço, porém não contíguos na
paisagem urbana, sendo reconhecidos em sua totalidade apenas pelos usuários:
circuito gay, circuito dos cines de arte, circuito esotérico, dos salões de dança e shows
black, circuito do povo-de-santo, dos antiquários, brechós, clubes e outros.
Tais categorias, assim como aquelas propostas por Kevin Lynch, devem ser entendidas em sua
particularidade, mas não existem e não podem ser interpretadas apenas de forma isolada. Elas
descrevem diferentes formas de uso e de apropriação do espaço, funcionam como lentes para a leitura

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da dinâmica urbana, porém desde que se reconheçam suas sobreposições, interações, conflitos e
deslocamentos. Segundo o autor, essa organização de pontos socialmente construídos na cidade pode

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revelar atividades do cotidiano que marcam práticas culturais. Atividades que não apenas preenchem
um espaço, mas que dão sentido a ele. “Fazem parte do patrimônio da cidade, configuram aquele
repertório de significantes que possibilitam guardar histórias e personagens que estariam esquecidas
pela permanência, na paisagem urbana, de tais suportes” (Magnani, 1996, p. 23)

Portanto, organizaremos nossa pesquisa a partir de uma interpretação de patrimônio cultural que
entende o próprio espaço como portador de traços e interações que revelam uma forma de ocupação
característica de um grupo social. Sua disposição física, construções e práticas ali exercidas serão
objeto de investigação para propor formas de preservação que contribuam para a continuidade do
patrimônio cultural local e permitam sua reprodução. Tal objetivo será buscado por meio do uso das
categorias propostas por Kevin Lynch e José G. C. Magnani em suas respectivas pesquisas, tanto pela
equipe técnica da DIPC quanto pelo resultado de entrevistas com moradores. Em um primeiro
momento, a equipe técnica fará a leitura do perímetro demarcado utilizando cada uma das categorias
descritas para, em seguida, identificar complementariedades e disparidades entre os grupos definidos
por cada autor citado. O trabalho de campo será realizado por caminhadas, observação direta e
classificação dos dados coletados. Isso será feito conforme planos pré-estabelecidos de percurso, com
37
o cuidado de realizá-lo em diferentes horários do dia e com duração variável, em acordo com as ---
propostas de Magnani. Na etapa seguinte, faremos entrevistas com moradores, nos moldes que Lynch
descreve, para, então, confrontar com as análises feitas pela equipe técnica. A quantidade de
entrevistas e idas a campo podem sofrer variações conforme condições meteorológicas e
disponibilidade dos entrevistados. Evidentemente que entre os grupos de categorias surgirão
interfaces, como entre vias e trajetos, limites e pórticos, bairros e manchas, pontos nodais e pedaço. O
trabalho de interpretação da equipe técnica é o de justamente reconhecer tais convergências e
divergências para caracterizar da melhor forma possível elementos passíveis de proteção. Por fim,
sistematizaremos o material e, com base nas conclusões, proporemos diretrizes de proteção para o
conjunto urbano.

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4. HISTÓRICO DO CONJUNTO URBANO

E
Durante a segunda metade do século XIX o Brasil passou por importantes mudanças tanto na sua

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forma política quanto na forma de organização do trabalho. Ideias e movimentos abolicionistas,
republicanos, ideias positivistas, racionalistas, envolvidas em um contexto que levou à abolição do
trabalho escravo e à proclamação da República. O rompimento com um passado colonial era visto
como o caminho para o desenvolvimento e para a modernidade. Foi nesse contexto que a ideia da
mudança da capital de Minas Gerais, até então sediada em Ouro Preto, ganhou força.

(...) o plano urbanístico da sede administrativa não poderia trazer os sinais do velho, como arruamento
irregular e as condições de saneamento das cidades coloniais, devendo incorporar os mais modernos
preceitos sanitários e higiênicos, saberes jurídicos e médicos na construção do novo horizonte.9
A Capital, enquanto símbolo das múltiplas possibilidades do movimento civilizador, tinha funções realmente
amplas, consubstanciando-se no impulso que iria modernizar Minas Gerais. (...) a cidade cosmopolita e
moderna deveria se um incremento para as atividades industriais e comerciais, um campo de
experimentação para inovações tecnológicas e científicas e, sobretudo, exercer um pape pedagógico no
sentido de incutir os novos hábitos urbanos.10

Alguns estudos importantes apontam bem as características e objetivos da edificação dessa nova
capital, projetada para ser moderna e republicana em detrimento da antiga capital Ouro Preto,
exemplar de um ambiente colonial e atrasado, não adequado aos novos tempos que o republicanismo
impôs ao país.

Ao analisar a mudança da capital Ouro Preto para a Cidade de Minas, atual Belo Horizonte, Afonso 38
---
Arinos de Melo Franco justificou a ação do estado no sentido do esgotamento econômico das cidades
mineradoras, visto a derrocada da produção aurífera e o consequente deslocamento do eixo
econômico do estado para as regiões sul, oeste, sudoeste e zona da mata, importantes polos
agropecuários. Nesse sentido, Belo Horizonte estaria geograficamente melhor localizada e poderia
fazer a junção dos ideais republicanos com os interesses econômicos do estado. Nas palavras de
Arinos,

A criação de Belo Horizonte, encerramento do século passado, romântico e oratório, marca a presença de
uma nova mentalidade política, mais de acordo com a nova era técnica característica do século XX. Foi uma
espécie de novo bandeirantismo, o impulso que então dominou o governo mineiro e as camadas mais

9 Saneamento Básico em Belo Horizonte: Trajetória em 100 anos – Os Serviços de Água e Esgoto – A comissão
Construtora e o Saneamento da Nova Capital. Fundação João Pinheiro/CEHC, Belo Horizonte, 1996.
10 Idem.

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influentes da opinião popular. Bandeirantismo nada primitivo, mas racionalista, científico, cujos capitães de
tropa eram jovens ou já famosos engenheiros, higienistas, construtores, calculistas, desenhistas, técnicos de
todo gênero. As fotografias daquele tempo, tomadas na cidade em construção, mostram-nos homens

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graves, de bigode, fraque e chapéu duro, pisando com as botas empoeiradas o carrascal daquele sertão.

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Eles não aderiram à natureza, não se plasmaram dentro dela como seus avós, os bandeirantes
setecentistas que, por falta de instrumentos materiais, só venciam submetendo-se ao meio natural,
conquistando ardilosamente a vida precária como os índios ou como os brutos. Os novos bandeirantes, ao
revés, dominavam desde logo a natureza pelo trabalho e pela máquina. Anulavam as distâncias construindo
meios de transporte de grande capacidade. Evitavam as doenças pondo em prática recursos médicos e
higiênicos modernos. Não temiam a penúria, pois traziam de longe os seus abastecimentos. A gente mineira
mostrava possuir um espírito viril de luta e de confiança no futuro, Era uma espécie de idealismo prático,
servido pela energia técnica. (FRANCO, 1976:262-263)

Construída entre 1894 e 1897, Belo Horizonte nasce sob a ideia da destruição e superação do passado
colonial e da emergência de uma modernidade urbanística inspirada em modelos europeus do século
XIX. Seus projetistas e executores tinham como objetivo a edificação de uma cidade ampla,
monumental, baseada nos princípios higiênicos, onde suas ruas e avenidas largas e arborizadas
seriam lugar de circulação de pessoas e de veículos, mas também preparadas para receber a
luminosidade e a ventilação natural, essenciais para a boa saúde de seus habitantes. Belo Horizonte
deveria então se opor a Ouro Preto, incrustada entre as montanhas, sem horizonte, sem luminosidade,
sem ventilação, sem espaço. O antigo Arraial do Curral Del Rei foi quase todo demolido, uma vez que
seus traçados aleatórios foram considerados incompatíveis com o projeto de seus engenheiros,
capitaneado por Aarão Reis. Nas palavras de Luciana Andrade,
39
Esta cartesiana Belo Horizonte, inspirada em texto expresso do Discurso sobre o método, com as suas ---
coordenadas implacavelmente retas, sua arquitetura perpendicular, seu gosto – que se diria uma fatalidade
– pelos ângulos, seu horror às curvas, mesmo às de nível, opõe-se à barroca, pascalina e curvilínea Ouro
Preto. Reta agressiva contra a curva harmoniosa e doce. Ouro Preto, a tradição, as igrejas, a religião, a
monarquia; Belo Horizonte, a ciência, o progresso, a república. (ANDRADE, 2004:75)

O local a ser escolhido para a construção da nova capital de Minas Gerais deveria ter “perfeitas
condições de salubridade: abundância de água e facilidades no que diz respeito ao escoamento
sanitário”11. O governo de Minas Gerais criou, então a Comissão Construtora da Nova Capital que, com
seus técnicos, deveria avaliar dentre as regiões pré-estabelecidas qual teria as melhores condições
ambientais, de fornecimento de materiais e de comunicação para planejar e construir a nova sede
administrativa do Estado.

11 Idem.

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A Comissão Construtora da Nova Capital era chefiada pelo engenheiro Aarão Reis e compunha-se de uma
equipe de engenheiros, arquitetos e urbanistas, cujos trabalhos estenderam-se entre os anos de 1894 e
1897, data da inauguração da cidade. Extinta a Comissão, as suas funções foram assumidas por outros

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órgãos municipais e estaduais. (...)12

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O engenheiro encarregado pela construção de Belo Horizonte, Aarão Reis, foi um entusiasmado
estudioso das teorias e reformas urbanísticas europeias e norte-americanas, principalmente a
elaborada por Haussmann em Paris. Importante destacar que a construção de Belo Horizonte
antecedeu a reforma urbana do Rio de Janeiro promovida por Pereira Passos entre 1902 e 1906,
também influenciada pela reforma parisiense. Escolhido o local, sobre o arraial do Curral del Rei, a
Comissão Construtora desenvolveu muitos estudos a partir dos quais foi feito o planejamento para a
construção da cidade. A partir desses estudos foram produzidos mapas que demarcam a topografia, o
relevo, os córregos e ribeirões, as pedreiras, as estradas, em suma, elementos que caracterizavam e
delimitavam a região onde a nova capital de Minas Gerais seria construída.

40
3 1 ---

Bello Horionte: Planta Geodésica, Topográphica e Cadastral da zona estudada. Comissão Construtora da Nova Capital.
Engenheiro Chefe: Aarão Reis. Escritório Técnico: 1º Engenheiro Hermillo Alves. 1895. Detalhe da região da Lagoinha com
os Córregos da Lagoinha, Córrego do Pastinho e Ribeirão Arrudas. 1 - Estrada para Venda Nova – Rua Itapecerica; 2 -

12Acervo da Comissão Construtora da Nova Capital de Minas. Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte/ Arquivo
Público Mineiro/ Museu Histórico Abílio Barreto. http://comissaoconstrutora.pbh.gov.br/

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Estrada para Venda Nova – Rua Formiga; 3 - Rua Diamantina. Engenheiro Chefe: Aarão Reis. Escritório Técnico: 1º
Engenheiro Hermillo Alves. 1895.13

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Nos mapas produzidos pela Comissão Construtora14 nota-se a presença do Ribeirão Arrudas, cujo
leito, na região da Lagoinha e do Carlos Prates, delimitaria e separaria a Zona Urbana e a Zona
Suburbana. Outros marcos referenciais nesses mapas são dois córregos, Corrego da Lagoinha e
Córrego do Pastinho, que correm para o Ribeirão Arrudas. A partir dos mapas vê-se regiões alagadiças
e com formação de pequenas lagoas na região desses córregos. Nota-se na planta cadastral, seguindo
o curso dos córregos da Lagoinha e do Pastinho, a existência de edificações que indicam e
documentam a existência de uma ocupação anterior à inauguração de Belo Horizonte15.

Sobre a origem do nome Lagoinha, embora textos e autores apresentem versões levemente
divergentes, pode-se afirmar que está relacionada às características geográficas e da hidrografia desta
região, visto a presença do Córrego da Lagoinha, das regiões alagadiças e das pequenas lagoas que
se formavam nas margens do Córrego. Estas características representavam um marco para aqueles
que chegavam ou saíam da região do Curral del Rei. Outra referência importante nestes mapas é a
marcação das estradas que ligavam o arraial do Curral del Rei às regiões de ocupação mais antigas,
como Venda Nova e Contagem. Inclusive, parte da Estrada para Venda Nova foi incorporada e
41
corresponde atualmente às ruas Itapecerica e Formiga. Observa-se também, na Planta Geodésica,
---
Topográfica e Cadastral da Comissão Construtora, a marcação de duas pedreiras, uma próxima à
inscrição “Lagoinha 1895” e outra próxima à inscrição “Viação 940”. Localizadas na região próxima ao
Córrego da Lagoinha, as pedreiras já existentes foram importantes nos momentos iniciais da

13 Biblioteca Digital Luso-Brasileira. Biblioteca Nacional Digital do Brasil.


https://bdlb.bn.gov.br//acervo/handle/123456789/21178 (acesso em 20/10/2016)
14 Panorama de Belo Horizonte: Atlas Histórico. Belo Horizonte/ Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e

Culturais. Belo Horizonte, 1997.


15 As primeiras referências sobre a região da Lagoinha datam do início do século XVIII, no documento de doação de

sesmaria ao bandeirante João Leite da Silva Ortiz de 1711. Neste documento constam os limites da região a ele destinada,
do Serro do Congonhas (Serra do Curral) até a Lagoinha, entre outros pontos limítrofes do terreno, o documento cita
também estradas e o Rio das Velhas. In: Revista do Arquivo Público Mineiro, ano X, fasc. III, e IV, de 1905. Cartas de
Sesmarias. http://www.siaapm.cultura.mg.gov.br/modules/rapm/capas_registros.php?op=exibirRegistros&capa=5
Presente também em BARRETO, Abílio. Belo Horizonte – Memória Histórica e descritiva – História Antiga e História Média.
Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais. 1996.

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construção da cidade fornecendo material para as edificações e para o calçamento das ruas. Nota-se
ainda que, nas proximidades das pedreiras, as curvas de nível se aproximam, o que indica uma maior

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inclinação do terreno. Assim, observa-se que a região da Lagoinha já existia de forma ativa antes
mesmo da Comissão Construtora projetar e começar a construção da cidade. Sua posição e suas
características geográficas ligando o arraial do Curral Del Rei às estradas de acesso a outras regiões
serão de fundamental importância no desenvolvimento da cidade e desta região.

Como citado anteriormente, a partir dos estudos feitos e das plantas geradas pela Comissão
Construtora, ao contrário das ruas irregulares da antiga capital Ouro Preto, projetou-se uma cidade
organizada com ruas e quadras em ângulos retos, largas avenidas, rios e córregos com qualidade e
quantidade capazes de abastecer a cidade, como se vê na Planta Geral da Cidade de Minas – Belo
Horizonte.

42
---

Planta Geral da Cidade de Minas Organizada sobre a Planta Geodésica, Topográfica e Cadastral do Bello Horisonte pela
Comissão Construtora da Nova Capital sob direção do Engenheiro Civil Aarão Reis. Aprovada em 1895. 16

16 Acervo da Comissão Construtora da Nova Capital. Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte.

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No projeto da nova capital de Minas Gerais foram planejadas três áreas distintas: a Zona Urbana; em

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torno desta a Zona Suburbana; e mais afastadas do centro, as Colônias Agrícolas, com sítios
destinados à produção de alimentos para abastecer a cidade. Também a Zona Suburbana foi planejada
com arruamento e quarteirões, além de alguns equipamentos como o Cemitério Municipal e o
Hipódromo. Entretanto, este planejamento não possuía o mesmo rigor, organização e padronização
aplicado na Zona Urbana. As ruas, o tamanho e formato dos quarteirões, o abastecimento de água e o
sistema sanitário, diferente do estabelecido para a Zona Urbana, não possuíam a mesma
infraestrutura.

43
---

Planta Geral da Cidade de Minas, 1895. Detalhe: Separação entre a Zona Urbana e Zona Suburbana

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Considerando o perímetro do Conjunto Urbano da Lagoinha, destacam-se, na Planta Geral da Cidade


de Minas produzida pela Comissão Construtora, elementos que dialogam com as ideias que nortearam

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o planejamento da cidade.

44
---
Planta Geral da Cidade de Minas, 1895. Detalhe para a região da Lagoinha, onde se destacam o Cemitério Municipal e a
Praça 14 de Fevereiro e Mercado Municipal.

Pode se observar, na Planta Geral da Cidade de Minas, a presença do Cemitério Municipal17, distante
da Igreja e fora da Zona Urbana. Destaca-se também a Praça 14 de Fevereiro e Mercado Municipal,
atual Praça Rio Branco.

17 O Cemitério Municipal Nosso Senhor do Bonfim foi inaugurado em 08 de fevereiro de 1897, antes da fundação da própria
cidade, na Zona Suburbana, fora dos limites da Avenida do Contorno e atendendo aos critérios sanitaristas e republicanos
do final do século XIX.

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Vista panorâmica da entrada principal do cemitério do Bonfim, vendo-se do lado direito a subida da rua Bonfim. Data: 1936.

Na mesma Planta, elaborada em 1895, estavam contempladas as principais ruas da região da


45
Lagoinha que permitiam o acesso do centro da cidade ao Cemitério Municipal. Nesse planejamento ---
podem ser vistas as ruas que ligam a região da Praça 14 de Fevereiro e Mercado Municipal à região da
Lagoinha, mais precisamente à Praça Vaz de Melo, de onde partem as ruas Bonfim e Além Paraíba,
que levam ao cemitério18. Além dessas ruas, outras que circundam o cemitério e a rua Itapecerica
também estão contempladas nesta Planta.

18 O Cemitério Municipal Nosso Senhor do Bonfim reproduziu em sua organização a própria ordenação da cidade. A
localização dos sepultamentos, as representações iconográficas, os materiais que ornamentaram seus túmulos e
mausoléus, demarcam relações sociais e de poder, além das condições financeiras da sociedade belo-horizontina.18 Em
torno do cemitério foram se instalando atividades ligadas aos sepultamentos como marmorarias e floriculturas. In:
ALMEIDA, Marcelina das Graças de. Relatório de Pesquisa: Cemitério do Bonfim de Belo Horizonte – História e Memória –
Um dossiê analítico. Belo Horizonte, 2015.

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Detalhe da Planta Geodésica,


Topográphica e Cadastral da

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Comissão Construtora. Detalhes
3

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para os locais onde foram
instalados o (1) Cemitério
Municipal; (2) Praça 14 de
Fevereiro e Mercado Municipal,
atual Praça Rio Branco; e (3)
encontro da Rua Peçanha e Rua
1 Patrocínio (3).
2

46
---
Detalhe da Planta Geral da Cidade
3 de Minas organizada sobre a
Planta Geodésica, Topográfica e
1
2 Cadastral de 1895. Detalhes para
os locais onde foram instalados o
Cemitério Municipal (1); a Praça
14 de Fevereiro e Mercado
Municipal (2), atual Praça Rio
Branco; e o encontro da Rua
Peçanha e Rua Patrocínio (3).

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A CHEGADA DE IMIGRANTES

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A Lagoinha situa-se entre duas estradas de ferro, a Central do Brasil e a Rede Mineira de Viação e está

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bem próxima da Estação Ferroviária, por onde chegavam pessoas e materiais para a construção da
capital mineira, além de imigrantes e pessoas vindas de outras regiões de Minas Gerais. Importante
ressaltar que, no final do século XIX, o governo implementou em nível nacional e nos Estados, políticas
de incentivo à imigração. A demanda por mão-de-obra devido à abolição da escravidão era intensa, e
dessa forma, várias leis foram implementadas no sentido de criar condições e atrair imigrantes,
necessários para a construção da nova capital do Estado de Minas Gerais e para o desenvolvimento da
produção agrícola que abasteceria a cidade.19

O povo do Estado de Minas Gerais, por seus representantes, decretou e eu, em seu nome, sanciono a
seguinte lei:
Art. 1º Fica o Presidente do Estado autorizado a promover direta ou indiretamente a imigração de
trabalhadores destinados principalmente ao serviço da agricultura, concedendo os seguintes favores:
a) Indenização de passagem (...);
b) Passagens livres nas estradas de ferro (...).
Art. 2º – Fica igualmente o Presidente autorizado a promover localização de colonos nacionais ou
estrangeiros, facilitando-lhes a aquisição de terras, de modo que junto dos grandes proprietários possam
tornar-se pequenos proprietários de lotes (...).
(...)
Art. 5º – O governo terá no estrangeiro um superintendente e agentes emissários que cuidem da
propaganda do serviço de imigração, com escritório de informação, e que seja ao mesmo tempo
intermediário de relações comerciais e industriais com as nações estrangeiras.
AFFONSO AUGUSTO MOREIRA PENNA (Presidente do Estado de Minas Gerais). 20 47
---
Como parte da política de imigração para arregimentar mão-de-obra, foi elaborada uma agressiva
propaganda em diversos jornais italianos, descrevendo as vantagens da imigração para Minas Gerais.
Nesse sentido, em 1894, David Campista foi nomeado para o cargo de Superintendente de Imigração
na Europa, com sede em Gênova. Na mesma data, em Lisboa, publicava-se o “Guia Português para o
Estado de Minas” que descrevia o estado e informava sobre clima, terrenos, estradas de ferro,
instrução pública, indústrias e agricultura, com referências explícitas sobre a construção de Belo

19 Para maior esclarecimento sobre as condições garantidas por lei para incentivar a imigração no final do século XIX, ver as
seguintes leis:
Lei nº 32, de 18 de julho de 1892.
(http://www.almg.gov.br/consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=LEI&num=32&comp=&ano=1892)
Lei nº 150, de 20 de julho de 1896.
(http://www.almg.gov.br/consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=LEI&num=150&comp=&ano=1896)
20 Lei nº 32, de 18 de julho de 1892.

