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Carlos de Laet

INDIFERENTISMO RELIGIOSO
Carlos de Laet, Indiferentismo religioso.
Conferência feita em 24 de Outubro de 1901 no Círculo
Católico da Mocidade em presença do Exmo. e Revmo.
Sr. D. Joaquim Arcoverde Arcebispo do Rio de Janeiro
pelo Dr. Carlos de Laet.
Com aprovação da autoridade diocesana.
ADVERTÊNCIAS NECESSÁRIAS

1ª Havendo, nesta conferência, exposição de matéria


que entende com o dogma e a moral, o autor muito
voluntariamente a submete às decisões da autoridade
eclesiástica.

2ª Aqui se publicam por extenso algumas leituras que,


por não se fatigar o auditório, apenas foram resumidas ou
indicadas pelo orador.

E, 3ª: foram suprimidas as notas de aprovação ou


aplauso; e somente se registra a benção com que ao
terminar o seu discurso, foi o orador premiado pelo Exmo.
E Revmo. sr. Arcebispo.
SUMÁRIO

I. — Caráter do indiferentismo nos tempos atuais e na


sociedade brasileira. — Matizes do indiferentismo. —
Algumas palavras sobre o materialismo e o positivismo.
— A pseudo-religião de Comte.

II. — Deístas, latitudinários. — O deus de Epicuro. —


A religião natural. — Como do protestantismo nasceu o
deísmo. — perigo de certas concessões... — A
solidariedade no erro. — Bayle contra os latitudinários.

III. — A razão como arquiteto de religiões. —


Pretensa intolerância e estreiteza do dogma católico. —
Quanto, ao invés disto, se evidencia a sua caridosa lição.
— O indiferentismo albergue de ruins paixões.

IV. — O indiferentismo religioso na família, — No


exército e na armada. — O Estado separado da Igreja. —
Vãos receios de uma religião de Estado opressora. — A
tolerância dos indiferentes. — Um pouco de estatística. —
Entre a moral e o dogma. — Harmonia no divórcio.

V. — (Conclusão) — O caminho da verdade, do belo


e do bem. — CHRISTUS regnat!
INDIFERENTISMO RELIGIOSO

Exmo. e Revmo. Sr. Arcebispo, — Revmos.


Srs. Membros do Clero. — Exmas.
Senhoras. — Meus senhores.

Tendo realizado em junho do ano passado uma


conferência sobre a Instrução religiosa, acreditei que
cumprido se achava meu dever, porque me não eximira do
encargo de suprir, nesta tribuna, a falta de oradores mais
competentes, ocasionalmente impedidos; e pensei que
portanto, estava dispensado de novamente ocupar a vossa
benévola atenção. Sucede, porém, que hoje, como então,
há quem entenda que de todo descabida não será a minha
palavra, e eis porque, pela segunda vez, aqui estou
solicitando a vossa benignidade para o que da minha parte
seria infundada presunção, se apenas não fora prova de
submissão e obediência.

Senhores, o assunto de que vou tratar tem o magno


interesse da atualidade, porque, se o indiferentismo em
religião é moléstia antiga, irrefragavelmente assume
caráter agudo nos tristes tempos que atravessamos.
Verberá-lo, mostrando a sua sem-razão e as suas perigosas
conseqüências, é tocar com o dedo em uma das mais
dolorosas chagas da sociedade moderna, e muito
principalmente da comunhão brasileira em nossos dias.

Principiemos, senhores, metodicamente definindo esta


enfermidade moral. “A indiferença em religião (leio em
seguro expositor) consiste em sustentar que todas as
religiões são igualmente boas; que nenhuma delas é, mais
do que as outras, verdadeira e vantajosa aos homens; que a
cada povo e a cada particular se deve deixar a liberdade de
prestar a Deus o culto que lhe aprouver, ou mesmo de não
prestar culto algum, se o tiver por conveniente”1.

Cumpre notar que, de ordinário, em o número dos


indiferentes se confundem vários matizes da
incredulidade. Suponhamos, para melhor explanação deste
assunto, que nos achamos em um desses lugares, em que,
todos os dias, nos acotovelamos com indivíduos das mais
diversas maneiras de pensar, na sala de redação de um
jornal, por exemplo, e que aos nossos ouvidos ali chegam
sons do bronze sagrado, convidando os fiéis à assistência
da Missa. Alguns, os católicos, preparam-se para o
cumprimento desse dever; e aos outros interpelamos por
que não o fazem.

— Sou materialista, responde-me um. Para mim todo


o universo se resume naquilo que me dão testemunho os
meus sentidos: a matéria eterna e infinita. Todo culto para
mim é uma superstição odiosa.

Estaríamos então a dialogar com um indiferente?


Certo que não. Este tal não é um homem a quem sejam
indiferentes quaisquer religiões, porque ele as proscreve
todas. Não é com ele que hoje haveríamos de tratar.
Poderíamos, com vantagem, notar-lhe que as suas teorias,
estabelecendo a eternidade da matéria para dispensar a
criação, constituem, por singular falta de lógica, um
dogmatismo sem demonstração científica. Poderíamos
amiudar as objeções que esmagam esse vão sistema, para
o qual tudo é matéria... Poderíamos exprobar-lhe a abjeção
da sua doutrina, que rebaixa o homem à condição dos
irracionais, prona atque ventri obedientia, como diz o
Sallustio. Mas o materialista não é um indiferente, e agora
escapa ao objeto desta conferência.

Outro dos circunstantes que figuraríamos, seria um


positivista. Notai, porém, que fora preciso desdobrá-lo,
porque há positivistas e positivistas. Há o grupo dos
Littreístas que francamente vão descambando no
materialismo; e o grupo dos Comtistas, que acompanham
o mestre na sua segunda fase e que têm sacerdotes e culto
externo.

Uns e outros (vede-o bem) distinguem-se do


materialismo, porque, mediante uma evasiva, que seria
hábil se desde muito não fosse tão conhecida, preceituam a
abstenção de juízo sobre as primeiras origens e últimos
fins. Ora, desde que absolutamente nada aceitam sobre a
existência de Deus criador e sobre o destino do homem,
claro está que da religião nada querem, e nada têm que ver
com as crenças religiosas dos demais homens.

Ordinariamente, senhores, se costuma dizer que o


positivismo é a filosofia do relativo, a condenação do
absoluto, mas cumpre entendê-lo em termos, e tendo
sempre em vista que no incognoscível de Spencer ou
naimensidade de Littré entreluzem os clarões da nebulosa
em que se envolve o nosso Deus. Ouçamos a um príncipe
do positivismo:

“O que se acha além do saber positivo (diz-nos ele)


ou, materialmente, o fundo do espaço ilimitado, ou,
intelectualmente, a concatenação das causas sem termo, é
inacessível ao espírito humano. Mas inacessível não quer
dizer nulo ou inexistente. A imensidade tanto material
como a imaterial, por um apertado liame se prende aos
nossos conhecimentos, e por esta aliança se torna uma
idéia positiva e da mesma ordem; quero dizer que,
tocando-os e orlando-os, esta imensidade aparece sob o
seu duplo caráter, a realidade e a inacessibilidade. É um
oceano que incessante vem bater às nossas plagas e para o
qual não temos barcos nem velas, mas cuja visão é tão
clara quão formidável”2.

Aí tendes, senhores: o positivista discerne o infinito na


matéria e no pensamento. Chegado à praia que orlam e
açoitam as vagas temerosas desse mar intérmino, ele não
pode contestar a existência e, muito mais do que admitir-
lhe a possibilidade, ele o reconhece como noção positiva.
O que lhe falta (para continuar a servir-me da bela imagem
de Littré) são as velas, é a barca com que se arrisque ao
duvidoso pélago...Que fazer em tão ansiosa conjuntura? O
que aconselharia o espírito da seita fora a indefinida
contemplação dessas vagas misteriosas: mas tal indecisão
vai de encontro à natureza intelectual do homem, e tão
verdade é isto que logo entraram a fragmentar-se os
grupos positivistas; uns, indóceis aos segundos
ensinamentos de Comte, insensivelmente têm descambado
para as hostes do materialismo, que com eles não pouco se
têm aumentado; ao passo que outros, obedientes às
místicas abusões do velho adorador de Clotilde de Vaux,
arquitetaram um “catolicismo sem Deus” e criaram uma
pseudo-religião sobre cujos termos convém que nos não
equivoquemos.

Esta distinção, senhores, é essencial, porquanto não se


cansam os comtistas de apregoar que o seu sistema é
essencialmente religioso. O próprio Comte, aliás, bem
claramente disse que – se no seu Curso de
FilosofiaPositiva tinha mudado a ciência em filosofia, no
seu Sistema de Política Positiva mudara a filosofia em
religião3. Legítima é, portanto, a curiosidade no
inquirirmos que coisa seja essa esquisita religião, que
fecha os olhos a Deus, e que proscreve as agitações da
causa primeira do universo e dos últimos fins do homem.

Senhores, a religião do comtismo nada tem de comum


com as outras senão a sonoridade do vocábulo, pois que
não é uma religião. O positivista não é um indiferente em
religião, não é um homem a quem sirvam todas as
religiões, pois ele só admite uma, e essa não é religião.
Este vocábulo para ele não tem a significação que o resto
do mundo lhe dá. Para nós, como para todos, exceto para
os discípulos de Comte, religião é o conhecimento da
Divindade e do culto que lhe devemos render, noção a que
se junta a vontade de bem cumprir esse dever. Segundo a
força do vocábulo (re ligo), ela é o laço que prende o
homem a Deus e à observância das suas leis pelos
sentimentos de respeito, de temor, de submissão, de
gratidão, de confiança e de amor, que nos inspiram as
perfeições divinas e os benefícios que do ALTÍSSIMO
temos recebido. Eis o sentido que ligamos à palavra. Mas
não assim os positivistas que se inculcam ortodoxos. Para
estes, segundo a definição do seu mestre, a religião não
passa do — “estado de plena harmonia própria à
existência humana, ou coletiva ou individual, quando
todas as suas partes se acham dignamente coordenadas”4.

