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Casais e familias terapia cognitivo-comportamental (TCC) com casais ¢ familias sem duvida saiu de sua infancia e esta entrando na adoles- céncia. Foi especialmente nos tiltimos dez anos que o campo da terapia de casais e familias reconheceu a forca e eficacia das abordagens cognitivo-comportamentais, seja como um modo de integracdo com outras formas de terapia fa- miliar (Dattilio, 1998; Dattilio e Epstein, 2003), seja como uma modalidade independente. A guisa de historia, as terapias cognitivo- comportamentais inicialmente foram desenvol- vidas para tratar depressao e ansiedade, o que certamente teve um tremendo impacto no cam- po da psiquiatria e satide mental contempora- neas. A aplicagao a problemas nas relacdes in- timas s6 comecou ha 40 anos, com os primei- ros escritos apresentados por Albert Ellis (Ellis e Harper, 1961). Foram Ellis e seus colabora- dores que reconheceram o importante papel que a cogni¢o desempenha nos relacionamen- tos conjugais, tendo como base a premissa de que ocorre disfungao quando os cénjuges man- tém crencas irrealistas sobre o relacionamen- to e fazem avaliagdes negativas extremas sobre a origem de suas insatisfacdes (Ellis, 1977; Ellis et al., 1989). Anteriormente, nas décadas de 60 e 70, os terapeutas do comportamento ti- nham experimentado aplicar principios da teo- ria da aprendizagem na abordagem de com- portamentos problematicos de adultos e crian- as. Muitos dos principios e técnicas compor- tamentais utilizados no tratamento de indivi- 25— Frank M. Darmiio duos puderam ser aplicados a casais disfuncio- nais e, muito mais tarde, a familias. Por exem- plo, Stuart (1969), Lieberman (1970) e Weiss, Hops e Patterson (1973) apresentaram a ul zacao da teoria do intercambio social e dos principios de aprendizagem operacional para facilitar uma interacao mais satisfatoria entre casais que se queixam de dificuldades. Isso preparou o terreno para as pesquisas que se seguiriam, fazendo com que os terapeutas de casais e familias reconhecessem a importancia de intervir nos fatores cognitivos, bem como nos padrdes de interagio comportamental. Muito antes de as principais teorias de terapia familiar existirem, sabia-se que as cognices poderiam ser utilizadas como componentes auxiliares de tratamento dentro de um para- digma comportamental (Margolin e Weiss, 1978). Foi durante a década de 80 que os fato- res cognitivos se tornaram um foco crescente da pesquisa sobre casais e da literatura tera- péutica. As cognicdes eram tratadas de forma mais direta e sistematica do que o que estava sendo proposto em outras abordagens tedri- cas da terapia familiar (Baucom, 1987; Baucom et al., 1989; Beck, 1988; Dattilio, 1989; Eps- tein, 1982; Epstein e Eidelson, 1981; Fincham, Beach, Nelson, 1987; Weiss, 1984). Quando a distorgao modificada e as percepgdes inade- quadas se tornaram o foco de atengao com casais, os terapeutas comecaram a dar mais atengao as inferéncias e crengas que os conju ges mantinham uns sobre os outros (Baucom e 378 Paulo Knapp & colaboradores Epstein, 1990; Dattilio e Padesky, 1995; Eps- tein, 1992; Epstein e Baucom, 1989). 0 estabe- lecimento da avaliacao cognitiva e dos méto- dos de intervencao foi emprestado da terapia individual e adaptado para utilizacao com ca- sais. Como na terapia individual, as interven- Ges cognitivo-comportamentais conjugais ti- nham por objetivo aperfeigoar a capacidade dos parceiros de modificar suas prdprias cog- nigdes problematicas e de comunicar e resol- ver problemas de maneira construtiva (Baucom e Epstein, 1990; Epstein e Baucom, 2002}. Da mesma forma, as abordagens compor- tamentais da terapia com familias se amplia- ram para incluir as cognigoes de uns integran- tes sobre os outros, Ellis (1982) também foi um dos pioneiros na introdugaio da abordagem cognitiva na terapia familiar, utilizando sua perspectiva emotiva racional, e Bedrosian (1983) destacou a aplicagaio do modelo de te- rapia cognitiva de Beck (Beck et al.,1979) & com- preensao e tratamento de dinamicas familia- res disfuncionais. Durante as décadas de 80 e 90, a literatura sobre terapia cognitivo-com- portamental com familias se expanditt rapida- mente (Alexander, 1988; Dattilio, 1993, 1994, 1997, 2001; Epstein e Schlesinger, 1996; Epstein, Schlesinger, Dryden, 1988; Falloon, Boyd, McGi I, 1984; Huber e Baruth, 1989: Robin e Foster, 1989; Schwebel e Fine, 1994; Teichman, 1981, 1992) ¢ hoje ¢ reconhecida como uma importan- te forma de tratamento nos livros didaticos sobre terapia familiar (p. ex., Goldenberg e Goldenberg, 2000; Nichols e Schwartz, 2001). A partir de estudos sobre resultados de tratamento, acumularam-se evidéncias empi- ricas sobre a eficacia da terapia cognitivo-com- portamental com casais, embora a maioria dos estudos tenha se concentrado principalmente nas intervencdes comportamentais e poucos tenham investigado 0 impacto dos procedimen- tos de reestruturacao cognitiva (consulte Bau- com et al., 1998, para uma andlise completa). Menos pesquisas foram realizadas sobre tera- pia cognitivo-comportamental familiar gené ca, € a literatura predominante se concentra em aplicagdes com transtornos