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Horizonte. Quanto aos espanhóis, não houve ação da Superintendência, predominando a imigração
espontânea. Entre 1894 e 1901, Minas Gerais recebeu um total de 52.582 imigrantes, sendo 47.096

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italianos, 352 portugueses, 188 austríacos, 1893 espanhóis e 46 originários da Alemanha, Grécia,
Armênia e Canadá. A maioria dos imigrantes tinha profissões no setor agrícola (43.998), mas os dados
registram 6.316 imigrantes sem profissão definida e 2.268 artistas. Nesse período, os custos de
imigração foram arcados, majoritariamente, pelo Governo do Estado.21 Percebe-se, através desses
números, que a maioria dos imigrantes que vieram para Minas Gerais eram italianos, pois além dos
benefícios ofertados pelo governo mineiro, o período em questão, coincide com a unificação do Estado
italiano, que acarretou, para algumas regiões dessa recém unificada Itália, a uma grave crise
econômica. Para fugir dessa crise, milhares de pessoas emigraram em busca de melhores condições
de vida, sendo a sua maioria absoluta em direção a América.22

Embora as políticas de incentivo à imigração atraíssem grande número de imigrantes na última década
do século XIX e nas primeiras do século XX, a cidade planejada dentro dos critérios de modernidade,
ordem e civilidade não previa a absorção dessa população que chegava em grande quantidade e com
costumes diferentes. Na parte interna da Avenida do Contorno, tradicionais famílias vindas de Ouro
Preto, funcionários públicos, médicos, políticos, dentre outros, tinham espaço dentro do traçado da
Zona Urbana. A população que chegava para construir a cidade não teve espaço dentro deste traçado,
48
seja pelo preço dos lotes na Zona Urbana, seja pela pelos locais a eles destinados como hospedarias, ---
insuficientes para abrigar o número de imigrantes que chegavam na capital mineira oriundos do exterior
ou de outras regiões do Estado. Dessa forma, as regiões na Zona Suburbana próximas à Estrada de
Ferro, como Lagoinha, Floresta, Carlos Prates e Santa Tereza, foram regiões que absorveram
intensamente esses imigrantes, muitas vezes de forma irregular e sem planejamento urbano. Por
serem próximas à Zona Urbana, que foi o local do trabalho de grande parte dessa população e por
possuírem preços mais baixos, essas pessoas se instalaram nessas regiões.

Acima da projetada rua Sapucaí, (onde) ia-se adensando uma povoação de cafuas e barracões de zinco, [...]
onde morava gente operária, (um) aglomerado de gente pobre, (no morro atrás da estação Minas, o grande

21Dossiê Conjunto Urbano Bairro Floresta. Diretoria de Patrimônio Cultural/FMC.


22No site do Arquivo Público Mineiro é possível ampla pesquisa sobre imigrantes que entraram em Minas Gerais no final do
século XIX e início do século XX.

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portal de entrada e saída da cidade) [...] um provisório barracão de tábuas coberto de zinco, plantado no
meio de uma esplanada que estava sendo preparada. Além da Favela a cidade tinha grandes nucleos
populosos, tais como: Lagoinha, Calafate, Pampulha, Cardoso, Pastinho, Menezes, Bom Sucesso e outros.

E
Nos pequenos montes e vales circunvizinhos existem nucleos igualmente populosos, também na sua

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maioria, formados de casas de construção ligeira e grosseira, denominadas cafuas, cujos moradores, na
maior parte, são operários [...]. Durante os dias era aquele ardor de trabalho por todos os ângulos da
localidade e às noites, enquanto o centro do arraial habitado pela gente ordeira e morigerada descansava,
(...) bairros de cafuas e barracões provisórios (...) fervilhavam em orgias e algazarras dos vadios e das
mundanas, que ali enxameavam em promiscuidade com pobres famílias de operários [...]" 23

Nesse sentido operários, construtores, arquitetos, engenheiros, artistas, marmoristas e comerciantes,


majoritariamente de origem italiana e que vieram para a construção de Belo Horizonte, formaram a
população da Lagoinha, conferindo a essa região uma identidade própria, mas não distante de demais
regiões da capital mineira. Os barracões e “cafuas” feitos com restos de materiais estavam bastante
presentes na região em questão, destoando da paisagem na moderna capital planejada sobre o antigo
arraial. Essa ocupação, que se deu lado a lado com a edificação de Belo Horizonte, decorreu de
expressões culturais distintas. Encontram-se no Arquivo Público da Cidade os projetos arquitetônicos
de algumas dessas construções, por vezes mais simples que aquelas projetadas e construídas para a
região interna da Avenida do Contorno, feitas pelos arquitetos, construtores e operários que
trabalhavam na Zona Urbana e que construíam suas próprias residências e estabelecimentos
comerciais na Zona Suburbana, como é o caso da Lagoinha.
49
As áreas que primeiro foram ocupadas, a Praça Vaz de Melo, a Rua Itapecerica, a rua Além Paraíba e ---
Bonfim, progressivamente começaram a receber uma população de classe média que começou a se
apropriar dessa região, pois a mesma possuía uma melhor infra-estrutura em comparação às demais,
fazendo assim, com que a população de menor renda fosse forçada a ir para lugares pais afastados e
com ainda menos recursos. A região da Lagoinha até a Pedreira Prado Lopes passou a abrigar uma
população pobre e com muitos desempregados, sobretudo após uma crise econômica vivenciada na
década de 1910. Muitas famílias construíram suas casas sem planejamento e em áreas invadidas,
como na Pedreira Prado Lopes,24 formando assim uma das primeiras favelas de Belo Horizonte. Outra
ocupação semelhante a essa da Pedreira, foi a da Vila Senhor dos Passos, entre as ruas Além

23Dossiê Conjunto Urbano Bairro Floresta. Diretoria de Patrimônio Cultural/FMC.


24História de Bairros [de] Belo Horizonte: Regional Noroeste / coordenadores, Cintia Aparecida Chagas Arreguy, Raphael
Rajão Ribeiro. Belo Horizonte: APCBH; ACAP-BH, 2008

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Paraíba, Alexandre Stockler, Turvo, Fagundes Varela e Pedro Lessa, nas proximidades da Praça
Quinze de Junho.25 Pretendendo regularizar as condições de moradia da região da Lagoinha, em 1906

E
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o governo autoriza a construção de vilas de aluguel barato na rua Bonfim.

Feitas as ligeiras modificações na lei n. 178, já lembradas no relatório de 1920 à página 52, e ainda a
substituição das palavras foreiro por adquirente, aforamento por venda etc; poderá a prefeitura crear em
terreno que possue, denominado “Pasto da Prefeitura”, uma grande Villa Proletária. Em terrenos de sua
propriedade situados atraz do Cemitério Municipal, fez a prefeitura, cerca de 300 lotes que serão cedidos
nas condições que ficarem definitivamente assentadas para as Villas Proletárias. Grande parte da 6 secção
suburbana (Lagoinha) está ocupada por habitações provisórias, construídas sem licença da prefeitura.
(Prefeitura de Bello Horizonte, 1922, p. 51)26

Nos relatórios dos prefeitos elaborados no início da década de 1920, observa-se uma preocupação
com as ocupações irregulares. Diante desse fato, a prefeitura criou a Lei das Vilas Operárias, 1922,
para regularizar a situação dessas pessoas.27 A preocupação do Governo em localizar os operários em
vilas „provisórias e gratuitas‟, não permitindo a permanência dos mesmos em outros pontos, denuncia o
critério segregativo que norteou a ocupação do espaço na capital mineira. Nos anos 1920, as ex-
colônias foram anexadas à cidade tendo os seus terrenos parcelados em lotes, por companhias de
desenvolvimento e por especuladores. A conversão das fazendas em vilas ampliou as áreas
residenciais de Belo Horizonte e aumentou o lucro imobiliário. Esta ampliação periférica incentivou a
construção de edificações ao longo dos itinerários de bondes. Os empreendedores adquiriram terrenos
50
extensos, grande parte por compra direta do Estado, dividiram as propriedades em pequenos lotes, ---
ordenaram as ruas e, de maneira vigorosa, anunciaram a sua venda com promessas de suprimento de
água, serviço de bondes, praças e escolas. Dos serviços oferecidos, somente o sistema de bondes
atendia a maioria dos habitantes, permitindo o acesso da população ao centro da cidade.

25 FREIRE, Cíntia Mirlene Pela. Do outro lado da linha do trem: História e intervenções no bairro Lagoinha. Programa de
Pós-graduação em Ciências Sociais da PUC Minas, 2009.
26 Citação feita por Cíntia Mirlene Pela Freire em seu texto Do outro lado da linha do trem: História e intervenções no bairro

Lagoinha. Esta citação é parte do Relatório apresentado ao Conselho Deliberativo pelo prefeito Flavio Fernandes dos
Santos, e pode ser encontrado no site
http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/contents.do?evento=conteudo&idConteudo=24201&chPlc=24201
27 Os Relatórios dos Prefeitos (Relatórios anuais da Prefeitura de Belo Horizonte - 1899-2005) podem ser encontrados em

http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/contents.do?evento=conteudo&idConteudo=24201&chPlc=24201

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Rua do Bonfim. Do lado esquerdo vê-se algumas edificações, a linha do bonde e postes de eletricidade. Do lado direito vê-
se trecho da rua em curva, um conjunto de imóveis de influência eclética e uma charrete de nº 7. Várias casas e árvores.
Data: 1922 a 1926.

A PRAÇA VAZ DE MELO E A BOEMIA

Conforme dito anteriormente, a Estação Ferroviária era a porta de entrada para as pessoas que
chegavam em Belo Horizonte, sejam eles estrangeiros ou provenientes de outras cidades de Minas
Gerais, além dos materiais para a construção da cidade. Nas décadas de 1910 e 1920, foi inaugurado
um ramal férreo na Lagoinha, de onde saíam composições que faziam o percurso Belo Horizonte –
Divinópolis. A inauguração desse ramal férreo favoreceu o surgimento de estabelecimentos comerciais 51
---
diversificados concentrados, em sua maioria na Praça Vaz de Melo e na Rua Itapecerica. A Lagoinha
tornou-se também local do lazer, da sociabilidade, do encontro, da música, dos botecos, da
malandragem, dos laços familiares e de vizinhança. Embora localizada na zona suburbana, a Lagoinha
estava perto e integrada não só fisicamente como também no cotidiano e no imaginário da cidade. A
boemia e a prostituição se tornaram cada vez mais presentes e passaram a estereotipar a região,
contribuindo para o estabelecimento de um imaginário de marginalização e violência.

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Praça Vaz de Melo no ano de 1930. O boêmio largo da Lagoinha (demolido no inicio da década de 1980

No artigo “A territorialidade da prostituição em Belo Horizonte”, de Luciana Teixeira de Andrade e


Alexandre Eustáquio Teixeira, é feito um mapeamento da prostituição em três períodos, o primeiro
entre a fundação de Belo Horizonte em 1897 até 1930, o segundo abrangendo as décadas de 1930 à
1960 e o terceiro período a partir de 1970. Nos dois primeiros os autores analisaram o que representou
a prostituição na época da construção da cidade, apontando as regiões onde tal prática ocorria e como 52
eram os mecanismos de controle social que sobre ela agiam. ---

O primeiro período é o que mais expressa as consequências da cidade planejada. Nessa época, o
crescimento e a ocupação de Belo Horizonte foram relativamente controlados. Por ser uma cidade planejada
e, principalmente, seguir o s princípios higienistas que orientaram as reformas da cidade, Belo Horizonte
tentará manter a prostituição sob o controle do „cabaré higienizado‟. (...) [a] hierarquia dos cabarés devia-se
principalmente aos preços cobrados, mas também a nacionalidade das prostitutas e as suas condições
físicas. (...) a região dos cabarés era uma „região moral‟, onde formas desviantes e marginais de vida eram
toleradas e onde se podia ainda observar a mistura de classes que as reformas urbanas do final do século
XIX e início do XX procuram de todas as formas excluir. (...) O planejamento de Belo Horizonte por Aarão
Reis procurou destinar as áreas centrais e urbanizadas da cidade para os estratos médios e altos. Os mais
baixos foram deslocados para a Zona Suburbana. A permanência dessas regiões boêmias (Montmartre, em
Paris, Lapa no Rio, Lagoinha e Bonfim em Belo Horizonte) mostra a incapacidade dos poderes públicos de
tudo controlar. Sobre Belo Horizonte, é interessante o depoimento de José Nava: „Neste bairro, pertinho da
estação do trem de ferro, instalaram-se as mulheres de isca. Não haviam sido convocadas por Aarão Reis,
mas se instalaram. (...) Em 1912 uma instrução de um delegado de polícia revelava o caráter ambíguo do
controle que se exercia. O delegado recomendava máxima vigilância às „pensões alegres‟, para que alí não
ocorressem „cenas de deboches visíveis ao público e perturbadores da tranquilidade das famílias”.
(ANDRADE, Luciana Teixeira de. 2004. P. 137)

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No final da década de 1910, em 1921 e em 1927 foram feitas normas e instruções de controle da

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prostituição em Belo Horizonte sendo que em 1927 foi criado o Serviço de Legitimação das Meretrizes
responsável pelo registro das prostitutas da capital.

O segundo período tratado no artigo tem como título “A extensão da zona boêmia e o surgimento do
homossexual valente:1930-1970”. Segundo o artigo,

(...) coube à Lagoinha e ao Bonfim o lugar de maior destaque nesse período, mais especificamente entre as
décadas de 1940 e 1960. A Praça Vaz de Melo, porta de entrada da Lagoinha, atrás da rodoviária, era o
centro dessa região, cujas ruas mais famosas eram a Paquequer e Bonfim.(...) Essas duas áreas eram
pouco valorizadas devido à proximidade com a estação ferroviária e rodoviária, o Ribeirão Arrudas, a linha
férrea e o Cemitério. Na Lagoinha somavam-se às casas de prostituição vários bares, restaurantes, cinemas
e clubes de dança, pontos tradicionais de encontro boêmios e artistas(...). Advém dessas características a
sua percepção ambígua por parte da população, pois ao mesmo tempo era conhecido negativamente pela
prostituição mas os boêmios também levaram fama e riqueza para o bairro.
A Lagoinha e o Bonfim eram bairros residenciais e por isso a prostituição causava muitos constrangimentos
as famílias, provocando inclusive mudanças para o interior do bairro 28. (...) Não se tem notícias da existência
de prostituição masculina. No enteanto, um travesti violento marcou esse período. José Arimatéia Cavalho
da Silva, conhecido como Cintura Fina, chegou a Belo Horizonte em 1953, (...) frequentou as zonas boemias
da cidade, principalmente a Lagoinha(...). “Nos anos setenta, intensifica-se a prostituição de rua na
Lagoinha, Bonfim e centro. (...) Já as travestis preferiam ficar nas proximidades do bairro Bonfim, faziam
„ponto‟ na frente de hotéis e casas de prostituição principalmente na rua Paquequer, ao lado de prostitutas
mulheres. (ANDRADE, Luciana Teixeira de. 2004. P. 162)

Sobre a boemia e a vida noturna, essa sempre foi uma característica da lagoinha. A Praça Vaz de
53
Melo, porta de entrada da Lagoinha, é descrita como um local repleto de bares, clubes, motéis, onde o ---
chorinho e o samba se misturavam com as vozes das conversas altas e das risadas. Segundo uma
série de estudiosos e saudosistas da vida boemia da cidade, a destruição da Praça Vaz de Melo levou
embora toda essa característica da região, não sendo substituída por nenhum outro local em Belo
Horizonte. Segundo Wander Piroli,

Não fui lá nesse dia. Não queria ver o fim melancólico e desnecessário da Praça. Em vez de tombá-la como
patrimônio Público, o último local mais característico da vida noturna da cidade, preferiram destruí-la. E
destruí-la a toa, sem a menor necessidade. O fato é que as tais autoridades municipais foram lá, muitos
curiosos para ver o espetáculo de uma implosão. E no meio da pequena multidão silenciosa, a Lagoinha
soltou o samba:

Adeus lagoinha, adeus

28A luz vermelha era colocada nas portas para diferenciar as casas de prostituição das casas que eram residências
familiares.

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Estão levando o que resta de mim.


Dizem que é a força do progresso.
Um minuto eu peço

E
Para ver seu fim”

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Houve um minuto de silencio após o último acorde da música. E, depois, todo mundo viu um prédio ser
jogado no chão. (PIROLI, Wander. Lagoinha. Belo Horizonte: Conceito, 2004. P. 19.)

Belo Horizonte é uma cidade reconhecida pelos seus bares e pelo vasto consumo de cerveja, sendo
que na maioria dos bares a cerveja é servida um copo chamado Lagoinha. Na verdade, trata-se do
Copo Americano, fabricado pela empresa Nadir Figueiredo, que em Belo Horizonte é chamado
Lagoinha em referência ao bairro e sua boemia. Nas pesquisas sobre esse copo, deparamos com um
depoimento interessante e que segue na íntegra. Trata-se de um e-mail de um jornalista belorizontino à
um leitor, que o questionava sobre uma matéria sobre o copo Lagoinha.

Gostaria de prestar um esclarecimento sobre as origens do famoso “Copo Lagoinha”. Primeiramente


gostaria de destacar que tenho 60 anos e minha mãe Yolanda (94 anos), sendo que ela morou com sua irmã
Carmelita Silveira Vaz de Mello, casada com Joaquim Séptimo Vaz de Mello, por muitos anos na Av. do
Contorno esquina com a Praça da Lagoinha, na casa ao lado do conceituadíssimo Armazém Vaz de Mello,
que foi de propriedade de Guilherme Ricardo Vaz de Mello (e seus filhos), mais conhecido como “BEDECO”.
Consultando alguns parentes, e por conhecimento pessoal, nunca tivemos noticia de fábrica de copos de
vidro neste bairro, daí estes esclarecimentos.

54
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A ponte sobre o Ribeirão dos Arrudas, que aparece na foto de família mostrando a praça com a linha de
bonde, a linha do trem Central do Brasil, uma carroça de leite na porta do armazém (à direita), era conhecida
no início do século XX, como ponte do “Seu Bedeco”, pois ele era um grande comerciante naquele local, e

E
tornou-se conhecido por sua bondade e benemerência, além de ser um comerciante exemplar.

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No ano de 1935, O Prefeito Octacílio Negrão de Lima, através de decreto deu a praça o nome de Coronel
Guilherme Ricardo Vaz de Mello, em sua homenagem. Precisamente neste armazém, meu Tio Quimquim,
filho de Guilherme Ricardo, referido acima, vendia os copos da Nadir Figueiredo, que nunca foram
fabricados em Belo Horizonte, mas de excelente qualidade, e conhecidos como copos Americanos. Meu tio
era muito brincalhão e batia com os copos sobre a bancada do armazém, às vezes até na beirada de
bancos e meio-fios, e demonstrava que os mesmos não se quebravam.

Após o fechamento do armazém, nos anos 1950, ali se instalou um Bar em que muitos frequentavam, tendo
recebido por um primo, Fernando Vicente Vaz de Mello, o nome de Bar Maracanã. Neste bar, os copos
americanos eram largamente usados para se beber a cerveja, pois eram de fácil limpeza e nunca se
quebravam.
Dizem os antigos frequentadores que nesta época é que muitos começaram a usar o nome de
COPO LAGOINHA, homenagem merecida ao bairro e a praça, de tantas glórias e paixões. Nesta época
a boemia era grande e a praça era toda comercio e centro irradiador para a zona Norte de Belo Horizonte,
onde passavam os bondes que levavam os trabalhadores para as suas casas. Na praça haviam muitas
casas comerciais e podemos citar a Casa das Chaves, Padaria Japonesa, Sapataria Sucuri, Farmácia
Irmãos Diniz, Farmácia Vaz de Mello, entre outras. Na Av. Contorno tinha o Cinema São Geraldo, na Rua N.
Sra. Fátima, o Cine Mauá, entre Av. Contorno e a N. Sra. De Fátima, tínhamos a Feira dos
Produtores disputadíssima por todos. O bairro fervia de dia e à noite. Eram os bons tempos 29.

Se a prostituição, a boemia e a violência30 passaram a ser um estigma e motivo de preconceito


para a Lagoinha, por outro lado, outras instituições fundadas ainda nas primeiras décadas do século
XX se tornaram referência cultural para os moradores, dando outro sentido para a região. Dentre eles, 55
---
destacam-se a educação e a religiosidade. Na segunda década do século XX foi construído o Grupo
Escolar Silviano Brandão na Rua Itapecerica que, ainda hoje, tem grande representatividade e
importância para a história e o cotidiano do bairro e dos seus moradores.

29 E-mail escrito por Flavio Edenlar P. Silva em 17/07/2009, para José Universo Soares, autor do blog do Universo. In:
http://juniverso.blogspot.com.br/2010/09/copo-lagoinha.html
30 A prostituição, a violência e, posteriormente, o tráfico de drogas são elementos presentes no imaginário sobre a lagoinha,

entretanto, existe um sentimento de pertencimento dos moradores que se relaciona a outros lugares da vida social, à
família, ao trabalho, à religiosidade, à educação, que são menos divulgados, porém não menos importantes no cotidiano e
imaginário daqueles que residem na região da Lagoinha.

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Vista do Grupo Escolar Silviano Brandão situado na Rua Itapecerica no bairro Lagoinha. Data: 1947.

56
O Grupo Escolar Silviano Brandão foi criado 5 de janeiro em 1914 por decreto do então Governador do
---
Estado Júlio Bueno Brandão e inaugurado em 16 de maio do mesmo ano. Foram matriculados 424
alunos e sua primeira diretora foi Mariana Horta. Posteriormente o Grupo Escolar passou a se chamar
Escola Estadual Silviano Brandão.31 Outra escola referência não só para a Lagoinha, mas para toda a
Belo Horizonte, foi o Ginásio Municipal, posteriormente Colégio Municipal, localizado na Rua José
Bonifácio. Inaugurado em 1948, primeiramente funcionando no Parque Municipal e depois transferido
para a Lagoinha em 1954, foi o primeiro ginásio gratuito a ser implantado em Belo Horizonte, mantendo
assim a referência da região no que tange à educação.

31Esta informação sobre a Escola Estadual Silviano Brandão foi publicada pela Revista Escola Silviano Brandão de 1974 e
republicada em eesilvianobrandao.blogspot.com/p/historia-da-escola.html (acesso em 22/11/2016)

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Vista do Colégio Municipal, nos anos 196032.

Outro ponto de referência para o bairro tanto pelo reconhecimento dos moradores quanto como um
marco na paisagem do bairro é a Igreja Nossa Senhora da Conceição, cuja edificação iniciou em 57
1914.33 ---

32 In: http://www2.faced.ufu.br/nephe/images/arq-ind-nome/eixo8/completos/colegio-municaipal.pdf
33 De acordo com o site da Arquidiocese de Belo Horizonte, em 1992, tornou-se Santuário Nossa Senhora da Conceição.

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Vista parcial da praça Rui Barbosa e adjacências. Em primeiro plano vê-se a Avenida do Canal, atual Avenida dos
Andradas. Ao fundo vê-se, a direita, parte do bairro Floresta e ao fundo o bairro da Lagoinha e a torre da Igreja de Nossa
Senhora da Conceiçao. Data: 1922 e 1949.

58
---

Vista parcial do bairro Lagoinha. Em segundo plano a esquerda, vê-se a Praça Vaz de Mello; a direita trilhos, provavelmente
do bonde que por ali transitava; e,a direita, vê-se a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, inaugurada em 1923, com sua
torre ainda sem o relógio.