Na religião de Augusto Comte não há Deus, nem


tampouco alma imortal. O ser supremo, o Grande Ser
(como ele lhe chama), é a Humanidade. Este grande ser
tem por origem a terra, mãe de todos os seres, e à qual deu
ele o nome de Grande Feitiço, Grand Fétiche. E a terra
está no espaço, cujas leis são as condições primeiras de
todas as existências, e que por isto ele chamou o Grande
Meio. O Grande Meio, o Grande Feitiço e o Grande Ser,
eis a trindade que é objeto do culto positivista. Mas como
a humanidade, afinal, não é propriamente um ser, mas uma
sucessão de indivíduos mortos, transitórios, e em cujo
desfilar Augusto Comte não duvida introduzir os animais
domésticos que nos prestam serviços, o culto positivista
não passa de uma comemoração dos mortos. A
imortalidade para eles é a lembrança que dos mortos
permanece na memória dos sobreviventes. E aí está,
senhores, o que significam essas peregrinações positivistas
aos cemitérios, as quais entre nós se amiúdam, não para
ali, como nós os cristãos, saudarem em uma ossada os
restos de um corpo que esperamos ressurja com vida
eterna, mas simplesmente para reacendermos nas
podridões do sepulcro os fogos fátuos das suas paixões
rancorosas e da sua daninha política...

Já se vê que, sendo a chamada religião dos comtistas


coisa bem diversa do que é para o resto do gênero
humano, tanto vale dizer que essa fração de filosofantes
considera todas as religiões do mundo como errôneas ou
supersticiosas criações de espíritos inferiores e não
emancipados.

Tem aqui todo cabimento, senhores, algumas palavras


de Pascal: “Grande mal (diz ele) já é de certo estar na
dúvida; mas para quem nela se acha, o indagar é pelo
menos um dever indispensável. Assim, aquele que duvida
e que não indaga, é ao mesmo tempo não só bem injusto
como igualmente bem infeliz. E se em tais condições
estiver tranqüilo e venturoso, se o apregoar e disto se
envaidecer, se desse mesmo estado tirar motivo para
alegria e para vaidade, — faltam-me termos para
qualificar tão extravagante criatura”5.

Posta, pois, também de parte essa extravagante grei de


transviados, ei-nos em frente do indiferentismo
propriamente dito, isto é, do grupo que, em nome do bom
senso, reconhece um Deus, mas que absolutamente não
cura dos meios de adorá-lo e servi-lo.

II

Nessa corte ainda cumpre distinguir duas classes bem


diversas: uma, a dos deístas, que são os sectários da
chamada religião natural; e outra a dos latitudinários, que
professam esta ou aquela religião, mas sustentando que
todos os sistemas religiosos podem servir para encaminhar
o homem, neste mundo, à consecução da glória eterna no
outro.

Entendamo-nos, primeiro, com o deísmo e


indaguemos em que consiste a sua religião natural. Ela se
cifra (respondem-nos seus autorizados sequazes) em
adorar a Deus e praticar o bem.

Otimamente: mas que Deus será este a quem adorares?


Se é o nosso, isto é, um Ser infinitamente poderoso e bom,
Criador e Conservador do universo, não lhe podeis negar o
zelo das suas criaturas; se Ele é providente, há de atender
ao destino final do homem; e absurdo se torna imaginar
que lhe tenha negado o conhecimento de certas verdades
tendentes a guiar a sua conduta neste mundo e esclarecê-lo
sobre o que o aguarda no outro.

Um deus que diante do homem, fraco, perplexo,


angustiado sobre o que mais precisa saber, se mantivesse
eterna, serenamente inacessível e cruelmente silencioso,
esse deus seria a negação da Providência, esse deus
baixaria do supremo ideal à plana inferior em que se
agitam os fantasmas de Epicuro. Seria um deus que nada
faz, como nos explica o Cícero no seu De Natura Deorum;
um deus vadio, que com coisa alguma se importa e que
viveria feliz, certo das eternas voluptuosidades e
dedignando-se de olhar para o verme humano.

Mas, senhores, se assim fosse, que significação


razoável teria qualquer adoração que lhe tributássemos? Já
Cícero com a sua habitual sagacidade aprendera este
argumento naquele passo do seu citado livro em que a
Epicuro, que nega a Providência, exproba haver escrito
uma obra sobre a santidade.

“Epicuro, diz ele, é um homem que zomba de nós, e


que tem menos graça do que atrevimento para escrever
quanto lhe apraza. Que santidade pode ser essa, se os
deuses não curam os homens?".

E mais adiante:

“Se é verdade ser Deus de tal natureza que nem ama


aos homens nem lhes faz bem algum — então que passe
por lá muito bem (valeat!); porquanto, que razão pode
haver para que eu lhe peça que me proteja a ele que a
ninguém pode proteger?”.

Aqui estão, portanto, as duas pontas do dilema em que


infalivelmente se têm de ferir os deístas. Se o vosso Deus
é a Providência, deve ter tratado do que mais interessa,
isto é, deve ter-lhe revelado as verdades necessárias à sua
salvação, ensinando-lhe qual o liame de amor e adoração
que prende a criatura ao Criador — e, neste caso, cais em
erro, volvendo costas à Revelação e pagando o amor com
a indiferença. Mas se o vosso deus é o vão fantasma de
Epicuro — um agregado de átomos que em nossa alma
produza impressões análogas às que sentimos durante os
sonhos — então não sois sinceros quando afirmas que
qualquer culto vos serve, porque das vossas premissas o
que decorre, é, ad instar dos materialistas e ateus, a
proscrição absoluta de toda prática religiosa.

A famosa religião natural não resiste, com efeito, ao


mais leve embate da boa razão. Adorar a Deus é uma
expressão vaga, e cumpriria dizer de que modo. Será, por
exemplo, indiferente a um deísta que se adore a Deus
venerando as forças produtoras da natureza, e
representando-as em vergonhosos símbolos? Que se
ponham em prática os sanguinosos holocaustos dos
antigos Mexicanos ou dos povoados centrais da África?
Neste caso todas as abominações, todas as torpezas, todos
os desvarios, todos os crimes perpetrados por motivo de
religião poderiam incluir-se na religião natural. E se
apenas com tal denominação se procura afetar uma
indefinida e insignificante deferência para com Deus,
então para condená-la vou pedir a autoridade, não de um
padre da Igreja, mas do próprio Augusto Comte, que na
sua Filosofia Positiva acertadamente verbera esse –
“cristianismo cada vez mais amesquinhado ou
simplificado, e reduzido enfim ao teísmo vago e impotente
que, por monstruosa aproximação de termos, os
metafísicos qualificaram de religião natural, como se toda
religião não fosse necessariamente sobrenatural”6.

Não se pode negar senhores, que o deísmo em suas


últimas manifestações seja um produto logicamente
derivado dos princípios do protestantismo.

“Lutero (diz La Mennais no seu Essai sur


l’indifférence) escandalizado por alguns abusos reais, em
lugar de neles reconhecer o inevitável efeito das paixões
humanas, arremeteu contra a própria doutrina. Atacou um
ponto em aparência pouco importante da fé católica; fraco
espírito que não percebia a vigorosa concatenação das
verdades do cristianismo! Mas desprendera ele um anel
dessa cadeia, e já toda a cadeia se lhe escapava. Um erro
chama outro erro. Já não são somente alguns dogmas
isolados que ele contesta, mas de uma feita abala os
alicerces de todos os dogmas. A tradição embaraça, ele
rejeita a tradição; a Igreja proscreve as suas máximas e ele
nega a autoridade da Igreja e declara que como regra de fé
só admite a Escritura; condenado enfim pela própria
Escritura, ele audaciosamente suprime dos livros santos
uma Epístola Apostólica toda inteira (a Epístola de S.
Tiago); e quando lhe perguntam com que direito,
arrogante responde: Eu, Martinho Lutero, assim o quero e
assim o ordeno, valha como razão a minha vontade
— Ego, Martinus Lutherus, sic volo, sic jubeo; sit pro
ratione voluntas”.
Deste modo, senhores, é que onde começa a dúvida e a
negação do catolicismo, entra o fermento que há de
levedar a massa com a lógica inevitável de todas as
decomposições. Multiplicam-se, subdividem-se,
esboroam-se, pulverizam-se as seitas protestantes, porque
como único critério têm o seu princípio da livre
interpretação, a razão erigida como supremo arbítrio em
frente da autoridade católica, cuja supremacia contestam.
Mas desse progressivo e indefinido parcelamento
nasceram inúmeros grupos cada vez mais emancipados do
dogma. Após o luteranismo, que ainda admite a presença
real na Hóstia Consagrada, veio o calvinismo que a
contesta; e depois do calvinismo o socinianismo, cujos
teólogos, ou antes cujos filósofos, raciocinando sobre os
dogmas cristãos, chegaram à perfeição de repudia-los
todos; e que (cumpre não esquecê-lo) contra todos os
mistérios, em geral, nada mais fizeram do que repetir os
argumentos dos protestantes contra o dogma eucarísticos e
outros da antiga fé cristã, que é a católica.

Que poderá, com efeito, resistir aos impetuosos


desvarios da razão humana transviada? O batismo, por
exemplo, cuja necessidade nos é claramente ensinada pelo
Evangelho, aos olhos de alguns sectários protestantes não
passa de vã cerimônia; e, renovando os erros de Pelágio no
5° século da nossa era, Calvino não trepidou em doutrinar
que os filhos dos fiéis são santificados desde o seio
materno – opinião cujo legítimo corolário seria a abolição
desse primeiro sacramento. Assim é que pouco a pouco,
como as pérolas de um colar que se desfia, caem as mais
augustas verdades, e da razão erigida em critério infalível
nada mais pode resultar do que o puro racionalismo.
É por isto, Exmo. Sr., que eu tremo de pavor quando
na tribuna, como no jornalismo, vejo eminentes
correligionários que, induzidos pelo desejo, aliás bem
intencionado, de conciliar a fé e a pseudo-ciência, ou o
catolicismo e uma constituição indiferentista, entram a
fazer indébitas concessões; e, receando escandalizar o
mundo com a sublime loucura da Cruz7, vão até excogitar
demonstrações científicas da divindade de Cristo ou
aceitar o ímpio divórcio da Igreja e do Estado.