individuais como a esquizofrenia e os transtornos de con- duta infantil (Reinecke, Dattilio, Freeman, 2003). Estudos recentes demonstraram a efi- cacia das intervencdes familiares de orienta- 0 comportamental (psicoeducacao, treina- mento ¢ habilidades de resolucao de proble- mas de comunicagao) com esses transtornos (Baucom et al., 1998). A ccrescente adogao de métodos cogniti- vo-comportamentais por terapeutas de casais e de familias parece dever-se a diversos fato- res: (a) evideéncias de pesquisa sobre sua efica- cia; (b) sua atratividade para os clientes, que valorizam a abordagem pré-ativa na resolucao de problemas e na construgao de habilidades que a familia pode utilizar para enfrentar futu- ras dificuldades; (c) sua enfase na relacao cola- borativa entre terapeutas e clientes. Aperfei- Goamentos recentes da terapia cognitivo-com- portamental (Epstein e Baucom, 2002) amplia- ram os fatores contextuais que sao levados em conta, tais como aspectos do ambiente fisico ¢ interpessoal do casal ou da familia (por exem- plo, parentes, o local de trabalho, violéncia no bairro, condicdes econémicas nacionais). As te- rapias cognitivo-comportamentais de casais ¢ de familias tornaram-se ambas uma abordagem tedrica importante na literatura de terapia de casais e de familias e continuam se desenvol- vendo por meio das iniciativas criativas de seus praticantes, medida que mais pesquisas au- mentam sua aplicabilidade ao campo da tera- pia familiar. TEORIA E PESQUISA NA TERAPIA. COGNITIVO-COMPORTAMENTAL Embora nao apareca com muita freqiiéncia na grande maioria dos textos sobre terapia cog- nitivo-comportamental, o trabalho tedrico ini- cial de Alfred Adler teve um tremendo impac- to na TCC em geral. Isso sem diivida se esten- de a terapia cognitivo-comportamental de ca sais e, em especial, & de familias. A teoria adle- riana de psicologia individual (Adler, 1964) con- siderava o funcionamento individual no con- texto mais amplo em que ocorrem certos com- portamentos. Adler (1978) teorizou que as pes- soas tém a necessidade de desenvolver um re- lacionamento intimo com pelo menos um in- Terapia Cognitivo- Comportamental na Pratica Psiquidtrica 319 dividuo para seu proprio bem e, em tiltima ana- lise, para o bem da comunidade, da sociedade e da humanidade. Adler também acreditava que a formacao de casamentos e familias fornece a sociedade conexdes entre 0 passado e o futu- ro, Ele sugeriu que o éxito no casamento é uma tarefa que exige posturas de igualdade, coope- ragao e responsabilidade de ambos os conju- ges, bem como habilidades para comunicar e resolver problemas de um modo colaborativo. Segundo Adler, os individuos comumente co- mecam os relacionamentos com crencas irrea- listas baseadas em mitos da sociedade. Tais crencas, conseqiientemente, prejudicam 0 éxito dos relacionamentos, especialmente enue casals. 0 foco de atencao de Adler no tratamento era principalmente a natureza significativa do com- portamento de cada membro da familia e a con- seqiiéncia que suas agdes tém sobre os outros membros. Disfungdes na interacao familiar en- volvem a tentativa de cada pessoa de obter ou manter uma posicdo mais vantajosa sobre 0 ou- tro. Um dos principios fundamentais de sua abor- dagem era mudar padrdes de interagao assimé- tricos que prejudicam a capacidade do casal e da familia de desenvolver um relacionamento equi- librado. Muito do trabalho de Adler se encontra na terapia cognitivo-comportamental contempo- ranea com casais e familias. Destacam-se a utili zacao da identificacao das atitudes ou das cren- as disfuncionais que cada membro da familia tem sobre o relacionamento, bem como o fornecimen- to de um retorno a familia sobre temas impor- tantes em seu relacionamento. Tarefas de casa utilizadas entre as sessoes facilitam mudan- cas duradouras. A obra de Adler, sem divi- da, forneceu uma base sdlida para a atual te- rapia de casais e de familias e, por isso, me- rece maior reconhecimento. O IMPACTO DA TEORIA DA APRENDIZAGEM SOCIALE DA TEORIA DO INTERCAMBIO SOCIAL. Ateoria da aprendizagem social de Albert Ban- dura (1977) integra principios da psiquiatria social, do desenvolvimento e cognitiva, bem como principios da teoria da aprendizagem oriundos da psicologia experimental (Bandura e Walters, 1963; Rotter, 1954). Além dos con- dicionamentos classico e operante, a teoria da aprendizagem social enfatiza a eficacia da aprendizagem observacional, na qual um indivi- duo adquire a habilidade de realizar tanto res- postas simples quanto complexas pela observa- Gao de outros individuos que servem de modelo de resposta. Um individuo pode nao imitar um comportamento modelado a menos que consiga prever o reforco recebido para fazer isso ou acre dite que é apropriado se comportar daquele modo. Os tedricos da aprendizagem social con- centram-se em aprender como as criancas adqui- rem padres de comportamento interpessoal pela exposicao a dinamica da familia de origem. Eles também sugerem que a aprendizagem humana & mediada por processos cognitivos. como, por exemplo, expectativas sobre a probabilidade de que nossas ages terao determinadas conseqiién-

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