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Localizada na rua Além Paraíba a Igreja de Nossa Senhora da Conceição teve sua pedra fundamental

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edificada em uma grande celebração realizada em 1914. Construída pelos religiosos Redentoristas,
com recursos arrecadados pela Corporação Musical Nossa Senhora da Conceição, a Paróquia foi
inaugurada em 1923. Essa igreja foi transformada em Santuário de Nossa Senhora da Conceição pelo
decreto de 8 de dezembro de 1992 de Dom Serafim Fernandes de Araújo. Data: 1930 e 1949. 34

59
---

Igreja Nossa Senhora da Conceição, rua Além Paraíba. Fonte: Arquivos da DIPC

INFRAESTRUTURA E URBANIZAÇÃO

O processo de urbanização e arruamento de Belo Horizonte não levou em conta os diversos córregos e
ribeirões que existiam na capital. Dessa forma para a abertura de ruas e avenidas, esses ribeirões

34 Arquidiocese de Belo Horizonte. Santuário Arquidiocesano Nossa Senhora da Conceição.


http://www.arquidiocesebh.org.br/site/atuacao.php?id=192 (acesso em 13/11/2016)

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deveriam ser canalizados e encobertos. Além de ser a solução urbanística adotada na época, a
canalização e cobertura dos córregos e ribeirões estava embasada em ideias higienistas, de cunho

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sanitário, visto que grande parte desses córregos recebiam o esgoto proveniente das diversas
edificações e seriam vetores de diversas doenças. Em 1927, na gestão do prefeito Christiano Machado,
foi promulgada uma lei que autorizou a desapropriação de vários terrenos para a abertura de uma
avenida sanitária, ao longo do Córrego da Lagoinha.

DECRETO Nº 19, DE 27 DE DEZEMBRO DE 1927.


DESAPROPRIA POR UTILIDADE PÚBLICA OS TERRENOS NECESSÁRIOS À ABERTURA DE UMA
AVENIDA SANITÁRIA, AO LONGO DO CÓRREGO LAGOINHA DESDE A RUA FORMIGA ATÉ A RUA DO
RAMAL.
O Prefeito de Belo-Horizonte, usando das atribuições conferidas pela lei nº 319, de 26 de outubro de 1927;
Considerando ser de necessidade publica a conclução de uma avenida sanitária ao longo do córrego
chamado "Lagoinha", o qual será canalizado;
Considerando ser de evidente precisão para a higiêne pública a construção dos emissários de esgôto
sanitário nas duas margens do referido córrego, de módo a receber as águas servidas das casas
construidas em sua bacia e que forma o bairro denominado "Lagoinha";
Considerando que a Saúde Pública reclama a drenagem dos terrenos ribeirinhos, ao dito córrego, os quais,
sendo pantanosos, constituem permanente ameaça à salubridade do bairro;
Considerando que a canalização do córrego se impõe para a tranqüilidade das casas ribeirinhas quasi que
anualmente prejudicadas com as cheias;
Considerando que a capacidade de tráfego da rua Itapecerica, já está esgotada, sendo permanente ali o
perigo de desastres, com sacrifícios de vidas, e que a abertura desta avenida vai desafogar o transito na rua
aludida:
Decreta, de acôrdo com a lei nº 319, a desapropriação dos terrenos necessários à abertura de uma avenida
sanitária ao longo do córrego da Lagoinha, desde a rua Formiga até a rua do Ramal.
Belo Horizonte, 27 de dezembro de 1927 60
Christiano Monteiro Machado - Prefeito35 ---

Nota-se que as avenidas Avenida Presidente Antônio Carlos e Avenida Dom Pedro II correspondem
aos antigos locais onde corriam o Córrego da Lagoinha, o Córrego do Pastinho. O local onde foi
construído o complexo viário que liga o centro a essas avenidas corresponde à região onde estes
córregos encontravam com o Ribeirão Arrudas. Com a canalização e pavimentação desses córregos a
partir da década de 1930 e com a construção do complexo viário entre o final dos anos 1970 e os anos
1980, não só os córregos foram cobertos e desapareceram como também a Praça Vaz de Melo, local
de relevante importância para a identidade e história do bairro foi suprimida. Entorno dessas avenidas

35https://leismunicipais.com.br/a/mg/b/belo-horizonte/decreto/1927/2/19/decreto-n-19-1927-desapropria-por-utilidade-

publica-os-terrenos-necessarios-a-abertura-de-uma-avenida-sanitaria-ao-longo-do-corrego-lagoinha-desde-a-rua-formiga-
ate-a-rua-do-ramal-1927-12-27-versao-original (acessada em 31/10/2016)

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se desenvolveram uma ocupação com ênfase nas atividades comerciais ou de uso misto, residencial e
comercial. Nota-se no interior do bairro a predominância da função residencial.

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Avenida sanitária, atual Antonio Carlos em 1941, nas imediações do Mercado da Lagoinha. Fonte: APCBH

61
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Vista parcial de Belo Horizonte do alto da Lagoinha. Ao fundo o bairro floresta e à esquerda o centro da cidade. Data: 1922
e 1925. Fonte: MhAB

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Vista parcial do belo horizonte tomada a partir do bairro da Lagoinha, onde se vêem a praça rio branco, a avenida Afonso
Pena, secretaria de agricultura (fundos) e o centro da cidade. Data: 1927. Fonte: MhAB

62
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Vista parcial do bairro da Lagoinha. Data: 1930. Fonte: MhAB

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Lagoinha, Igreja Nossa Senhora da Conceição, Praça Vaz de Melo, ruas Itapecerica, Além Paraíba e Bonfim, Ribeirão Arrudas, Praça Rui
Barbosa com Feira de Amostras e Avenida Afonso Pena , 1947. Fonte: MhAB.
63
---
Nos anos 1940, principalmente durante o governo de Juscelino Kubitschek, Belo Horizonte passou por
um intenso processo de modernização, com a implementação de diversas obras que ampliaram a infra-
estrutura da cidade. Com a construção do conjunto arquitetônico da Pampulha, houve a necessidade
da expansão das linhas dos bondes e a consequente ampliação das vias e avenidas que ligavam o
centro à região da Pampulha. Sendo assim, foi aberta a Avenida Antonio Carlos e outras vias
importantes que passavam pela região da Lagoinha.

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Abertura da Avenida da Pampulha, atual Antonio Carlos e a implantação dos trilhos dos bondes em frente ao local onde se
edificou o IAPI. 1940. Fonte MHAB

64
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Abertura da Pedreira Prado Lopes para prolongamento da Rua Pedro Lessa. Na fotografia vê-se ao centro, na linha férrea,
um bonde, com um homem pendurado no seu estribo. À esquerda, subindo a rua há uma mulher carregando uma trouxa de

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roupa na cabeça e um homem sobre um cavalo. A abertura da rua, iniciada em 1940, pretendia ligar o bairro da Lagoinha à
Vila Santo André, afim de que por ela fosse possível passar a linha de bondes para os bairros operários. Antes da abertura
da rua, a população da região onde hoje são os bairros Cachoeirinha, Bom Jesus, Santo André, Aparecida, tinha que se

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deslocar até a Lagoinha para pegar os bondes. Em um trecho das obras os serviços tiveram que ser feitos através da rocha

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viva, numa profundidade de 20 metros. A linha de bondes construída tinha a extensão de 1.350 metros. Data: 1942 Fonte:
MhAB.

Ainda nos anos 1940, foi apresentado o projeto do Conjunto IAPI, através de um contrato entre a
Prefeitura, o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários (IAPI) e a Companhia Auxiliar de
Serviços de Administração (CASA). Esse conjunto habitacional veio substituir os projetos de vilas
operárias implementadas em Belo Horizonte nas primeiras décadas do século XX e foi denominado
Bairro Popular.

Na época da implantação do Conjunto IAPI, entre 1940 e 1941, verificamos a construção da Avenida da
Pampulha (atual Antônio Carlos), com 7,5km de extensão, substituindo outra antiga (Rua Manoel Macedo) que
levava ao distrito de Venda Nova. A construção dessa avenida facilitou muito o acesso a Venda Nova e à
Pampulha e favoreceu a ocupação de bairros que margeavam a avenida, principalmente a área da
Cachoeirinha, como veremos mais adiante. A presença dessa via na região reforçou sua importância como local
de passagem de pessoas indo e vindo de um lado a outro da cidade.36

65
---

Projeto do Conjunto IAPI. Fonte: APCBH

36Histórias de bairros [de] Belo Horizonte : Regional Noroeste / coordenadores, Cintia Aparecida Chagas Arreguy, Raphael
Rajão Ribeiro. – Belo Horizonte: APCBH; ACAP-BH, 2008. http://www.pbh.gov.br/historia_bairros/NoroesteCompleto.pdf
(Acesso em outubro/2016)

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Em 1948 iniciaram as obras de construção do Túnel Lagoinha – Concórdia, com o objetivo de ligar
diretamente o centro urbano com o Matadouro e o Horto Florestal, abrangendo assim os bairros da

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Concórdia, Renascença e algumas vilas. A construção do túnel ficou interrompida até o ano de 1959,
sendo retomada apenas nos anos 60 e inaugurada em 13 de maio de 1971. A ligação Lagoinha-
Concórdia passou por uma imensa reformulação e ampliação, na década de 80 e recebeu a
denominação de Túnel Tancredo Neves. Se por um lado essa solução viária contribuiu para o
descongestionamento do trânsito no Bairro Floresta, por outro, facilitou o acesso de veículos, o que
pode ser comprovado pela intensidade do tráfego na esquina das ruas Pitangui e Jacuí. Todos os
cruzamentos com a via férrea, em passagens de nível, nos acessos à Floresta foram substituídos por
passarelas e viadutos.

66
---

Obras do Túnel da Lagoinha. 1968. APCBH.37

37 In.: http://curraldelrei.blogspot.com.br/2015/10/metamorfoses-urbanas-tunel-da-lagoinha.html (Acesso em outubro/2016)

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Construção do complexo viário da Lagoinha. Fonte: MhAB.

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Construção do complexo viário da Lagoinha. Fonte: MhAB.

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Construção do complexo viário da Lagoinha.

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Construção do complexo viário da Lagoinha.

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Vista aérea da região central da cidade. Em primeiro plano vemos parte do complexo viário da Lagoinha, a Estação
Rodoviária, inaugurada em 1971. Em segundo plano o Edifício Mesbla localizado na esquina das avenidas Afonso Pena e
Paraná e outras edificações do Centro. Em terceiro plano a Praça Raul Soares e o Conjunto JK. Data: 1971 e 1977. Fonte:
MhAB.

69
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Vista da Estação Rodoviaria de Belo Horizonte. Inaugurada em 1971, a Rodoviária fica localizada no bairro Centro, onde
antes ficava o prédio da Feira de Amostras que foi demolido. Em primeiro plano o estacionamento da rodoviária com alguns
veículos. Ao fundo observa-se os bairros Lagoinha e Bofim. Data: 1980. Fonte: MhAB.

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AS TRANSFORMAÇÕES URBANÍSTICAS EM DOCUMENTOS OFICIAIS

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Uma boa maneira de perceber as diversas transformações ocorridas na região da Lagoinha no decorrer

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do tempo, é analisar as plantas cadastrais produzidas pelo poder municipal de Belo Horizonte. Para
cumprir esse fim, é interessante visualizar esses documentos em suas versões produzidas nos anos
1920, 1928/29 e 1942. A seguir, as plantas de 1920 e 1928/29.

70
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Ex-Colônia Carlos Prates, Planta cadastral 1920. Fonte: PANORAMA de Belo Horizonte; Atlas Histórico. Belo Horizonte:
FJP. 1997. p.103

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Parte da Ex-Colônia Carlos Prates na Planta Cadastral de 1928/1929. Fonte: APCBH

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Comparando as plantas cadastrais de 1920 e de 1928/29 observa-se um adensamento populacional


com a subdivisão de lotes e a construção de grande número de edificações concentradas às margens

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das principais vias. Nesse sentido, destacam-se as regiões entre o Cemitério e a rua Lambari, entre o
Cemitério e a avenida Dom Pedro II, às margens das ruas Além Paraíba, Itapecerica, Bonfim, Praça
Vaz de Melo, Avenida Mauá e ruas Peçanha e Patrocínio. Outra observação é a existência de muitos
espaços vazios nos lotes entre estas ruas. Verificando esta última observação, comparando os mapas,
as curvas de nível e a partir das vistorias realizadas pela equipe da DIPC, foi verificado que esses
espaços vazios correspondem a áreas de grandes inclinações do terreno, o que relaciona a topografia
às formas construtivas e recursos disponíveis naquele período e região.

A planta cadastral seguinte, de 1942, foi produzida durante a administração de Juscelino Kubitschek.
Nota-se, no início dos anos 1940, a presença de uma vila na porção do Carlos Prates, uma maior
concentração de edificações próximo à Praça Vaz de Melo e rua Paquequer, um maior preenchimento
dos espaços vazios, mas com esses espaços ainda se destacando. Nesta planta já aparece a avenida
sanitária Presidente Antônio Carlos entre as ruas Diamantina e Itapecerica.

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Planta Cadastral de Belo Horizonte, 1942 (JK)

A presença do cemitério e da vida boêmia na região podem ter influenciado tanto a ocupação da
região, quanto as formas de circulação no bairro. Duas possíveis comprovações dessa hipótese foram 73
---
o desenvolvimento de atividades relacionadas aos sepultamentos, como marmorarias e floriculturas,
que se instalaram nas proximidades do cemitério, e as lendas e mitos criados pelo imaginário popular,
como a Loura do Bonfim, por exemplo, podem ter influenciado e diferenciado a forma de circulação na
região em horário noturno.

A complexidade da Lagoinha está não só nas formas e estilos das edificações mas também nas formas
de ocupação, na sociabilidade estabelecida por décadas e gerações, nos lugares da memória, nas
formas de morar, de viver, de trabalhar, nos trajetos, nos costumes, na forma de integração com outras
regiões da cidade, no sentimento de pertencimento ao mesmo tempo que as vivências geram
identificação pessoal e críticas à relação com a administração pública, também nas questões que
envolvem renovação e preservação.

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5. PERÍMETRO DO CONJUNTO URBANO

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Analisar um perímetro urbano com o intuito de identificar os elementos de força que lhe atribui um

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caráter específico de organização, com valores, signos e modos de vida próprio, depende em grande
medida da delimitação espacial da região a ser estudada. Um recorte muito restrito pode, por exemplo,
deixar de fora aspectos importantes para a compreensão da dinâmica do perímetro escolhido; já um
recorte muito amplo pode, eventualmente, abarcar territórios tão distintos entre si que impossibilite o
reconhecimento de diferentes nuances de cada região. O presente estudo não foge a este desafio e,
portanto, a definição de um perímetro ao Conjunto Urbano proposto apresentou-se como uma das
primeiras preocupações.

De acordo com os estudos anteriormente realizados a respeito da Lagoinha, notadamente o Inventário


do Patrimônio Urbano e Cultural de Belo Horizonte – IPUC/BH e a Área de Diretrizes Especiais – ADE
da Lagoinha, constatamos que os limites territoriais apresentavam algumas diferenças.

74
---

Perímetro de estudo do IPCU/BH Perímetro da ADE - Lagoinha

De forma geral, ambas compreendem um dos trechos mais conhecidos do bairro Lagoinha, isto é, o
perímetro formado entre as ruas Além Paraíba, Itapecerica, Turvo e Formiga. O inventário realizado
pelo IPUC/BH, em específico, estendia sua área à leste da Av. Antônio Carlos, em direção ao bairro
Colégio Batista, completando toda a subdivisão administrativa do bairro Lagoinha até a Rua Pitangui.

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Já no perímetro da ADE - Lagoinha optou-se por restringir seu limite até a própria Av. Antônio Carlos,
excluindo, portanto, um trecho do estudo anterior. A parte norte do perímetro de ambos os estudos

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apresenta muita similaridade, apresentando pouca variação apenas entre as ruas Pedro Lessa e
Evaristo da Veiga. Nas porções oeste e sul, no entanto, ocorre uma distinção mais significativa. Na
primeira, o IPCU/BH estabelece a rua Jaguari como limite, inserindo o Cemitério do Bonfim em seu
perímetro; já a ADE - Lagoinha define a rua Mariana como ponto de interrupção de sua área, excluindo,
portanto, o Cemitério de seu perímetro. A parte sul, que também apresenta considerável variação, é
composta por parte do bairro Carlos Prates na definição do IPCU/BH, entre o Elevado Dona Helena
Greco, a linha férrea e a Av. Nossa Senhora de Fátima; ao passo que a ADE – Lagoinha termina na Av.
Dom Pedro II até sua intersecção com a Av. Antônio Carlos.

Observando as áreas descritas, podemos constatar que ambos os perímetros coincidiam em abarcar
um trecho delimitado entre a Rua Bonfim e Av. Antônio Carlos como objeto de estudo. Consideramos
que tal escolha não tenha sido por acaso, pois é justamente nessa região que se encontra uma das
porções mais tradicionais e emblemáticas do bairro Lagoinha. Conhecida não só pelos moradores das
redondezas como por boa parte dos belo-horizontinos, este local é muito identificado como berço e
centro do bairro. Caracterizado, como pudemos ver no capítulo anterior, por uma ocupação anterior até
a da própria Capital, representa um modo de vida específico do bairro. Comparativamente, este seria,
75
portanto, o espaço central de ambos os estudos, o elemento polarizador que permitira identificar a ---
própria região. A exclusão do trecho leste da Av. Antônio Carlos, pela ADE – Lagoinha, provavelmente
deve-se ao fato de que os sucessivos alargamentos desta avenida38 constituíram uma espécie de
barreira entre essas duas porções, interrompendo uma maior coesão entre estes espaços. Avaliamos
que na época do estudo realizado pelo IPCU/BH tal “barreira” não se apresentava de forma tão
marcante e, por isso, concluiu-se pela relevância da inclusão desta porção.

Um olhar mais atento, poderia chamar a atenção para outro elemento de força que está dentro dos
limites do IPCU/BH e fora do perímetro da ADE - Lagoinha: o Cemitério do Bonfim. Sem dúvida, este

38 As intervenções de alargamento, desapropriação e implantação do BRT na Avenida Antônio Carlos, em 2013, talvez
tenham sido as mais contundentes para uma segmentação do bairro em duas partes, leste e oeste. Apesar das
semelhanças no processo de ocupação, a partir desta última obra, o trecho leste parece incorporar paulatinamente uma
dinâmica mais próxima do bairro Colégio Bastista, ao passo que se distancia de características do bairro Lagoinha.

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local é bastante emblemático não apenas para o bairro Bonfim, como para a própria cidade. Construído
pela Comissão Construtora fora dos limites urbanos definidos pela Avenida do Contorno, este

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equipamento assumiu certa ambivalência desde sua inauguração por se referir ao “lado de dentro”
estando do “lado de fora”39. Devido a sua relevância, o Cemitério foi incluído no perímetro do IPCU/BH
“(...) pelas suas proporções e por ser o primeiro cemitério da cidade, marca a descontinuidade do
tecido urbano, porém sua história está extremamente imbricada à história do bairro e da cidade, o que
faz dele, ao mesmo tempo, um limite e uma estrutura importante na configuração da Lagoinha”. (P. 36)
Nesse sentido, o Inventário realizado pelo IPCU/BH considera o Cemitério como um elemento indutor
não apenas no seu entorno imediato, mas também de uma macrorregião, um espaço mais difuso, no
qual o bairro Lagoinha faz parte. Já o perímetro da ADE – Lagoinha, ao excluir o Cemitério, concentra-
se de forma mais específica em um trecho mais tradicional do bairro e indica uma interpretação que
distingue de forma mais nítida os bairros Bonfim e Lagoinha e seus respectivos modos de ocupação.

Outro trecho que apresenta discrepância entre os dois perímetros observados é a porção sul. No
estudo do IPCU/BH, ao sul da Av. Dom Pedro II está inserida toda parte do bairro Carlos Prates
circundado pela linha férrea, entre o Complexo da Lagoinha e o Elevado Dona Helena Greco, ao passo
que a ADE – Lagoinha termina justamente na Av. Dom Pedro II. Podemos constatar, mais uma vez,
uma maior abrangência territorial por parte da pesquisa elaborada pelo IPCU/BH que, apesar de se
76
concentrar no bairro Lagoinha, ultrapassa os limites administrativos do bairro para incorporar outros ---
locais. Ainda que o resultado de sua análise estabeleça este trecho sul como uma “subárea com perfil
indefinido”, sua inserção no perímetro estudado permitiu identificar elementos tanto de atração quanto
de repulsão, que moldam características próprias de cada região, ao mesmo tempo que constroem
dinâmicas compartilhadas. Dessa forma, a força que parecia advir de um enfoque concentrado em uma
área menor, como a proposta da ADE – Lagoinha, acaba por revelar dificuldades no momento de
interpretar as diferentes influências que a região absorve de seu entorno.

39 Como vimos no capítulo anterior, de certa maneira o Cemitério do Bonfim pertence do lado de dentro da cidade, pois
apesar de situar-se na região suburbana foi construído como reflexo da própria organização da Nova Capital, além de
constituir-se como o cemitério oficial. Ao mesmo tempo pertence ao lado de fora, pois foi implantado ao largo da adequada
infraestrutura dos limites urbanos, em meio a chácaras e fazendas.

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Como a parte norte é quase idêntica entre no perímetro de ambos os estudos, concluímos, de maneira
geral, que a amplitude da área proposta pelo IPCU/BH tem como mérito a análise de possíveis inter-

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relações dos bairros Lagoinha, Bonfim e Carlos Prates, propiciando uma perspectiva interessante na
identificação de elementos polarizadores e a forma como eles dialogam entre si. A influência do
Cemitério, nesse sentido, foi um dos fatores que mais nos chamou a atenção para a potencialidade de
uma investigação mais ampla. Restava, então, a próxima etapa para confrontar nossas suposições e
definir os limites precisos da área de estudo.

Assim, foi realizada uma pré análise da paisagem urbana com a intenção de elencar os principais
pontos de referência da região e até onde as formas de ocupação estabelecidas se assemelhavam, se
imbricavam e se diferenciavam. Nesta investigação, observamos que o trecho mais tradicional do bairro
Lagoinha, definido pelas ruas Itapecerica, Além Paraíba e Bonfim, apresentava certa homogeneidade
tanto nas ocupações quanto na coesão entre os moradores. Tal suposição era de se esperar, dada à
relevância que esse núcleo assumiu nos perímetros tanto do IPCU/BH quanto da ADE – Lagoinha,
como descrevemos acima. A diferenciação surgiu ao constatarmos que a Av. Antônio Carlos marcava
uma espécie de limite deste trecho, interrompendo uma interface mais próxima com a porção leste.
Esta “barreira” se estendia em todo eixo norte-sul até a Praça do Peixe, quando, sob influência da Av.
Dom Pedro II, conformava outro tipo de espaço. Ali, o intenso comércio de serviços indicava uma maior
77
permeabilidade entre os bairros Bonfim e Carlos Prates, tornando menos evidente uma distinção das ---
duas regiões. Ainda que as avenidas Dom Pedro II e Nossa Senhora de Fátima sejam vias de intenso
tráfego de veículos, ambas distinguiam-se da Av. Antônio Carlos por incorporar, aparentemente, uma
interface maior com os moradores. Identificamos, portanto, que esta referência se estendia também em
todo trecho sul da Avenida Dom Pedro II em direção ao bairro Carlos Prates e só era interrompido à
medida que avançamos na direção oposta, para a parte interna do bairro Bonfim. Nesta região, o
Cemitério se mostrou como o principal elemento, funcionando como ponto de referência, além de
ocupar parte significativa do bairro. Os galpões e o comércio majoritariamente de serviços em torno da
Av. Dom Pedro II são substituídos por residências de um pavimento à medida que seguimos para a
porção norte do bairro Bonfim, sem contudo, implicar em uma organização distinta do próprio bairro.
Mesmo em seu limite mais ao norte o espaço ainda é fortemente marcado pelo Cemitério e pela

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dinâmica de toda região. Esta coesão só começa a se alterar na Praça Quinze de Junho, mais ao
norte, e em toda a extensão da Rua Bonfim. Esses dois pontos parecem indicar uma transição de

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locais que possuem uma identidade própria e ao mesmo tempo compartilhada. No primeiro nota-se a
influência da Vila Nossa Senhora dos Passos e do bairro Lagoinha, no segundo o diálogo entre os
bairros Bonfim e Lagoinha.