Lembra-me, senhores, que em certa localidade de


Minas um pobre vigário se viu obrigado, em virtude de
reiteradas ordens de seu Bispo, a explicar o Evangelho nas
missas paroquiais. O seu ensinamento ele o dava todos os
dias, a todas as horas, na palestra com os seus
paroquianos, que o idolatravam e com quem vivia na mais
íntima comunhão de vida espiritual... Mas o Bispo
ordenava, e era preciso falar em público. Ora, a lição do
dia envolvia o mistério da Santíssima Trindade. O velho
padre volveu-se trêmulo para os seus fregueses: — “O que
nisto é mistério (disse) nem vós o compreendeis, nem eu o
compreendo; mas não fiqueis tristes, porque também não
há sábio que o compreenda. Em torno deste mistério, que
está fechado, têm andado muitos e depois caem de joelhos
para adorar; adoremos nós, sem tanto trabalho nem
indagação”. Ora, aí está, senhores, um servo de Deus que
sem dúvida falou pouco, mas bem, e cujas singelas
palavras infinitamente eu prefiro às perigosas divagações
de certas conferências e de certos artigos de jornais...

Deixemos, porém, de parte este melindroso assunto, e,


reconhecido que o protestantismo é o ponto de partida de
uma vertiginosa carreira que vai dar no abismo
racionalista, assinalado fique também que um dos seus
consectários naturais devia ser o latitudinarismo.

Veio este nome do termo latino latitudo, que, como


não ignorais, quer dizer largura; e sob a denominação
delatitudinários se designam, em teologia, certos
tolerantes que sustentam a indiferença dos sentimentos em
matéria de religião, e concedem a salvação eterna até
mesmo às seitas mais discordes do cristianismo.

Os argumentos, meus senhores, que deixo produzidos


para combater o indiferentismo dos deístas, têm ainda
maior aplicação com referência aos latitudinários.

Com maioria de razão podemos, com efeito,


perguntar-lhes como é que, reconhecendo não somente um
Deus, mas um Deus providente e benfazejo, pai amoroso e
solícito pela salvação dos homens, não nos tenha Ele
indicado os meios, e ensinado o caminho da eterna bem-
aventurança.

O absurdo do latitudinarismo era, porém, exigido pela


disparidade, pela discordância dos erros protestantes. O
protestantismo não é, como às vezes irrefletidamente se
pensa, um corpo doutrinal que se oponha ao catolicismo: é
um acervo de negações da verdade católica, mas negações
que umas às outras se repelem e contradizem. “A quem
não crê, diz um escritor católico, pouco repugna fingir que
se une a outro descrente”. E, senhores, assim foi que, por
exemplo, latitudinariamente se constituiu a chamada Igreja
Evangélica, na qual o mesmo ministro distribui o pão
eucarístico de duas maneiras diferentes e contraditórias, de
sorte que o luterano crê receber o corpo de Jesus Cristo, e
o calvinista apenas o símbolo deste corpo. O
latitudinarismo fecha os olhos a tal absurdo, admitindo
que uma coisa passa a ser e não ser ao mesmo tempo,
segundo a opinião de quem a recebe. Assim o exigiam as
conveniências para que se aparentasse uma união que não
existe. O latitudinarismo, senhores, é a solidariedade no
erro, como a nossa unidade católica o é na verdade.

Não se podem, contudo, impunemente quebrantas as


leis da lógica; e certo é que mesmo entre os protestantes
essa falsa doutrina padece restrições. Os Anglicanos, na
sua Profissão de fé, art. 18, consideram excomungados
todos os que ousam afirmar que pode alguém salvar-se
dentro da lei ou seita que tiver abraçado, contanto que viva
de acordo com essa lei e com as luzes naturais, porquanto
nas Santas Escrituras se ensina que só nos podemos salvar
pelo nome de Jesus Cristo; e, segundo o Catecismo de
Genebra, os Calvinistas, depois de estabelecerem o
latitudinarismo em princípio, logo abrem uma exceção,
determinando que ao fiel cumpre separar-se de uma igreja,
quando, como a Igreja Romana, ordene coisas contrárias
ao Evangelho.

Eis o que eles acharam de melhor, os nossos


adversários protestantes, para opor à doutrina católica;
triste subterfúgio, aliás, e devidamente verberado pelos
espíritos que das falsas premissas tiram todas as
conseqüências.

Por isso, respondendo a um protestante (o ministro


Julien) outro incrédulo, o célebre Bayle, apóstata e
precursor de Voltaire — vede bem que me não valho de
autoridades suspeitas aos inimigos do catolicismo —
escreveu uma obra intitulada Janua cœlorum omnibus
reserata, ou a Porta dos Céus aberta a todos. Este livro
abrange três tratados. No primeiro Bayle faz ver que, de
acordo com as doutrinas protestantes, podem todos os
cristãos salvar-se dentro da igreja Católica, o que, pelos
menos torna inútil a reforma protestante, e demonstra o
vanilóquio dos Luteranos e Calvinistas, que à Igreja de
Roma acoimam de idolatria e de erros fundamentais. E no
2° e no 3° livros prova Bayle que, segundo os mesmos
princípios, não somente é admissível a salvação em todos
as comunidades cristãs, por maiores que sejam os erros
que professem, mas que ainda não se podem excluir da
salvação nem os judeus, nem os maometanos, nem os
pagãos. Deste modo (conclui um expositor) ao pregarem a
independência em tão delicada matéria, os latitudinários,
em vez de facilitarem a entrada no Céu, nada mais fizeram
do que alargar o caminho do inferno.

Já vedes portanto, senhores, com que sabedoria o


Sumo Pontífice Pio IX, mestre inerrável em pontos de
dogma e de costumes, incluiu o latitudinarismo entre os
erros contemporâneos, compendiando no Syllabus as
condenáveis proposições em que se consubstancia tal
doutrina. Permiti que vo-las recorde:

Proposição condenada n° 15: — É livre a qualquer


homem abraçar e professar a religião que tiver
considerado verdadeira, guiado pelas luzes da razão.

Nesta condenação se resumem os conceitos da carta


Apostólica Multiplices inter de 10 de junho de 1851, e da
alocução Maxima quidem, de 9 de junho de 1862.
Mais ainda: também está condenado que – podem os
homens achar o caminho da salvação no culto de qualquer
religião. É a proposição 16ª, já verberada pela
encíclica Qui pluribus, de 9 de novembro de 1846, pela
alocução Ubi primum, de 17 de dezembro de 1847, e pela
encíclica Singulari quidem de 17 de março de 1856.

E, mais ainda, mereceu a condenação do sucessor de


S. Pedro a opinião que — pelo menos se deve bem esperar
da eterna salvação de todos aqueles que não vivem no
grêmio da verdadeira Igreja de Cristo. De acordo com a
doutrina desta condenação já se pronunciara o Pontífice na
alocução Singulari quadam, de 9 de dezembro de 1854, e
na encíclica Quanta conficiamur, de 10 de agosto de 1863.

Contra a rocha destes ensinamentos vemos embater-se


as falaciosas objeções dos filosofantes; e, como acaso
possam impressionar desprevenidos espíritos, não será
talvez tempo perdido o que consumirmos tomando em
consideração algumas delas, pois não vale disfarçar os
atrativos e seduções com que para captar os incautos se
exorna e disfarça o pai da mentira.

III

O indiferentismo fala em primeiro lugar, ao orgulho


humano, enaltecendo o lume racional, que é o mais belo
apanágio da humanidade. Dispensando a lição das
Escrituras, a tradição e o ensino da Igreja, todos os
auxílios enfim com que a eterna Misericórdia nos socorreu
na religião revelada, o indiferentismo faz do homem o
supremo árbitro na opção dos meios conducentes à
conquista da mansão celestial. Reproduz a mítica alegoria
de Ícaro, e ei-lo de novo, ensoberbecido, nas suas asas de
cera a demandar o Empíreo sem outro guia senão a sua
protérvia.

Ele fala depois ao sentimentalismo, que se diz


magoado pelo exclusivismo, pela intolerância católica.
Como! Exclama-se – pois de tantos heróis, de tantos
benfeitores da humanidade, de tantas almas ingênuas e
boas a quem nunca foi pregado o Evangelho, ou que não
lograram abraça-lo, nenhuma terá conseguido, perante o
Supremo Juiz, a plenitude da recompensa prometida à
virtude? Ninguém se terá salvado, ninguém mais se
salvará senão o católico? E este pensamento contristador
reclama para seu consolo as frouxidões do latitudinarismo.

Finalmente, senhores, o indiferentismo favorece as


paixões, subtraindo-as à inspeção e às severidades da
Igreja. Favorece o orgulho, eliminando qualquer
intermediário entre o fiel e Deus. Agrada ao avarento,
porque o dispensa do óbolo para manutenção do culto e
das obras pias. Fulano quer repudiar a esposa e suspira por
casar-se com a de Sicrano: pois bem! Fulano faz-se
protestante, vai perpetrar bigamia nos Estados Unidos, e à
sua consciência sobressaltada responde que por todos os
caminhos se vai ao céu. O iracundo assassino, maculado
de sangue inocente, não terá necessidade de penitência,
porque pela porta escancarada dos céus ninguém se aperta,
nem se incomoda. Para o glutão cessam as importunas
admoestações do preceito abstinencial. Nem há porque lhe
fiquem atrás a inveja e a preguiça... Senhores, uma
doutrina que ao mesmo tempo lisonjeia o orgulho, ataca
em sensibilíssimas fibras o coração humano e termina
provocando a conflagração das paixões, não pode deixar
de ser uma temerosa doutrina: e só me admira a infinita
bondade com que Deus, Senhor Nosso, compassivamente
nos ampara de tão bem tecidas armadilhas.

Mas em primeiro lugar ponderemos que é cúmulo de


insensatez admitir-se na razão humana capacidade e forças
para a solução da suprema questão religiosa.

Esta louca pretensão que se arroga o homem para


entestar com a Divindade é, aliás, antiga qual o mundo.
Nós a vemos no alvorecer das idades, entre edênicas
paisagens, ostentando na soberba do primeiro homem a
estultícia de equiparar-se ao Criador. Et eritis sicut dii8.
“Há tal ambição de subir? — inquire em um de seus belos
sermões o inimitável Vieira — Há tal desatino de crescer?
Anteontem nada, ontem barro, hoje homem, amanhã
Deus!”9 Nós a vemos, nos delírios da revolução francesa,
colocando no altar-mor de Notre Dame uma prostituta
deusa da Razão. E aqui mesmo, nesta cidade cristã e
católica, no único templo que o Comtismo tem conseguido
erigir em todo o orbe, podemos vê-la personificando a
humanidade e recebendo o culto que a criatura racional
deve ao seu onipotente Criador.

Senhores, a razão do homem, a qual legitimamente se


exerce naquilo que, segundo a Escritura, Deus entregou à
disputa dos homens10, nisso mesmo extravaga e se perde
a cada momento. Na matemática, que é o peristilo da
ciência positiva, não são poucos os capítulos lacunosos, e
para não ir mais longe o da teoria geral das equações. Na
Física e na Química surgem de vez em quando inopinadas
descobertas (como por exemplo esta mais recente dos
raios X) as quais nos deixam assombrados das nossas
ignorâncias anteriores. Tateia a medicina, procurando,
com as pompas da tecnologia, encobrir as lacunas da não-
ciência, ao passo que em cada obituário canta a morte o
seu triunfo sobre a arte de curar. Em Atenas, no centro da
mais brilhante civilização que o mundo tem contemplado,
429 anos antes de Cristo, sucumbia Péricles, vitimado pela
peste; e agora, 2.330 anos depois, ainda não se acertou
com o remédio para o tremendo flagelo, ainda se discute
se a extirpação do gânglio é meio de cura ou incremento
de infecção! Disputam estadistas, forjam-se reformas,
preconizam-se admiráveis progressos no tocante à
governação dos povos: e todavia nesta fronteira de dois
séculos ainda a força domina o direito, como no tempo da
pedra lascada, os congressos de paz são desastres
vergonhosos, nem há constituição política (inclusivamente
a nossa) que não seja o consectário de uma revolução.

Eis, senhores, a bancarrota científica; bancarrota que


só podem negar os superficiais e os nulos — e diante da
qual fica reduzida a dimensões liliputianas essa audácia de
arquitetar, por meios puramente racionais, um sistema
completo de relações entre a Divindade e o homem. Nessa
ligação do céu e da terra, em vez da miraculosa escada por
onde via o patriarca que subiam e desciam anjos11,
teríamos o fantástico arrojo dos Titãs, acumulando Pelion
sobre Ossa para invadir o Olimpo...

Vamos, porém, senhores, à segunda ordem dos


argumentos, que destarte se podem resumir:
a intolerância da Igreja, que se reserva o monopólio da
verdade, e assim gera sentimentos de ódio ou desprezo
entre os homens, ainda mesmo que sejam cristãos; e 2°,
a estreiteza do dogma que da eterna salvação exclui
grande número de almas virtuosas.

Senhores, a maior parte das dissensões provém da má


compreensão de alguns termos, e, pois, vamos entender-
nos sobre este vocábulo — intolerância. Se por ele tendes
em mente aquela paixão feroz que nos induz a odiar e a
perseguir os que se acham em erro, então desde já vos
digo que ela é incompatível com a religião católica, que é
a do amor e do perdão. Distingamos, portanto, as diversas
espécies de intolerância, ou, o que vem a dar no mesmo,
quais sejam, teológica e filosoficamente consideradas, as
diversas espécies de tolerância.

Há a chamada tolerância
eclesiástica, religiosa ou teológica, que outra coisa não é
senão o próprio latitudinarismo, isto é, a profissão que faz
uma seita de acreditar que os membros de outra seita se
podem salvar sem renunciarem a seus erros. Existe
a tolerância civil ou política, que é, no direito público dos
países que têm religião de estado, a permissão facultada
aos dissidentes de professarem outras religiões. E
finalmente, em geral se entende por tolerância (ou mais
restritamente tolerância de pessoas, para distingui-la
da tolerância de princípios) a caridade fraterna e a
humanidade, que cristãmente deve reinar entre todos os
homens, qualquer que seja o seu modo de pensar.

Senhores, a intolerância dogmática contra os erros é


um dos caracteres lógicos da posse da verdade. Eu sei que
os três ângulos de um triângulo retilíneo valem em soma
dois ângulos retos, 180 graus, e sobre isto não posso fazer
a menor concessão a quem quer que seja. Ao melhor dos
meus amigos, ou sob ameaça de morte, não posso tolerar
que à dita soma se tire ou se acrescente um segundo de
arco. Argüir, portanto, de intolerância a Igreja Católica
neste ponto é reconhecer-lhe um dos caracteres da sua
verdade. E para que não o diga eu desajudado de qualquer
autoridade, permitireis que a propósito disto eu me
socorra, não a um doutor da Igreja, porém ao insuspeito
campeão da liberdade de consciência, Júlio Simon:

“A intolerância religiosa assim entendida (diz ele) é a


condição indispensável da unidade e da estabilidade da fé
e a conseqüência natural do dogma da revelação. Não se
pode exprobrar a uma Igreja o crer na verdade de seus
próprios dogmas e excluir do seu seio os dissidentes.
Excluindo-os, ela nada mais faz do que registrar o estado
em que se acham aqueles espíritos, porque ninguém pode
pertencer a uma Igreja cujas crenças repudia. Se o estado
liga à excomunhão penas temporais, ou se obriga os
incrédulos e mesmo os crentes à ortodoxia e à prática dos
deveres religiosos, essa intervenção da força em negócios
da consciência não mais pertence à intolerância religiosa”.

“Uma Igreja (conclui Júlio Simon) está, pois, no seu


direito, quando aos seus fiéis impõe a obrigação de crer
em tudo que ela ensina, isto é, quando em si mesma
pratica a intolerância religiosa; então não mais faz do que
obedecer ao seu princípio, que é o princípio da autoridade.
É para ela uma questão de vida ou de morte: nem pode em
si mesma introduzir o princípio de livre exame sem que
cesse de ser uma religião”12.

A tolerância política ou civil não é o que entre nós


existe, nem se deve confundir com o indiferentismo. O
Estado que reconhece uma religião (como outrora sucedia
entre nós) pode, por motivos de ordem pública, tolerar os
cultos dissidentes, comprometendo-se a não incomodar os
que os professam; mas disto vai grande distância a não
reconhecer religião alguma e a proibir no pacto
fundamental qualquer aliança entre a religião e o
Estado13.

Quanto à tolerância para com os que erram, escusado é


dizer que ela decorre da mesma natureza do cristianismo.
Jesus Cristo, o divino modelo, orava na Cruz pelos seus
perseguidores. S. Agostinho preceituava a morte dos erros
e o amor dos que erram: Diligite homines, interficite
errores. S. Bernardo queria que se conquistassem os
hereges com argumentos e não com a espada: Hæretici
capiantur non armis, sed argumentis14. Nem para
invalidar este constante testemunho e esta doutrina
incessantemente pregada pode valer a alegação de alguns
abusos, cuja responsabilidade cabe à Igreja.

Passemos, pois, senhores, à increpada estreiteza do


dogma que nega a salvação aos que não são católicos.

É certo, dogmática, infalivelmente certo que fora da


Igreja Católica não pode haver salvação. Falando perante
católicos ilustrados eu não preciso citar os repetidos
passos da Escritura que estabelecem este dogma. “A
Igreja, nos Evangelhos (diz o célebre padre Ravignam em
uma das suas conferências), é o reino, é a cidade, é a casa,
é o aprisco, é o corpo. Fora do reino, da cidade, da casa
não há direito aos bens interiores: fora do corpo, o
membro separado não tem mais vida”.
Mas agora a objeção: E os homens bons que
antigamente viveram, cuja memória é, por assim dizer, a
honra da história, estarão todos condenados porque não
conheceram a doutrina cristã? Estará condenado um
Regulo, que abnegadamente se sacrificou pela pátria? Um
Sócrates, que laçou as bases da moral tão perfeita quanto
pudera ser desajudada da Revelação? Um Fabrício, de
quem se disse que menos dificilmente se apartara da
virtude do que o sol da sua carreira? E, para mais ainda
impressionar-nos, aí vem concomitantemente o argumento
do número, fazendo ver que a grande maioria do gênero
humano há de ser ou tem sido condenada e que o divino
sangue do Nosso Salvador se terá derramado por um
pequeno número de eleitos.

Sobre este ponto vale a pena ouvir o que a tal respeito


nos pondera um dos melhores escritores modernos, o
excelente padre Faber:

“Tenho ainda a fazer (diz-nos ele) outra queixa


impopular. A abominação da heresia está foram de moda e
vai-se tornando rara. Deus não é habitualmente
considerado como a verdade única; e assim a existência
das heresias não mais nos assombra a mente. Está
assentado que Deus nada deve fazer que nos seja penoso, e
que ao seu domínio não se deve conceder que assuma o
feitio de uma inconveniência ou de um estorvo à liberdade
das suas criaturas. Se o mundo perdeu a idéia do
exclusivismo, Deus tem de acompanhar-nos nesse
progresso, e há de abrir mão desse princípio em suas
relações conosco. O que a maioria quer, finalmente lhe
tem de ser dado. Tal é a regra e experiência de um país
constitucional. Assim a dissidência e a falsidade em
religião chegaram a ser menos odiosas e menos
assustadoras aos homens, simplesmente porque a elas
estão habituados. É necessário ter coragem, tanto moral
como intelectual, para acreditar que em erro se acha a
totalidade de uma grande nação, ou para pensar que vai
transviado um século inteiro. Porém a teologia, com
valorosa simplicidade, conclui que um mundo inteiro está
sujeito ao pecado, e não vê dificuldade em que a
verdadeira Igreja tão somente reclame uma diminuta parte
da população da terra”15.