A partir desta análise, consideramos que ocorria uma mudança suficientemente significativa no modo
de ocupação atual da região, apenas na parte oeste da Av. Dom Pedro II, em direção ao bairro Carlos
Prates, na parte leste da Av. Antônio Carlos, na parte sul depois da linha férrea, em direção ao centro
da cidade e o bairro Barro Preto, e na parte norte nos limites administrativos dos bairros Bonfim e
Lagoinha. Entendemos, portanto, que todo o bairro Bonfim, a Vila Nossa Senhora dos Passos, trecho
do bairro Carlos Prates e o bairro Lagoinha até a Av. Antônio Carlos, compunham uma interação que
caracterizava toda essa região. Apesar de existirem núcleos com especificidades próprias dentro desse
limite, que atribui um sentido mais preciso a determinados locais, são formados também pela relação
que estabelecem entre si. Portanto, apresentamos o perímetro de estudo do Conjunto Urbano em
análise, no intuito de compreender quais construções são portadoras de significado cultural para a
região, quais espaços são considerados importantes para a preservação de práticas culturais e modos
de vida característicos de sua comunidade e de quais elementos contribuem para definir a identidade
78
local. ---

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Perímetro de proteção do Conjunto Urbano Bairros Lagoinha e Bonfim deliberado pelo CDPCM-BH

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6. CARACTERIZAÇÃO DO CONJUNTO URBANO

E
Conforme apontamos no capítulo anterior, procuramos delimitar um perímetro urbano portador de uma

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dinâmica comum, ainda que não se apresente de forma homogênea. No caso do presente Conjunto
Urbano, a heterogeneidade de certos locais não parecia indicar uma ruptura na paisagem, ao contrário,
dava a impressão de formar uma imagem que somente poderia ser adequadamente visualizada com o
encaixe de cada uma dessas peças.

Para compreender os usos, os costumes, os deslocamentos, as funções, os referenciais, a forma como


cada trecho é percebido, realizamos entrevistas com moradores da região. Procuramos escolher nossa
amostragem da forma mais próxima possível do perfil geral dos residentes. Apesar de não termos
acesso a dados oficiais atualizados sobre, por exemplo, idade, escolaridade ou renda dos moradores,
obtivemos indicadores do censo realizado pelo IBGE, no ano de 2010, setorizados por bairros 40. De
forma geral, podemos constatar, a partir de tal fonte, que a população residente no perímetro em
estudo é composta majoritariamente por pessoas acima de 55 anos de idade, ensino médio completo e
em proporção similar de homens e mulheres. A partir destes indicadores, procuramos moradores que
se dispusessem a conceder entrevista para a equipe da DIPC, no intuito de compreender a percepção
que eles fazem da região. Foram realizadas nove entrevistas, todas com pessoas residentes na região,
dos quais apenas um residia entre seis e dez anos e todos os outros por mais de vinte anos. De forma 80
similar à proporção de homens x mulheres estabelecido pelo censo do IBGE, o grupo foi constituído por ---

cinco homens e quatro mulheres. A faixa etária dos entrevistados também acompanhou de forma
próxima a distribuição geral de idade na região, de acordo com o IBGE, constituída em sua maioria por
pessoas com mais de quarenta anos de idade, com maior concentração na faixa acima dos sessenta
anos de idade. O único fator que apresentou diferença com relação ao perfil levantado pelo IBGE foi a
escolaridade. Enquanto o censo de 2010 apontou a preponderância do ensino médio completo, nossa
amostragem foi constituída em sua maioria por ensino superior completo, sendo uma pessoa com
ensino fundamental completo, uma com ensino superior incompleto e sete com ensino superior
completo. O perfil geral dos entrevistados pode ser conferido conforme o quadro abaixo:

40 Os dados utilizados foram obtidos nos endereços eletrônicos do IBGE e da Prefeitura de Belo Horizonte:
http://www.censo2010.ibge.gov.br/sinopseporsetores/ e http://portalpbh.pbh.gov.br/. Acesso em setembro de 2016.

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Gênero Faixa etária

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de 26 a 35
11% anos
44% Masculino 44% de 36 a 50
56% Feminino anos
45%
acima de 66
anos

Escolaridade Tempo de moradia

11% superior
completo 22% 6 a 10 anos
11%
fundamental
completo mais de 20
78% superior 78% anos
incompleto

81
---
Profissão
Profissional
11% Liberal

34% Profissional
22% autônomo
Emprego
formal
33% ocupação
informal

As entrevistas foram divididas em duas etapas. Na primeira, após explicar o intuito da atividade e o
estudo em andamento pela DIPC, pedimos que o entrevistado desenhasse em uma folha em branco

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como vê o bairro em que vive41. Este exercício tinha como objetivo identificar as representações que o
entrevistado fazia do lugar, a preponderância que determinado local ou objeto possuía em relação aos

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outros e os signos que eram atribuídos àquele espaço. Diferente da fala, onde por vezes o orador já
trás uma linha de raciocínio pronta e carrega certas nuances nas palavras que nem sempre é possível
detectar, este “mapa mental” procurava alcançar a percepção mais imediata do entrevistado. Após o
desenho, o entrevistador pedia alguns comentários sobre o que foi representado e em seguida, de
forma complementar, aplicava um questionário já previamente elaborado42.

Essa ferramenta se mostrou muito útil tanto para referendar quanto para reconsiderar algumas
avaliações que fizemos do espaço em estudo. Um dos aspectos mais marcantes durante a pesquisa foi
a própria delimitação do Conjunto Urbano. Sem conhecimento do exato perímetro proposto pela DIPC,
os entrevistados foram praticamente unânimes em estipular as avenidas Dom Pedro II e Antônio Carlos
como dois limites inequívocos da região. De fato, ambas as avenidas se destacam na paisagem local.
Construídas em cima do leito de rios, sua inauguração e posteriores obras viárias tiveram como
objetivo torná-las aptas a receber um acentuado fluxo de veículos, além de absorver o eixo de
deslocamento leste-oeste e norte-sul do transporte público coletivo de Belo Horizonte. A constante e
maciça presença deste tráfego afastou moradores e comerciantes estabelecidos ali antigamente,
dando lugar à função primordialmente de corredor de deslocamento, com destaque para a Av. Antônio
82
Carlos. Segundo a quase totalidade dos entrevistados, a construção destas duas avenidas ergueu uma ---
“barreira” junto ao bairro, privilegiando o fluxo de veículos em toda sua extensão e rompendo, assim, a
interação do bairro com os arredores. A Av. Antônio Carlos, nesse sentido, constitui-se como o trecho
mais crítico, pois além de “separar” a porção leste do bairro Lagoinha deixou um “espaço vazio”,
“abandonado”, “sem atividades”, “desprovido de vida”, como definido pelos entrevistados.

41 Esta proposta baseia-se na perspectiva de construção do “mapa mental”, conforme apresentado no capítulo Referências
Metodológicas.
42 Ver Anexo I.

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Trecho da Av. Antônio Carlos que forma o Complexo da Lagoinha Fonte: DIPC

83
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Início da Av. Dom Pedro II próximo à junção com a Praça do Peixe. Fonte: DIPC

Tal situação só não se apresenta de forma mais crítica do que o conjunto de viadutos que forma o
Complexo da Lagoinha e a passarela de pedestres que liga o bairro ao centro. Neste local, onde
antigamente situava-se a Praça Vaz de Melo, conhecida pela sua boemia e movimentado comércio,
está implantado uma ampla rede viária que se constituiu como o principal corredor de deslocamento do
eixo norte-sul da cidade. As edificações ali antes existentes foram demolidas, transformando o lugar em
um espaço exclusivo para veículos e inacessível para os pedestres. A única forma de acesso ao centro
para quem efetua seu deslocamento a pé é por meio de uma passarela elevada acima das avenidas
Nossa Senhora de Fátima e Antônio Carlos, que dá acesso à estação de metro Lagoinha, à Rodoviária
e à Rua 21 de Abril. Conforme relatado pelos entrevistados, a substituição da Praça Vaz de Melo pelo

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Complexo da Lagoinha acarretou “uma ruptura e um isolamento do bairro”, restringindo o acesso dos
pedestres a uma única passarela. A Praça Vaz de Melo estabelecia uma permeabilidade entre o bairro

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e o resto da cidade, um elemento de ligação com bastante vitalidade. Se antigamente era possível
fazer sua própria rota, escolher o caminho, com o Complexo da Lagoinha o pedestre é obrigado a fazer
um único percurso pré-definido. Essa única ligação foi descrita pelos entrevistados como “suja”,
“escura” e “sem segurança”, fazendo com que as pessoas a evitem ou a usem de forma parcial. Com
isso, ainda de acordo com os entrevistados, a proximidade com o centro se tornou mais distantes e
surgiu uma “barreira” que dificulta o deslocamento. Principalmente à noite, este trecho remete uma
forte sensação de insegurança que, aliada a sujeira, torna esta uma região degradada.

Você tem medo da passarela, medo de ser atacado. Ela é muito suja, muito mal cheiro. Então
assim, ficou aquele bairro, no nosso modo de pensar, isolado. (...) Eu, por exemplo, não vou mais
pra cidade a pé. Ia demais, só ia e vinha para a cidade a pé43.

84
---

Imagem aérea do conjunto de pistas de rolamento, viadutos e do túnel que forma o Complexo da
Lagoinha. Fonte: Google Maps

43 Trecho de entrevista concedida à equipe da DIPC por um morador da região.

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Um resultado muito interessante da constatação dessas “barreiras” foi a ambivalência que a região
assumiu com relação ao restante da cidade. Localizado ao lado do centro da capital mineira, todo este

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espaço sempre teve uma forte influência da área central. Até a demolição da Praça Vaz de Melo, o
bairro, e a Praça em particular, exercia a função de um centro expandido, gravitando em torno do setor
comercial pertencente à Av. do Contorno. Quase na extensão da Av. Afonso Pena, os bairros Lagoinha
e Bonfim constituíam uma espécie de portal de passagem do centro para a zona norte. Esse vínculo
caracterizou a região como um lugar “próximo”, a poucos minutos de caminha das principais redes de
serviço, transporte, lazer e equipamentos urbanos de Belo Horizonte. A partir do surgimento da
“barreira” do Complexo da Lagoinha esta proximidade foi modificada. Apesar das coordenas
geográficas permanecerem inalteradas, tais obras viárias provocaram um “afastamento”, como se todo
território tivesse se deslocado alguns metros mais adiante. Tal fenômeno pode ser percebido nas
entrelinhas dos relatos de todos os entrevistados. De forma geral, primeiramente era citado o
Complexo da Lagoinha como responsável pela divisão dos bairros com o centro para, em seguida,
mencionar a proximidade com o centro como uma vantagem da região. Essa dualidade se repetiu em
diversos momentos. Apenas na ocasião em que o entrevistado era perguntado se então considerava a
região separada do restante da cidade, a resposta vinha com certa surpresa ao constatar que sim, os
bairros eram “distantes”. Ainda assim, em boa parte das entrevistas, posteriormente era mencionado
85
novamente que estar próximo do centro era um dos fatores positivos da região. ---
Este “cercamento” dos bairros Lagoinha e Bonfim constitui um elemento representativo daquilo que K.
Lynch classifica como limite, isto é, uma fronteira, uma quebra de continuidade. O fechamento
promovido pelo emaranhado de pistas de rolamento, viadutos e pequenas praças de difícil acesso
criaram um espaço urbano quase exclusivo de veículos. As edificações voltadas para as avenidas Dom
Pedro II e Antônio Carlos são, em sua maioria, de atividades comerciais e de serviço, reforçando a
característica de corredor de deslocamento dessas vias. Com isso, os quarteirões situados do “lado de
fora”, do “outro lado” da avenida, deixam de se relacionar de forma mais estreita com os do “lado de
dentro”, assumindo características distintas entre uma e outra região. O movimento refratário que tais
barreiras provocam, no entanto, se dá de forma mais abruta na Av. Antônio Carlos. Neste trecho, a
cisão entre a porção leste e oeste do bairro Lagoinha se mostra mais significativo do que uma

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separação entre a parte do bairro Carlos Prates com o bairro Bonfim. Além do número
comparativamente maior de residências na Av. Dom Pedro II, as atividades comerciais exercidas ao

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longo da via apresenta semelhanças tanto em sua porção sul quanto norte. A maior permeabilidade
proporcionada pelos usos em comum dos dois bairros ainda foi reforçada pela praça localizada na
confluência das ruas Patrocínio e Peçanha, citada por dois entrevistados que se referiram ao local
como “mirante”. Entendemos, portanto, que essa diferenciação caracteriza a Av. Antônio Carlos
também como um pórtico, um espaço fronteiriço que não se situa nem do “lado de cá” nem do “de lá” 44.

86
---
Representação das categorias de limite e pórtico no Conjunto Urbano. Do lado esquerdo os limites formados pelas avenidas
Dom Pedro II e Antônio Carlos. Do lado direito o pórtico formado pela Av. Antônio Carlos.

Ao constatar a influência que esses limites e esse pórtico exercem no Conjunto Urbano, pudemos
observar outros desdobramentos. Por constituir uma “barreira”, essas avenidas também assumem uma
função externa à região, vinculada muito mais aos deslocamentos fora dos bairros do que os de dentro.
Devido à interrupção que as caracteriza, essas vias são pouco usadas para a circulação intra-bairro.
Na verdade, elas são importantes para acessar a região, mas uma vez dentro, elas são pouco
utilizadas. Devido à frequente descontinuidade das ruas internas dos três bairros, que em boa parte
acompanha a topografia acidentada do terreno, cinco ruas se destacam como significativas para a
circulação no perímetro estudado: as ruas Itapecerica, Além Paraíba, Bonfim, Patrocínio e Peçanha. As

44 Ver capítulo Referências Metodológicas.

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três primeiras estão inseridas no bairro Lagoinha, sendo que a rua Bonfim constitui-se como uma
transição entre o bairro Bonfim e Lagoinha. As duas últimas pertencem ao bairro Carlos Prates e são

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as únicas opções de acesso à porção mais ao sul. Além da importância no deslocamento para diversos
pontos de intersecção, tais ruas possuem usos bastante diversificados que lhes confere ainda maior
relevância. Ao longo desses eixos estão concentrados muitos elementos de referência para os
moradores, como comércio, igreja, escola, etc.

87
---

Exemplo de mapa mental produzido pelos entrevistados, onde a região é representada como um “bico”,
isolado do restante da cidade pelos limites das avenidas Dom Pedro II e Antônio Carlos, e internamente
estruturado em torno das ruas Itapecerica, Além Paraíba e Bonfim.

A rua Além Paraíba está situada entre as ruas Bonfim e Itapecerica, com início na pequena praça
formada pela passarela de pedestres que liga o bairro ao centro. Possui um aclive em direção à Praça
Quinze de Junho, onde se encontra o ponto topograficamente mais alto do bairro, e também em
relação às ruas paralelas, constituindo-se como o trecho de maior elevação do bairro. A rua é

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composta em sua maioria por edificações de até um pavimento, com raras exceções de dois
pavimentos e apenas duas edificações com três pavimentos. Os imóveis estão implantados no

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alinhamento do lote e, aliado à uma volumetria semelhante em muitos casos, propiciam uma
interessante continuidade visual em toda a rua. A ocupação é diversificada, variando entre
estabelecimentos comerciais, residenciais e algumas lojas de serviços. O passeio é bastante estreito
com poucos trechos arborizados, o que dificulta o caminhar, sobretudo nos dias mais quentes. Em
função da pequena largura da pista de rolamento, o trânsito, em geral, é muito intenso até sua primeira
metade, dificultado ainda mais pela via de mão dupla e pela passagem de uma linha de ônibus urbano.
Próximo à Praça Quinze de Junho, a ampla vista da Serra do Curral compõe um dos elementos mais
emblemáticos no horizonte, sendo ligeiramente encoberta à medida que descemos pela rua. A
presença da torre do Santuário Arquidiocesano Nossa Senhora da Conceição se destaca em toda sua
extensão como um elemento de referência. Para muitos entrevistados, a Além Paraíba é a principal rua
da região, a mais “representativa”. Descrita como “a menina dos olhos”, assume uma referência
inclusive geográfica por ocupar a porção central do bairro. Local de moradia de famílias tradicionais da
região, alguns desses imóveis foram citados nas entrevistas, ainda que de maneira difusa, como
emblemáticos, o que caracteriza a importância que estes exercem na composição da paisagem. Dois
entrevistados frisaram a Serra do Curral como um dos aspectos que mais chamam a atenção ao
88
descer a rua. Alguns pontos comerciais como padaria, pequenas oficinas, bares e restaurantes, ---
também foram lembrados pelos entrevistados como ponto de referência, principalmente na descrição
de alguns percursos. Contudo, o elemento mais mencionado foi o Santuário Nossa Senhora da
Conceição. Citado por oito dos nove entrevistados como uma das construções mais representativas de
toda região, o Santuário parece desempenhar um papel central no imaginário da comunidade,
estabelecendo-se como símbolo e parâmetro de orientação. Na maioria das entrevistas a rua foi
descrita como agradável, apesar do passeio estreito e do tráfego desorganizado de veículos. Ainda de
acordo com boa parte dos entrevistados, a sensação de perigo aumenta à medida que se aproxima do
seu início, entre o Santuário e a passarela, tornando este um trecho a ser evitado, principalmente
durante a noite.

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À esquerda início da rua Além Paraíba, com destaque para a torre do Santuário. À direita final da rua Além ---
Paraíba, com destaque para a vista da Serra do Curral. Fonte: DIPC

A rua Bonfim inicia-se na Praça do Peixe, próxima a rua Além Paraíba, e termina no Cemitério do
Bonfim. Principal via de acesso ao Cemitério, a rua possui um traçado sinuoso, adaptado à topografia
acidentada do terreno que forma aclives na porção mais ao norte e declives na porção mais ao sul,
mas desenvolve-se de forma plana em toda sua extensão. É composta por edificações de até quatro
pavimentos, sendo a maioria de um ou dois pavimentos. Possui uso tanto residencial quanto comercial,
sendo que este último assume maior relevância principalmente em seu trecho inicial onde estão
localizadas algumas peixarias. Via de mão dupla, o tráfego de veículos ocorre de forma um pouco mais
moderada do que na rua Além Paraíba. Os passeios também são pouco arborizados, porém mais
largos do que os da rua Além Paraíba, tornando-a uma rua mais adequada para caminhar. De acordo

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com as entrevistas, esta rua foi descrita, em geral, com bastante apreço pelos moradores. A presença
de bares ao longo da via foi citada por dois entrevistados como um dos motivos que torna essa rua

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uma certa “convergência de pessoas”. Assim como na rua Além Paraíba, foram lembradas muitas
residências de famílias antigas do bairro, caracterizando-as também como elementos significativos na
paisagem. A menção de tais edificações, constituídas por uma arquitetura eclética e situadas no
começo da rua, próximo às peixarias, era muitas vezes vinculada ao período de formação e
crescimento da região, no qual este trecho ficou conhecido pela boemia e prostituição, principalmente
na rua Paquequer. Esta porção da rua Bonfim, no entanto, foi apontada praticamente por unanimidade
dos entrevistados como uma das piores regiões. Se o trecho próximo ao cemitério foi descrito como um
“bom lugar”, “tranquilo”, “seguro” e “bom de andar”, a região próxima à Praça do Peixe já evocava
insegurança e medo. Entre os fatores apontados para justificar essa sensação, os mais frequentes
foram a grande quantidade de imóveis invadidos, a sujeira e a constante presença de moradores de
rua. Para apenas um entrevistado o trecho inicial da rua se apresentava com o mais interessante, para
os outros oito, o Cemitério foi evocado como elemento de qualificação do entorno. Descrito pelos
entrevistados como “bonito”, “maravilhoso” e “esplendoroso”, o Cemitério se mostrou de forte
significado para os moradores, contribuindo inclusive para uma percepção mais agradável do seu
entorno.
90
---

Início da rua Bonfim, com destaque para as peixarias. Fonte: DIPC

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Final da rua Bonfim, próximo ao Cemitério do Bonfim. Fonte: DIPC
A Rua Itapecerica possui um traçado ligeiramente entrecortado, com visadas intermitentes do
alinhamento montanhoso da Serra do Curral. Possui pista de rolamento asfaltada e estreita, com
tráfego de veículos relativamente intenso. A primeira porção da rua, próxima à Av. Antônio Carlos e rua
Além Paraíba, apresenta-se como um caminho acanhado em razão da presença da alça do viaduto
que se eleva sobre parte da via, reduzindo sua largura. Esse primeiro trecho é dominado por edifícios
bastante deteriorados, exemplares art déco dos anos 1940, com dois pavimentos, balcões no segundo
pavimento e lojas no primeiro, voltadas para o passeio. Os trechos seguintes da via são circundados 91
por edificações de um ou dois pavimentos. Grandes galpões, recentemente construídos, servem para ---
depósito de ferro e sucatas, sendo ainda intercalados por algumas edificações que remetem à imagem
tradicional do bairro. Muitas desses imóveis possuem uma arquitetura referente ao início do século XX,
marcado pelo primeiro ecletismo de Belo Horizonte, mas apresentando também exemplares art déco,
protomodernistas ou modernistas com feição popular. Um número significativo de edificações, no
entanto, apresenta-se em estado de quase ruína, ou com expressivas descaracterizações. A porção
intermediária, entre as ruas Turvo e Jequeri, é marcada por imóveis de até três pavimentos, a maioria
de uso comercial, misto e institucional, e um edifício de sete pavimentos que interrompe a continuidade
altimétrica dos dois lados da rua. Quatro edificações referenciadas ao primeiro ecletismo de Belo
Horizonte se destacam na paisagem formada por diversas construções ecléticas e art déco. A parte
final da via, a partir da rua Turvo, se conforma como uma das partes da bifurcação que abraça a Vila

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Senhor dos Passos, com calçadas estreitas e ruas movimentadas, conformando uma ambiência com
vitalidade urbana e forte comércio, em edificações que conformam blocos compactos. Delimitada pelo

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pórtico representado por algumas edificações de três e mais pavimentos nos dois lados da via,
apresenta uma sequência de edificações ecléticas e art déco em um dos lados da pracinha localizada
no final da rua, que confere um traço característico ao lugar. De acordo com o relato dos entrevistados,
a rua Itapecerica apresenta uma dicotomia muito nítida no imaginário da comunidade. Apesar de
possuir forte referência devido à presença de importantes construções ecléticas da primeira metade do
século XX, a via é descrita como “abandona”, “insegura” e “ameaçadora”, principalmente durante a
noite. Considerada pior que as ruas Além Paraíba e Bonfim, um único entrevistado considerou a rua
Itapecerica um local agradável para caminhar, porém, apenas durante o dia. A maioria dos outros
entrevistados definiu a rua como lugar pouco atraente, desagradável de caminhar, com um comércio de
“baixa qualidade” devido à presença de muitos depósitos de ferro velho, sobretudo em seu trecho
inicial. A presença dos antiquários, das lojas de móveis antigos e do Colégio Silviano Brandão, foi
citado por todos os entrevistados como um aspecto positivo, mas a sensação de degradação sentida
ao longo da via parece se sobressair nos relatos. A palavra “abandono” foi usada por seis entrevistados
como a melhor definição da rua, o que reforça uma percepção majoritariamente de degradação por
parte da comunidade. Apesar da situação descrita como de abandono, muitos entrevistados frisaram a
92
importância desta rua. Todos os relatos, aliás, apontaram que esta via possui uma história muito ---
significativa, um lugar cheio de memória, que foi negligenciado, mas que deveria ser “revivido”. Definida
por um dos entrevistados como “instigante”, a Itapecerica ainda contém uma representatividade para o
bairro, mas muito circunscrito ao passado. Trata-se de uma via que está transformando sua identidade
muito rapidamente, à medida que são implementadas mudanças em sua ocupação. A partir do relato
dos entrevistados, é durante a noite que os aspectos negativos se fazem presente de forma mais
intensa. Oito entrevistados disseram que evitam a todo custo passar por ela a noite, apenas um disse
que passa, porém sentindo-se inseguro. Do comércio efervescente durante o dia, a noite a rua se
transforma em um local ocupado por moradores de rua e usuários de drogas. Esta condição, aliada a
parca iluminação da via, caracteriza-a como um local ameaçador, vinculado ao comércio de drogas.
Juntamente com o conjunto de edificações ecléticas, o Colégio Silviano Brandão foi destacado como

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um dos elementos mais simbólicos dessa região. Mencionado pela maioria dos entrevistados, esse
espaço foi descrito quase como uma analogia da própria rua. Considerado antigamente como um dos

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melhores e mais prestigiados colégios de Minas Gerais, atualmente está em decadência, assumindo
ares melancólicos.