Não se pode com mais finura sublinhar o erro dos que


à doutrina da eterna salvação pretendem aplicar o
princípio democrático das maiorias. Mas ainda aí o
argumento dos inimigos do dogma extraordinariamente se
avoluma pela exageração.

Não é verdade que o dogma católico tenha o caráter de


injustiça que lhe atribuem os latitudinários. Interrogado
em 1820 sobre esta melindrosa questão — qual seja
positivamente a doutrina católica com referência à
salvação dos protestantes — Frayssinous respondeu com
máxima clareza: “Aos olhos da Igreja Católica todas as
outras comunhões mais ou menos estão no erro: porém as
crianças batizadas em tais seitas são membros da Igreja
Católica, pelo batismo que propriamente lhe pertence; e
dúvida não haja que tais crianças se salvem, se morrerem
antes da idade da razão. E mesmo entre os adultos de
qualquer idade todos os que se achassem na ignorância
invencível da verdadeira fé, não seriam culpados de seus
erros, porque na sua boa fé achariam escusa perante
Deus”.
Nem é somente ao protestantismo (abrangidas nesta
denominação as diversas seitas cristãs e católicas) que o
catolicismo estende a sua compassiva doutrina.

Segundo os melhores tratadistas, a infidelidade, isto é,


a falta de fé, pode ser de três modos — negativa, privativa
e positiva ou contrária. Esta é a dos que, tendo abraçado a
religião verdadeira, depois a rejeitam total ou
parcialmente, o que constitui gravíssimo pecado.
Infidelidade privativa é a dos que, tendo ouvido falar da
verdadeira religião ao menos in confuso, não procuram
instruir-se a respeito dela, e por isto já é pecaminosa.
Quanto à primeira, a negativa é a dos que nunca ouviram
falar da fé; e, como é involuntária, não se constitui pecado,
sendo aliás pena do pecado original.

“A infidelidade dessas almas transviadas (ensina um


douto escritor) não é pecado, conforme a doutrina católica,
e não põe fora do caminho da salvação. E, notai-o bem, a
verdade católica é aqui mais tolerante do que a heresia dos
Baius, dos Luteros e dos Calvinos, segundos os quais a
infidelidade, qualquer que seja, é crime merecedor de
condenação, punindo Deus ao infiel, entenda-se aos que
não têm a mesma fé que tais hereges, não somente pelo
mal que ele faz sem querer fazê-lo, mas ainda pelo bem
que se esforça por fazer”16.

Fora da Igreja não há salvação — nada mais certo,


nada mais repetidamente asseverado nas Escrituras: mas
vejamos bem que três são os modos de pertencer à Igreja.

Uns pertencem igualmente ao corpo e à alma da Igreja


— e tais são os que no seio dela receberam o batismo e
observam o que ela declara necessário à salvação. São os
verdadeiros cristãos, os filhos abençoados de Deus, os
católicos em estado de graça.

Outros pertencem ao corpo da Igreja, mas não à sua


alma: — e são os católicos em pecado, a cuja salvação não
bastará o sacramento do batismo, se para delirem o efeito
de suas más obras não recorrerem à penitência.

E outros, finalmente, não pertencendo ao corpo da


Igreja, porque não foram batizados, contudo pertencem á
sua alma, pela caridade que os une a Deus. A ignorância
invencível ampara-os dos raios que fulminam a
infidelidade voluntária; e, se a esta ignorância eles reúnem
a fé sobrenatural, nas verdades absolutamente necessárias,
a observância da lei natural, o amor de Deus segundo o
conhecimento que d’Ele têm, e disposição para lhe
obedecer e servi-lo — não parece duvidoso que sejam
objeto de especial comiseração.

Neste assunto delicadíssimo, senhores, tremo de


adiantar-me inconsideradamente mas creio que irei bem
com S. Justino:

“Jesus Cristo (ensina ele) é o Filho Único, o


Primogênito de Deus e a soberana razão de que todo o
mundo participa. Todos os que viveram conforme esta
razão divina são cristãos, posto que acusados de ateus.
Tais eram entre os gregos Sócrates, Heráclito e os que se
lhes assemelharam; e entre os bárbaros Abraão, Ananias,
Azarias, Mizael, Elias e muitos outros de quem longo fora
referir os nomes e as ações. Ao contrário, aqueles dentre
os antigos que não regraram a sua vida pelos ensinamentos
do Verbo e da razão eterna, eram inimigos de Jesus Cristo
e dos que viviam segundo a razão. Mas todos os homens
que viveram segundo essa razão, são verdadeiramente
cristãos e devem estar isentos de qualquer temor”17.

E, depois do santo medieval, o grande Pontífice


moderno:

“Sabeis (disse Pio IX) que aqueles a quem aflige


invencível ignorância relativamente à nossa santa religião,
mas que fielmente observam a lei natural e os princípios
gravados em todos os corações e que, habituados a
obedecer a Deus, levam uma vida honesta e proba, podem,
pela luz da graça divina, alcançar também a vida eterna;
porque Deus, que vê plenamente os corações, os espíritos,
os pensamentos, os hábitos, perscruta e julga segundo a
sua extrema bondade e clemência, e não pune com eternos
suplícios os que não foram verdadeiramente culpados”18.

E ainda não é tudo, senhores. As dificuldades do


julgamento e da condenação de um herético, de um
excomungado ou de um infiel acrescentam-se as
formidáveis sombras das suas disposições no momento
tremendo da morte. O destino de cada homem só é
determinado no seu último instante, e só Deus o conhece.

Está condenado Lutero? — perguntou alguém a S.


Francisco de Sales; e o virtuoso bispo de Genebra
respondeu que o não sabia.

Deus, que à sua Igreja, pelo órgão do Sumo Pontífice,


atribuiu o direito de proferir infalíveis sentenças sobre a
canonização dos Santos, não lhe concedeu a permissão de
pronunciar-se no tocante à condenação dos que mal
viveram.

O padre Gratry19, na sua Filosofia do Credo, refere a


este respeito um fato característico. Certo réu de morte
sobe ao cadafalso entre exortações de piedoso confessor,
mas obstinado lhe resiste aos conselhos e às súplicas. O
condenado repele o santo homem e redobra de blasfêmias.
“Cristãos, — exclama então o padre – vinde ver como
acaba um réprobo!” Quarenta anos depois, trata-se de
canonizar o sacerdote; heróicas eram as suas virtudes, e
incontestáveis alguns milagres que operara: mas a essas
provas opõem-se as imprudentes palavras que ele tinha
proferido sobre o patíbulo do impenitente, e tanto bastou
para que a canonização se não efetuasse. A Igreja, severa
neste ponto, como em todos os que entendem com matéria
dogmática, recusou o culto de dulia ao servidor de Deus,
porque indiscreto se antecipara nos mistérios da Suprema
Misericórdia.

Ora aí está, senhores, em toda a sua caridade,


mansidão e doçura o ensinamento católico, tão acoimado
de intolerância e dureza; e não vos escapará, em
contraposição, quanto é cruel, na sua inconseqüência, a
doutrina protestante, cujo latitudinarismo não se estende à
infidelidade negativa.

Quanto ao proveito que do indiferentismo em religião


colhem as más paixões, acossadas pela severidade
católica, facilmente comigo eis de convir que não pode
existir argumento mais contraproducente e que mais
deponha contra a pureza de uma opinião. O indiferentismo
é o albergue em que se encontram a bigamia, a flacidez do
caráter, o desfibramento moral. Não é aí que devemos
buscar pouso, neste jornadear pelo mundo, porque
realmente ficáramos em muito má companhia.

IV

Até aqui, senhores, me tem ocupado o indiferentismo


em geral; mas eu ainda ousaria chamar as vossas atenções
para os seus perniciosos efeitos na família e na agremiação
de família que constitui a nação.

Senhores, eu não sou um pregador rabugento; e


simplesmente vos pedirei que, pondo a mão na
consciência, cotejeis os hábitos da família moderna com
os de nossos pais. Não ignoro que há em nossa terra
inúmeros chefes de família bons católicos, mas o que
afirmo é o afrouxamento dos laços que à Divindade
prendiam os habitantes de cada lar doméstico. A oração
em comum, freqüentíssima entre os protestantes no dia do
Senhor, raras vezes se pratica entre os católicos. É preciso
que isto se diga para envergonhar-nos e para que nos
corrijamos. Nossos maiores rezavam o terço em família. O
chefe orava e os demais, parentes ou servos, respondiam...
Quantas as casas onde ainda isto se faz? Qual mesa em
que antes e depois da comida se rendam graças ao Deus
que nos disparte o pão de cada dia?

Se da família propriamente dita passarmos a outros


maiores grupos sociais, o mesmo notareis, e de modo
ainda mais deplorável. Há, em todas as sociedades, duas
famílias especiais, não constituídas pela consangüinidade,
mas por certos vínculos menores, que às vezes ainda mais
prendem que os do sangue. Uma delas é o exército, grupo
de irmãos cuja solidariedade se afirma em trabalhos e
perigos comuns; e a outra é a marinha, dividida em
pugilos de homens, que quotidianamente se atiram entre
os abismos do céu e das águas. Pois bem, ao nosso
exército e à nossa armada se proíbe que em público
adorem a Deus. Ao diabo deixa-se a porta franca; e ainda
mal para os governos, porque não pode haver melhor
conspirador do que o chefe da primeira conspiração.