À esquerda foto do início da rua Itapecerica. Acima foto de


seu trecho final, próximo ao Hospital Odilon Berehns. 93
Fonte: DIPC ---

A rua Patrocínio, localizada no bairro Carlos Prates, se configura por edificações predominantemente
de um e dois pavimentos, implantadas em sua maioria no alinhamento, com tipologia original
residencial preservada, sendo observadas pequenas intervenções. No primeiro trecho da via, as
edificações remetem ao estilo art déco, em sua porção superior estão vinculadas ao ecletismo. Trata-se
de via de pequeno aclive, de mão única para veículos, possui árvores de médio e grande porte
implantadas nos dois lados da rua, postes de iluminação e fiação instalados apenas em um dos lados e
interliga a Av. Nossa Senhora de Fátima à Praça Carlos Prates. Há presença de pequenos edifícios
comerciais de dois e três pavimentos no trecho central da via, implantados possivelmente na década de
1980 em substituição às primeiras ocupações da rua. Uma edificação multifamiliar de 13 pavimentos
implantada na porção mais alta da via destaca-se na paisagem do entorno. As edificações encontram-

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se, em geral, em bom estado de conservação. Tem uma pequena movimentação de veículos e de
pedestres, apesar de constituir-se como uma das principais ruas de acesso para a porção mais ao sul

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de parte do bairro. Não foi muito lembrada pelos entrevistados, sua maior relevância aparentemente
concentra-se nos deslocamentos que ela promove entre os bairros vizinhos, notadamente com a rua
Padre Eustáquio, Av. Dom Pedro II e Av. Nossa de Fátima. Agradável de maneira geral para caminhar,
a principal referência citada pelos entrevistados é a Praça Mirante Carlos Prates, que funciona como
um mirante para a região central de Belo Horizonte, sendo frequentada inclusive por moradores de
outros locais além do entorno imediato.

94
Início da rua Patrocínio. Fonte: DIPC ---

Trecho final da rua Patrocínio. Fonte: DIPC

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A rua Peçanha trata-se de via arborizada, com árvores de grande porte implantadas nos dois lados da

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rua. Instalada em aclive, interliga a Praça Mirante Carlos Prates ao começo da Av. Dom Pedro II.
Apenas um dos quarteirões possui mão única para veículos, o restante é de mão dupla, com postes de
iluminação e fiação instalados apenas em um dos lados da via. No seu entroncamento com as
avenidas Nossa Senhora de Fátima e Dom Pedro II, observa-se maior movimento de veículos. A via
destaca-se por galpões comerciais implantados em sua maioria no alinhamento e edificações
multifamiliares. Nota-se também terrenos amplos e desocupados que funcionam como estacionamento
de veículos ou garagem de empresas de ônibus. Observam-se esparsas edificações residenciais
vinculadas ao ecletismo e ao art déco. As edificações, em geral, se encontram em bom estado de
conservação. Comparada, à rua Patrocínio, esta via possui maior fluxo de pessoas e veículos.
Destaca-se também nesta via o CREAS – Centro de Referência Especializado em Assistência Social e
um poste de telefonia celular implantado em lote ocupado por estacionamento, no número 280. Pouco
mencionada pelos entrevistados, essa via tem como destaque a função de ligação entre a porção mais
ao sul deste trecho do bairro com a Av. Nossa Senhora de Fátima e pela distribuição que promove do
trânsito em toda parte interna do bairro.

95
---

Início da rua Peçanha, próximo à Praça Mirante Carlos Prates. Fonte: DIPC

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Final da rua Peçanha, próximo à Av. Nossa Senhora de Fátima. Fonte: DIPC

A estrutura formada pelas ruas acima descritas compõe uma espécie de sustentação sobre a
qual o restante do bairro se estabelece. Descrito por um dos entrevistados como “um sistema”, o
reconhecimento da polaridade exercida por estas vias tanto pela função de distribuição dos
deslocamentos quanto pelos símbolos que elas carregam, mostrou-se importante para interpretar a
organização e caracterização do perímetro em estudo. A ambivalência da rua Itapecerica marca uma
conotação de afeto e decadência para seu entorno, muitas vezes citado como síntese do próprio bairro. 96
---
A rua Além Paraíba, classificada como principal via de deslocamento e distribuição do bairro Lagoinha,
apresenta-se como um dos mais fortes símbolo do bairro, seu eixo central. A rua Bonfim que liga as
peixarias e o Cemitério, parece assumir uma função de “costura” entre os bairros Lagoinha e Bonfim,
propiciando uma intensa permeabilidade entre dois espaços de características distintas e ao mesmo
tempo complementares. As ruas Patrocínio e Peçanha desempenham um papel de interligação do
bairro com outras regiões, em particular com o bairro Bonfim, e “abrem” todo este trecho para uma
maior integração com espaços do perímetro, ora marcado por usos residenciais ora por usos
comerciais. Com isso, tais ruas assumem o sentido de vias, conforme definido por K. Lynch, ou seja,
canais de circulação habitual onde elementos referenciais se organizam e se relacionam. Devido à
maior representatividade das ruas Itapecerica, Além Paraíba e Bonfim, carregados de simbologias e
pontos de encontro para muitos moradores, estes trechos identificam-se também com o conceito de

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trajeto, elaborado por J. G. C. Magnani. Este termo caracteriza-se por uma forma de uso diferenciada
do espaço, como os principais pontos de ligação entre locais com identidades semelhantes ou

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diferentes. Assim, representamos o Conjunto Urbano da seguinte maneira:

Do lado esquerdo as vias, do lado direito os trajetos que caracterizam o perímetro estudado.

Essa configuração das ruas, no entanto, apresenta uma polarização que ultrapassa seus eixos
e se estende de forma distinta em diversas direções. A rua Itapecerica, por exemplo, recebe uma forte 97
influência dos impactos que a ampliação da Av. Antônio Carlos causou em toda a região. Situada entre ---

a rua Além Paraíba e a citada avenida, a Itapecerica absorve características de ambas as vias. Apesar
desta rua ser no começo do século XX o principal eixo de deslocamento para o setor norte, com a
inauguração da Av. da Pampulha em meados da década de 1940, posteriormente denominada Av.
Antônio Carlos, sua vitalidade entra gradativamente em declínio, devido em grande medida à
substituição de residências e comércio pelas pistas de rolamento implantadas na avenida. Este “vazio”
tornou a Itapecerica uma rua menos atraente e mais exposta a algumas situações de vulnerabilidade,
como o aumento da presença de moradores de rua. Com o passar dos anos, a própria Itapecerica
parece ter se constituído parcialmente em um limite, a última fronteira entre a avenida e o bairro. A
significativa representatividade que a caracterizou desde seu surgimento, materializada em sofisticadas
edificações que remetiam ao seu apogeu, permaneceu no imaginário da comunidade e ofereceu uma

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forma de resistência ao processo de degradação em andamento. Contudo, o abando de muitas destas


construções e as constantes modificações implementadas em seu entorno, acabaram por ofuscá-la.

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Vemos assim, que os usos das quadras situadas entre a rua Itapecerica e a Av. Antônio Carlos
apresentam-se de forma já bastante distinta das situadas entre a Itapecerica e rua Além Paraíba.
Próximo à avenida as edificações são menos vibrantes e mais degradadas, constituindo um aspecto
distintivo àquela região. Um único trecho, no entanto, difere desta situação: o entorno. No trecho final
da rua, a presença do Hospital Odilon Behrens, do Mercado da Lagoinha e do conjunto habitacional
IAPI, impõe certa uma ambiência mais particularizada, caracterizada pela maciça presenta destes
equipamentos. Ali, a “barreira” formada pela avenida e a degradação da rua Itapecerica é sentida de
forma mais atenuada, pois estes equipamentos intensifica a circulação de pessoas que, aliado a um
significativo comércio no entorno, restitui mais vivacidade à região. Assim, entendemos que este trecho
assume uma particularidade na relação de seus habitantes com o ambiente urbano, dotando-o de certa
referência. Nesse sentido, este trecho se enquadraria no conceito de mancha, formulado por J. G. C.
Magnani45 e, sendo assim, optamos por denomina-lo por “Mancha Itapecerica”.

Já a porção situada à oeste da rua Itapecerica, compreendendo as ruas situadas entre a Além Paraíba
e a Bonfim, além de boa parte do entorno do Cemitério e a porção norte do bairro Bonfim, apresenta
uma forte coesão. Com um traçado urbano irregular, ruas que alternam entre asfalto e paralelepípedo e
98
lotes com área inferior à 400m², esta trecho é composto com maior índice de uso residencial em todo o ---
perímetro estudado. Permeada por pontos comerciais, praças, construções e instituições que foram
citados pelos entrevistados como os mais representativos da região, este trecho possui uma ambiência
regular, marcada em geral pela baixa altimetria das edificações, construídas no alinhamento do lote e
relativa homogeneidade arquitetônica, particularmente pelos estilos eclético, art déco e, em menor
grau, modernista. A região é marcada com uma ambiência que remete à vida interiorana, fator
repetidamente citado nas entrevistas realizadas. Conforme relatado por um dos entrevistados, o trecho
ao redor da rua Além Paraíba foi amplamente ocupado por trabalhadores e imigrantes. Já a porção ao
redor do Cemitério, ficou teve uma maior afluência de artistas e artesãos. Aliado às grandes extensões
de lotes, principalmente no bairro Lagoinha, esta ocupação propiciou a consolidação de residências

45 Ver capítulo Referências Metodológicas

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familiares e de uso misto, que caracterizou toda a região. Dada tais características, poderíamos
classificar esse trecho como eixo central do Conjunto. À esta porção, demos a nomenclatura de

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“Mancha Residencial”.

Esta sequência só é interrompida no trecho onde está situado a Vila Senhor dos Passos. Esta região é
formada pela implantação de construções por vezes precárias, parcial existência de infraestrutura
urbana adequada, ruas estreitas, passeios irregulares, deficiente iluminação pública e uma topografia
bastante acidentada. É muito perceptível a ruptura no espaço urbano quando se caminha pela região.
O estreitamento das vias, aliada à precariedade em geral de muitas edificações, indicam a
segmentação deste trecho. Composta por construções implantadas de forma bastante heterogênea,
adaptando-se ao relevo íngreme em toda sua extensão, a Vila é constituída por residências e
pequenos comércios que proporcionam vitalidade e movimento à região. De acordo com as entrevistas
realizadas pela equipe da DIPC, existe uma distinção muito marcada entre os que moram “dentro” e
“fora” da Vila, restringindo este espaço a um isolamento, de uso quase exclusivo de seus moradores.
Os percursos limítrofes foram geralmente descritos como locais a serem evitados, principalmente à
noite. Nesse sentido, este trecho apresenta uma baixa integração com o restante do Conjunto Urbano,
constituindo-se como o local mais segregado. A partir do exposto, denominamos este local como
“Mancha Vila Senhor dos Passos”.
99
---
O trecho situado, de forma geral, entre a rua Bonfim, Av. Dom Pedro II até a altura da rua Baependi e a
Av. Nossa Senhora de Fátima, também apresenta clara distinção dos outros trechos acima descritos.
Diferentemente da Mancha Residencial e da Mancha Vila Senhor dos Passos, este espaço caracteriza-
se pela forte presença comercial. Ainda que seja o local de um número importante de residências, esta
região é marcada pela grande quantidade de estabelecimentos comerciais, principalmente oficinas
mecânicas, lojas de peças automotivas e terrenos subutilizados. De forma ligeiramente semelhante à
Mancha Residencial, possui uma ambiência relativamente homogênea, demarcada pela baixa altimetria
das edificações e implantação no alinhamento. Diferencia-se, contudo, pela irregularidade de estilos
arquitetônicos e pela forte presença de galpões, principalmente ao longo da Av. Dom Pedro II. A
sobreposição de usos comerciais na região faz com que durante a noite este trecho fique muito vazio, e
seja evitado pelos moradores. A partir dos relatos dos entrevistados, essa região está associada à

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insegurança, prostituição e degradação, sendo utilizada geralmente apenas como lugar de passagem.
Como apontou um dos entrevistados, o trecho abaixo do Cemitério em direção à antiga Praça Vaz foi

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durante muito tempo caracterizado como o lugar da transgressão, que fez a fama do bairro. Talvez isso
contribua para que o local possua um estigma desfavorável, particularmente entre os moradores mais
idosos. A este trecho denominamos “Mancha Comercial”.

Na porção mais ao sul, já no bairro Carlos Prates, que se desenvolve topograficamente em uma
encosta, constata-se uma certa continuidade desta mancha, porém com características um pouco
diversas das anteriormente descritas. Delimitado pela rua Peçanha no sentido leste, este trecho
diferencia-se por uma maior presença de residências entre os pontos comerciais. Aliado ao menor
número de oficinas automotivas e à melhor conservação dos galpões ali instalados, a região assume
uma ambiência particularizada, marcada pela heterogeneidade arquitetônica e de altimetrias das
edificações. As ruas Lúcio Bittencourt e Entre Rios possuem ligeiro declive, limitadas pelo muro da
linha do trem, com passeios estreitos, pouca arborização e uma notável vista para a Serra do Curral,
que torna fácil reconhecê-las. As vias desse trecho são asfaltadas e em bom estado de conservação.
Na rua Peçanha, é possível identificar a presença de alguns terrenos desocupados e galpões
comerciais, que remete tanto à Mancha Comercial quanto ao trecho das ruas Lúcio Bittencourt e Entre
Rios. Por tais semelhanças e diferenças que caracterizam seu entorno, optamos por denominar este
100
trecho separadamente de “Mancha Comercial Carlos Prates”. ---

No restante do bairro Carlos Prates identificamos uma mudança no uso que se assemelha mais à
Mancha Residencial. Assim como no seu trecho comercial, no entanto, este espaço também possui
características particulares. A porção do bairro Carlos Prates se desenvolve topograficamente em uma
encosta. Em sua parte mais baixa, as ruas Patrocínio e a Peçanha, servem como ligação entre o ponto
mais baixo e o mais alto do pedaço, culminando na Praça Carlos Prates, que funciona como mirante,
marco referencial e ponto de visada para a cidade. As quadras possuem tamanhos diversos, com
predomínio de edificações de uso residencial unifamiliar sendo observados edifícios multifamiliares
principalmente na rua São Jorge e rua Peçanha. Semelhante à Mancha Residencial, neste trecho a
altimetria dominante das edificações é de até 3 pavimentos e, em sua maioria, possuem acabamento
simples de fachada (alvenaria pintada ou cerâmica 10x10). As calçadas são em cimentado, largas e

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pouco arborizadas. A Maioria dos lotes possui grandes profundidades, com presença de quintais aos
fundos. As vias em sua maioria são largas e possuem previsão de estacionamento nos dois lados da

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via com exceção na Avenida Dom Pedro II. Através da rua Peçanha é possível o acesso também à rua
Serpentina, via larga e sinuosa que possui 13 edificações com processo de tombamento aberto e
vinculadas ao ecletismo, remanescentes da primeira ocupação da área, configurando um pequeno
núcleo arquitetônico. A ausência de vegetação na via, juntamente com a altimetria das edificações de
um e dois pavimentos gera uma sensação de amplitude da rua. As edificações são implantadas no
alinhamento ou com muros em alvenaria e parte deste trecho possui calçamento em pé-de-moleque.
Marcado principalmente pela presença das avenidas Nossa Senhora de Fátima e Dom Pedro II, este
trecho se distancia ligeiramente do eixo residencial dos bairros Bonfim e Lagoinha em função do
processo de ocupação relativo isolamento entre as manchas comerciais que o circunda. Por este
motivo, optamos por denominá-la “Mancha Residencial Carlos Prates”.

Apesar das distinções acima descritas, também foi possível notar diálogos mais estreitos entre uma
mancha e outra. O bairro Carlos Prates, por exemplo, ainda que tenha sido divido em “duas partes”,
apresenta uma permeabilidade entre seus diferentes espaços. Da mesma forma, a Mancha Itapecerica
parece interagir de forma mais próxima com a Mancha Residencial do que com a Mancha Comercial.
Outro fator que nos levou a considerar um olhar complementar na observação do Conjunto Urbano foi o
101
local onde os moradores declaravam sua residência. Se em toda extensão das ruas Itapecerica e Além ---
Paraíba os entrevistados foram inequívocos em se declarar moradores da Lagoinha, a rua Bonfim
parecia suscitar certa dúvida. Em alguns relatos o entrevistado oficialmente residia no bairro Bonfim,
mas se identificava mais com o bairro Lagoinha e vice-versa. Um dos entrevistados que residia
oficialmente no bairro Lagoinha, por exemplo, relatou que conhecia pouco a região “de lá” do Bonfim,
restringindo-se aos eixos da Além Paraíba, Itapecerica e adjacências.

Considerando este cenário, entendemos que uma classificação por bairros, consoante com as
definições de K. Lynch46, complementariam o panorama para melhor compreendermos nosso objeto de
estudo. Dessa forma, identificamos que uma dessas áreas que apresenta significativa coesão era
aquela inserida entre a Av. Antônio Carlos até o encontro da rua Bonfim com rua Fortaleza, delimitada

46 Ver capítulo Referências Metodológicas.

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pela Vila Senhor dos Passos. Nesse espaço denominamos por “Bairro Lagoinha”. A Vila, pelas
diferenças já descritas, parece assumir uma identidade a parte. Por isso, a inserimos no “Bairro Vila

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Senhor dos Passos”. Já na porção ocupada pela bairro Bonfim, conforme delimitação administrativa
oficial da Prefeitura de Belo Horizonte, a presença de características díspares que culminaram nas
duas manchas anteriormente citadas, mostra-se suficientemente forte para classificar este espaço em
dois: o Bairro Alto Bonfim e o Bairro Bonfim. O primeiro faz referência a toda porção norte do Cemitério,
o qual se inclui, até a praça da entrada do Cemitério, situada na rua Mariana. O segundo a todo trecho
sul, delimitado pela Av. Dom Pedro II. O quinto e último é o Bairro Carlos Prates, que congrega as duas
manchas ali inseridas, devido à relação de pertencimento que este trecho assume entre seus
moradores. Apesar do estreito relacionamento com os bairros Bonfim e Lagoinha, este Bairro possui
uma identidade própria vinculada à relação de vizinhança entre seus moradores. Esta classificação tem
como intuito contribuir para uma identificação mais clara das forças de atração e conflitos atuantes no
espaço estudado. Ainda que certas características na paisagem urbana sejam mais fortes, alguns
elementos estão presentes em mais de uma definição e, por isso, dificultam uma categorização
definitiva. Por encontrarmos algumas regiões que assumiam tal transitoriedade no Conjunto Urbano em
estudo, entendemos que o uso desta categoria de forma complementar a mancha possibilitaria
caracterizar também estes territórios pertencentes a mais de uma fronteira.
102
---
Dessa forma, representamos o Conjunto Urbano da seguinte maneira:

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À esquerda um esquema representativo dos bairros, a partir das características identitárias mais marcantes. À
direita, as manchas a partir dos usos e formas preponderantes de apropriação pela comunidade.

Paralelamente a estas categorizações, podemos constatar alguns elementos interessantes que se


articulam com as manchas e os bairros. Seja como local de encontro ou apenas como estímulo a
determinadas lembranças, estes elementos funcionam como uma espécie de orientação que atribui
significados específicos ao entorno imediato. Diferentemente das manchas e bairros que revelam uma
identidade, um modo de vida característico de algumas regiões, esses pontos dialogam tanto 103
internamente quanto externamente a cada uma destas categorias, podendo até, em alguns casos, se ---
estender por todo perímetro estudado. São locais estratégicos que podem simbolizar toda uma área.
Como define K. Lynch, são pontos nodais, lugares que sintetizam uma região sobre qual sua influência
se irradia. Ou ainda como conceitua J. G. C. Magnani, são pedaços, locais portadores de uma
sociabilidade mais densa que o torna característico. A presença de locais dessa natureza pôde ser
mais facilmente identificada no Conjunto Urbano em estudo por meio das entrevistas. Ainda que no
trabalho de campo certos pontos possam ter sido percebidos com destaque, o relato dos entrevistados
foi um fator decisivo na sua identificação.