Lembra-me ter lido numa bela página do Visconde de


Vogue, que antes de ser abalizado membro da Academia
das Letras, em França, soube ser um valente oficial no
campo de batalha. Refere ele que, uma noite em 1870, por
ocasião daquele terrível duelo entre a França e a
Alemanha, passeava nas linhas avançadas do seu exército
donde podia avistar os fogos do inimigo. Do lado dos
franceses soavam músicas improvisadas, a cujos acordes
festivos dançava a oficialidade com as mulheres de vida
airada que acompanhavam as tropas. Do lado dos alemães
silêncio profundo; mas eis que de súbito o interrompe um
clamor solene e majestoso: eram os cânticos religiosos dos
soldados germânicos, que se encomendavam ao Deus das
batalhas na véspera talvez de mortífero encontro. Desde
então (conclui o escritor francês), desde então compreendi
para que parte penderia a vitória...

Senhores, evocando as minhas recordações pessoais


posso dar testemunho da profundíssima impressão que
muitas vezes me causou o Bemdicto rezado nos quartéis
brasileiros. Era um coro misticamente patriótico, e onde,
congraçadas as vozes do caboclo da Amazônia, do guasca
do rio-grandense ou do mestiço baiano, eloqüente se
proclamava que sobre a diversidade regional e étnica,
sobre a diferença de habitáculo e de raça, havia
um quid comum e que a todos prendia com os mesmos
laços da crença e do amor. Estes soldados, senhores, de
vitória em vitória caminharam desde o Passo da Pátria até
Aquidaban. Pode ser que haja outros mais filósofos, mas
eu afirmo que nunca os houve mais intrépidos no combate
nem mais sofredores nas agruras da sua nobre profissão.

Relativamente ao grande todo social, a nação na


separação da Igreja do Estado se resume a suprema
aspiração do indiferentismo religioso.

Admira, senhores, que a tamanho número de bons


espíritos haja reduzido essa fórmula de impiedade, porque
mesmo entre católicos, e ousarei dizer que mesmo entre os
membros do clero, tenho encontrado vítimas de tal erro.

Em duas classes podem agrupar-se os que objetam


contra a união da Igreja e do Estado: havendo de uma
parte a oposição declarada dos inimigos da Igreja, que
almejam vê-la desajudada de todo socorro; e de outro lado
o paralogismo dos católicos que gostosamente aceitam tal
separação como um penhor de independência e
prosperidade.

Senhores, a verdade neste ponto, como nos outros, está


nos ensinamentos da Santa Sé, que explicitamente
condenou a doutrina da separação. A proposição
condenada que no Syllabus tem o n° 55, não nos pode
deixar dúvidas a tal respeito, máxime tratando-se de país
que o nosso foi e tem sido católico. A Igreja deve separar-
se do Estado, e o Estado da Igreja, Ecclesia a Statu,
statusque ab Ecclesia sejungendus est — eis a doutrina
errônea já anteriormente verberada pela
alocução Acerbissimum, de 27 de setembro de 1852.

Outras proposições condenadas e referentes ao mesmo


erro são as leis n° 77, 78 e 79, isto é:

1° Que em nossos dias não mais convém que a religião


católica seja considerada como a única religião do Estado,
com exclusão dos demais cultos. E de acordo com esta
condenação já se enunciara a alocução, Nemo vestrum, de
26 de julho de 1855.

2° Que, assim, com razão é que, em alguns países


denominados católicos, acautelou a lei aos imigrantes a
liberdade de publicamente exercerem o culto público de
cada um. Doutrina esta já fulminada pela
alocuçãoAcerbissimum, de 27 de setembro de 1852.

E, 3° — ser com efeito falso que a liberdade civil de


todos os cultos, e o pleno poder, a todos concedido, de
explícita e publicamente manifestarem todas as suas idéias
e todas as suas opiniões, contribuam para a corrupção dos
costumes e do espírito dos povos, bem como para
propagar a peste do indiferentismo.

Condenação esta já pronunciada na


alocução Nunquam fore, de 15 de dezembro de 1856.

São estes os fundamentos da doutrina católica, e com


quanta razão estatuídos facilmente se descortina, pela
improcedência das objeções.
Uma delas é que aspiram os católicos a intolerante e
despótico predomínio pelo estabelecimento legal de uma
religião de Estado. Mas em verdade assim não é, nem
poderia ser, observados os conselhos da Igreja.

Percorram-se com ânimo imparcial as páginas da


história, e nelas se encontrará a demonstração do meu
asserto.

A Igreja Católica, senhores, nunca pretendeu ganhar


prosélitos pelo emprego da força material; e muito são de
notar as lições de tolerância e humanidade de que deram
provas os seus representantes em épocas que o pedantismo
atual não duvida acoimar de bárbaras e atrasadas.

Assim, por exemplo, no alvorecer da Idade Média o


Papa S. Hormisdas, que foi Sumo Pontífice de 514 a 523,
dando instruções aos legados que mandara a
Constantinopla para a reconciliação dos hereges,
ponderava acertadamente: “O que nos importa e aquilo em
que zelosamente deveis trabalhar, é que ninguém se
convertasem conhecimento de causa, nem venha a
queixar-se de que o príncipe o obriga a fazer uma
profissão sem o medicamento da doutrina”.

O Papa Nicolau I, cognominado o Grande, e que


reinou de 858 a 867, respondeu aos búlgaros que o
consultavam a respeito de conversões: “Quanto aos que
refusam aceitar o bem do cristianismo, nada vos podemos
escrever senão que os convençais à verdadeira fé mediante
advertências, exortações e argumentos, antes do que pela
força, porquanto tudo o que não procede da boa vontade,
não pode ser bom. Deus somente quer homenagens livres
prestadas por seres livres”.

Suarez, o grande filósofo e teólogo jesuíta, cujos 23


volumes são um dos mais assombrosos repositórios do
saber humano, e parte de cujas obras tiveram a honra de
ser queimadas em Londres pela mão do carrasco
protestante, — Suarez, falando do poder civil, nega-lhe o
direito da coação para fazer abraçar a fé: “Neque coactio
ad suscipiendam fidem licite usurpari potest ex vitalis
potestatis...”20.

Finalmente, senhores, é princípio coerente do direito


canônico que — ninguém obrigue ao batismo dos judeus
que o recusam e que não o querem: “Ut nullos invitos aut
nolentes Judœs ad baptismum venire compellat”21.

Já se vê, pois, quão infundada é esta balela da invasão


das consciências pelo catolicismo erigido em religião do
Estado; e, como retorsão do argumento, eu poderia
perguntar aos sectários do indiferentismo a que excessos
de satânico zelo os tem arrastado a sua falta de religião.

Sim, eu tenho aqui o direito, senhores, de evocar, no


estilo sóbrio e com o insuspeito critério de um historiador
protestante, do eminente Guizot, uma página da revolução
francesa...

Era setembro de 1792.

“...Nada mais temos que fazer aqui, exclamam os


Marselheses, vamos aos Carmelitas!”. Os padres ali
estavam juntos em grande número, e uma chamada
nominal acabava de reuni-los todos no jardim. Os gritos
dos sicários reclamavam o arcebispo de Arles, acusado de
haver no meio-dia tramado uma conspiração reacionária.
Adianta-se o ancião, saindo de um pequeno oratório.
Quiseram retê-lo: acabava ele de pedir a absolvição a um
de seus companheiros. “Deixai-me passar, disse, talvez
que o meu sangue lhe chegue”. Depois, voltando-se para
os assassinos: “Aqui me tendes, sou quem procurais,
poupai a estes, eles rezarão por vós na terra e eu no céu”.
Cobriam-no de insultos. “Nunca fiz mal a ninguém”,
respondeu o arcebispo — “pois vou eu fazer-to”,
exclamou um marselhês dando-lhe com a espada no rosto.
E o velho caiu debaixo de pancadas.

“Os padres, perseguidos pelos algozes, que riam e


cantavam, fugiam pelo jardim, de árvore em árvore, de
muralha em muralha; as vítimas sucumbiam umas após as
outras orando a Deus. Os feridos foram reunidos na Igreja:
saíram dois a dois e foram trucidados na escadaria. O
bispo de Saintes estava com a perna quebrada. ‘Senhores,
disse, não me recuso a morrer com meus irmãos, porém
não posso andar’. Agarraram-no por baixo dos braços para
leva-lo ao suplicio. Seu irmão, o bispo de Beauvais, já fora
morto. De antemão se tinham feito as covas perto da
Barreira de Saint-Jacques; e havia carroças que esperavam
para transportar os cadáveres...”22.

Dulaure que foi membro da Convenção Francesa, o


que bem o define em assuntos religiosos, em concisa
página dá testemunho dos processos empregados pelos
racionalistas e deístas em relação ao clero católico: “A 9
de novembro (de 1793), de noite, Hébert, Luillier,
Chaumette e Momoro dirigiram-se à casa do arcebispo de
Paris, Gobel, e com ameaças o intimaram a que no dia
seguinte comparecesse perante a Convenção, para abjurar
a religião católica e declarar que tudo o que até então
ensinara era um tecido de absurdos. ‘Hás de fazê-lo,
disseram-lhe, ou estás morto...’ O velho solta gritos
lamentosos, deita-se-lhes aos pés, pede-lhes, conjura-os,
com o pranto nos olhos, a que lhe poupem tal
ignomínia: foram inexoráveis! Nem a todos os padres é
dado terem a força dos mártires. Gobel salvou a vida por
algum tempo: mas prometendo apenas que renunciaria ás
suas funções”23.

Para acabar este quadro da tolerância do


indiferentismo e se ainda lícito me fosse demorar o vosso
espírito nestas penosas reminiscências, eu ainda vos
lembraria aquele padre Salignac — Fénelon, sobrinho do
preclaro autor do Telemaco, e fundador da obra pia dos
Petits Savoyards, santo velho de 80 anos, condenado à
morte em 1794, a quem muitos dos seus pequenos
protegidos acompanharam até o patíbulo, e que só pedia
lhe desatassem as mãos para abençoa-los24; aquelas
quatorze carmelitas de Compiègne, que foram para o
suplicio todas vestidas de branco, cantando o Te-Deum, e
que no sopé da guilhotina renovaram os seus votos,
pedindo a Deus que mediante aquele sacrifício aplacasse a
sua cólera25; eu vos recordaria, senhores, que na obra de
Guilon, estampada em 1821, o martirológio dos prelados,
padres, religiosos e leigos que morreram na fé católica,
vítimas do racionalismo e da tolerância da revolução
francesa, não foram menos de quatro volumes de 700
páginas26.
Depois disto creio que tendes idéia formada sobre a
sinceridade da objeção que estou rebatendo... Passemos a
outras.