O elemento citado com mais frequência, que mais vezes foi definido como símbolo de todo o Conjunto
Urbano, foi o Santuário Arquidiocesano Nossa Senhora da Conceição, localizado na rua Além Paraíba.
Mencionado por oito entrevistados, este parece ser um dos locais mais significativos da região.

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Inaugurada em 1923, a “Igreja”, como é conhecida entre os moradores, tem sido durante muitos anos
palco de manifestações religiosas e culturais da comunidade. Certamente as celebrações religiosas,

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como as missas, casamentos e procissões tem destaque entre as ações ali desempenhadas. No
entanto, este espaço também assume uma função de ponto de encontro para convivência,
confraternização e festividade entre os moradores. Muitos entrevistados relataram diversas ocasiões
em que participaram de atividades neste espaço. Por vezes organizado pela arquidiocese, outras pela
própria comunidade, esses encontros foram geralmente descritos como importantes para o
fortalecimento ou até mesmo reconstrução de laços entre os moradores. A presença do Santuário
impõe-se no trecho urbano inclusive como ponto de referência geográfica, do qual os moradores
utilizam para se direcionar ou prestar informações. A sua torre se destaca na paisagem, sendo possível
identifica-la ao longe, mesmo de outros bairros. Esta imagem mostrou-se tão marcante, que três
entrevistados relataram sentir-se em casa quando enxergam a torre. Apesar de se constituir um
importante símbolo para a região, o Santuário é percebido atualmente de forma mais fragilizada. Esta
perda de força foi associada, pelos entrevistados, à presença de muitos moradores de rua em seu
entorno e da sensação de insegurança provocada pela proximidade com a passarela no início da rua
Além Paraíba. Ainda assim, esta construção permanece uma referência inequívoca de toda região.

104
---

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Foto da frente do Santuário, situado no trecho inicial da rua Além Paraíba. Fonte: DIPC.
105
---
O segundo local mais lembrado pelos entrevistados foi o Cemitério do Bonfim. Este equipamento
público ocupa uma extensa parte do território do bairro que carrega seu nome. Sua presença foi
determinante para o início e a intensificação da ocupação de toda a região. Planejado pela Comissão
Construtora e inaugurado em 1897, é a necrópole mais antiga de toda cidade e, até a década de 1940,
a única de Belo Horizonte. Tais características o tornaram, talvez, o cemitério mais conhecido por toda
população da capital. Fonte de pesquisa e de visitação pelo seu acervo, este espaço abriga esculturas
decorativas de túmulos e mausoléus, conhecidas pela riqueza de detalhes e aprumo artístico. O local é
identificado pelos entrevistados como muito bonito e agradável. Suas descrições denotam afeto e
referência a inúmeros fatos históricos atrelados ao local e a personalidades ilustres ali sepultadas. O
comércio ao seu redor é formado em grande parte por floriculturas e marmorarias, principalmente
próximo ao velório na rua Mariana, que atesta a influência deste equipamento na organização do

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espaço circundante. Assim como o Santuário, também funciona como ponto de referência para
orientação e identificação da região. Apesar de não se sobressair como a torre do Santuário na

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paisagem, o Cemitério está implantado em uma porção levemente elevada do terreno, tornando
possível sua visualização a partir de diferentes locais. Particularmente da rua Além Paraíba e das ruas
que a atravessam, por situarem-se em elevação, é possível ter uma vista quase completa de todo
Cemitério. Sua presença, portanto, atribui um aspecto distintivo a toda região e se impõe como um forte
elemento identitário da região.

106
Foto da entrada principal do Cemitério do Bonfim. Fonte: DIPC. ---

O Complexo da Lagoinha também foi caracterizado como um local que acarreta uma
organização particular ao seu entorno. Conforme já analisamos anteriormente, este trecho é composto
por viadutos e pistas de rolamento voltadas para o uso de veículos automotivos. As “barreiras”
formadas pelas avenidas Antônio Carlos e Dom Pedro II se encontram neste espaço, tornando-o
inacessível ao pedestre e desprovido de quaisquer atividades que possam ser praticadas pelos
moradores. Apesar da característica hostil que atribui ao entorno, o Complexo da Lagoinha parece ter
uma forte presença no imaginário da comunidade. Dos nove entrevistados, cinco citaram este trecho
como um símbolo da região. Em geral, esta escolha foi justificada pela grandiosidade da estrutura
viária e pelo impacto causado no perímetro estudado. O isolamento, a insegurança, a influência nas

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alterações de uso de certos trechos da região e os demais fatores anteriormente descritos, estão
nitidamente associados à este espaço. Em certo sentido, esta estrutura tornou-se também um símbolo

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da região, com o passar do tempo. Tal fato pode ser percebido no relato de três entrevistados quando
expressaram que sentem que chegaram ao bairro Lagoinha no momento que acessam o complexo.
Nesse sentido, este elemento foi apropriado pela região e incorporado pelos moradores como
pertencente ao bairro em que vivem. Por isso, este espaço situa-se do “lado de dentro”, e apesar de
impactar de forma desfavorável a região, confere ao entorno uma organização particular e assume uma
referência importante na imagem da paisagem.

107
---
Foto da passarela de pedestres na praça em frente à Av. Antônio Carlos, trecho que compõe o
Complexo da Lagoinha. Fonte: DIPC.

Situados na rua Itapecerica, a Escola Estadual Silviano Brandão e o conjunto de edificações ao


lado, particularmente o imóvel de número 579, são outros pontos significativos na paisagem urbana.
Mencionados por metade dos entrevistados, esse núcleo se destaca de toda rua ao evocar um forte
sentimento afetivo nos moradores. Fundada em 1914, a Escola Estadual Silviano Brandão foi uma
instituição muito prestigiada na capital durante várias décadas. Considerada uma das melhores escolas
do Estado de Minas Gerais, foi responsável pela formação de alunos advindos de diversas regiões. A
partir de meados da década de 1960, com a presença de um grande número de novas escolas, sua
influência diminui no cenário municipal, mas uma referência para a região. As edificações implantadas

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ao lado, retratam a importância que esta região possuía no início do século passado. Com um desenho
arquitetônico refinado, esses imóveis eram objeto de admiração pelos que por eles passavam. O

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imóvel de número 579, conhecida como “Casa da Loba”, é em particular uma das edificações mais
conhecidas na região. Suntuosa, seu apelido advinha da escultura de uma loba amamentando Rômulo
e Remo, localizada na fachada superior. Construída na década de 1920 por Octaviano Lapertosa para
o proprietário João Abramo, de origem italiana, esta residência logo se tornou- bastante característica
na paisagem. Os entrevistados citaram este trecho como um local que os faz lembrar de um período
efervescente do bairro Lagoinha, com muito comércio e atividades de lazer frequentado por boa parte
da população de Belo Horizonte. Apesar da rua Itapecerica ser muitas vezes descrita pelos
entrevistados como “feia”, este trecho traz maior harmonia e beleza na percepção dos mesmo. As
atividades escolares e o comércio de antiquários no imóvel ao lado, dá vitalidade ao entorno e o faz ser
retratado como um local mais agradável. De fato, a “Casa da Loba” mostra-se como um símbolo da
região. Para muitos entrevistados este imóvel sintetiza o próprio bairro, pois o atual mau estado de
conservação da edificação, representa o declínio da Lagoinha que, assim como o imóvel, já fora
exuberante no passado. Essas construções, portanto, dotam uma ambiência diferenciada ao lugar,
delimitando formas de relacionamento próprias entre moradores e frequentadores.

108
---

Foto da Escola Estadual Silviano Brandão, situada na rua Itapecerica. Fonte: DIPC.

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Foto das edificações situadas ao lado da Escola Silviano Brandão, que criam uma ambiência
particulara para a região.

Enquanto espaço urbano, propriamente dito, um dos locais mais emblemáticos foi a Praça
Quinze de Junho. Localizada no final da rua Além Paraíba, esta praça foi citada por quatro
entrevistados como outro símbolo da região. No projeto elaborado pela Comissão Construtora da Nova
Capital, não estava previsto a construção de uma praça neste local, mas com o desenvolvimento do
bairro, foi posteriormente delimitado um largo com um ajardinamento no centro que constitui a atual
109
Praça Quinze de Junho. Circundada por estabelecimentos comerciais e residências familiares nas ruas
---
adjacentes, este local tem um movimento intenso em diversos períodos do dia, servindo como ponto de
encontro para moradores e frequentadores. É comum identificar pessoas sozinhas ou acompanhadas
sentadas nos bancos da praça, convivendo com os clientes de bares e padarias situados ao redor.
Entroncamento das ruas Guapé, Lambari, Sete Lagoas e Além Paraíba, este espaço também assume
um papel de destaque para o deslocamento da região. Situado em um dos pontos mais altos do
terreno, possui uma ampla vista da cidade, com destaque para o Cemitério do Bonfim e a Serra do
Curral. Apesar de se situar no limite administrativo do bairro Santo André, funciona como uma espécie
de intersecção para a Vila Senhor dos Passos e os bairros Lagoinha, Bonfim e Santo André.
Mencionado por muitos entrevistados como um local vinculado tanto à Lagoinha e quanto ao Bonfim, a
praça parece “costurar” uma identidade comum a toda região, fazendo com que os moradores

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apropriem-se dela, mas não de forma exclusiva. Aliada a sensação de pertencimento que reforça entre
a comunidade, este foi identificado como um dos melhores espaços urbanos da região. A vegetação e

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amplitude de seu espaço, funciona como um local de descanso para moradores e frequentadores, em
contraposição à aridez dos passeios estreitos e pouco arborizados de muitas ruas ao redor. Com uma
ambiência bastante característica, este trecho assume uma forte relevância para toda região, tanto
para qualificação da estrutura urbana quanto para propiciar um local agradável de convívio.

Foto da Praça Quinze de Junho com a vetegação marcante no seu canteiro central. Fonte: DIPC. 110
---
No início da rua Bonfim, encontra-se uma sequência de peixarias que também foi muito citada nas
entrevistas. Na verdade, esta região tem uma identidade atrelada a presença desses estabelecimentos
desde o começo da formação do bairro. Não por acaso, a praça formada entre a rua Bonfim, Av. Dom
Pedro II e Av. Nossa Senhora de Fátima tem o nome de Praça do Peixe. Esta atividade comercial
remonta às primeiras ocupações da região, época em que existiam pequenas lagoas e dois rios.
Segundo fontes bibliográficas, o próprio nome do bairro, Lagoinha, advém da presença destas lagoas.
A partir da intensificação da ocupação do bairro, os terrenos onde estavam situadas as “lagoinhas”
foram ocupados por edificações e os rios canalizados para dar lugar às avenidas Dom Pedro II e Nossa
Senhora de Fátima. Contudo, as peixarias que haviam se estabelecido na região permaneceram.
Durante muitas décadas este foi o principal local para compra de peixes e frutos do mar em toda

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cidade. A construção do complexo viário e o intenso crescimento de Belo Horizonte parecem ter sido
fatores decisivos para a queda da frequência de consumidores. Entre a população mais idosa este

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lugar permanece até hoje vinculado ao comércio de peixes, mas é principalmente entre os moradores
da região que essa característica se sobressai. De maneira geral, este trecho é descrito como pouco
atrativo. O único elemento que provoca entusiasmo é a presença das peixarias. Diversos relatos
consistiam na descrição de melhorias e revitalização do espaço urbano ao redor, denotando a
importância destes estabelecimentos mesmo em trecho considerado degradado. Sendo assim, esse
pedaço constitui-se como um local diferenciado, memória das origens do bairro, marcado pelo
comércio e pela frequência de seus clientes.

111
---

Esculturas situadas na Praça do Peixe, situada em frente às peixarias. Tanto o nome da Praça quanto
a natureza das esculturas fazem referência à presença marcante das peixarias nesse trecho. Fonte:
DIPC.
Por último, temos uma extensa área onde conflui a influência de três grandes equipamentos: o Hospital
Municipal Odilon Behrens, o Mercado da Lagoinha e o conjunto habitacional IAPI. O Hospital foi
construído em 1944, durante a gestão do prefeito Juscelino Kubistcheck, e projetado pelo arquiteto
Rafaello Berti. Com estilo art déco, o Hospital inicialmente era destinado ao atendimento exclusivo de
funcionários da Prefeitura de Belo Horizonte. Em 1989 passa a integrar o Sistema Único de Saúde –
SUS e se consolida como um dos mais conhecidos e importantes hospitais da cidade. Na mesma

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década de 1940, foi construído o conjunto habitacional Instituto de Aposentadorias e Pensões dos
Industriários – IAPI. Inaugurado antes mesmo do término das obras em 1947, foi efetivamente ocupado

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e re-inaugurado em 1948. Composto por nove edifícios residenciais, o conjunto possui ruas internas,
praça, jardim e uma área de lazer com quadras. Ainda na mesma década, o Mercado da Lagoinha foi o
último dos três equipamentos a ser inaugurado, em 1949. Criado para a comercialização de frutas,
verduras e legumes, o Mercado teve uma forte atividade até meados do fim do século XX, época em
que foi desativado. Posteriormente reformado, passou a oferecer cursos para qualificação profissional.
Atualmente abriga o Centro Cultural Liberalino Alves de Oliveira, onde são realizadas atividades
culturais e cursos de arte, além de sediar uma biblioteca pública. Não por acaso, estes três
equipamentos surgiram na mesma época. Naquele período estava em marcha um projeto de expansão
de Belo Horizonte, sobretudo para o vetor norte, onde fora construído a Lagoa da Pampulha. Para
ampliar e facilitar o acesso a toda região norte foram feitas as primeiras obras viárias que criaram a Av.
Pampulha, posteriormente ampliada e renomeada como Av. Antônio Carlos. Por se situar na saída do
centro em direção à Pampulha, esta região foi escolhida como local para a implantação dessas
construções, de forma a estimular a ocupação do eixo norte. Atualmente, este trecho apresenta uma
intensa movimentação de pessoas e veículos, influenciada principalmente pela presença de usuários
do Mercado, pacientes e familiares atendidos pelo Hospital e moradores do IAPI. O constante fluxo de
112
pessoas parece ter estimulado o surgimento de diversos estabelecimentos comerciais situados no ---
entorno dessas edificações, o que confere a este trecho ainda mais vitalidade. Tal movimentação
estabelece uma relação menos ligada com o restante dos bairros e mais circunscrita a uma dinâmica
própria. Este local, no entanto, permanece atrelado à identidade da região, simbolizando um período de
expansão e crescimento da região. Dessa forma, apresenta-se de fato incorporado ao Conjunto Urbano
em estudo, mas com uma especificidade que lhe confere uma força característica.

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Foto da praça formada pela confluência das ruas Itapecerica, Formiga e Pedro Lessa, entre o Hospital Odilon
Berehns e o Mercado da Lagoinha. Fonte: DIPC.

113
---
Foto da frente do Hospital Odilon Berehns. Fonte: DIPC.

Foto da entrada do IAPI. Fonte: DIPC.

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A partir desses elementos, representamos o perímetro em estudo da seguinte forma:

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7

Marcos/ Pedaços
5
4 1 - Santuário
2 - Cemitério
3 - Complexo da Lagoinha
1 4 - Casa da Lobo
2
5 - Praça Quinze de Junho
3
6 - Peixaria
6 7 - Grandes Equipamentos

Mapa do Conjunto Urbano com a indicação dos pedaços, caracterizados a partir da amplitude que cada um estende sua
influência. 114
---
Como vimos, esses elementos polarizadores não só assumem uma referência simbólica muito forte
para a região como também uma referência física. Além de constituírem uma imagem, um signo que
representa e caracteriza as relações desenvolvidas no lugar, também são utilizados para identificar o
bairro à distância e se orientar durante os deslocamentos internos. Entretanto, outros locais também
apresentam uma função semelhante, só que com menor intensidade. Estes são os marcos que, como
define K. Lynch, constituem um objeto físico usado como referência radial, identificado de maneira mais
simplificada e que serve como um emblema ao lugar em que se situa. A partir desta definição,
poderíamos considerar todos os pedaços também como marcos, que agregados com outros três locais
comporiam os marcos do Conjunto Urbano.

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O primeiro deles é a Praça Mirante Carlos Prates. Situada na porção mais ao sul do bairro Carlos
Prates, a praça está implantada em um cume e se configura como um mirante através do qual se é

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possível observar parte da região central da cidade. Bastante arborizada, os pequenos platôs que a
caracteriza proporciona a contemplação. Neste cume, destaca-se também um ficus de grande porte
que pode ser visualizado de vários pontos do Conjunto Urbano. A comunicação entre a praça e o
elevado Helena Grecco é realizada por talude de grande inclinação e acessado apenas por pedestres.
Citado por dois entrevistados como um lugar agradável para descansar, sua característica de maior
destaque é a vista proporcionada. Por marcar um dos limites do bairro, a praça é frequentemente
utilizada como um ponto de referência para os deslocamentos na região.

115
---

Foto da Praça Mirante Carlos Prates, com a ampla vista para o centro da cidade e para a Serra do Curral. Fonte:
DIPC.

Outra praça, porém na porção mais norte do Conjunto Urbano, também assume importância na
paisagem urbana. Trata-se da Praça Doze de Dezembro, popularmente conhecida apenas como “praça
doze”. Delimitado pela confluência das ruas Lambari, Miraí e Baependi, este espaço possui uma
modesta vegetação em seu pequeno canteiro central disposto em formato triangular. Apesar de situar-
se em uma região majoritariamente residencial é cercada por cinco bares que intensifica o afluxo de

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pessoas no entorno. Descrita pelos entrevistados como um local tranquilo e agradável é comum
observar idosos e crianças caminhando calmamente ao redor ou sentados nos bancos da praça

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conversando durante o dia. Já à noite, os frequentadores são substituídos pelos clientes dos bares.
Sendo assim, o espaço raramente encontra-se desabitado, dotando-o de certa vivacidade. Mencionada
nas entrevistas como ponto de encontro e de referência, a “praça doze” assume uma função relevante
tanto para o convívio dos moradores do entorno quanto para os que passam pela região.

116
---

Foto da Praça Doze de Dezembro. Fonte: DIPC.

O último marco é um elemento fora do perímetro em estudo, mas que interage tão constantemente
com ele que se torna parte integrante, este elemento é a Serra do Curral. Localizado a mais de sete
quilômetros de distância, o alinhamento montanhoso é visível de diversos pontos dos bairros Lagoinha,
Bonfim e Carlos Prates, integrando-se à paisagem local. Vista de forma mais ampla na Praça Carlos
Prates e em diversas ruas do bairro Lagoinha, a Serra do Curral não apenas emoldura o horizonte em
certas visadas, como também se mostra como uma referência geográfica, identificando a direção da
região centro-sul da capital. Ou como foi descrito por um dos entrevistados, a posição onde se encontra
a “cidade”.

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Foto da rua Arceburgo, com uma ampla visada da Serra do Curral. Fonte: DIPC.

117
---

Foto da rua Borda da Mata com ampla visada da Serra do Curral. Fonte: DIPC.

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Dessa forma, elaboramos um mapa que representa da seguinte forma os principais marcos do
Conjunto Urbano:

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10

Marcos referenciais/

9
11 1 - Santuário
2 - Cemitério
3 - Complexo da Lagoinha
8 6 4 - Escola Silviano Brandão
4
5
5 - Casa da Lobo
6 - Praça Quinze de Junho
7 - Peixaria
1 8 - Praça Doze de Dezembro
2 3 9 - Hospital Odilom Behrens
10 - IAPI
7
11 - Mercado da Lagoinha
12 - Serra do Curral
13 - Praça Mirante Carlos Prates
12

13
118
---
Mapa identificando os principais marcos do perímetro em estudo.

A partir do trabalho de campo realizado pela equipe da DIPC, das pesquisas bibliográficas, das
entrevistas com os moradores e da aplicação das ferramentas metodológicas acimas movimentadas,
pudemos melhor compreender a(s) dinâmica(s) dos usos, dos símbolos e dos atores da área estudada.
Os resultados mostraram o local com uma grande riqueza de representações que forjam diferentes
nuances aos trechos que o compõe. Tais diferenças, no entanto, não são excludentes. Pelo contrário,
se articulam para formar identidade mais ampla, construindo uma significativa noção de pertencimento
à comunidade. Contudo, também existem conflitos. A visível degradação de alguns de seus trechos é
respaldada pelo relato de moradores como um fator de desmotivação para a permanência na região.
Assim, a preservação dos valores e modos de vida que caracterizam o Conjunto, deve ser conjugada

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com uma renovação equilibrada de determinados locais. Todo eixo das avenidas Dom Pedro II e
Antônio Carlos, que formam limites no Conjunto, são exemplo dessa necessidade. Em menor medida,

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mas também de grande importância, um amplo trecho abaixo do Cemitério do Bonfim, denominado
mancha comercial, mostra-se apto à instalação de novas edificações que possam restituir maior
vitalidade ao entorno. A região mais delicada situa-se nos quarteirões voltados para a rua Itapecerica.
Ali, a manutenção de muitas edificações é fundamental para a salvaguarda de significados e valores
próprios do bairro, porém esta região é entrecortada com espaços degradados ou simplesmente
vazios. A renovação deve ser incentivada, mas de forma cuidadosa para não se sobrepor à identidades
já consolidadas. O eixo mais coeso e que merece uma proteção mais intensiva é a mancha residencial
e a mancha residencial Carlos Prates. Situada nos três bairros, esta área apresenta uma ambiência
contínua, com inúmeras edificações que delimitam e reforçam identidade à região.

Ações de proteção e preservação orientadas por estes critérios podem restituir uma qualidade urbana
que foi se enfraquecendo ao longo do tempo neste espaço. Mais antigo do que a própria cidade da
qual faz parte, este complexo território foi objeto de muitas pressões e intervenções que o remodelaram
ao longo do tempo. Mesmo assim, a afetividade e o carinho demonstrado por seus moradores em
diversas tentativas de preservação da memória local, nos chamam a atenção para a importância da
salvaguarda de um pedaço significativo da história de Belo Horizonte. Adequadas ações de proteção
119
neste Conjunto, podem minimizar a ambiguidade de sensações que seus habitantes parecem sentir ---
com relação ao local em que vivem, alternado entre o desencanto e a admiração.

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Exemplo de mapa mental, nos quais os entrevistados destacam sentimentos conflitantes. À esquerda, a representação de
120
uma lata de lixo que simboliza a forma como o entrevistado se ente para o resto da cidade. À direita, a forma como o
entrevistado escolheu para representar o local em que vive, com afeto. ---

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7. CRITÉRIOS PARA A PROTEÇÃO DOS BENS CULTURAIS IMÓVEIS

E
A metodologia adotada ns definição dos conjuntos urbanos de interesse para proteção em Belo

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Horizonte, formulada em 1994, é baseada na valorização da visão do patrimônio a partir da noção de
conjuntos urbanos, agrupamentos de construções e espaços dentro da cidade onde se reconhece um
grau expressivo de coesão e valores estéticos, arquitetônicos, sócio-culturais e históricos.47 A sua
abrangência espacial é definida por estabelecimentos, edificações referenciais, espaços polarizadores
ou ambiências características, entendendo-se por ambiência o quadro natural ou construído que influi
na percepção estática ou dinâmica desses conjuntos, ou a eles vincula-se de maneira imediata no
espaço, ou por laços sociais, econômicos ou culturais48.

A definição dos limites de proteção do conjunto urbano Lagoinha, Bonfim e Carlos Prates foi
embasada nas demandas advindas da gestão do patrimônio, assim como da análise de amplo material
já disponível sobre os bairros que compõem o conjunto urbano. Dessa forma, o traçado da área
estudada foi deliberado pelo CDPCM-BH, não sofrendo alterações no decorrer do estudo.

A seleção das edificações a serem protegidas institucionalmente considerou a classificação


adotanda desde em 1994, quando se iniciou a estruturação da Politica de Patrimônio Cultural em Belo
Horizonte. Assim, tal classificação dos bens culturais considera três graus de proteção: 121
1) interesse, a edificação que simplesmente se situa dentro do conjunto e cuja ---
relevância é a de conformar a paisagem urbana em termos de altura e harmonia; 2)
registro documental49 é a edificação que tem um valor cultural mais expressivo, o
qual, no entanto, não chega a justificar o seu tombamento; 3) tombada ou
merecedora de tombamento são aquelas que o Conselho decide tombar ou que vê
importância para tombamento. (MAGNI, 2012, pg. 89-90).

47 CARTA de Nairobi 1976 - Unesco – Organizações das Nações unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, 19ª
Sessão – Nairobi, 1976. In: Caderno de Sociomuseologia, n. 15, 1999, pp. 187-208. De acordo com a carta considera-se
“conjunto histórico ou tradicional todo agrupamento de construções e de espaços, inclusive os sítios arqueológicos e
palenteológicos, que constituam um assentamento humano, tanto no meio urbano quanto no rural e cuja coesão e valor são
reconhecidos do ponto-de-vista arqueológico, arquitetônico, pré-histórico, histórico, estético ou sócio-cultural”.
48 CARTA de Nairobi 1976 – Unesco... op.cit.
49 Para a edificação listada nesse grau de proteção, antes da Prefeitura conceder o alvará de demolição, é necessária a

elaboração e aprovação pelo Conselho de um registro documental. Em seguida, o documento é enviado ao Arquivo Público
da cidade, como material para pesquisas. O Registro documental contém o levantamento arquitetônico completo da
edificação, fotografias e descrição de materiais e acabamentos, além de dados históricos, com entrevistas com moradores e
cópia de documentação sobre os primeiros ocupantes, proprietários, construtor, arquiteto ou projetista.

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Altimetrias propostas

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07 metros
10 metros
16 metros
20 metros
24 metros
27 metros
Rerenciado ao imóvel protegido
Legislação urbanística

Imóveis protegidos

Processo de tombamento pelo CDPCM/BH

Indicação de tombamento neste estudo

Tipos de manchas

Mancha residencial Lagoinha/ Bonfim 122


Mancha de serviços Antônio Carlos ---
Mancha residencial Senhor dos Passos
Mancha de serviços Pedro II
Mancha residencial Carlos Prates
Mancha de serviços Carlos Prates

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Usos atuais

Residencial
Comercial
Serviços
Misto
Lote vago

Altimetria atual 123


atualtuSedificaçõesal ---
Cemitério do Bonfim
1 pavimento
2 pavimentos
3 pavimentos
4 pavimentos
Mais de quatro pavimentos

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10

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Marcos referenciais/
Imóveis indicados e em processo
9
11 de tombamento
1 - Santuário
6
2 - Cemitério
8
4 3 - Complexo da Lagoinha
5 4 - Escola Silviano Brandão
5 - Casa da Lobo
6 - Praça Quinze de Junho
2 1 7 - Peixaria
3
8 - Praça Doze de Dezembro
7 9 - Hospital Odilom Behrens
10 - IAPI
11 - Mercado da Lagoinha
12 - Serra do Curral
12
13 - Praça Mirante Carlos Prates

13

124
---
Trajetos referenciais/
Imóveis indicados e em processo
de tombamento

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440

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600
520 140
Valor do metro quadrado
450 600 de terreno segundo as
áreas homogêneas (2010).
1700 500 Fonte: PBH.
580

850
1400
750

125
---

Pontos de visadas
referenciais da Serra do
Curral e curvas de nível

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No presente estudo, a atribuição do grau de proteção a cada imóvel considerou basicamente o


critério da representatividade arquitetônica que foi analisado no contexto da percepção espacial da

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ambiência, contemplando fatores de localização, históricos e afetivos. A avaliação da localização do
bem cultural está relacionada à leitura do espaço, aos usos que ocorrem na ambiência e às
apropriações. Como instrumentos para essa avaliação, foram adotados os conceitos associados às
categorias de mancha urbana, pedaço, trajeto, pórtico e circuito, desenvolvidos pelo Núcleo de
Antropologia Urbana NAU/USP, coordenado pelo Professor Doutor José Guilherme Cantor Magnani.
Por outro lado, foram também adotados as categorias da percepção dos ambientes urbanos e de
análise físico-espacial, elaboradas pelo urbanista americano Kevin Lynch: vias, limites, bairros, pontos
nodais e marcos.

A seleção das edificações, pelo critério da representatividade da arquitetura, remete ao


significado histórico, estético, estilístico, de uso e de inserção harmônica em conjunto arquitetônico. Ao
considerar o critério da representatividade da arquitetura, ressaltamos que embora não se trate de uma
regra geral, frequentemente as edificações situadas nas áreas pericentrais de Belo Horizonte não
apresentam monumentalidade, suntuosidade nem grande elaboração formal, pois são resultado de
projetos mais simples e com menor aderência aos critérios de estilo. Isto se evidencia especialmente
nos pedaços residenciais do Carlos Partes e do Bonfim, sendo que o pedaço residencial do bairro 126
---
Lagoinha apresenta algumas exceções a esta regra, com exemplares de elaboradíssima arquitetura,
infelizmente muitos deles semi-destruídos. Contudo, é inegável a representatividade e importância
arquitetônica das pequenas edificações inventariadas nestes bairros. Em nada se justificam certas
percepções de senso comum que tendem a descartá-las enquanto patrimônio cultural por classificá-las
como criações singelas, desprovidas dos atributos associados à arquitetura monumental produzida nas
regiões mais ricas da cidade.

Na realidade, a arquitetura do Conjunto Urbano Lagoinha, Bonfim e Carlos Prates exemplifica o


processo de absorção, reinterpretação e recombinação dos esquemas recorrentes no repertório dos
diversos estilos arquitetônicos históricos. Ou seja, no mesmo período histórico, enquanto nas áreas
centrais da cidade os esquemas arquitetônicos foram aplicados com maior rigor, nos bairros

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pericentrais esses mesmos esquemas eram reinterpretados e modificados com certa liberdade. Assim,
em termos plásticos, a arquitetura do conjunto urbano estudado apresenta elementos estilizados,

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reelaborados, inspirados principalmente nas soluções das arquiteturas clássica, neocolonial, art déco e
protomoderna.

Deve-se frisar que as reinterpretações das soluções estilísticas a partir dos elementos dos
estilos históricos era feita de forma expontânea, livre e criativa, segundo esquematizações de uma
estética popular. Em termos sociológicos, o sentido dessa produção reflete os valores dos moradores e
dos construtores ou, em outras palavras, o modo como a arquitetura produzida pelos arquitetos e
construtores ligados à academia foi lida e apropriada pelos construtores autodidatas que atuavam nas
áreas menos “nobres” da cidade. Essa lógica de formação do processo de produção da arquitetura
popular pode ser assim interpretada:
[...] a estética popular se apoiaria em um gosto derivado das necessidades práticas da vida, mas que
reverencia os valores consagrados pelas classes altas[...] percebe-se que ela é orientada muito
frequentemente por critérios que remetem ao reconhecimento e à valorização de determinados símbolos
“cultos”, os quais são reproduzidos com uma estética reinterpretada. Ou seja, há uma apropriação dos
estilemas e das soluções formais da arquitetura consagrada pelas classes mais instruídas. A partir de
releituras, criam-se arquiteturas que ora são rotuladas de belas e criativas, ora de pastiches. De todo modo,
nesses contextos a apropriação simbólica é realizada sem um real conhecimento das regras em base às
quais se estrutura a arquitetura que os projetistas e construtores copiam e reinterpretam. A partir de
Bourdieu (1983), entendo que se trata de apropriação que denota o reconhecimento, sem contestação, de
uma cultura dominante. (MAGNI, 2012, pg. 49-50) 127
---
O arquiteto Lauro Cavalcanti, ao fazer uma análise da produção popular de inspiração
modernista, constata esse amplo reconhecimento simbólico através da apropriação das formas da
arquitetura moderna brasileira pelas classes populares:
[...] O sucesso da nova arquitetura perpassava regiões e camadas sociais. As elites aderiram às novas
formas, assim como leigos e mestres-de-obras, na periferia de cidades e no interior de todo o país, fizeram
proliferar alegres cópias de um modernismo estilizado. (CAVALCANTI, 2001, p. 25).

A seleção das edificações pelo critério de localização, históricos e afetivos pode ser
exemplificado pelo maior número de indicações para tombamento nas manchas residenciais, nos
trajetos ou vias referenciais, nos bens culturais que por seus aspectos físicos conformam os pontos
nodais, a ambiência dos pedaços. Além disso há edificações indicadas para tombamento por se
constituírem como marcos. As escolas e a Igreja são marcos e podemos chamá-las também de lugares

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de memória, conforme define Pierre Nora (1993), locais que podem ter uma consistência material,
funcional ou mesmo simbólica e que dão frequentemente suporte às nossas memórias mais intensas.

E
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Assim, para citar alguns exemplos, foram indicadas para tombamento diversas edificações com
representatividade e que contextualizam as manchas residenciais da Lagoinha e Alto Bonfim e
mancha residencial Carlos Prates. Tratam-se de ambiências conformadas pela concentração
edificações, próximas umas das outas e percebidas espacialmente como essenciais para a
caracterização das manchas. Da mesma forma, a paisagem e a ambiência de trajetos ou vias
referencias, tais como Além Paraíba, Itapecerica, Patrocínio justificaram, pelo presente critério, a
seleção de grande número de imóveis indicados para tombamento, imóveis que muitas vezes
apresentam proximidade física e harmonia visual.

Por outro lado, a mancha comercial que se desenvolve ao longo das grandes avenidas Nossa
Senhora de Fátima, Pedro II e Presidente Antônio Carlos revelou-se inadequada para proteção de
grande número de edificações, tanto pela presença de uma ambiência de galpões e de uma arquitetura
de má qualidade, quanto pelo fato de ser transpassada por vias em processo de frequentes
transformações. Como referências arquitetônicas significativas, foram assinaladas, nessa mancha
comercial, algumas edificações para registro documental, como as pertencentes a um núcleo isolado
128
de casas vinculadas ao ecletismo de metade do século XX, já parcialmente descaracterizadas e ---
adaptadas para usos de serviços. Portanto, essa mancha abriga edificações cuja relevância sugere a
indicação para a proteção no segundo grau de proteção, registro documental.

O ponto nodal, a exemplo do existente na confluência da avenida Nossa Senhora de Fátima


com Rua Bonfim e Além Paraíba, é percebido como um lugar estratégico, referência de localização do
bairro Lagoinha. Trata-se de um largo onde há um conjunto de prédios de três pavimentos vinculados
estilisticamente ao art déco ou protomodernismo. Embora em péssimo estado de conservação esses
exemplares dão destaque ao início dos trajetos da Bonfim e da Além Paraíba, possuindo valor afetivo,
histórico e como lugar de memória.

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Ainda por este critério, alguns marcos foram indicados, a exemplo da Praça Quinze de Junho,
da Praça Doze de dezembro e do Santuário Arquidiocesano Nossa Senhora da Conceição e a Escola

E
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Estadual Silviano Brandão. Outros marcos do conjunto indicados para tombamento são dois grandes
espécimes arbóreos, os fícus existentes na Rua Formiga, junto ao mercado da Lagoinha, e o existente
no mirante na confluência de Rua Patrocínio e Rua Peçanha.

129
---

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8. CRITÉRIOS PARA A DEFINIÇÃO DAS DIRETRIZES ALTIMÉTRICAS

E
A proposta das diretrizes altimetrias considerou as seguintes premissas:

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1 - Preservar a visibilidade de marcos citados como referência pelos moradores e
frequentadores dos bairros;

2 - Preservar as visadas privilegiadas da Serra do Curral, identificada como um dos marcos


referenciais do bairro;

3 - Manter a altimetria baixa no entorno do Cemitério do Bonfim, de forma a não obstruir, partir
do seu interior, as visadas dos marcos referenciais e da paisagem;

4 - Preservar a ambiência de vias e trajetos referenciais, onde se identificou uma paisagem


com especial qualidade urbana, decorrente de harmonia de edificações representativas da história e da
formação urbana dos bairros;

5 - Disciplinar a ocupação do entorno imediato de bens com interesse de proteção, garantindo


a sua visibilidade e a harmonia da ambiência;

6 - Conciliar as diretrizes de preservação com a renovação e adaptação do tecido urbano, 130


---
especialmente em pedaços mais degradados e nos lotes localizados ao longo das vias de limite e que
configuram pórtico.

Cada um dos atuais 2.700 lotes que compõe a área em estudo recebeu, a princípio, apenas um
valor de altimetria. Porém, excepcionalmente, alguns lotes de grandes dimensões que ocupam mais de
uma faixa altimétrica, receberam mais de uma altimetria, evitando a desarmonia que poderia ser
induzida em determinados locais.

Para o cálculo dessa altimetria, a altura da edificação foi considerada como a maior dentre as
distâncias entre cada ponto da edificação e a respectiva projeção, segundo a direção vertical, no
terreno natural. Considerando as premissas acima, foram definidas sete faixas altimétricas, cuja
caracterização e adoção são justificadas da seguinte forma:

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A altimetria referenciada ao bem protegido foi aplicada a todos os lotes das edificações

E
tombadas, das edificações em processo de tombamento e das indicadas para tombamento neste

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estudo. Visa garantir que não seja impedida ou reduzida a visibilidade do bem tombado, conforme
determina o artigo 17 da Lei Municipal 3.802/84. Nos lotes onde é adotada, resguardados os
parâmetros da legislação urbanística, novas edificações poderão ser construídas guardando a distância
de cinco metros do corpo da edificação protegida e não a superando em altura. Porém, abre-se, nesses
casos, a possibilidade de o CDPCM/BH redefinir diretrizes específicas para o lote, que normalmente
incluem a restauração completa do bem cultural protegido;

A altimetria de 7,0 metros normalmente viabiliza construções de dois pavimentos ou em


alguns casos de apenas um pavimento, uma vez que os telhados e outros elementos construídos
acima da laje de cobertura são considerados no cálculo da altura máxima. A proposição desta altimetria
foi definida para preservar a horizontalidade e harmonia da paisagem construída, as visadas
referenciais e a ambiência associada a modos de vida característicos dos bairros, atendendo aos
objetivos da ADE Lagoinha de estimular a permanência do uso residencial, conforme previsto na lei de
uso e ocupação do solo;

Esse nível altimétrico favorece, portanto, a preservação de tipologias arquitetônicas em


131
interação com a ambiência e seus modos de vida, afastando as alterações bruscas decorrentes da
---
construção de galpões e novas edificações multifamiliares verticais, as quais ocasionam aumento do
tráfego de veículos e do ruído.

Essa altimetria foi proposta em lotes voltados para as vias ou trajetos identificados como
referenciais em termos de ambiência e de concentração de edificações de interesse arquitetônico, a
exemplo das ruas Além Paraíba, Itapecerica, Bonfim, Patrocínio, Lambari e Serpentina. Também é
adotada no entorno imediato dos marcos referenciais, principalmente a torre do Santuário
Arquidiocesano Nossa Senhora da Conceição, mas também a Praça Doze de Dezembro, a Praça
Quinze de junho e a praça localizada do mirante, na confluência da Rua Patrocínio e Rua Peçanha. No
caso dos lotes voltados para os muros de divisa a oeste e a sul do cemitério do Bonfim, a altimetria de
7,0 metros preserva as visadas referenciais da Serra do Curral a partir de dentro do cemitério. A

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altimetria de 7,0 metros é também utilizada nos lotes ao longo dos trechos de maior cota altimétrica das

E
vias que se caracterizam como eixos de visadas privilegiadas da Serra do Curral.

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A altimetria de 10,0 metros viabiliza edificações de dois pavimentos com caixa d‟água e
volumes técnicos. Dependendo da engenhosidade da solução projetual, podem ser viabilizadas
edificações de três pavimentos. Esse nível altimétrico foi proposto como faixa de transição entre a faixa
mais restritiva de 7,0 metros e a faixa menos restritiva de 16,0 metros, promovendo o escalonamento
das novas implantações;

A altimetria de 16,0, a depender das características da edificação, pode viabilizar até quatro
pavimentos, com caixa d‟água e volumes técnicos. Considerando a premissa de viabilizar a renovação
do tecido urbano, essa faixa altimétrica se justifica em lotes com cotas altimétricas baixas, localizados
ao longo das avenidas que configuram limites dentro do conjunto urbano, tais como a Avenida Nossa
Senhora de Fátima e a Avenida Dom Pedro II. Trata-se de vias para as quais a proposta de revisão da
legislação aponta a tendência de verticalização, com grande tráfego e consolidação do uso comercial e
de serviços. Esta altimetria foi aplicada também nas quadras localizadas nas extremidades oeste e
norte da mancha residencial, assim como nas adjacências da mancha Senhor dos Passos, porções
onde uma maior altimetria não interfere nas visadas referenciais, contribuindo para a revitalização
132
urbana;
---

As altimetrias de 20,0 e 24,0 metros viabilizam seis a sete pavimentos. Da mesma forma que
a faixa de 16,0 metros, consideram a premissa de viabilizar a renovação do tecido urbano. Estas
altimetrias, localizam-se na porção mais baixa do conjunto, correspondente ao pedaço localizado na
confluência de avenidas Pedro I, Nossa Senhora de Fátima e Antônio Carlos. Mesmo permitindo a
renovação com edificações maiores, não interrompem as linhas de visada em direção aos marcos
referenciais, contribuindo para a melhoria da ambiência.

A altimetria de 27,0 metros viabiliza edificações com até sete pavimentos e volumes técnicos.
Assim como as demais faixas mais permissivas, essa faixa altimetrica atende à premissa da renovação
do tecido urbano. Ela ocorre ao longo da Avenida Presidente Anônio Carlos, em trecho da Avenida
Carlos Luz e nas cotas altimétricas mais baixas na extremidade oeste do conjunto protegido.

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145
145
145
145
145
145

133
---

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9. DIRETRIZES ESPECIAIS DE PROJETO:

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As ações de gestão do conjunto urbano, assim como as intervenções no mesmo deverão

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seguir as seguintes diretrizes:

1 - As restaurações ou intervenções em edificações em processo de tombamento ou tombadas


deverão considerar a reconstituição dos seus elementos tipológicos, formais e estruturais originais,
devendo as edificações serem destinadas a usos compatíveis com as suas características;

2 - De modo geral, as intervenções se pautarão pela eliminação das volumetrias impactantes,


empenas cegas e engenhos de publicidade inadequados; tratando-se esteticamente as fachadas,
especialmente as de fundo, voltadas para os trajetos referenciais, como o da Avenida Antônio Carlos e
Avenida Pedro II;

3 - Em se tratando de processo de modificação e regularização de edificações construídas


irregularmente, deverão ser revertidas as alterações feitas de forma inadequada nas fachadas e
volumetrias, sendo dado tratamento estético que recupere a leitura da edificação. Nesse sentido,
deverá ser regularizado o imóvel situado na Rua Sete Lagoas, 9, dando sequência às notificações
20150061959, 20150061963 e 20150061964, lavradas pela GRFIL-NO em 06/10/2015, durante a fase
134
de estudo da proteção do conjunto. A recomposição da ambiência do local será feita com a demolição ---
dos pavimentos construídos irregularmente e com novo tratamento da volumetria da edificação,
considerando a harmonia com a Praça Quinze de Junho e a eliminação da obstrução de visibilidade do
marco referencial Serra do Curral.

4 - Deverá ser preservada a ambiência da pequena vila localizada na Rua Jaguari, entre os
números 613 e 631, devendo ser mantido o calçamento original em granito poliédrico (pé de moleque).
Deverá ser verificada a regularidade do estacionamento coberto implantado no meio da via e no caso
de se tratar de intervenção irregular, deverá ser providenciada a sua regularização;

5 - Em caso de projeto de nova edificação, projeto de modificação ou de regularização, os


fechamentos frontais ao longo de toda a testada dos lotes deverão ser realizados com elementos

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vazados que garantam a visibilidade a partir dos logradouros públicos, não sendo admitida a utilização
fechamento em vidro. O fechamento com elementos sem permeabilidade visual só será permitido para

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contenção de terreno natural ou com altura máxima de 80 cm;

6 - As novas edificações deverão respeitar a altimetria prevista para o lote, assim como
harmonizar-se em termos formais e volumétricos com a ambiência em que se inserirão, ficando os
projetos sujeitos à análise e aprovação do CDPCM/BH quanto à qualidade estética e à harmonia com o
ambiente urbano;

7 - Para novas edificações ou para modificações que resultem em acréscimo de volumetria


deverão ser aplicadas as seguintes regras:

7.1 - caso a edificação vizinha tenha afastamento lateral, é obrigatório o cumprimento de


afastamento lateral para novas edificações ou alterações existentes nos termos da lei. Caso a
edificação vizinha seja tombada ou esteja em processo de tombamento, os projetos de nova
edificação devem considerar afastamento mínimo de 5,0 metros do seu corpo edificado.

7.2 - caso a edificação vizinha se situe em uma sequencia de edificações sem afastamentos
frontais e laterais, não poderá haver afastamentos frontal e laterais para novas edificações ou 135
modificação das existentes até a altura na divisa praticada pela edificação vizinha, de forma a ---
não criar lacunas urbanas;

7.3 - o afastamento de fundo é obrigatório, sendo impedido edificar até a altura máxima na
divisa. No caso de edificação tombada, deverá ser mantida a distância de 5,0 metros do seu
corpo edificado, salvo entendimento diferente do CDPCM/BH, após análise de projeto
específico.