Figura, entre elas, o singularíssimo argumento — que


o indiferentismo, proscrevendo a obrigatoriedade de
qualquer culto, tem pelo menos um préstimo, o de não
ofender o melindre religioso da população dissidente. Mas
esse adquire ridículo aspecto em um país onde a estatística
somente acusa 154.300, digamos 155.000 acatólicos em
mais de 14 milhões de católicos27.

Um desgraçado apóstata, que já compareceu diante


perante Deus, certo dia enraivou-se contra a imagem do
Crucificado, que lá estava no recinto do júri para aos
juízes de fato intimar que a misericórdia pode ser
companheira da equidade; e por satisfazer ao renegado, os
demais jurados católicos deixam de contemplar a divina
efígie, nem pode o réu alçar os olhos mais altos do que
para a justiça dos homens.

Na Sexta-Feira da Paixão um professor lembrou-se de


dar aula; e para não magoar os escrúpulos do incrédulo,
todos os seus alunos católicos, foram obrigados, sob pena
de ponto, a violar o santificado repouso desse dia.

Por dentro de um regimento passa Nosso Senhor


Sacramentado: e, para não se obrigar algum herege a
reverenciá-lo, coage-se toda a fileira católica a lhe não
prestar adoração.
Basta... Eis o que se chama o respeito das maiorias sob
uma forma de governo em que teoricamente elas fazem a
lei!

Prossigamos, senhores... O Estado, diz-se, havendo


por objeto a prosperidade temporal dos homens, nada tem
que ver com a religião, cuja missão é encaminha-lo à
felicidade eterna; e logo aí vêm, forçosamente, as palavras
de Nosso Senhor: — Dai a César o que é de César, e a
Deus o que é de Deus... Ou então: O meu reino não é deste
mundo.

Senhores, não pode haver sofisma mais capcioso. É


verdade que distintos sãos os objetos da sociedade
temporal e da Igreja; Mas lícito não é disto inferir que em
tudo possam e devam funcionar separadamente, desde que
muitas e importantíssimas são as relações entre seus fins.
O Estado dá leis ao cidadão, não ao fiel, ninguém o
contesta; mas a verdade é que o correto desempenho dos
deveres cívicos essencialmente depende das crenças
religiosas de cada qual.

Uma das mais grandiosas personificações do poder


humano, o grande capitão do transacto século, Napoleão I,
com o seu olhar de águia tinha apanhado esta grande
verdade e, dirigindo-se ao clero de Milão, em 5 de junho
de 1800, nobremente expressou com a sua habitual
clareza:

“Persuadido (exclamou) de que esta religião é a única


que possa granjear verdadeira felicidade a uma sociedade
bem constituída e firmar as bases de um governo, aplicar-
me-ei a protegê-la e a defendê-la por todos os meios.
Também eu sou filósofo e sei que em uma sociedade, seja
ela qual for, nenhum homem pode ser tido como virtuoso
e justo, se não sabe de onde vem para onde vai. Não pode
a simples razão orientar-nos sobre tal matéria. Sem a
religião caminhamos de contínuo nas trevas, e a religião
católica é a única que ao homem dá luzes certas e
infalíveis sobre o seu princípio e último fim. Não pode
existir sociedade sem moral, não há moral sem religião; e,
portanto, só esta pode dar ao Estado um apoio firme e
durável. Sociedade sem religião é navio sem bússola: e em
tais condições nem há certeza no rumo nem esperança de
aportar em salvamento”28.

De acordo com o gênio prático de Napoleão está a fria


doutrina de um racionalista:

“Uma verdadeira religião (escreveu Jouffroy) não é


outra coisa senão uma solução completa das grandes
questões que interessam a humanidade, isto é, o destino do
homem, a sua origem, o seu futuro, suas relações com os
seus semelhantes. Ora, é em virtude das opiniões
professadas pelos povos sobre tais questões, que eles se
dão culto, leis, governo; que adotam certos pensamentos,
certos hábitos, certos costumes; que aspiram a certa ordem
de coisas, a qual para eles é o ideal do belo, do bom, da
verdade neste mundo. Toda verdadeira religião arrasta,
pois, necessariamente consigo, não só um certo culto, mas
uma certa organização política e certos costumes”.

Isto, senhores, é do racionalista Jouffroy29, e, se


depois da política e da filosofia quereis ouvir a autoridade
religiosa, recebamos como celestial ensinamento o do
Egrégio Pontífice que, correspondente às três coroas da
sua tiara, tem a tríplice auréola das suas veneráveis cans,
da sua sabedoria e das suas virtudes. Diz Sua Santidade
Leão XIII:

“Observação mais importante é que o poder civil e o


sagrado, conquanto nem tenham os mesmos fins nem
andem pelos mesmos caminhos, todavia no desempenho
de suas funções algumas vezes se devem encontrar.
Ambos, com efeito, exercem a sua autoridade sobre os
mesmos súditos e mais de uma vez sobre os mesmos
objetos, posto que sob aspectos diferentes. O conflito nesta
ocorrência fora absurdo e abertamente repugnaria à
Infinita Sapiência dos conselhos divinos. Urge, pois,
necessariamente, que haja um meio, um processo para
fazer desaparecer as causas de contestações e de lutas, e
estabelecer o acordo prático. E este acordo, sem razão não
foi que o compararam à união existente entre a alma e o
corpo; e isso com grande vantagem de ambos os
conjuntos, porque a separação é particularmente funesta ao
corpo, pois que o priva da vida”30.

Mais explícita e autorizadamente não se poderia


explanar a doutrina.

Quanto às palavras de Jesus Cristo citadas pelos


apologistas da separação da Igreja e do Estado, não podem
ter a significação que se lhes atribui.

Mandando pagar ao príncipe o tributo legal, nosso


Divino Salvador preceituava o respeito às leis civis, o que
de nenhuma forma inculca que entre o Estado e a Igreja se
despedacem os vínculos que naturalmente os conjugam.
O segundo texto também costuma ser falseado.
Citemo-lo integralmente: “Meu reino não é deste mundo,
porque, se o meu reino fosse deste mundo, os meus
combateriam para que eu não fosse entregue aos Judeus;
porém agora o meu reino não é deste mundo”. Tal é o
texto do Evangelho de S. João, cap. 18, vs. 36. E agora
atendei ao comentário de S. Agostinho:

“Cristo não diz o meu reino não é aqui e sim que ele
não é daqui. Não disse: o meu reino não é neste mundo, e
sim deste mundo. Em verdade o seu reino é aqui, até a
consumação dos séculos”.

Extraordinário seria, com efeito, que tendo baixado


Jesus Cristo para salvar o gênero humano, houvesse
ensinado a indiferença das coisas temporais naquilo em
que elas interessam à eterna salvação dos príncipes e dos
povos.

E tão fora do natural, senhores, é essa separação dos


dois poderes que — notai-o bem — um deles só continua
a ter vida, porque se atribui a força moral que logicamente
decorre do outro poder, que único domina as consciências.

Que são, realmente, senhores, os códigos penais das


nações modernas, senão o transmuto, adulterado, é certo,
mas em todo o caso o transmuto dos eternos preceitos do
Decálogo? Suprimi o Decálogo e todos os códigos só terão
a força irrisória das baionetas. Suprimi a religião e com ela
não tardarão a vir abaixo as construções sociais que
pretendam dispensá-lo.
“É admirável — disse uma vez Proudhon — que no
fundo da nossa política achemos sempre a teologia”31. “O
que é admirável, — respondeu-lhe Donoso Cortez — é a
admiração expressa em tais palavras. Pois não é a teologia
a ciência de Deus, o oceano que contém e abraça todas as
ciências, como Deus é o oceano que contém o abraço
todas as coisas?32.

Ouvi, senhores, sobre este ponto de magna


importância as conceituosas palavras do eminente D.
Antônio de Macedo Costa:

“... A moral dimana do dogma — ensina-nos ele. Tal


religião, tal moral. Livres pensadores, evolucionistas,
como sois, não podeis logicamente admitir senão uma
moral toda relativa.

“Partidários da absoluta liberdade de consciência


quanto às crenças, deveis sê-lo igualmente quanto à moral
que delas dimana... Ora, onde irá parar a pobre moral e a
sanção dela no meio desse turbilhão de sistemas
fantásticos, de hipóteses arbitrárias, que se cruzam e
recruzam no mundo das inteligências contemporâneas sob
o aparatoso nome de ciência? Rota e desfeita em pedaços a
unidade religiosa, entronizado nas instituições o
indiferentismo para com todos os cultos, o direito de
professar todos eles ou de se não professar nenhum, ficará
sendo evidentemente a moral um nome vão: cada um a
entenderá e a praticará a seu modo, como a religião”33.

Realmente, senhores, com que direito o poder público,


aqui no Brasil, onde ele nenhuma aliança quer com
qualquer culto religioso, irá proibir certos crimes contra o
pudor? É falso que a moral universal os condene, porque
eu vos citaria, como prova contrário, inúmeras torpezas de
várias seitas antigas e modernas, desde as abominações da
Astarte fenícia, passando pelos delírios dos Adamitas, até
às perversões quase contemporâneas do satanismo...

Com que direito os poderes públicos vedam a


poligamia simultânea, ou mesmo a poliandria, se para o
Estado o matrimonio, destituído do seu caráter
sacramental, não passa de um contrato meramente civil?
Se assim é, quem pode impedir que com diversas mulheres
contrate um homem o fabrico familiar? Acaso não o
permite a lei de Maomé, ainda tão em voga em muitos
países? Nem é tudo: atendendo aos rápidos triunfos do
feminismo, as mulheres emancipadas do jugo do
Evangelho reclamarão para si o mesmo direito, e aí as
teremos, as mães de família livres-pensadores, campeando
nos seus serralhos, ou antes nos seus androceus, no meio
de muitos esposos simultâneos...