8 - Fica proibida a construção de edifícios que conformem bandejas. Entendendo-se por


bandeja a volumetria que apresente pavimento(s) inferior(es) com afastamento(s) frontal e/ou laterais e
acima deste(s), apresente pavimento(s) sem afastamento(s) frontal e/ou laterais;

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9 - Qualquer intervenção no traçado urbano do Conjunto Urbano Lagoinha, Bonfim e Carlos


Prates dependerá de anuência prévia do CDPCM-BH;

E
CONJUNTO URBANO BAIRROS LAGOINHA, BONFIM
10 - O calçamento em paralelepípedo de granito existente na Rua Turvo deverá ser mantido e
recomposto, removendo-se os capeamentos parciais ou integrais em asfalto. Essa diretriz não se aplica
aos trajetos referenciais, com transito intenso, a exemplo da Rua Além Paraíba, Rua Itapecerica, Rua
Bonfim, Rua Peçanha, Rua Patrocínio, assim como ao calçamento das avenidas Presidente Antônio
Carlos, Avenida Dom Pedro II e Avenida Nossa Senhora de Fátima. Qualquer intervenção no
calçamento poliédrico das demais vias do bairro deverá ser previamente aprovado pelo CDPCM-BH;

11 - Fica proibida a instalação de Estação Rádio Base que utilize suporte do tipo greenfield,
ficando vedada a renovação de licenças existentes para eventuais estações desse tipo;

12 - Os engenhos de publicidade, toldos e antenas deverão se adaptar às normas contidas nas


deliberações do CDPCM/BH que tratam da normatização de engenhos de publicidade, toldos e
antenas.

10. LISTAGEM DE GRAUS DE PROTEÇÃO


136
---
10.1. BENS CULTURAIS INDICADOS PARA TOMBAMENTO NESTE ESTUDO

Abaeté 57
Abaeté 210
Abaeté 516
Abaeté 22
Abaeté 182
Abaeté 318
Abaeté 452
Adalberto Ferraz 32
Além Paraíba 11
Além Paraíba 143
Além Paraíba 208
Além Paraíba 268
Além Paraíba 288

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Além Paraíba 341


Além Paraíba 380

E
Além Paraíba 442

CONJUNTO URBANO BAIRROS LAGOINHA, BONFIM


Além Paraíba 460
Além Paraíba 530
Além Paraíba 557
Além Paraíba 575
Além Paraíba 582
Além Paraíba 614
Além Paraíba 622
Além Paraíba 917
Além Paraíba 963
Além Paraíba 999
Além Paraíba 504
Além Paraíba 514
Arari 15
Arari 16
Arari 25
Arari 65
Arari 75
Arari 80
Arari 134
Arceburgo 49
Arceburgo 257
Arceburgo 292 137
Arceburgo 304 ---
Arceburgo 390
Arceburgo 414
Arceburgo 488
Ardósia 207
Ardósia 225
Ardósia 235
Ardósia 236
Baependi 102
Baependi 110
Bonfim 6
Bonfim 440
Bonfim 725
Bonfim 818
Bonfim 849

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Bonfim 857
Bonfim 1001

E
Bonfim 28/ 60

CONJUNTO URBANO BAIRROS LAGOINHA, BONFIM


Caparaó 95
Caparaó 105
Caparaó 379
Caparaó 405/ 415
Caparaó 415/ 417
Capitólio 105
Caxambu 54
Caxambu 64
Caxambu 110
Comendador Nohme Salomão 133
Comendador Nohme Salomão 145
Comendador Nohme Salomão 165
Comendador Nohome Salomão 177
Comendador Nohme Salomão 191
Comendador Nohme Salomão 155
D. Pedro II 554
Dalva 39
Dalva 49
Do Serro 190
Do Serro 280
Do Serro 294
Do Serro 343 138
Do Serro 359 ---
Do Serro 375
Do Serro 399
Do Serro 489
Do Serro 517
Do Serro 368/ 379
Do Serro 377/ 387
Doze de Dezembro 36
Doze de Dezembro 81
Doze de Dezembro 93
Entre Rios 75
Entre Rios 141
Espinosa 121
Fagundes Varela 180
Fagundes Varela 210

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Fagundes Varela 220


Fagundes Varela 148/ 150

E
Fortaleza 60

CONJUNTO URBANO BAIRROS LAGOINHA, BONFIM


Fortaleza 76
Fotaleza 92
Frei Caneca 20
Frei Caneca 41
Frei Caneca 42
Frei Caneca 52
Frei Caneca 74
Grupiara 22
Grupiara 30
Guapé 25/ 37
Ibiá 110
Ibiá 229
Ibiá 459
Ibiá 465
Ibiá 518
Ibiá 560
Ibiá 21
Ibiá 177
Ibiá 183
Ibiá 226
Itapecerica 263/ 269
Itapecerica 362 139
Itapecerica 840 ---
Itapecerica 685 (Escola Estadual Silviano Brandão)
Jaguari 110
Jaguari 335
Jaguari 345
Jaguari 745
Jaguari 748
Jaguari 758
Jaguari 773
Jaguari 790
Jaguari 793
Jaguari 818
Jaguari 848
Jaguari 860
Jaguari 975

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Jaguari 1019
Jaguari 605 a 631

E
Jaguari 762/ 768

CONJUNTO URBANO BAIRROS LAGOINHA, BONFIM


Jaguari 774/ 782
Jaguarão 134
Jequeri 62
Jequeri 73
Jequeri 83
Lagoa Santa 124
Lagoa Santa 129
Lagoa Santa 134
Lambari 1
Lambari 117
Lambari 200
Lambari 231
Lambari 240
Lambari 243
Lambari 259
Lambari 260
Lambari 314
Lambari 337
Lambari 462
Lambari 486
Lambari 496
Lambari 508 140
Magnólia 74 ---
Magnólia 120
Magnólia 130
Magnólia 142
Magnólia 152
Magnólia 164
Magnólia 176
Mariana 92
Mariana 120
Mariana 874
Mariana 896
Mariana 906
Mariana 934
Mariana 958
Mariana 110/ 116

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Mariana 207/ 213


Mariana 831/ 291

E
Mariana 871/ 873

CONJUNTO URBANO BAIRROS LAGOINHA, BONFIM


Miraí 176
Miraí 182
Miraí 252
Miraí 262
Miraí 176
Nossa Senhora de Fátima 1866
Nossa Senhora de Fátima 1880
Nossa Senhora de Fátima 1888
Nossa Senhora de Fátima 1972
Nossa Senhora de Fátima 2000
Nossa Senhora de Fátima 2061
Nossa Senhora de Fátima 2081
Patrocínio 11
Patrocínio 48
Patrocínio 199
Patrocínio 209
Patrocínio 229
Patrocínio 276
Patrocínio 294
Patrocínio 317
Patrocínio 331
Patrocínio 353 141
Patrocínio 360 ---
Patrocínio 377
Patrocínio 387
Patrocínio 397
Patrocínio 404
Patrocínio 414
Patrocínio 426
Patrocínio 436
Patrocínio 446
Patrocínio 476
Patrocínio 20
Patrocínio 41
Patrocínio 74
Patrocínio 118
Patrocínio 158

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Pedro Leopoldo 130


Pedro Leopoldo 131

E
Pedro Leopoldo 143

CONJUNTO URBANO BAIRROS LAGOINHA, BONFIM


Pedro Leopoldo 155
Pedro Lessa 136
Peçanha 472
Peçanha 492
Peçanha 402/ 492
Piratininga 28
Piratininga 41
Piratininga 44
Piratininga 68
Piratininga 123
Presidente Antônio Carlos 561
São Salvador 111
São Salvador 112
São Salvador 162/ 164
Sebastião de Melo 36
Sebastião de Melo 45
Sebastião de Melo 46
Sebastião de Melo 55
Sebastião de Melo 56
Sebastião de Melo 65
Sebastião de Melo 75
Serpentina 78 142
Serpentina 107 ---
Sete Lagoas 6
Sete Lagoas 15
Sete Lagoas 21
Sete Lagoas 76
Sete Lagoas 90
Sete Lagoas 220
Sete Lagoas 162/ 168
Sete Lagoas 501/ 511
São Jorge 30
São Jorge 56
São Jorge 66
São Salvador 151/ 175
Traíras 73
Traíras 81

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Traíras 102
Traíras 113

E
Traíras 128

CONJUNTO URBANO BAIRROS LAGOINHA, BONFIM


Traíras 148
Turvo 28
Turvo 38
Turvo 73
Turvo 83
Turvo 90
Turvo 126
Turvo 136
Turvo 156
Turvo 157
Turvo 172
Turvo 192
Turvo 195
Turvo 202
Turvo 244/ 248
Turvo 264/ 272

10.2. PRAÇAS INDICADAS PARA TOMBAMENTO NESTE ESTUDO

Praça Quinze de junho


Praça do Mirante Carlos Prates 143
Praça Doze de dezembro ---

10.3. ÁRVORES INDICADAS PARA TOMBAMENTO NESTE ESTUDO

Ficus - Formiga 140 (Mercado da Lagoinha)


Ficus - Patrocínio 534 (Praça do Mirante)

10.4. BENS CULTURAIS INDICADOS PARA REGISTRO DOCUMENTAL NESTE ESTUDO

Abaeté 73
Arari 37
Arari 131
Arceburgo 429

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Arceburgo 468
Ardósia 48

E
Ardósia 56

CONJUNTO URBANO BAIRROS LAGOINHA, BONFIM


Ardósia 120/124
Caparaó 343
Caparaó 355
Caparaó 80
Capitólio 305
Capitólio 549
Capitólio 559
Dom Pedro II 343
Dom Pedro II 346
Dom Pedro II 356
Dom Pedro II 366
Dom Pedro II 388
Dom Pedro II 442
Dom Pedro II 533
Dom Pedro II 543
Dom Pedro II 516/ 534
Dom Pedro II 378
Dom Pedro II 404
Entre Rios 61
Entre Rios 108
Gama 62
Guapé 113 144
Ibiá 170 ---
Jaguarão 96
Jaguari 117
Jaguarão 146
Jaguarão 175
Lagoa Santa 56
Lagoa Santa 221
Mariana 123
Mariana 787
Mariana 799
Nossa Senhora de Fátima 1664
Nossa Senhora de Fátima 1744
Nossa Senhora de Fátima 1758
Nossa Senhora de Fátima 1832/ 1840
Peçanha 436

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Senador Lúcio Bittencourt 64


Senador Lúcio Bittencourt 84

E
Senador Lúcio Bittencourt 100

CONJUNTO URBANO BAIRROS LAGOINHA, BONFIM


10.5. BENS CULTURAIS TOMBADOS

Além Paraíba 700


Bonfim 118
Bonfim 180
Itapecerica 251
Itapecerica 373
Serro 141
Presidente Antônio Carlos 1035, 1089, 1143 1197 (Conjunto IAPI)
Araribá 336 (conjunto IAPI)
José Bonifácio 180, 240, 300, 360 (Conjunto IAPI)

10.6. BENS CULTURAIS COM PROCESSO DE TOMBAMENTO ABERTO PELO CDPCM/BH

Abaeté 536
Adalberto Ferraz 59
Além Paraíba 18
Além Paraíba 68
Além Paraíba 40 145
Além Paraíba 51 ---
Além Paraíba 102
Além Paraíba 258
Além Paraíba 274
Além Paraíba 289
Além Paraíba 400
Além Paraíba 408
Além Paraíba 413
Além Paraíba 424
Além Paraíba 426
Além Paraíba 505
Além Paraíba 577
Além Paraíba 604
Além Paraíba 690
Além Paraíba 716

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Além Paraíba 724


Além Paraíba 808 (Igreja Nossa Senhora da Conceição e anexos)

E
Além Paraíba 867

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Além Paraíba 877
Além Paraíba 891
Além Paraíba 121/127
Além Paraíba 774/786
Além Paraíba 78/ 88
Bonfim 1120 (Cemitério do Bonfim)
Botelhos 90
Caparaó 397
Caxambú 146
Do Serro 94
Do Serro 187
Do Serro 202
Do Serro 295
Do Serro 319
Do Serro 333
Entre Rios 95
Entre Rios 105
Formiga 50
Formiga 101
Itapecerica 241
Itapecerica 303
Itapecerica 382 146
Itapecerica 454 ---
Itapecerica 551
Itapecerica 579
Itapecerica 592
Itapecerica 613
Itapecerica 622
Itapecerica 714
Itapecerica 719
Itapecerica 769
Itapecerica 811
Itapecerica 825
Itapecerica 866
Itapecerica 918
Itapecerica 938
Itapecerica 945

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Itapecerica 946
Itapecerica 958

E
Itapecerica 963

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Itapecerica 983
Itapecerica 987
Itapecerica 1017
Itapecerica 1007/ 1011
Itapecerica 423/ 431
Itapecerica 464/ 468
Itapecerica 595/ 605
Itapecerica 625/ 633
Itapecerica 757/ 771
Itapecerica 789/ 791
Itapecerica 878/ 890
Itapecerica 905/ 911
Itapecerica 919/ 927
Itapecerica 999/ 1005
Jequeri 47
Jequeri 52
José Bonifácio 189 (Escola Municipal de Belo Horizonte)
José Ildeu Gramiscelli 86
José Ildeu Gramiscelli 115
José Ildeu Gramiscelli 341
Lambari 228
Patrocínio 34 147
Presidente Antônio Carlos 821 ---
Presidente Antônio Carlos 901
Rio Novo 45
Serpentina 12
Serpentina 14
Serpentina 32
Serpentina 51
Serpentina 71
Serpentina 86
Serpentina 114
Serpentina 136
Serpentina 139
Serpentina 182
Serpentina 189
Serpentina 209

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Serpentina 36/44
Traíras 116

E
São Cristovão s/n (Igreja de São Cristovão)

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10.7. BENS CULTURAIS COM REGISTRO DOCUMENTAL CONCLUÍDO E APROVADO PELO CDPCM/BH

Além Paraíba 109


Além Paraíba 1007
Anfibólios 304
Bonfim 844
Dom Pedro II 117
Dom Pedro II 174
Dom Pedro II 174
Dom Pedro II 194
Fortaleza 28
Itapecerica 951
Itatiaia 11
Jaguari 133
Jequeri 126
Lagoa Santa 36
Nossa Senhora de Fátima 1675
Nossa Senhora de Fátima 1861
Pedro Leopoldo 42
Presidente Antônio Carlos 465 148
Rio Novo 19 ---
Serpentina 54
Sete Lagoas 20

10.8. BENS CULTURAIS COM REGISTRO DOCUMENTAL SOLICITADO PELO CDPCM/BH (EM DEZEMBRODE 2016)

Além Paraíba 58
Além Paraíba 665
Além Paraíba 819
Além Paraíba 840
Arceburgo 162
Do Serro 42
Dom Pedro II 95
Fortaleza 40

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Itapecerica 185
Itapecerica 189

E
Itapecerica 207

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Itapecerica 261
Itapecerica 527
Itapecerica 656
Itapecerica 764
Itapecerica 833
Itapecerica 843
Itapecerica 969
Itapecerica 263/ 269
Jaguari 975
Patrocínio 360
São Salvador 66

149
---

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11. REFERÊNCIAS

E
LIVROS, TESES E MONOGRAFIAS

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CAVALCANTI, Lauro. Quando o Brasil era moderno: guia de arquitetura 1928-1960, Aeroplano, Rio de
Janeiro 2001.

MAGNI, Teodoro. O direito ao patrimônio em Belo Horizonte: A institucionalização das práticas e a


proteção do bairro Floresta. 2012, 265 f. Tese (mestrado) Programa de Ciências sociais da Pontifícia
Univerdade Católica de Minas Gerais.
NORA, Pierre. Entre Memória e História: a problemática dos lugares, In: Projeto História. São Paulo:
PUC, n. 10, dez. 1993, p. 07-28.
ANDRADE, Luciana Teixeira de Andrade e TEIXEIRA, Alexandre Eustáquio. A territorialidade da
prostituição em Belo Horizonte. Cadernos Metrópole, n. 11, p 137-157. 1º sem. 2004.

CASTRIOTA, Leonardo. Paisagem cultural: novas perspectivas para o patrimônio. [on-line].


Arquitextos: 2013. Disponível na Word Wide Web:
http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/14.162/4960. ISSN 1809 - 6298
CHOAY, Françoise. A alegoria do patrimônio. São Paulo: Editora da Unesp: Estação Liberdade, 2006.
FONSECA, Maria Cecília Londres. O Patrimônio em processo: trajetória da política federal de
preservação no Brasil. 2ª Edição. Rio de Janeiro: UFRJ/MinC-IPHAN, 2005.
LYNCH, Kevin. A imagem da cidade. 2ª Ed. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2010.
MAGNANI, José Guilherme Cantor. De perto e de dentro: notas para uma etnografia urbana. Revista
Brasileira de Ciências Sociais, vol 17, n. 49 - São Paulo, junho de 2002 150
---
___. Patrimônio e Cultura. Trilhas do Patrimônio/ Boletim do Departamento do Patrimônio Histórico e
Artístico, Brasília, v. 3, 1996.
___. Da periferia ao centro: Pedaços & Trajetos. Revista de Antropologia (São Paulo), São Paulo, v. 35,
n. 1, p. 191-204, 1992.
___ . Quando o campo é a cidade: fazendo antropologia na metrópole. In: José Guilherme Cantor
Magnani; Lilian de Lucca Torres. (Org.). Na Metrópole: Textos de Antropologia Urbana. 2 ed. São
Paulo: Edusp - FAPESP, 2000, v. 1, p. 15-53.
RODRIGUES, Miriam Sartori. A contribuição do patrimônio cultural na qualidade visual da paisagem
urbana. Dissertação (mestrado) – UFRGS, Faculdade de Arquitetura, Programa de Pós-graduação em
Planejamento Urbano e Regional. Porto Alegre, 2010.
Carta de Atenas - Sociedade das Nações - Outubro de 1931. Conclusões Gerais e Deliberações da
Sociedade das Nações, do Escritório Internacional dos Museus. [on-line]. Disponível na Word Wide
Web: http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20de%20Atenas%201931.pdf.

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Carta de Atenas - CIAM - Novembro de 1933. Generalidades, diagnósticos e conclusões sobre os


problemas urbanísticos das principais e grandes cidades do mundo, apurados pelo Congresso

E
Internacional de Arquitetura Moderna, em Atenas. [on-line]. Disponível na Word Wide Web:

CONJUNTO URBANO BAIRROS LAGOINHA, BONFIM


http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20de%20Atenas%201933.pdf
Carta de Veneza - Maio de 1964. II Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos de Monumentos
Históricos [on-line]. Disponível na Word Wide Web:
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20de%20Veneza%201964.pdf
Recomendações de Nairóbi - Novembro de 1976. 19ª Sessão da UNESCO. [on-line]. Disponível na
Word Wide Web:
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Recomendacao%20de%20Nairobi%201976.pdf
Carta de Washington - 1986. Carta Internacional para a Salvaguarda das Cidades Históricas. [on-line].
Disponível na Word Wide Web:
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20de%20Washington%201986.pdf
Recomendação Europa - Setembro de 1995. Recomendação Europa sobre a conservação integrada
das áreas de paisagens culturais com as políticas paisagísticas, adotada pelo Comitê de Ministros por
ocasião do 543º encontro de vice-ministros. [on-line]. Disponível na Word Wide Web:
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Recomendacao%20Europa%201995.pdf

151
---

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12. ANEXOS

E
ANEXO I

CONJUNTO URBANO BAIRROS LAGOINHA, BONFIM


Data: __ / __ /__
Questionário Nº

Informações sobre o entrevistado

Gênero: Feminino Masculino


Faixa etária:
de 18 a 25 anos
de 26 a 35 anos
de 36 a 50 anos
de 51 a 65 anos
acima de 66 anos
Instrução:
ensino fundamental incompleto
ensino fundamental completo
ensino médio incompleto 152
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ensino médio completo
ensino superior incompleto
ensino superior completo
Mora no bairro: sim não
Tempo de moradia: Com que frequência vai ao bairro:
<1 ano diariamente
2 a 5 anos 1 a 2 vezes por semana
6 a 10 anos 3 a 5 vezes por semana
11 a 20 anos 3 vezes por mês
+ de 20 anos 1 vez por mês
Profissão:

DIRETORIA DE PATRIMÔNIO CULTURAL FUNDAÇÃO MUNICIPAL DE CULTURA CONSELHO DELIBERATIVO DO PATRIMÔNIO CULTURAL DE BELO HORIZONTE DEZ. 2016
CARLOS PRATES
D O S S I Ê P A R A P R O T E Ç Ã O

1. Quando ouve a palavra Lagoinha o que pensa imediatamente?

E
2. O que simboliza o bairro pra você?

CONJUNTO URBANO BAIRROS LAGOINHA, BONFIM


3. Descreva fisicamente o bairro em linhas gerais.

4. Descreva o caminho que faz da casa para o trabalho (ou qualquer outro destino diário). Faça uma
descrição completa do percurso, o que vê, ouve, cheira, incluindo o que considera importante como
referência e lugares ou construções significativas.

5. Nesse mesmo sentido, descreva o percurso que faria saindo da Praça XV de Junho até a Praça do
Peixe.

6. Nesse mesmo sentido, descreva o percurso que faria saindo da Praça do Peixe até o Hospital
Odilon.

7. Nesse mesmo sentido, descreva o percurso que faria saindo da Praça do Peixe até o Cemitério do
Bonfim.

8. Nesse mesmo sentido, descreva o percurso que faria saindo do Centro até sua casa/trabalho.

9. Quais são os lugares e construções mais representativos do bairro?

10. Das construções consideradas como as mais representativas, indique as principais razões pela 153
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qual elas contribuem:

Positivamente para o bairro Negativamente para o bairro

Altura da edificação Altura da edificação


Forma da edificação Forma da edificação
Estilo arquitetônico Estilo arquitetônico
Ornamento e detalhes decorativos Ornamento e detalhes decorativos
Estado de conservação Estado de conservação
Valor histórico Valor histórico
Valor afetivo Valor afetivo

DIRETORIA DE PATRIMÔNIO CULTURAL FUNDAÇÃO MUNICIPAL DE CULTURA CONSELHO DELIBERATIVO DO PATRIMÔNIO CULTURAL DE BELO HORIZONTE DEZ. 2016
CARLOS PRATES
D O S S I Ê P A R A P R O T E Ç Ã O

11. No que o bairro é melhor e no que é pior do que os outros bairros de Belo Horizonte?

E
12. Como são as pessoas que moram e frequentam o bairro?

CONJUNTO URBANO BAIRROS LAGOINHA, BONFIM


13. Quais são os costumes e atividades que mais caracterizam o bairro?

14. Você percebe alguma manifestação cultural específica do bairro?

154
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DIRETORIA DE PATRIMÔNIO CULTURAL FUNDAÇÃO MUNICIPAL DE CULTURA CONSELHO DELIBERATIVO DO PATRIMÔNIO CULTURAL DE BELO HORIZONTE DEZ. 2016

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