Partindo dos princípios de Darwin, tão ardentemente


admitidos, encomiados, ampliados e vulgarizados em
nossas escolas, uma mulher ilustrada, Mme. Clemencia
Royer, condena como viciosa a caridade cristã e aconselha
pela renovação dos costumes espartanos o morticínio das
crianças34.

Proudhon, por outro lado, como não ignorais,


considera inadmissível perante a razão o direito de
propriedade e faz a apoteose da anarquia — “forma de
governo (diz ele) da qual todos os dia nos
aproximamos”35.
Aí tendes, senhores, os últimos paradeiros da moral
livre. De cada um desses insensatos pode acercar-se o
padre católico e falar-lhe em nome de Jesus Cristo, que é o
caminho, a verdade e a vida. Mas em nome de que lhe
falará um poder civil que se declara dissociado de Deus?
Com que força há de sufocar tais corolários, ele que
protege a sementeira dos maus princípios? Arastis
impietatem (diz um profeta) iniquitatem messuistis,
comedistis frugem mendacii36. O que estamos comendo é
o pão da mentira, arado e segado por maus governos.

Lembra-me, senhores, que sobre este assunto por


vezes discorri com um dos pais desta república, ele
sustentando a possibilidade de uma moral exclusivamente
científica, e eu, forte na minha fé, a mostrar o absurdo
dessa vã construção sem os fundamentos religiosos. E o
último argumento de meu ilustre contendor, que era
positivista, foi todo pessoal. “Veja bem, disse-me, aqui
estou eu, aí está meu genro, ambos discípulos de Comte; e
acaso não somos dois bons chefes de família?” — Sim,
respondi-lhe, não contesto as vossas virtudes domésticas,
mas tanto ele como vós sois vasos que se encheram de
oloroso bálsamo, e que conservam o perfume mesmo
depois de evaporado o líquido. Evolou-se-vos o dogma,
mas ficastes impregnados da moral cristã. Não me servis
para exemplo. Para aquilatar os frutos da moral positivista,
faz-se preciso ver o que farão vossos discípulos
completamente descristianizados... E senhores, não foi
preciso aguardar muito tempo. Dois lustros não eram
decorridos – e já todos sabiam quanto descera, sob o
influxo do comtismo, no extremo norte, no Amazonas, o
nível da moralidade pública e particular, e quanto no
extremo sul, no Rio Grande, se embravecera a crueldade, a
fereza, o canibalismo partidário...

Os governos que professam o indiferentismo são aliás


bastantes perspicazes para perceberem que tudo têm a
perder praticando-o; e isso se verifica, Exmo. E Revmo.
sr., nas infrações constitucionais que repetida e
forçosamente cometem.

Que significa a manutenção de uma embaixada do


nosso governo em Roma, junto à Santa Sé, senão o
reconhecimento da autoridade que o Santo Padre exerce
sobre as consciências católicas, e que teria de ver com isto
o governo, se ele também não reconhecesse que na
consciência religiosa está o modo de entender os deveres
cívicos?

Que quer dizer aquela visita do atual Sr. Presidente da


República ao Santo Padre, se não foi a expressão do
desejo da colaboração das duas potestades para realizarem
o que têm de fazer em comum? Porque não visitou o Sr.
Ex. qualquer dos chefes das confissões protestantes?
Porque não visita, aqui no Rio, o pontífice da grei
positivista?

E que significação, por outro lado, podem ter as


provas de deferência dispensadas pelos nossos Bispos a
um poder que constitucionalmente os desconhece como
prelados? E como isto explicaríamos, se em tal não
enxergáramos a piedosa aspiração de renovar o consórcio
que infelizmente se destruiu?
Harmonia e não união, — alegam alguns... Mas isto é
abusar das distinções. Por minha parte não compreendo a
situação do casal divorciado, e no qual marido e mulher
repetidamente se visitassem, trocando demonstrações de
afeto...

Basta, porém, senhores, pois sinto a necessidade de


pôr termo a esta exposição, que já vai longa, e com que há
tanto tempo abuso da vossa atenção... Tenho combatido,
não com minhas débeis forças, porém mediante valiosos
subsídios e robustos auxiliares, as especiosas razões com
que se abona o indiferentismo religioso; mas estulta
vaidade seria a minha, se acaso me vangloriasse de o
haver debelado.

Possam das minhas palavras germinar tão somente


algumas convicções, e por feliz me darei, eu que sou o
mais obscuro e o mais inábil dos semeadores de verdades!

O indiferentismo religioso, senhores, é uma das


feições da apatia, da astenia moral que infirma a quadra
contemporânea. Houve um filosofo (Romilly Junior) que
definiu a tolerância como a virtude dos fracos. Não era da
tolerância, era do indiferentismo que ele queria falar. Nas
sociedades decadentes o homem que crê e que espera, é
uma espécie de fóssil, digno talvez de admiração, mas
fatalmente condenado à celebridade dos museus. A
dúvida, a transigência, a indiferença não exigem a força da
afirmação e por isto mesmo são muito cômodas. Em
literatura aceitam-se todas as enormidades, todas as
imundícies e só se faz questão de forma; perdeu-se na arte
o sentimento do grandioso; em filosofia guerreiam-se os
ideais, apenas se admite o que nos entra pelos olhos ou
pelos ouvidos; na política endosam-se todas as opiniões
vencedoras, bajulam-se todos os fatos consumados; em
religião todas as seitas são boas, e tanto vale o erro como a
verdade... Nesta baixura alagadiça, onde amolecem os
caracteres, é que uma falsa democracia estabeleceu a sua
cátedra de pestilência...

Mas ataquemos, senhores, o indiferentismo em


religião — e tudo estará feito. Temperadas no catolicismo,
as almas saberão achar o caminho do belo nas letras e nas
artes, o da verdade na filosofia, o da justiça no governo
dos povos.

E nesse dia, senhores, (endereçando-se ao Exmo. Sr.


Arcebispo) nesse dia, não só em nossos templos como
também na praça pública, o Brasil, o católico, proclamará
o nosso Deus, o nosso rei, Jesus Cristo, e caminhará,
precedido da Cruz, à realização dos mais brilhantes
destinos.

(Publicado em 1905, pelo Circulo Católico. Escola


Tipográfica Salesiana, Niterói)
1. 1.BERGIER, Dictionnaire de théologie,
verb. INDIFFÉRENCE.
2. 2.Auguste Comte et la philosophie
positive. 2ª ed. pág. 529.
3. 3.Systeme de politique positive, IV, 530.
4. 4.Politique positive, II, 8.
5. 5.Pascal, Pensées, 2ª parte, art. II.
6. 6.Cours de philosophie positive, 4ª ed.
paris, 1877 — Tom. IV, pág. 63.
7. 7.Verbum enim Crucis pereuntibus
stultia est. I Cor., I, 18.
8. 8.Gen, III, 5.
9. 9.Sermões, tomo L col. 303.
10. 10.Eclesisates, III, 11.
11. 11.Gen, XVIII, 12.
12. 12.Liberté de conscience, pg. 67 – 69.
13. 13.Nenhum culto ou Igreja gozará de
subvenção oficial, nem terá relações de
dependência ou aliança com o governo da União ou
dos Estados. —Constituição da República dos
Estados Unidos do Brasil, art. 72, § 7°.
14. 14.Sermões, 64.
15. 15.Faber, Spiritual
th
Conferences, 6 edition, London - Pg. 349 –350.
16. 16.P. Petitalot, Le Syllabus base de
l’union catholique, Paris, 1877. – Pg. 08.
17. 17.Apolog., II, pg. 83.
18. 18.Encyclica de 10 de agosto de 1863.
19. 19.Graty, Philosophie du Crédo, pg. 83.
20. 20.Suarez, De fide, Disput, 18ª, sect. 3ª,
n° 5, opp. 11 – Venet., 1742.
21. 21.Decret., L. V, Tit. VI, De Judœis, C.
V.
22. 22.Guizot, L’Histoire de France depuis
1789 juqu’en 1848. – Paris,1878 – Tom. I, pág.
120-121.
23. 23.Dulaure, Esquisses historiques des
principaux événements de la révolution française,
tom. III, pág. 132.
24. 24.Georges Duval, Souvenirs de la
Terreur, Tom. III, pág. 380.
25. 25.M. Jauffret, Mémoires pour servir à
l’histoire de la religion, Tom. II, pág. 350 e
seguintes.
26. 26.Guillon, Martyrs de la foi pendant la
révolution française, ou Martyrologe des pontifes,
prêtres, religieux, religieuses, laiques del’um et
l’autres qui périrent alon por la foi. – 1821.
27. 27.Pela estatística de 1890 a população
do Brasil assim se acha distribuída: Católicos
14.179.615; Evangélicos 19.957; Ortodoxos
(Gregos Cismáticos) 16.703; Positivistas 1.327;
Presbiterianos 1.317; Islamitas 300; outras seitas
122.469; sem culto 7.257. — Total 14.348.945.
28. 28.Apud, Berseaux, Liberte et
libéralisme. Nancy, 1889, pág. 144.
29. 29.De l’etat actuel d l’humanité.
30. 30.Encíclica Libertas prœstantissimum,
de 29 de junho de 1888.
31. 31.Confession d’um révolucionnaire,
pag. 61, 1849.
32. 32.Donoso Cortez, Œuvres
complète, Paris, 1862, tomo III, págs. 1 e 2.
33. 33.A liberdade de cultos, Rio de Janeiro,
1888. – pag. 39-40.
34. 34.Clemence Royer, no seu Prefácio
à Origine des espècies, pág. 56 e 61.
35. 35.Proudhon, Qu’est-ce que la
propriété? Pag. 277.
36. 36.Oseas, X, 15.

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